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Proc. nº 652/92
2ª Secção Relator: Cons. Luís Nunes de Almeida
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
1 - A. foi condenada no 4º Juízo Correccional de Lisboa, pela autoria material de um crime previsto e punível pelos artigos 164º, nº 1, 166º e 168º, nº 1, do Código Penal, na pena de seis meses de prisão substituída por igual tempo de multa à taxa diária de 300$00, e em 90 dias de multa à mesma taxa; e, em alternativa, na pena de seis meses de prisão. Foi ainda condenada em indemnização civil ao assistente B., no montante de 1.200.000$00.
De ambas as condenações, a arguida recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa, tendo subido, com este recurso, um outro que havia interposto de um despacho proferido no decorrer da audiência de julgamento, indeferindo uma diligência de prova por si requerida.
No Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 12 de Fevereiro de 1992, foi declarado amnistiado o crime imputado à arguida, e assim julgado extinto o respectivo procedimento criminal. O recurso prosseguiu apenas, a requerimento do assistente, nos termos do disposto no artigo 12º, nº 2, da Lei nº 23/91, de 4 de Julho (amnistia), para apreciação do pedido cível. E, quanto a este, veio a ser proferido o acórdão de 21 de Maio de
1992, que concedeu provimento parcial ao recurso, reduzindo a indemnização para
800.000$00.
A demandada recorreu de novo, agora para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro (actual redacção), porquanto o acórdão recorrido teria feito interpretação e aplicação dos artigos 379º e 374º do Código de Processo Penal por forma a violar as normas dos artigos 13º, nº 2,
32º, nºs 1 e 5, 32º, 52º e 210º da Constituição, e dos artigos 10º e 11º da Declaração Universal dos Direitos do Homem.
O recurso não foi admitido na Relação, por se ter considerado que não satisfazia as condições daquele artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº 28/82, porquanto em nenhuma peça processual a recorrente havia suscitado a inconstitucionalidade de qualquer das normas aplicadas.
2 - E daí a presente reclamação.
A reclamante discorda do motivo invocado pelo Tribunal de Relação para não admitir o recurso. O Ministério Público pronunciou-se no sentido do indeferimento da reclamação.
Corridos os vistos, cumpre decidir.
3 - A reclamação é improcedente.
Efectivamente, segundo a própria reclamante reconhece, o que foi alegado perante o Tribunal da Relação de Lisboa foi que «o Tribunal de 1ª instância violou os seguintes artºs da C.R.P: 13º-2;
32º-1 e 5; 52º, 210º-3 e ainda artºs 10º e 11º da Declaração Universal dos Direitos do Homem» [fls. 3 da reclamação, conclusão 15ª das alegações de recurso para o Tribunal de Relação (fls. 67 vº) e requerimento do recurso para o Tribunal Constitucional (fls. 77 vº)].
Ora, o recurso de constitucionalidade em questão foi interposto com fundamento na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, ou seja, por aplicação de «norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo». Tal recurso tem, portanto, de ter por objecto normas e não meras decisões judiciais, como o Tribunal Constitucional vem decidindo uniformemente.
Mas a reclamante, durante o processo, apenas invocou a inconstitucionalidade da decisão constante do acórdão de primeira instância, e não a de quaisquer normas que ela tivesse aplicado. É certo que, depois, ao recorrer para o Tribunal Constitucional (fls. 77), referiu que «o douto acórdão recorrido fez interpretação e aplicação dos artigos 379º e
374º do C.P.P. por forma a violar as normas constitucionais supra citadas». Aí, sim, suscitou a inconstitucionalidade de normas jurídicas; só que demasiado tarde, pois, tendo tido oportunidade de levantar tal questão anteriormente, e não o tendo feito, ela não pode ter-se por suscitada durante o processo, uma vez que nessa altura já havia sido proferida a decisão sob recurso.
4 - Assim, e pelo exposto, indefere-se a presente reclamação.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em seis U.C's.
Lisboa, 30 de Março de 1993
Luís Nunes de Almeida Mário de Brito Fernando Alves Correia
José de Sousa e Brito Messias Bento Bravo Serra José Manuel Cardoso da Costa