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Processo nº 684/92
1ª Secção Rel. Cons. Tavares da Costa
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
1.- O Ministério Público na comarca de Lisboa, deduziu, em 3 de Abril de 1991, acusação contra A., identificado nos autos, pela autoria material de dois crimes de emissão de cheque sem provisão, previstos e punidos pelas disposições conjugadas dos artigos 23º e 24º do Decreto nº 13 004, de 12 de Janeiro de 1927, este último na redacção dada pelo artigo 5º, nº 1, do Decreto-Lei nº 400/82, de 23 de Setembro.
A acusação foi recebida por despacho de 25 de Setembro seguinte pelo Senhor Juiz da 2ª Secção do 5º Juízo Correcional de Lisboa que, no entanto, por decisão de 27 de Abril de 1992, considerando o início de vigência, entretanto ocorrido, do Decreto-Lei nº 454/91, de 28 de Dezembro, o disposto no seu artigo 11º, nº 1, alínea a), ao exigir a verificação do requisito objectivo consubstanciado na existência de prejuízo patrimonial, e, bem assim, o disposto no artigo 2º, nº 2, do Código Penal, ordenou o arquivamento dos autos por se encontrarem despenalizadas as condutas imputadas ao arguido.
Interposto recurso pelo Ministério Público, a Relação de Lisboa, por acórdão de 20 de Outubro de 1992, negou provimento ao recurso, confirmando integralmente o despacho recorrido.
Suscitada, nas respectivas alegações, a questão da inconstitucionalidade da norma daquele artigo 11º, nº 1, alínea a), por alegada violação do disposto no artigo 168º, nº 1, alínea c), da Constituição da República (CR), o acórdão entendeu não se verificar o apontado vício.
2.- O Magistrado do Ministério Público junto daquele Tribunal, veio, ao abrigo do disposto no artigo 280º, nº 1, alínea b), e nº 2, alínea d), da CR e no artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, recorrer para o Tribunal Constitucional do aresto da Relação, por, em seu entender, se terem violado os artigos 168º, nº 1, alínea c), 3º, nº 3, e
115º, nº 2, da Lei Fundamental.
Recebido o recurso, só o representante do Ministério Público no Tribunal Constitucional apresentou alegações, concluindo por entender dever conceder-se provimento ao recurso, determinando-se a reformulação da decisão recorrida de acordo com o juízo de inconstitucionalidade que desenvolve e condensa, a final, do seguinte modo:
'1º- A reserva de competência legislativa da Assembleia da República relativa à 'definição de crimes' (artigo 168º, nº 1, alínea c), da Constituição) abrange quer a definição de novos tipos de crimes, quer a modificação, degradação ou eliminação de tipos existentes;
2º- No nº 1 do artigo 3º da Lei nº 30/91, de 30 de Julho, a Assembleia da República define como sentido da autorização legislativa concedida ao Governo para definir as condutas integradoras do crime de emissão de cheque sem provisão uma diferenciação consistente em exigir a verificação do requisito da produção de prejuízo patrimonial a outrem para a incriminação da conduta descrita na alínea c), e em não exigir a verificação desse requisito para a incriminação das condutas descritas nas alíneas a) e b);
3º- Ao estender a exigência da verificação desses requisitos para a incriminação das condutas descritas nas correspondentes alíneas a) e b) do nº 1 do artigo 11º do Decreto-Lei nº 454/91, de 28 de Dezembro - e, assim, ao não criminalizar tais condutas nos casos em que não ocorra a produção de prejuízo patrimonial para o tomador do cheque ou para terceiro -, o Governo desrespeitou o sentido da autorização legislativa que para o efeito lhes havia sido concedida;
4º- É, assim, inconstitucional (ou ilegal, consoante a qualificação que se prefira para o vício consistente em o decreto-lei autorizado, não extravasando o objecto da autorização legislativa, lhe desrespeitar o sentido), por violação do artigo 115º, nº 2, da Constituição, a norma constante do corpo e da alínea a) do nº 1 do artigo 11º do Decreto-Lei nº
454/91, na parte em que exige a verificação da produção de prejuízo patrimonial para outrem para a incriminação da conduta prevista nessa alínea.'
3.- A questão objecto do presente recurso - da inconstitucionalidade da norma do artigo 11º, nº 1, alínea a), do Decreto-Lei nº 454/91, foi, entretanto, apreciada por este Tribunal, em plenário e ao abrigo do artigo 79º-A da Lei nº 28/82, pelo Acórdão nº 343/93, de 19 de Maio de
1993, publicado no Diário da República, II Série, de 3 de Agosto último.
Por ser assim, não se detectando razões válidas para nos afastarmos da linha jurisprudencial então traçada, dispensando-se os vistos na sequência lógica deste mesmo entendimento e dando-se por reproduzidos neste lugar os fundamentos constantes daquele acórdão, decide-se:
a) não julgar inconstitucional a norma do artigo 11º, nº 1, alínea a), do Decreto-Lei nº 454/91, de 28 de Dezembro;
b) negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmar o acórdão recorrido, no tocante ao julgamento da questão de inconstitucionalidade.
Lisboa, 27 de Outubro de 1993
Alberto Tavares da Costa
Vítor Nunes de Almeida
Antero Alves Monteiro Dinis
Maria da Assunção Esteves
Armindo Ribeiro Mendes
José Manuel Cardoso da Costa