Imprimir acórdão
Processo: n.º 521/94.
Requerente: Presidente da República.
Relator: Conselheiro Bravo Serra.
Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional:
I
1 — O Presidente da República, estribando-se nos artigos 278.º, n.os 1 e 2, da
Constituição e 51.º, n.º 1, da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, veio solicitar
a este Tribunal a apreciação preventiva da constitucionalidade das normas
constantes do Decreto n.º 183/VI da Assembleia da República, na parte em que dá
nova redacção aos artigos 16.º, n.os 7 e 9, 33.º, n.º 2, e 53.º, n.os 5 e 6,
todos do Decreto-Lei n.º 85-C/75, de 26 de Fevereiro.
Para tanto, aduziu a seguinte argumentação:
os direitos de liberdade de imprensa e de resposta são direitos que, gozando do
estatuto de direitos fundamentais, se postam com igual dignidade, podendo
«entrar em rota de colisão», pelo que é de exigir ao legislador especiais
cautelas na sua harmonização prática, designadamente por forma a que a
respectiva limitação se «faça na medida estritamente necessária, com observância
do princípio da proporcionalidade»;
o artigo 1.º do Decreto, na parte em que dá nova redacção ao artigo 16.º, n.os 7
e 9, do Decreto-Lei n.º 85-C/75 — o primeiro só permitindo a recusa da
publicação da resposta nos casos de não ter sido respeitado o disposto no n.º 2
desse mesmo artigo 16.º ou de a sua extensão exceder os limites do n.º 5, e o
segundo ao proibir que o periódico insira no mesmo número em que foi publicada a
resposta qualquer anotação ou comentário à mesma — poderá configurar uma
desproporcionada restrição da liberdade de imprensa, já que, de um lado, impede
«à direcção do periódico recusar a inserção de respostas manifestamente
impertinentes, que contenham responsabilidade civil ou criminal ou a que faltem
os pressupostos legais do exercício do direito de resposta» e, de outro, «não
parece haver razão constitucionalmente fundada», para proibir a inserção, no
mesmo número do periódico em que for publicada a resposta, de anotações ou
comentários, com o fim restrito de apontar inexactidões, erros de interpretação
ou matéria nova nela contidos (como sucede com o n.º 6 do artigo 16.º do
Decreto-Lei n.º 85-C/75 em vigor), desse modo se «deixando prevalecer durante um
dia, uma semana ou um mês — conforme a periodicidade — a versão errada contido
no texto da resposta»;
aquele artigo 1.º do Decreto, na parte em que dá nova redacção aos artigos 33.º,
n.º 2, e 53.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 85-C/75, cominando as penas de multa de
Esc. 500 000$00 a Esc. 5 000 000$00 pela inobservância do direito de resposta no
prazo legal, pela recusa infundada do respectivo exercício, pela violação do que
se consagra nos n.os 3, 7 e 8 do artigo 16.º e pelo não cumprimento da obrigação
de publicação do extracto decisório da sentença determinativa da publicação da
resposta e desta mesma num dos dois números subsequentes à data do trânsito em
julgado daquela sentença e por cada edição posterior publicada sem a sua
inclusão, poderá ser «considerado excessivo e desproporcionado», mesmo quanto ao
seu limite mínimo, e isto «se se tiver em conta a situação de precário
equilíbrio económico-financeiro da generalidade das empresas jornalísticas,
muito particularmente das de âmbito local e regional, o que, a verificar-se,
poderá configurar uma restrição da liberdade de imprensa sem fundamento material
bastante»;
se se considerar que o princípio da culpa vigora também no domínio dos ilícitos
contravencionais, o que inculcará que «a medida da pena deverá ser sempre
determinada em função do grau de culpa do agente», poderá entender-se que o
artigo 1.º do Decreto, na parte em que dá nova redacção ao n.º 6 do artigo 53.º
do Decreto-Lei n.º 85-C/75, é feridente de tal princípio.
2 — O Presidente da Assembleia da República, notificado nos termos e para os
efeitos do artigo 54.º da Lei n.º 28/82, veio oferecer o merecimento dos autos e
fazer juntar aos mesmos exemplares dos Diários daquela Assembleia relativos ao
processo de edição do Decreto em causa.
II
1 — Em 31 de Março de 1994 aprovou o Governo uma proposta de lei de alteração do
Decreto-Lei n.º 85-C/75, de 26 de Fevereiro, proposta essa que veio a tomar o
n.º 99/VI (cfr. Diário da Assembleia da República, II Série-A, n.º 39, de 5 de
Maio de 1994).
Após parecer elaborado na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos,
Liberdades e Garantias (cfr. Diário da Assembleia da República, II Série-A, n.º
47, de 16 de Junho de 1994), foi a dita proposta de lei aprovada na generalidade
em 16 de Junho de 1994 (cfr. Diários da Assembleia da República, I Série, n.os
79 e 80, respectivamente de 16 e 17 de Junho de 1994).
A votação na especialidade foi efectuada na aludida Comissão (cfr. Diário da
Assembleia da República, II Série-A, n.º 53, de 14 de Julho de 1994) e, na
sessão plenário de 13 de Julho de 1994, procedeu-se ao debate da citada
proposta, tendo sido rejeitados, à excepção de um, vários requerimentos de
avocação a Plenário para votação na especialidade de disposições do texto
aprovado na Comissão (cfr. Diário da Assembleia da República, I Série, n.º 91,
de 14 de Julho de 1994).
A final, tal proposta veio a ser aprovada apenas com os votos do Partido Social
Democrata, assim se formando o Decreto da Assembleia da República n.º 177/VI
(cfr. Diário da Assembleia da República, II Série-A, n.º 55, de 16 de Julho de
1994) que, enviado ao Presidente da República para promulgação, foi objecto de
«veto político» pelas razões constantes da «Mensagem» que se encontra publicada
no Diário da Assembleia da República, II Série-A, n.º 59, de 22 de Setembro de
1994.
Na sequência de um tal veto, a Assembleia da República, na sua reunião plenária
de 22 de Novembro de 1994, veio a reapreciar na generalidade o Decreto n.º
177/VI (cfr. Diário da Assembleia da República, I Série, n.º 15, de 23 de
Novembro de 1994).
Nessa mesma sessão, e a propósito de um outro Decreto, igualmente objecto de
«veto político» do Presidente da República e que iria ser reapreciado, o
Presidente da Assembleia da República disse, a dado passo:
Neste momento, estou confrontado com uma dúvida jurídica.
Um Deputado alertou-me para o facto de a votação, na generalidade, deste decreto
não se destinar à sua confirmação. Também de acordo com os serviços jurídicos
da Assembleia, não é habitual a votação na generalidade versar sobre a
confirmação do diploma vetado, tal como está prescrito na Constituição e no
Regimento.
Foi-me dito que, tendo sido apresentadas propostas de alteração, não seria
necessária, nos termos regimentais e constitucionais, uma confirmação do decreto
com 116 votos favoráveis, para passarmos à fase seguinte da discussão na
especialidade.
Por estas razões, gostava de ouvir, sobre esta matéria, a opinião de um dos
Deputados juristas de cada grupo parlamentar para poder decidir em consonância
com a sensibilidade jurídica da Câmara.
Depois de uma tal intervenção, seguiu-se um diálogo, transcrito naquele Jornal
Oficial do Parlamento, que aqui se repete:
O Sr. Alberto Costa (PS): — Sr. Presidente, não como jurista mas na qualidade de
Deputado e desconhecendo os antecedentes da Câmara sobre esta matéria, parece-me
que o n.º 3 do artigo 169.º do Regimento da Assembleia da República tem o
sentido útil de abrir a possibilidade de uma votação, na generalidade, em que o
diploma é aprovado ou rejeitado.
O Sr. Presidente: — Mas com que maioria, Sr. Deputado?
O Orador: — Sr. Presidente, com a maioria requerida para, neste caso, poder
haver uma confirmação do diploma.
O Sr. Presidente: — Portanto, no mínimo, com 116 votos favoráveis, não é assim?
O Orador: — Exactamente, Sr. Presidente. Tomada essa deliberação, se o diploma
for reprovado não teremos, evidentemente, de passar à fase da especialidade; se
o diploma for confirmado na generalidade, passaremos, naturalmente, à votação na
especialidade.
O Sr. João Amaral (PCP): — Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a
Mesa.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): — Sr. Presidente, não sei se, aqui, não estará
envolvido um problema político mas, do ponto de vista jurídico, creio que o veto
bloqueou a publicação e a entrada em vigor do diploma e, para que o mesmo possa
entrar em vigor, é necessário que uma maioria absoluta o confirme, ou seja, é
para esse efeito — para que o decreto, como tal, entre em vigor — que é precisa
a maioria absoluta.
Nesta fase, vamos proceder a uma votação na generalidade, a qual admito que seja
necessária. Agora, se vamos aprovar um novo decreto e, portanto, aceitar o veto
— porque, ao introduzir alterações, estamos a aceitar o veto mesmo que não
concordemos com todos os seus fundamentos, e recordo que um qualquer presidente
da República, neste sistema constitucional, pode, face ao novo decreto, vetá-lo
de novo nos mesmos termos —, parece que, aparentemente, se trata de um novo
processo legislativo, isto é, trata-se da continuação do mesmo processo
legislativo mas para aprovação do novo decreto.
Será necessária uma maioria de 116 votos, Sr. Presidente? Tenho dúvidas, porque
se essa maioria funciona, nessa base, então, já não há alterações a fazer,
quando, precisamente, se pretendem introduzir algumas alterações.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a
Mesa.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sr. Presidente, estou inteiramente de acordo com
a interpretação feita pelo Sr. Deputado João Amaral.
Eventualmente, poderia discutir-se se seria necessária uma votação na
generalidade, uma vez que o texto de que partimos já foi votado pela Câmara mas,
em todo o caso, quod abundat non nocet. Não vejo inconveniente em proceder-se a
essa votação, na generalidade, não para confirmar o decreto mas para passarmos à
sua discussão na especialidade. Consequentemente, não vejo que seja necessária
a maioria especial prevista para confirmar o decreto na íntegra, tal qual está.
Esta é a minha opinião e o entendimento da bancada do PSD.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): — Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar
a Mesa.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): — Sr. Presidente, da conjugação dos artigos
169.º e 170.º do Regimento parece extrair-se a seguinte conclusão: quando o
diploma é apreciado de novo, o veto do Presidente da República também é
reapreciado, embora não se vote a mensagem mas o texto vetado, o qual pode ser
substituído ou alterado. Por isso mesmo, seguem-se os trâmites de um
miniprocesso legislativo que comporta uma apreciação na generalidade, uma
apreciação na especialidade e votação final global.
Neste caso concreto, sucede que nenhum dos grupos parlamentares quer
simplesmente confirmar o decreto anterior, pois qualquer um está interessado em
introduzir alterações. Assim, deverá ser seguido o tal miniprocesso
legislativo: discussão do diploma, na generalidade, baixa à Comissão respectiva
para discussão na especialidade e votação final global no Plenário.
O Sr. Presidente: — Quer isto significar que a maioria — uma vez que não há
unanimidade — entende que não é necessária a votação na generalidade?
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): — Sr. Presidente, é necessária uma votação na
generalidade para que, na especialidade, possam ser aceites as alterações ao
diploma.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, sem prejuízo de a minha opinião pessoal
coincidir com a do Sr. Deputado Alberto Costa, seguirei a interpretação
correspondente à generalidade da doutrina aqui firmada.
Nestes termos, procederemos à votação, na generalidade, deste decreto, para, por
maioria simples, apurar a vontade da Câmara e, de seguida, passarmos à discussão
na especialidade.
Vamos votar o Decreto n.º 174/VI — Controlo público de rendimentos e património
dos titulares de cargos públicos.
O Decreto ora em causa foi aprovado na generalidade, não se tendo, pois,
procedido a uma votação de confirmação, nos termos do artigo 139.º, n.º 2, da
Constituição. Após ter sido levado a cabo o debate na especialidade, no qual
foram rejeitadas várias propostas de alteração, à excepção de uma (cfr. Diário
da Assembleia da República, II Série-A, n.º 7, de 26 de Novembro de 1994),
procedeu-se à votação final global, vindo aquele Decreto a ser aprovado
unicamente com os votos dos Deputados presentes do Partido Social Democrata,
tomando o n.º 183/VI (cfr. texto publicado no Diário da Assembleia da República,
II Série-A, n.º 8, de 9 de Dezembro de 1994).
2 — Efectuada esta resenha do processo que conduziu à emanação do Decreto sub
iudicio, importa, antes do mais, muito embora essa questão não se encontre
aflorada no pedido, ponderar, aferido que seja que o Tribunal tem competência
para dela conhecer, se — sabido que é que este órgão de fiscalização concentrada
da constitucionalidade pode (mesmo nos casos de fiscalização preventiva)
pronunciar-se pela desconformidade com a Lei Fundamental por violação de normas
ou princípios que não são invocados no pedido (cfr. n.º 5 do artigo 51.º da Lei
n.º 28/82) — porventura não estará tal diploma inquinado de vício procedimental
que conduza à sua inconstitucionalidade, e isto em face da circunstância de se
não poder asseverar que a respectiva votação na generalidade foi levada a cabo
pela maioria dos Deputados em efectividade de funções.
Sobre tais questões — justamente as que se ligam com a competência deste
Tribunal e com o saber se o Decreto n.º 183/VI não enfermará de vício
procedimental que torne inválidas do ponto de vista constitucional todas as suas
normas —, em caso idêntico ao agora em apreço, teve já o mesmo Tribunal
oportunidade de se pronunciar.
2.1 — Fê-lo por intermédio do seu Acórdão n.º 320/89 (publicado nos Acórdãos do
Tribunal Constitucional, 13.º Vol., Tomo I, pp. 29 a 85, e, bem assim, no Diário
da República, I Série, de 4 de Abril de 1989), tirado em processo de
fiscalização preventiva da constitucionalidade e numa situação que, como se
disse, se aproxima da presente, quanto ao particular de que ora se cura.
Aí se concluiu, embora por maioria, não só pela competência do Tribunal, como
ainda que, no caso de um decreto vetado pelo Presidente da República e que,
posteriormente, veio a ser retomado, mas aprovado com alterações pelo
Parlamento, se não impunha a sua prévia confirmação pela maioria a que se
reportam os n.os 2 e 3 do artigo 139.º da Constituição.
A fundamentação carreada ao citado aresto continua a convencer a maioria do
Tribunal, pelo que se dispensa o mesmo, perante a economia do presente acórdão,
de repetir a corte de razões que ali foram invocadas e que conduziram a dar
resposta positiva à questão da competência e negativa à consistente em saber se
um decreto objecto de «veto político» pelo Presidente da República e
posteriormente alvo de retoma por banda da Assembleia da República e que veio a
ser aprovado com alterações, carece de ser confirmado pela maioria a que se
alude nos n.os 2 e 3 do artigo 139.º da Constituição.
3 — Presente esta postura do Tribunal, há que concluir, in casu, pela sua
competência e que o Decreto n.º 183/VI se não mostra inquinado — supondo que não
foi votado na generalidade pela maioria dos Deputados em efectividade de funções
— de vício procedimental acarretador da sua global desconformidade
constitucional — e, logo, do questionado artigo 1.º —, por isso que aquele
Decreto apresenta, quanto ao seu articulado e referenciadamente àquele que
constava do Decreto n.º 177/VI, uma alteração de redacção tocante à alteração do
n.º 4 do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 85-C/75 que, de todo o modo, não deixa
de constituir uma intenção de adaptação às preocupações que teriam motivado o
«veto político» exercido pelo Presidente da República quanto ao Decreto n.º
177/VI.
Isto posto, passar-se-á à análise que é solicitada ao Tribunal.
III
1 — O Decreto da Assembleia da República n.º 183/VI veio a consagrar no seu
artigo 1.º:
Artigo 1.º
Os artigos 16.º, 26.º, 33.º, 36.º, 53.º e 68.º do Decreto-Lei n.º 85-C/75, de 26
de Fevereiro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 181/76, de 9
de Março, e pelo Decreto-Lei n.º 377/88, de 24 de Outubro, passam a ter a
seguinte redacção:
Artigo 16.º
[…]
1 —
...................................................................................
2 —
...................................................................................
3 — A publicação é feita gratuitamente, devendo ser inserida de uma só vez, sem
interpolações e sem interrupções, no mesmo local do escrito que a tiver
provocado, salvo se este tiver sido publicado na primeira ou na última página.
4 — No caso do escrito relativamente ao qual se exerce o direito de resposta ter
sido destacado em título, na primeira ou na última página, deve aí ser inserida
uma nota da chamada, devidamente destacada com a identificação da página onde é
publicada a resposta e a identificação do titular do direito de resposta.
5 — O conteúdo da resposta será limitado pela relação directa e útil com o
escrito ou imagem que a provocou, não podendo a sua extensão exceder 300
palavras ou a do escrito respondido, se for superior, nem conter expressões
desprimorosas ou que envolvam responsabilidade civil ou criminal, a qual, neste
caso, só ao autor da resposta poderá ser exigida.
6 — (Actual n.º 5).
7 — O periódico não poderá em caso algum, inserir no mesmo número em que for
publicada a resposta qualquer anotação ou comentário à mesma.
8 — É permitido à direcção do periódico fazer inserir no número seguinte àquele
em que for publicada a resposta uma breve anotação à mesma, com o fim restrito
de apontar qualquer inexactidão, erro de interpretação ou matéria nova contida
na resposta, a qual não poderá originar nova resposta.
9 — A publicação da resposta apenas pode ser recusada caso não seja respeitado o
disposto no n.º 2 ou a sua extensão exceda os limites referidos no n.º 5,
devendo o director do periódico comunicar a recusa mediante carta registada com
aviso de recepção, expedida nos três dias seguintes à recepção da resposta, sem
prejuízo da eventual responsabilização por abuso do direito de resposta.
10 — (Actual n.º 8).
Artigo 26.º
[…]
1 —
...................................................................................
a)
b)
2 —
...................................................................................
a)
b)
c)
3 —
...................................................................................
4 — Os directores de órgãos de comunicação social não podem ser criminalmente
responsabilizados, tratando-se de textos de opinião, devidamente assinalados
como tal, e que não ofereçam dúvidas de identificação do seu autor.
5 — Tratando-se de entrevistas, o jornalista que a tiver realizado e o director
não podem ser criminalmente responsabilizados por afirmações produzidas pelo
entrevistado, quando este esteja devidamente identificado.
6 — (Actual n.º 4).
7 — (Actual n.º 5).
Artigo 33.º
[…]
1 —
...................................................................................
2 — A inobservância do direito de resposta no prazo legal, a recusa infundada do
respectivo exercício ou a violação do disposto nos n.os 3, 7 e 8 do artigo 16.º
são punidas com multa de 500 000$ a 5 000 000$.
Artigo 36.º
[…]
1 — A acção penal pelos crimes de imprensa exerce-se nos ternos do Código de
Processo Penal e legislação complementar ou especial, ressalvadas as disposições
da presente lei.
2 — Ao julgamento dos crimes de imprensa é inaplicável o processo sumário.
Artigo 53.º
[…]
1 — No caso de o direito de resposta não ter sido integralmente satisfeito, pode
o interessado recorrer ao tribunal competente para aplicação do disposto no
artigo 33.º
2 — Requerida a notificação judicial do director do periódico que não tenha dado
satisfação ao direito de resposta, será o mesmo notificado, por carta registada
endereçada à redacção do jornal, para contestar no prazo de dois dias, após o
que será proferida em igual prazo a decisão, da qual há recurso, com efeito
meramente devolutivo.
3 —
...................................................................................
4 — No caso de sentença que determine a publicação da resposta fica o periódico
obrigado a publicar extracto decisório e a resposta num dos dois números
subsequentes à data do seu trânsito em julgado.
5 — O não cumprimento do previsto no n.º 4 determina a aplicação da multa do
artigo 33.º por cada edição posterior sem inclusão do extracto decisório e da
resposta.
6 — Para a hipótese do incumprimento referido no número anterior, o juiz fixará
desde logo na sentença a multa que deverá acrescer à da condenação.
7 — O disposto no n.º 4 é também aplicável aos casos de recusa de exercício do
direito de resposta, considerada infundada por deliberação da Alta Autoridade
para a Comunicação Social, nos termos da legislação aplicável.
Artigo 68.º
[…]
1 — O disposto no artigo 36.º-A é aplicável aos processos correspondentes aos
crimes previstos no artigo 66.º
2 —
...................................................................................
2 — Na redacção em vigor do Decreto-Lei n.º 85-C/75 estabelece-se para os
periódicos a obrigatoriedade de inserção, dentro de dois números, contados da
data «do recebimento em carta registada, com aviso de recepção e assinatura
reconhecida», de resposta «de qualquer pessoa singular ou colectiva ou organismo
público que se considerem prejudicados pela publicação no mesmo periódico de
ofensas directas ou de referências de facto inverídico ou erróneo que possam
afectar a sua reputação e boa fama, ou o desmentido ou rectificação oficial de
qualquer notícia neles publicada ou reproduzida» (artigo 16.º, n.º 1, mantido
inalterado pelo Decreto ora em apreciação), limitando-se a extensão do conteúdo
da resposta a 150 palavras ou à do escrito respondido, se for superior (n.º 4 do
artigo 16.º), permitindo-se «à direcção do jornal fazer inserir no mesmo número
em que for publicada a resposta uma breve anotação à mesma, com o fim restrito
de apontar qualquer inexactidão, erro de interpretação ou matéria nova contida
na resposta», anotação essa que «poderá originar nova resposta» (n.º 6 do artigo
16.º), e facultando-se ao director do periódico, ouvido o conselho de redacção,
a recusa da «publicação mediante carta registada com aviso de recepção expedida
nos três dias seguintes à recepção da resposta», caso esta contrarie o disposto
no n.º 4, ou seja, na hipótese de não ser limitada «pela relação directa e útil
com o escrito» e «conter expressões desprimorosas ou que envolvam
responsabilidade civil ou criminal» (n.º 7 do artigo 16.º).
3 — A normação, ora questionada pelo requerente, constante do artigo 1.º do
Decreto na parte em que confere nova redacção aos n.os 7 e 9 do artigo 16.º do
Decreto-Lei n.º 85-C/75, como facilmente se constata, difere, relativamente à
ainda em vigor, nos pontos em que, de uma parte, não permite, em caso algum, a
inserção, no mesmo número do periódico em que for publicada a resposta, de
qualquer anotação ou comentário à mesma e, de outra, de a resposta unicamente
poder ser recusada nas hipóteses de o respondente não ser a pessoa atingida pela
ofensa, seu representante legal, herdeiro ou cônjuge sobrevivo e no período de
30 ou 90 dias a contar da inserção do escrito ou da imagem, consoante se tratar
de diário ou semanário, e de a extensão da resposta ultrapassar as trezentas
palavras (caso seja inferior o número de palavras utilizadas no escrito
respondido).
O mesmo peticionante, após ponderar que os direitos de liberdade de imprensa e
de resposta, que têm igual dignidade, podem «entrar em rota de colisão», motivo
pelo qual se exigem ao legislador especiais cautelas de molde a só poder limitar
o exercício de tais direitos «na medida do estritamente necessário, com
observância do princípio da proporcionalidade», coloca a questão de saber se a
nova redacção intentada conferir aos n.os 7 e 9 do artigo 16.º do Decreto-Lei
n.º 85-C/75 — nos pontos em que é impedida a possibilidade de recusa de inserção
de resposta nos casos de uma sua manifesta impertinência, de conter matéria que
envolva responsabilidade civil ou criminal do titular do respectivo direito e de
faltarem os pressupostos legais do seu exercício — não irá configurar uma
claramente desproporcionada restrição da liberdade de imprensa.
Impõe-se, assim, analisar uma tal questão.
3.1 — No preâmbulo da proposta de lei originadora do Decreto em crise, a
propósito das aventadas alterações do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 85-C/75
(cfr. citado Diário da Assembleia da República, II Série-A, de 5 de Maio de
1994), explicitou-se (após se discorrer sobre a consagração, efectuada na Lei
Fundamental, quer dos direitos à liberdade de expressão e dos jornalistas ao
acesso às fontes de informação e à protecção da independência e do sigilo
profissionais, quer do asseguramento, a todas as pessoas, singulares ou
colectivas, em condições de igualdade e eficácia, do direito de resposta e
rectificação):
........................................................................................................
A efectiva e eficaz aplicação destes princípios, sem a qual não é possível
assegurar um justo equilíbrio entre liberdade de informação e o direito ao bom
nome e honra do cidadão, que são valores impostergáveis da cidadania, requer,
entretanto, que a lei onde os mesmos se regulem afirme e garanta, com nitidez
completa, a inteira salvaguarda desses valores.
Como acentua Vital Moreira em O Direito de Resposta na Comunicação Social, 1994,
«[…] torna-se necessário defender não só a liberdade da imprensa mas também a
liberdade face à imprensa».
Sendo este um objectivo que importa por igual à imprensa e aos cidadãos, dele
decorre a necessidade de se proceder à alteração da Lei de Imprensa, aprovada
pelo Decreto-Lei n.º 85-C/75, de 26 de Fevereiro, no sentido de a aperfeiçoar em
duas vertentes fundamentais:
Na efectivação sem constrangimentos do direito de resposta, como impõe o n.º 4
do artigo 37.º da Constituição.
Na obtenção de maior celeridade processual, a benefício das partes interessadas.
A presente iniciativa não visa a intenção nem pode alcançar o menor efeito de
limitar, coarctar ou por qualquer meio cercear os direitos que assistem aos
profissionais da informação ou diminuir as garantias de que são titulares, já
ampla e claramente consagradas. Limita-se, tão-só, a aperfeiçoar os mecanismos
legais que proporcionem aos cidadãos a defesa dos seus direitos essenciais.
Trata-se, assim, e exclusivamente, de estabelecer os melhores critérios que
permitam a harmonização entre interesses distintos, mas dignos de igual respeito
e salvaguarda.
........................................................................................................
Na área das relações entre a imprensa e o cidadão, como sustenta ainda Vital
Moreira, na obra já citada, «O direito de resposta perfila-se como um meio de
compensar o desequilíbrio natural entre os titulares dos meios de informação —
que dispõem de uma posição de força ‘pela posse de um instrumento capaz de
incidir substancialmente sobre a opinião pública’ (Lex, 1989, a: 4) — e o
cidadão isolado e inerme perante eles. O direito de resposta releva justamente
da divisão entre os detentores e os não detentores do poder informativo e visa
conferir a estes um meio de defesa perante aqueles».
É a compensação desse desequilíbrio ou, dizendo de diferente forma, o primado de
um justo equilíbrio entre todos que aqui se visa. Como princípio que afinal
importa por igual aos diferentes destinatários da lei.
A problemática do direito de resposta, designadamente quanto a saber se, perante
as disposições constantes do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 85-C/75, seria
admissível uma recusa para além dos casos enunciados no seu n.º 4, quais as
dificuldades de determinação da «pertinência» da resposta e do que se deva
entender por expressões «desprimorosas» e os cuidados a ter quanto à
concordância prática entre os direitos de liberdade de imprensa e liberdade
editorial e de resposta, foi objecto de tratamento na doutrina portuguesa (cfr.
Lopes Rocha no «Estudo» intitulado «Sobre o Direito de Resposta na Legislação
Portuguesa de Imprensa (Algumas Questões)», Boletim do Ministério da Justiça,
n.º 346, pp. 15 a 35, Figueiredo Dias no «Estudo» intitulado «Direito de
Imprensa e Tutela da Honra no Direito Penal da Imprensa Portuguesa», Revista de
Legislação e de Jurisprudência, ano 115.º, pp. 100 e segs., e Vital Moreira,
obra já aludida, maxime pp. 119 a 127).
Dos ensinamentos extraíveis dessa doutrina, e pesando as medidas pretendidas
implementar através da intenção de conferir nova redacção aos n.os 7 e 9 do
artigo 16.º, retira o Tribunal a conclusão de que tais medidas não se postam
como desproporcionadamente desadequadas na limitação que, objectivamente, impõem
à liberdade de imprensa na sua vertente de liberdade editorial, confrontadamente
com a salvaguarda, constitucionalmente consagrada, do asseguramento, a todas as
pessoas, singulares ou colectivas e em condições de igualdade e eficácia, do
direito de resposta e de rectificação (n.º 4 do artigo 37.º da Lei Fundamental).
3.2 — Efectivamente, a disposição questionada do n.º 9 do artigo 16.º do
Decreto-Lei n.º 85-C/75, ao se reportar às causas que podem permitir a recusa de
publicação da resposta, fá-lo de um modo taxativo e por apelo a fundamentos de
natureza estritamente objectiva a cuja assumpção são alheios quaisquer critérios
que se revistam ou possam revestir de subjectivismo.
Afastam-se, desta arte, eventuais perigos de actuação do director do periódico
como «juiz em causa própria» (assinalados no já citado «Estudo» de Lopes Rocha)
e que poderiam diminuir, quer o conteúdo, quer o alcance, quer a eficácia do
direito prescrito no n.º 4 do artigo 37.º da Constituição.
A proeminência deste direito, por outro lado, não pode, sem mais, ser afastada
em nome daqueloutra referente ao direito de liberdade de imprensa.
Torna-se claro que poderão surgir hipóteses em que a limitação da possibilidade
de recusa do direito de resposta possa conduzir a resultados que, do ponto de
vista do vigente ordenamento jurídico, seriam, no mínimo, passíveis de ser
perspectivados como aberrantes (pense-se, verbi gratia, nas situações que possam
ser integradas como de causas de exclusão de ilicitude ou de culpa). Todavia,
uma recusa de inserção da resposta, nesses casos, porque pode implicar que o
respondente solicite a intervenção de um órgão jurisdicional (cfr. artigo 1.º do
Decreto ao intentar conferir nova redacção aos n.os 1 e 2 do artigo 53.º do
Decreto-Lei n.º 85-C/75), acarretará que este pondere as situações acima
exemplificadas, dando-lhes o tratamento adequado perante as regras do
ordenamento jurídico e, se for essa a hipótese, não determinando a aplicação da
sanção a que se refere o artigo 33.º e, se for o caso, a própria publicação
daquela resposta.
Fica, assim, arredada a possibilidade de, por uma interpretação demasiadamente
atida à letra da normação sub specie constitucionis (interpretação essa até, de
certo jeito, restritiva), se ser conduzido a situações que, do ponto de vista do
ordenamento jurídico vigente, poderiam, como se disse, ser consideradas como
absurdas, e isso porque essas situações, ao sofrerem o tratamento ditado por um
tal ordenamento, levariam a que não fossem susceptíveis de sancionamento ou de
um juízo de censura jurídica.
Nesta postura, presente o binómio de direitos e interesses subjacentes, não
divisa o Tribunal que a limitação dos casos de recusa de publicação do direito
de resposta, na vertente de uma eventual restrição à liberdade de imprensa ou da
liberdade editorial, constitua uma acentuada, clara ou patente desproporção em
face da garantia, em termos de igualdade e eficácia, do direito de resposta.
Ora, este Tribunal, quando não quiser correr o risco de censurar o mérito das
opções do legislador, só deve invalidar essas mesmas opções quando elas se
apresentarem manifesta ou excessivamente desproporcionadas, e não também as
opções que traduzam apenas, ou sobretudo, um menor acerto desse legislador.
3.3 — No tocante à norma pretendida introduzir com a conferência de nova
redacção ao n.º 7 do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 85-C/75, argumenta o
requerente com a consideração de que parece não haver razão constitucionalmente
fundada para a proibição, ali consagrada, de no próprio número do periódico em
que a resposta é publicada se inserir qualquer anotação ou comentário, pois que,
assim, poderá prevalecer durante um dia, uma semana ou um mês — dependendo da
periodicidade da edição do órgão de comunicação escrita — uma errada versão
decorrente do texto da resposta.
O direito de resposta e de rectificação, pode afoitamente dizer-se, decorre, no
âmbito de uma lei fundamental como a Constituição da República Portuguesa «tão
centralmente preocupada com a defesa da ‘dignidade da pessoa humana’» (palavras
de Figueiredo Dias no «Estudo» citado), da «tutela efectiva da honra das
pessoas», destinando-se, como diz Vital Moreira (ob. cit., pp. 77 e 107), «a
ripostar a declarações ou afirmações de outrem relativas à pessoa que responde»,
a, enfim, «contestar uma notícia em tempo útil», «só tendo sentido como direito
constitucional autónomo na medida em que ele seja algo mais do que uma simples
liberdade», ou seja, impondo-se «de algum modo àqueles a cujas declarações se
responde».
Refere este ultimo autor (cfr. pp. 32 e 79) que o direito de resposta se destina
a permitir a defesa dos direitos de personalidade do visado ou do ofendido e a
promover — e, por isso, devendo ser aproximado de — dois outros direitos
constitucionalmente consagrados, quais sejam o direito ao contraditório e o de
pluralismo da comunicação social.
Pois bem:
Por um lado, a não proibição de inserção de qualquer nota ou comentário no mesmo
número do periódico em que é publicada a resposta (note-se que, nos termos da
redacção intentada introduzir ao n.º 8 do artigo 16.º, não se veda a publicação
de uma breve anotação no número seguinte), poderia, certamente, diminuir, se não
desvirtuar, a corte de razões que levaram o respondente a exercer o seu direito
de resposta como forma de defesa da sua «honra» (tomada esta expressão num
sentido amplo e compreensivo) e de exercício do contraditório, desse modo
diminuindo, quiçá drasticamente, o impacto da resposta. Por outro lado, a
proibição estatuída vai permitir que, de um modo porventura mais sereno dado o
decurso do tempo, a direcção do periódico pondere na natureza, forma e extensão
dos comentário ou nota a fazer à resposta, reflexões que, possivelmente, não
seriam possíveis num momento imediato e que talvez conduzissem a réplicas ou
infundadas ou, ao menos, passíveis de desencadeamento de novos litígios.
A isto é de aditar que se não pode dizer que com a proibição constante do n.º 7
do artigo 16.º fique gravemente restringido o «direito à verdade» implicado na
liberdade de informação, pois que, de todo o modo, é assegurada a possibilidade
de, na edição subsequente à da publicação da resposta, ser inserida anotação com
o fim de serem apontadas inexactidões, erros de interpretação ou matéria nova.
O que com as alterações intentadas introduzir se pretendeu foi, na concordância
prática de direitos com igual dignidade constitucional, optar-se por uma certa
prevalência do titular do direito de resposta, sem, grave ou
desproporcionadamente, se lesar o direito de liberdade de imprensa e de
informação, pelo que a proibição ínsita no n.º 7 do artigo 16.º não fere
qualquer princípio ou norma constitucional, nomeadamente o n.º 3 do artigo 18.º
do Diploma Básico.
4 — No domínio da sua vigente versão, as violações ao disposto no Decreto-Lei
n.º 85-C/75 (cfr. artigo 33.º) são punidas com multa até Esc. 50 000$00, mas
nunca inferiores a Esc. 20 000$00 em caso de reincidência ou por violação do n.º
4 do seu artigo 3.º (conteúdo do estatuto editorial das publicações
informativas), do n.º 10 do artigo 7.º (imposição de acções nominativas no caso
de a publicação periódica pertencer a sociedade anónima), do n.º 1 do artigo
15.º (proibição de recusa de inserção na íntegra, nas publicações informativas
diárias, de notas oficiosas) e do n.º 1 do artigo 16.º (obrigação de inserção de
resposta).
De harmonia com as alterações levadas a efeito pelo Decreto sub specie, o
quantitativo da multa por infracção às disposições do Decreto-Lei n.º 85-C/75
passará para um limite máximo de Esc. 600 000$00 (mas nunca inferior a Esc. 240
000$00 em caso de reincidência) (cfr. artigo 3.º do Decreto), excepto se a
infracção se reportar a inobservância do direito de resposta no prazo legal, a
recusa infundada do respectivo exercício ou a violação dos n.os 3 (publicação
gratuita da resposta no mesmo local do escrito que a tiver provocado, à excepção
da primeira ou última páginas, sem interrupções ou interpolações), 7 (proibição
de inserção de qualquer anotação ou comentário à resposta no mesmo número do
periódico em que esta tenha sido publicada) e 8 (possibilidade de inserção de
uma breve anotação à resposta no número seguinte ao da publicação desta nos
termos já mencionados) do artigo 16.º, casos em que haverá lugar à imposição de
uma multa de Esc. 500 000$00 a Esc. 5 000 000$00.
É esta última imposição que é questionada pelo solicitante, que coloca a questão
de se poder considerá-la excessiva, desproporcionada e materialmente infundada,
sendo susceptível de criar graves restrições de natureza económico-financeira às
empresas jornalísticas, pois que é notório que grande parte dessas empresas não
desfruta de situação financeira desafogada.
Entende o Tribunal que a questão colocada não deve ser tida por procedente.
4.1 — Na realidade, num Estado democrático, ao legislador, como emanação da
vontade colectiva do respectivo povo, cabe consagrar as soluções normativas que
sejam as mais adequadas às situações que se intentem regular e aos fins que se
pretendem ser atingidos.
Isso implica, pois, que ao legislador deva ser reconhecida uma larga margem de
liberdade de conformação ou, se se quiser, uma ampla margem conformativa. Mas,
falar-se de liberdade conformativa não significa que se adopte, neste
particular, um entendimento segundo o qual essa liberdade é irrestrita ou não
possa ser sujeita a juízos de censura.
No caso do estabelecimento de sanções, e iluminado que é o Estado de direito
democrático, por entre o mais, pelos princípios da adequação e da
proporcionalidade, possível é a efectivação daqueles juízos de censura
relativamente às soluções legislativamente consagradas. Há, porém, que efectuar
uma harmonização entre a dita liberdade e a possibilidade de censura
acarretadora de invalidade da regulação levada a efeito pelo legislador, de
sorte a que a segunda, levada a extremos, não conduza a um Tribunal como este a
determinar a invalidade de actos legislativos impositores de sanções só pela
simples circunstância de entender que essas sanções se revestem de um já
acentuado grau de gravidade.
Fazê-lo sem mais seria, no fundo das coisas — como de resto decorre de algo que
já acima se disse —, actuar já como legislador e intérprete da vontade
colectiva, quiçá sem estar munido dos dados necessários que conduziram este
último à estatuição que entendeu por bem prosseguir.
Nesta dualidade, torna-se claro que um juízo de censura quanto ao
estabelecimento de sanções como a que ora nos ocupa só pode acarretar a decisão
de invalidade das mesmas nos casos em que, tendo por parâmetro, inter alia, os
interesses que se visam proteger, a gravidade do sancionamento se mostre,
inequívoca, patente ou manifestamente excessiva. A desproporção então divisada,
proibida, repete-se, pelo Estado de direito democrático, conduzirá a um juízo de
censura constitucional e fulminará com a invalidade a solução encontrada pelo
legislador.
Só assim será possível balancear a liberdade de conformação do legislador com o
poder/dever de fiscalização cometido a este Tribunal.
Na situação em análise, o legislador entendeu que o sancionamento que propôs que
ficasse prescrito no n.º 2 do artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 85-C/75 era aquele
que melhor se adequava à protecção dos interesses subjacentes à efectivação do
direito de resposta.
Conquanto porventura possa haver quem entenda que um tal sancionamento apresenta
já acentuado grau de gravidade, o que é certo é que o mesmo não deixa de actuar
como forma de protecção de um direito constitucionalmente consagrado, como é o
direito de resposta.
Mas mais:
Como acima se discorreu, no que concerne a esse direito, a Constituição não se
limita a proclamá-lo; assegura ainda que o respectivo exercício deva ser
prosseguido com eficácia.
Ora, para tanto, resulta límpido que somente através do estabelecimento de
sanções revestidas de uma certa gravidade é que será possível desincentivar
actuações que, na prática, tornem ineficaz o exercício do direito de resposta.
Não se coloca aqui, consequentemente, na óptica do Tribunal, qualquer manifesta
desproporção entre a sanção pretendida estatuir para o n.º 2 do artigo 33.º do
Decreto-Lei n.º 85-C/75 e os interesses que se visam defender por essa
estatuição, interesses esses — até pela circunstância de estarem presentes no
espírito do legislador constituinte e que o levaram a erigi-los como uma
garantia fundamental — cuja proscrição aponta desde logo para que se revele como
não insignificante a vontade que a essa proscrição conduz.
4.2 — Poderia ainda entender-se que, tomando por termo de comparação os regimes
previstos para as actividades de radiodifusão e de televisão (cfr. Leis n.os
87/88, de 30 de Junho, e 58/90, de 7 de Setembro), a sanção que ora prende a
nossa atenção se perspectivaria como passível de um juízo de censura
constitucional tendo presentes os princípios da proporcionalidade ligado com
aqueloutro da igualdade.
Um tal entendimento, porém, não é acolhido pelo Tribunal.
De facto, logo em primeira linha, para além de uma argumentação possível de ser
aqui invocada e segundo a qual, havendo várias situações em diversas previsões,
desejando o legislador alterar uma, não lhe seria exigível a imposição de
alteração das restantes — por isso que o direito não é algo imutável —, razão
pela qual mais dificilmente se poderia convocar uma directa violação, nesses
casos, do princípio da igualdade, o que é certo é que mesmo, antes da normação
ora querida implementar pelo Decreto, os regimes ligados ao exercício do direito
de resposta quanto à actividade de imprensa, por um lado, e às actividades de
radiodifusão e de televisão, por outro, eram já, por si, diferentes, tendo
ocorrido em distintos momentos temporais.
Na Lei n.º 87/88, o direito de resposta encontra-se consagrado nos artigos 22.º
e seguintes, possibilitando-se ao respondente, no caso de recusa de transmissão
da resposta, o recurso ao tribunal competente. Se este determinar a
transmissão, o não acatamento da decisão fará incorrer os responsáveis no
cometimento de um crime de desobediência qualificada (cfr. artigos 25.º, n.º 3,
e 35.º). Por outro lado, é ainda defensável que a multa de 50 a 300 dias,
cominada no n.º 1 do artigo 37.º desta Lei, é aplicável aos casos de recusa
infundada de transmissão da resposta.
Na Lei n.º 58/90, a consagração do direito de resposta tem lugar nos seus
artigos 35.º e seguintes, apresentando um regime semelhante ao prescrito para a
actividade de radiodifusão. Simplesmente, no caso de recusa de transmissão da
resposta, o titular do respectivo direito pode ainda recorrer, para além do
tribunal, à Alta Autoridade para a Comunicação Social (n.º 3 do artigo 38.º). O
não acatamento da decisão, tomada pelo tribunal, faz incorrer os responsáveis no
cometimento de um crime de desobediência qualificada (artigo 48.º). Também aqui
é defensável que a recusa infundada de transmissão da resposta é passível de
aplicação da multa de 100 a 300 dias referida no n.º 1 do artigo 50.º
Verifica-se, assim, que, globalmente, o sancionamento previsto para a recusa da
transmissão da resposta nos regimes das actividades de radiodifusão e de
televisão não é, nitidamente, de menor gravidade do que aquele que se intenta
instaurar por intermédio da nova redacção conferida ao n.º 2 do artigo 33.º do
Decreto-Lei n.º 85-C/75.
A tudo isto poderá ainda aditar-se que as transmissões televisivas e
radiodifundidas motivadoras do direito de resposta e de rectificação são feitas
num determinado momento, não se arrastando projectadamente (não perdurando,
pois) no tempo (verba volant scripta manent).
Esta corte de razões aponta, consequentemente, para que, no cotejo da norma
agora em apreço com os regimes de sancionamento das infracções ao direito de
resposta consagrados para as actividades de televisão e radiodifusão, se não
lobrigue desproporcionalidade com referência ao princípio da igualdade.
5 — Resta efectuar-se a solicitada apreciação da norma constante do artigo 1.º
do Decreto ao introduzir nova redacção aos n.os 5 e 6 do artigo 53.º do
Decreto-Lei n.º 85-C/75.
Numa tal análise mister é, em primeiro lugar, que o Tribunal fixe o sentido que
aqueles números devem comportar.
No regime ora em vigor, dispõe-se nos artigos 30.º e 53.º:
Artigo 30.º
(Crimes de desobediência qualificada)
1 — Constituem crimes de desobediência qualificada:
a) ……………………………………………………………;
b) O não acatamento pelo director do periódico e pelo conselho de
redacção, nos termos do n.º 7 do artigo 16.º, da decisão do tribunal que ordene
a publicação de resposta, ao abrigo do n.º 1 do artigo 53.º;
c) …………………………………………………………….
2 — ………………………………………………………………
3 — No caso da alínea b) do n.º 1, o director ou os membros do conselho de
redacção não serão responsáveis se não tiverem participado na decisão ou dela
houverem discordado expressamente.
4 — ……………………………………………………………….
Artigo 53.º
(Efectivação judicial do direito de resposta)
1 — No caso de o direito de resposta não ter sido satisfeito ou de haver sido
infundadamente recusado, poderá o interessado recorrer ao tribunal competente
para julgar a contravenção prevista no artigo 33.º, sendo neste caso o periódico
obrigado a publicar o teor da decisão e da resposta nos prazos fixados no n.º 2
do artigo 16.º, contados a partir da data do trânsito em julgado daquela
decisão.
2 — Requerida a notificação judicial do director do periódico que não tenha dado
satisfação ao direito de resposta, será o mesmo notificado por via postal, para
contestar no prazo de dois dias, após o que será proferida em igual prazo a
decisão, da qual não há recurso.
3 — Só será admitida prova documental, sendo todos os documentos juntos com o
requerimento inicial e com a contestação.
5.1 — A normação tentada introduzir pelo Decreto e neste concreto ponto agora em
análise deve, segundo o Tribunal, comportar o seguinte sentido:
requerida a um periódico, por qualquer pessoa singular ou colectiva ou organismo
público, a publicação de uma resposta relativamente a um escrito ou notícia ali
publicados, os quais, na óptica do requerente, o prejudicaram em virtude de
conterem ofensas directas ou referências de facto inverídico ou erróneo
susceptíveis de afectar a sua reputação e boa fama, e não sendo essa resposta
objecto de inserção no mesmo periódico e nos dois números seguintes a contar do
seu recebimento ou, sendo-o, não tendo sido respeitado, verbi gratia, o disposto
nos n.os 3, 4, 7 e 8 do artigo 16.º (na redacção proposta pelo Decreto), o
titular do direito de resposta poderá recorrer ao tribunal competente (cfr.
artigo 51.º do Decreto-Lei n.º 85-C/75, Decreto-Lei n.º 17/91, de 10 de Janeiro,
artigos 19.º a 22.º do Código de Processo Penal, artigos 55.º, 75.º e 77.º, n.º
2, da Lei Orgânica dos Tribunais, aprovada pela Lei n.º 38/87, de 23 de
Dezembro, e artigos 5.º, 11.º e 12.º do Decreto-Lei n.º 214/88, de 17 de Junho),
a fim de este aplicar ao director do periódico as sanções previstas no artigo
33.º, podendo ainda requerer, concomitantemente (ou quiçá só), que aquele órgão
de administração de justiça venha a determinar que o periódico publique a
resposta;
nesta última hipótese (ou seja, sendo também solicitado ao tribunal que o mesmo
determine a publicação da resposta), seguem-se os termos processuais previstos
nos n.os 2 e 3 do artigo 53.º e, se o tribunal, na sentença a proferir, impuser
ao periódico a inserção da resposta, fica este obrigado a efectuá-la, bem como a
publicar o extracto da decisão assim tomada num dos dois números subsequentes à
data do trânsito em julgado daquela sentença;
nessa decisão, o tribunal imporá desde logo que, por cada número do periódico —
posterior aos dois números subsequentes à data do futuro trânsito em julgado da
sentença — em que não tenha ocorrido a publicação (da resposta e do extracto da
decisão que a ordenou), ficará ele sujeito ao pagamento de uma quantia de
carácter compulsório, que o referido tribunal fixará de entre os montantes
mínimo e máximo indicados no artigo 33.º [trata-se, pois, da imposição de um
quantitativo pecuniário que tem por fim coagir o periódico à prestação de facto
que só por ele pode ser realizada — a publicação da resposta e do extracto
decisório —, não se afigurando, sequentemente, que essa imposição traduza um
juízo reprovativo em relação a comportamentos já ocorridos (na verdade, aquando
da determinação constante da decisão, esses comportamentos nem sequer ainda
ocorreram)];
o pagamento desta quantia acrescerá ao da multa contravencional imposta, nos
termos do artigo 33.º, pela infracção cometida pela inobservância dos preceitos
legais regulamentadores do direito de resposta.
5.2 — Desta postura quanto ao sentido a conferir ao artigo 53.º do Decreto-Lei
n.º 85-C/75, com as alterações intentadas introduzir pelo Decreto, resulta,
desde logo, que o não acatamento da decisão judicial determinativa da publicação
da resposta deixará de constituir a prática do específico crime de desobediência
qualificada cuja previsão consta da alínea b) do n.º 1 do artigo 30.º daquele
diploma ao fazer referência ao n.º 1 do artigo 53.º, cujo teor, em face daquelas
alterações, é profundamente modificado.
Resulta também que, após o trânsito da sentença que, para além do proferimento
da decisão sobre a contravenção prevista no artigo 33.º, ordene a publicação, se
esta não tiver lugar num dos dois números subsequentes do periódico, a este
será, por cada número publicado sem a inclusão da resposta e do extracto
decisório, aplicada uma sanção compulsória, a ser fixada pelo juiz num
determinado montante que se situará de entre os limites quantitativos
consignados no artigo 33.º
Resulta ainda que a determinação daquela aplicação ocorrerá, prospectivamente,
na sentença que, além do mais, ordene a publicação da resposta e do extracto
decisório.
5.3 — Em consequência do que imediatamente acima se deixou exposto, entende o
Tribunal que se não extrai da normação pretendida introduzir pelo Decreto sob
apreciação um sentido que aponte, de um lado, para que o n.º 5 do artigo 53.º
venha a cominar um sancionamento que se adite à sanção criminal que seria
imposta pelo cometimento de um específico ilícito de desobediência qualificada,
previsto e punível pelas combinadas disposições dos artigos 30.º, n.º 1, alínea
b), do Decreto-Lei n.º 85-C/75 e 388.º, n.º 3, do Código Penal e por virtude do
não acatamento da decisão judicial determinante da publicação da resposta; de
outro, que a aplicação daquele primeiro sancionamento tenha uma natureza penal
(na vertente contravencional — cfr., sobre a natureza criminal do ilícito
contravencional, Eduardo Correia, Direito Criminal, ed. de 1963, vol. 1.º, p.
217), assim agindo como uma pena advinda por uma actuação omissiva traduzida na
eventual não publicação da resposta e extracto decisório por cada um dos números
do periódico subsequentes aos dois primeiros números publicados após o trânsito
em julgado da sentença; de outro, ainda e por fim, que o n.º 6 do artigo 53.º
venha a estabelecer a imposição de um outro sancionamento que acresce ao do
prescrito no n.º 5.
Perante este entendimento, designadamente no que tange a não apresentar a sanção
estatuída no n.º 5 do artigo 53.º uma natureza contravencional, não há, no
ponto, que apelar a equacionamentos conexionados com o princípio da culpa
consagrado, conjugadamente, nos artigos 1.º e 25.º, n.º 1, da Constituição (cfr.
Acórdão deste Tribunal n.º 426/91, publicado na II Série do Diário da República
de 2 de Abril de 1992), princípio que para determinada doutrina, imporá, em sede
de direito penal e do mesmo passo, quer a proibição do estabelecimento
sancionatório como «simples meio para a prossecução de fins preventivos»
(palavras do citado Acórdão ao discretear sobre tal princípio), quer da
proibição da punição sem concreto apuramento da culpa ou excedente da medida
desta.
5.4 — Não procederá uma argumentação segundo a qual a sanção aludida no n.º 5 do
artigo 53.º é imprecisa por da formulação desse preceito não resultar qualquer
critério densificado da respectiva fixação.
Na verdade, como deflui do que acima ficou exposto, a sanção ali estabelecida é
fixada pelo juiz na sentença num determinado montante que oscilará entre os
precisos limites quantitativos, mínimo e máximo, constantes do artigo 33.º e
para um facto bem determinado. Não se vislumbra, assim, existir aqui qualquer
indeterminabilidade ou falta de precisão quanto ao estabelecimento da sanção em
causa na norma do n.º 5 do artigo 53.º
De outra via, a não natureza contravencional dessa mesma sanção afastará, desde
logo e quanto a ela, quaisquer eventuais entendimentos que porventura apontem no
sentido de serem tidas por inconstitucionais penas criminais (lato sensu) que,
mercê da latitude dos limites que comportam, violam o princípio da legalidade
das penas.
Igualmente se não afigura procedente uma argumentação segundo a qual, atento o
facto de no n.º 5 do artigo 53.º se não limitar o número de situações que
desencadeiem a aplicação do sancionamento ali previsto, essa circunstância poder
implicar, ao fim e ao cabo, a imposição de uma sanção sem limite ou a aplicação
de sanções sem qualquer fim temporal.
Considerações de jaez tal como as carreadas naquela argumentação olvidariam, bem
vistas as coisas, a essencialidade do acatamento das decisões já definitivas
proferidas pelos tribunais num Estado de direito democrático.
De facto, o que se consagra no n.º 5 do artigo 53.º visa compelir o periódico a
cumprir uma determinação emanada de uma decisão de um tribunal unicamente após
esta se tornar definitiva (e só o será, ou quando os interessados se conformem
com a proferida em 1.ª instância ou, quando não haja essa conformação, após ter
sido lavrada, por um tribunal superior, decisão no sentido determinativo da
publicação, e isto depois de aqueles interessados terem tido a oportunidade de,
perante esse tribunal superior, exporem as suas razões e formularem um pedido de
reapreciação do antecedentemente decidido).
Ora, as decisões dos tribunais, di-lo a Constituição (cfr. n.º 2 do seu artigo
208.º), como não poderia deixar de ser num Estado de direito, «são obrigatórias
para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as de quaisquer
outras entidades».
O comportamento omissivo consistente no não acatamento do decidido por um
tribunal que, no caso, tem por fim efectivar um direito que a Lei Fundamental
quis que fosse exercido e em condições de eficácia — o direito de resposta — não
pode deixar de reclamar a adopção de medidas, também elas eficazes, para se
atingir o desiderato final que a Constituição acolhe (a dita efectivação do
direito de resposta).
Por isso, nenhuma desproporcionalidade se afigura existir na não previsão, no
n.º 5 do artigo 53.º, de um limite das edições a partir das quais a não
publicação da resposta e do extracto decisório, posteriores ao segundo número
subsequente ao trânsito em julgado da sentença determinante daquela publicação,
já não desse lugar à imposição da sanção ali normatizada.
De todo o modo, e como se torna por demais claro, para obstar a uma reiterada
aplicação da sanção prevista na indicada norma, bastará que se proceda à
publicação da resposta e do extracto decisório; bastará, enfim, que se efective
um direito constitucionalmente consagrado, efectivação essa que, no quadro da
situação concreta deparada, foi objecto, de facto e de direito e após se ter
desenvolvido um processo contraditório, de ponderação por um órgão isento,
independente e imparcial, que decidiu por dever ela vir a ter lugar.
Aditar-se-á, finalmente, que, no respeitante aos quantitativos previstos para o
sancionamento constante do referido n.º 5 do artigo 53.º, são, com as adaptações
advenientes da sua diferente natureza em relação à sanção estatuída no artigo
33.º, aplicáveis os considerandos já acima efectuados pelo que, também por esta
via, se não vislumbra ofensa de qualquer norma ou princípio constitucional.
IV
Perante o que se deixa dito, decide o Tribunal:
a) Não se pronunciar pela inconstitucionalidade do artigo 1.º do Decreto n.º
183/VI da Assembleia da República, que altera o Decreto-Lei n.º 85-C/75, de 26
de Fevereiro (Lei de Imprensa), por violação do n.º 2 do artigo 139.º da
Constituição da República Portuguesa;
b) Não se pronunciar pela inconstitucionalidade do mencionado artigo 1.º, na
parte em que dá nova redacção ao artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 85-C/75,
aditando-lhe o n.º 7;
c) Não se pronunciar pela inconstitucionalidade do assinalado artigo 1.º, na
parte em que dá nova redacção ao artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 85-C/75,
aditando-lhe o n.º 9;
d) Não se pronunciar pela inconstitucionalidade do citado artigo 1.º, na parte
em que confere nova redacção ao n.º 2 do artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 85-C/75;
e
e) Não se pronunciar pela inconstitucionalidade do falado artigo 1.º, na parte
em que adita os n.os 5 e 6 ao artigo 53.º do Decreto-Lei n.º 85-C/75.
Lisboa, 25 de Janeiro de 1995. — Bravo Serra — Fernando Alves Correia — Vítor
Nunes de Almeida — Messias Bento — Armindo Ribeiro Mendes [vencido quanto às
decisões constantes das alíneas a), d) e e), nos termos da declaração de voto
junta] — Antero Alves Monteiro Diniz [vencido relativamente às matérias
constantes das alíneas a), d) e e), nos termos da declaração de voto junta] —
Maria Fernanda dos Santos Martins da Palma Pereira [vencida quanto às decisões
constantes das alíneas a) e e), nos termos de declaração de voto, e com
declaração de voto, por discordar da fundamentação, quanto à alínea c)] —
Alberto Tavares da Costa [vencido quanto às matérias constantes das alíneas d) e
e), conforme declaração de voto junta] — Guilherme da Fonseca [vencido quanto às
decisões das alíneas c), e) e d), conforme declaração de voto] — José de Sousa e
Brito [vencido quanto à decisão da alínea e), nos termos da declaração de voto
junta] — José Manuel Cardoso da Costa — (Tem voto de conformidade da Ex.ma
Conselheira Maria da Assunção Esteves, que não assina por não se encontrar
presente) — Bravo Serra — Tem voto de vencido do Ex.mo Conselheiro Luís Nunes de
Almeida, cuja declaração, nos termos do Regulamento Interno, me entregou
atempadamente) — Bravo Serra.
DECLARAÇÃO DE VOTO
1 — No presente processo de fiscalização preventiva de constitucionalidade,
elaborei, na qualidade de primitivo relator, memorando em que preconizava que o
Tribunal Constitucional se pronunciasse pela inconstitucionalidade de todas as
normas que constituíam objecto daquele, por se verificar um vício procedimental
quanto a todo o Decreto n.º 183/VI, decorrente da violação do artigo 139.º, n.º
2, da Constituição.
Não obstante este juízo de inconstitucionalidade, aliás por fundamento não
invocado pelo Presidente da República, entendi que se justificava conhecer das
questões de eventual inconstitucionalidade material das normas postas em causa
pela entidade requerente, à semelhança do que o Tribunal Constitucional tem
feito noutras ocasiões, tendo preconizado nesse memorando que o Tribunal se
deveria pronunciar pela inconstitucionalidade do artigo 1.º do referido Decreto
n.º 183/VI apenas na parte em que dá nova redacção ao n.º 2 do artigo 33.º e
adita dois novos números (n.os 5 e 6) ao artigo 53.º da Lei de Imprensa.
Tendo ficado vencido quanto a estes três pontos, ocorreu mudança de relator.
Importa, assim, fundamentar as razões da minha discordância relativamente às
decisões constantes das alíneas a), d) e e) da parte decisória do acórdão.
A) A questão da inconstitucionalidade procedimental
2 — No memorando já referido, dei conta de que o Tribunal Constitucional já
havia abordado em 1989, na sua anterior composição, questão semelhante a
propósito de um decreto da Assembleia da República que, na sequência de um veto
político do Presidente da República, reformulara a Lei Eleitoral para o
Parlamento Europeu, sem ter antes procedido à confirmação do diploma vetado com
a maioria qualificada prevista no artigo 139.º, n.º 3, da Constituição (Acórdão
n.º 320/89, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 13.º Vol., Tomo I, pp. 29 e
segs.). Nessa altura, o Tribunal Constitucional não se havia pronunciado pela
inconstitucionalidade do diploma, numa decisão tirada por maioria. No mesmo
memorando propunha que o Tribunal se afastasse da sua jurisprudência, por me
parecer que havia razões ponderosas para considerar que tinha ocorrido uma
violação do n.º 2 do artigo 139.º da Constituição, invocando em abono desta tese
o voto de vencido do Ex.mo Conselheiro Luís Nunes de Almeida, bem como a posição
assumida pelos Deputados António Barbosa de Melo, presidente da Assembleia da
República, e Alberto Costa no sentido de que a reformulação do Decreto n.º
177/VI só podia eventualmente ser levada a cabo após a confirmação do mesmo
decreto pela maioria absoluta exigida no n.º 2 do artigo 139.º da Constituição.
3 — No decurso do debate do memorando por mim apresentado, ficou fortalecida a
minha convicção inicial no sentido de que ocorrera um vício procedimental que
inquinava todo o Decreto n.º 183/VI.
De facto, o artigo 139.º da Constituição não distingue as situações de
confirmação do decreto vetado e de reformulação do decreto vetado sem prévia
confirmação. Tão-pouco tal distinção é acolhida pelo Regimento da Assembleia da
República (o seu artigo 169.º, n.º 3, estatui que a votação na generalidade do
decreto vetado «versa sobre a confirmação», estatuindo o n.º 4 do mesmo artigo
que «só há discussão na especialidade se até ao termo do debate na generalidade
forem apresentadas propostas de alteração, incidindo a votação apenas sobre os
artigos objecto das propostas»). Nessa medida, considerei que a tese acolhida
pela maioria do Tribunal de que havia uma lacuna de regulamentação e que a mesma
devia ser preenchida por recurso ao n.º 3 do artigo 279.º da Constituição era
inaceitável, como o tinha já demonstrado o Ex.mo Conselheiro Luís Nunes de
Almeida no seu voto de vencido junto ao Acórdão n.º 320/89. Por uma questão de
economia de meios, remeto para essa declaração de voto, bem como para a
declaração de voto do mesmo Conselheiro junta ao presente acórdão, aderindo à
respectiva fundamentação.
4 — Para além do que consta dessas duas declarações de vencido, afigura-se-me
que não pode constituir argumento a favor da tese adversa a invocação da
distinção de regimes prevista no artigo 170.º do Regimento da Assembleia da
República. Este artigo acolhe a possibilidade, admitida no n.º 4 do artigo
precedente, de serem introduzidas alterações a um decreto vetado pelo Presidente
da República nos termos do n.º 1 do artigo 139.º da Constituição — possibilidade
que se não acha prevista no texto da Lei Fundamental. E distingue aí duas
situações: havendo confirmação sem alterações, o decreto da Assembleia da
República é o mesmo, sendo enviado ao Presidente da República para promulgação
no prazo de oito dias a contar da sua recepção; havendo alterações introduzidas
no decreto, o novo decreto é enviado ao Presidente da República para
promulgação.
É manifesto que, tendo a Assembleia introduzido quaisquer alterações no decreto
vetado, não obstante a prévia confirmação — formalidade exigível como decorre de
uma interpretação literal dos n.os 3 e 4 do artigo 169.º do Regimento — não
poderia o Presidente da República ficar vinculado a promulgar esse diploma
alterado, sem que pudesse submeter as inovações a eventual fiscalização
preventiva de constitucionalidade ou, mesmo, vetar politicamente o decreto, em
função das inovações. Mas a confirmação destinar-se-ia, em qualquer caso, a
tornar firme o que não foi alterado no diploma, traduzindo a assunção, por
maioria clara dos Deputados, do Decreto anteriormente aprovado.
5 — Em termos políticos, não se afigura desejável o prolongamento de conflitos
entre o Presidente da República e o órgão parlamentar. Em caso de veto
presidencial, parece, no mínimo, exigível que a Assembleia só prossiga o intento
de manter o diploma vetado — ainda que com alterações — se houver uma maioria
qualificada nesse sentido que o possa confirmar. De outro modo, a tratar-se de
um novo diploma sem prévia confirmação, verificam-se «insuperáveis entorses às
regras constitucionais sobre o processo legislativo, já que se não descortina a
quem tenha podido caber a iniciativa legislativa, sendo certo que o n.º 1 do
artigo 170.º da Lei Fundamental enumera taxativamente as entidades e quem ela
pode competir» (Conselheiro Luís Nunes de Almeida, no seu voto de vencido junto
ao presente acórdão). E não se percebe bem como pode justificar-se a dispensa
de confirmação por maioria qualificada com a preocupação de não permitir a
subversão dos critérios de formação democrática da vontade legislativa quanto ao
órgão parlamentar.
6 — No voto de vencido do Ex.mo Conselheiro Luís Nunes de Almeida mostra-se como
o acolhimento no caso sub judicio da tese maioritária propicia uma fraude à
Constituição. Na verdade, face a uma mensagem presidencial em que se
explicitaram os múltiplos fundamentos da discordância política com o articulado
constante do Decreto n.º 177/VI, a Assembleia da República não confirmou o
decreto aprovado nos termos do n.º 2 do artigo 139.º da Constituição,
limitando-se a introduzir uma modificação pontual, alterando a redacção do n.º 4
do artigo 16.º da Lei da Imprensa visada naquele primeiro decreto, suprimindo aí
a referência «ou noutro local» e voltando, assim, à redacção aprovada no seio da
Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
Dificilmente se encontra nessa alteração a preocupação de ir ao encontro de
alguma das críticas presidenciais constantes da aludida mensagem.
Como se afirmava no texto do memorando por mim apresentado, era «manifesto no
caso sub judicio que o Decreto da Assembleia permaneceu praticamente inalterado,
situação mais nítida do que aquela que foi apreciada pelo citado Acórdão n.º
320/89» (n.º 15).
7 — Assim, entendo que se impunha a conclusão de que todas as normas postas em
causa pelo Presidente da República se acham viciadas por inconstitucionalidade,
por violação do n.º 2 do artigo 139.º da Lei Fundamental.
B) A questão da inconstitucionalidade do artigo 1.º do Decreto, na parte em
que dá nova redacção ao n.º 2 do artigo 33.º da Lei de Imprensa
8 — Através desta norma, o legislador parlamentar pretende agravar
acentuadamente a responsabilidade contravencional dos directores dos periódicos.
Dispõe a mesma:
A inobservância do direito de resposta no prazo legal, a recusa infundada do
respectivo exercício ou a violação dos n.os 3, 7 e 8 do artigo 16.º são punidas
com multa de 500 000$00 a 5 000 000$00.
No memorando apresentado, chamava-se a atenção para a amplitude do agravamento,
na medida em que, por força do disposto no artigo 3.º do Decreto n.º 183/VI, as
multas previstas para o comum das contravenções no n.º 1 do mesmo artigo 33.º
passariam a ter, após a actualização, como limites mínimo e máximo os valores de
240 000$00 e 600 000$00. No debate parlamentar, a Deputada Odete Santos afirmou
que os autores do Decreto «foram à lei em vigor e multiplicaram por 25 o valor
mínimo da multa, enquanto nas outras multas o coeficiente utilizado é apenas 12»
(Diário da Assembleia da República, I Série, n.º 15, de 23 de Novembro de 1994,
p. 554). Mais impressionante, porém, era a fixação do valor máximo da multa em
5 000 contos, ou seja, o décuplo do valor mínimo de multa, situando-se no
cêntuplo do limite máximo ainda vigente. Escrevia-se nesse memorando, em
seguida:
[O limite máximo da multa é fixado] muito acima do montante máximo previsto no
regime geral do ilícito de mera ordenação social quanto a pessoas singulares
(500 000$00, nos termos do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de
Outubro, na redacção do Decreto-Lei n.º 356/89, de 17 de Outubro) e do limite
máximo geral das multas criminais (300 dias a 10 000$00 por dia — artigo 46.º,
n.os 1 e 2, do Código Penal), sendo certo que os autores das contravenções
serão, em regra, os directores dos periódicos e, ainda que pudessem ser as
empresas jornalísticas, estas poderão pertencer a pessoas singulares (artigos
7.º, n.os 1 e 2, da Lei de Imprensa).
No decurso do debate do memorando, tornou-se mais claro para mim que o regime
sancionatório constante da nova redacção do n.º 2 do artigo 33.º da Lei da
Imprensa relativamente a infracções relacionadas com a inobservância do direito
de resposta, a sua recusa infundada e outras violações do regime do direito de
resposta é extraordinariamente mais gravoso do que o previsto nas Leis da Rádio
e da Televisão.
9 — Comecemos pela Lei da Rádio (Lei n.º 87/88, de 30 de Julho). O direito de
resposta vem regulado nos artigos 22.º e seguintes. De harmonia com o artigo
25.º, n.º 1, a entidade emissora decide sobre a transmissão da resposta no prazo
de 72 horas a contar da recepção da formalização, podendo recusar tal
transmissão «se for manifesto que os factos a que se refere a resposta não
preenchem o condicionalismo do artigo 22.º ou se o conteúdo desta infringir o
disposto no n.º 3 do artigo anterior» (n.º 2 do mesmo artigo 25.º). Segundo o
n.º 3 do artigo 24.º, «o conteúdo da resposta deve ser limitado pela relação
directa e útil com a emissão que a provocou, não podendo o texto exceder 300
palavras nem conter expressões desprimorosas ou que envolvam responsabilidade
civil ou criminal, a qual, neste caso, só ao autor da resposta pode ser
exigida».
Da decisão da entidade emissora de recusa de transmissão do direito de resposta
pode o titular deste direito recorrer para o tribunal competente (artigo 25.º,
n.º 3), bem como pode apresentar queixa a Alta Autoridade para a Comunicação
Social [artigo 4.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 15/90, de 30 de Junho]. O não
acatamento pelos responsáveis da programação ou por quem os substitua da decisão
do tribunal que ordene a transmissão da resposta constitui crime de
desobediência qualificada [artigo 35.º, alínea b)].
Para além de responsabilidade criminal do responsável de programação, não se
prevê nenhum ilícito contra-ordenacional, diferentemente do que agora se
pretende fazer. Existe ainda o artigo 37.º na Lei da Rádio que estabelece a
pena de multa para «quem ofender qualquer dos direitos, liberdades e garantias
consagradas na presente lei». Tal pena de multa tem os limites mínimo e máximo
de 50 a 300 dias, sendo «cumulável com a correspondente aos danos causados à
entidade emissora» (n.º 2 do mesmo artigo). Dada a generalidade de previsão,
pode admitir-se que a mesma abranja a recusa de transmissão do direito de
resposta, se julgada ilegítima.
10 — A Lei da Televisão (Lei n.º 58/90, de 7 de Setembro) regula em termos
idênticos o direito de resposta (artigos 35.º e seguintes). De novo, se permite
a recusa da transmissão da resposta se faltarem os respectivos pressupostos e,
nomeadamente, se não houver relação directa e útil com a emissão que a provocou,
se exceder o número de palavras do texto respondido, se contiver «expressões
desprimorosas ou que envolvam responsabilidade civil ou criminal» (artigos 38.º,
n.º 2, e 35.º, n.º 3). O não acatamento da ordem judicial de transmissão da
resposta constitui crime de desobediência qualificada, sendo autores do mesmo
«os responsáveis pela programação ou […] quem os substitua» [artigo 48.º, alínea
a)]. De novo, aparece uma incriminação, punível com multa da 100 a 300 dias,
relativamente «a quem ofender qualquer dos direitos liberdades ou garantias
consagrados na presente lei» (artigo 50.º, n.º 1).
11 — Feita a descrição do regime legal dos direitos de resposta nas Leis da
Rádio e da Televisão, logo se alcança que o regime visado pelo Decreto n.º 183/V
é desproporcionadamente mais gravoso em matéria sancionatória, sendo igualmente
mais rigoroso em outros aspectos:
— na rádio e na televisão, a respectiva estação tem uma ampla possibilidade de
apreciar a legitimidade da resposta, podendo dizer-se que, só após a resolução
do litígio quanto a este aspecto, surge a obrigação de transmissão da mesma; no
caso da imprensa, impõe-se ao periódico a publicação da resposta, ainda que o
respondente aja com abuso do direito (artigo 16.º, n.º 9, in fine);
— na rádio e na televisão, permite-se que a estação respectiva faça acompanhar
a transmissão da resposta de um comentário necessário para corrigir inexactidões
factuais nela contidas (artigo 26.º, n.º 4, da Lei da Rádio; artigo 39.º, n.º 4,
da Lei da Televisão), ao passo que, no caso da imprensa, «o periódico não
poderá, em caso algum, inserir no mesmo número em que for publicada a resposta
qualquer anotação ou comentário à mesma» (artigo 16.º, n.º 7, nova redacção);
— o não acatamento da ordem judicial de transmissão ou publicação da resposta é
sancionado como crime de desobediência qualificada no caso da rádio, da
televisão e, provavelmente, da imprensa, visto, no caso desta última, não ter
sido expressamente revogada a norma incriminatória na Lei de Imprensa [artigo
30.º, n.º 1, alínea b)] não parecendo aceitável a tese de que terá havido uma
revogação de sistema dessa norma incriminatória;
— por último, a não publicação da resposta, ainda que abusiva, é punida com
multa de 500 a 5 000 contos, independentemente da difusão do periódico, ao passo
que, no caso das Leis da Rádio e da Televisão, a multa tem limites muito mais
baixos (50 a 300 dias) e não há obrigação de transmissão de respostas abusivas.
Ora, dando de barato que o direito de resposta carece de uma regulamentação mais
exigente no que toca à imprensa escrita, dada a especificidade da rádio e da
televisão, bastará atentar na diferença essencial consistente em que as estações
de rádio e de televisão não são obrigadas a transmitir respostas abusivas,
diferentemente do que irá suceder no caso da imprensa, para se alcançar que o
sistema sancionatório previsto no n.º 2 do artigo 33.º em apreciação é
inconstitucional por violação dos princípios da igualdade e da proporcionalidade
lidos conjuntamente, à semelhança do que o Tribunal Constitucional já decidiu no
seu Acórdão n.º 370/94 (publicado no Diário da República, II Série, n.º 27, de 7
de Setembro de 1994). Neste último acórdão, considerou-se que a punição de um
crime de abuso de confiança previsto no Código de Justiça Militar não podia ser
feita de forma desproporcionadamente mais grave do que a prevista no Código
Penal. Ora, também aqui, tendo o direito de resposta a mesma natureza, não é
concebível que a recusa de transmissão de uma resposta abusiva nunca seja punida
nos casos da rádio e da televisão, ao passo que, no caso da imprensa, a
resposta, ainda que abusiva, tenha de ser sempre publicada, sob pena de prática
de uma contravenção punível com tanta gravidade. O argumento da credencial
constitucional de «eficácia» (artigo 37.º, n.º 4, da Lei Fundamental), não pode
aplicar-se só à imprensa escrita.
12 — Daí a conclusão de que o n.º 2 do artigo 33.º em apreciação é
inconstitucional por violação do disposto nos artigos 13.º e 18.º, n.os 2 e 3,
da Constituição.
C) A questão da inconstitucionalidade do artigo 1.º do Decreto na parte em que
adita os n.os 5 e 6 ao artigo 53.º da Lei de Imprensa
13 — O artigo 53.º da Lei de Imprensa regula actualmente uma providência de
natureza cível que se não confunde com o processo destinado a sancionar as
contravenções, sujeito ao diploma que regula o processamento e julgamento das
contravenções (Decreto-Lei n.º 17/91, de 10 de Janeiro, aplicável por força do
artigo 51.º da Lei de Imprensa). A única especialidade desta providência cível
reside no tribunal competente para dela conhecer, que é, precisamente, o
tribunal com competência para julgar as contravenções (cfr. Vital Moreira, O
Direito de Resposta na Comunicação Social, Coimbra, 1994, p. 149).
14 — No Decreto n.º 183/VI, o artigo 53.º é profundamente alterado, mantendo-se
da versão original intocado apenas o n.º 3. Consagra-se inovatoriamente a
existência de recurso da decisão de primeira instância, «com efeito meramente
devolutivo».
O n.º 5 do artigo 53.º estabelece que o não-cumprimento do previsto no n.º 4
(não acatamento pelo periódico da obrigação de publicar «extracto decisório e a
resposta num dos dois números subsequentes à data do seu trânsito em julgado»)
«determina a aplicação da multa do artigo 33.º por cada edição posterior
publicada sem inclusão do extracto decisório e da resposta».
Não se afigurou fácil ao Tribunal Constitucional determinar com rigor o sentido
deste preceito, nem a sua concatenação com o subsequente n.º 6. As mesmas
dificuldades foram sentidas na Assembleia da República.
Na sessão plenária de reapreciação do Decreto n.º 177/VI, o Partido Comunista
propôs a eliminação desse número. A Deputada Odete Santos justificou essa
proposta com base na circunstância de o mesmo ser «verdadeiramente
inconstitucional», por se tratar de julgar uma pessoa por uma infracção que
ainda não cometeu («… no caso de não ser publicada a resposta, o juiz condena
mas fixa logo a multa para a hipótese de a pessoa não publicar a resposta
posteriormente. Isto é verdadeiramente incrível, viola os princípios da culpa e
da proporcionalidade» — Diário, I Série, n.º 15, citado). Tal medida foi mesmo
qualificada como «aborto», num aparte do Deputado Narana Coissoró, o qual
afirmou que não haveria nenhum juiz que aplicasse tal norma. Não houve qualquer
intervenção subsequente em defesa da constitucionalidade do preceito ou sobre a
sua interpretação.
15 — A maioria do Tribunal entendeu que, o legislador pretendeu criar uma sanção
de tipo compulsório, cujo regime processual teria sido estabelecido no
subsequente n.º 6 do artigo 53.º, a qual se cumularia com a sanção
contravencional prevista no artigo 33.º
Discordei desse entendimento, mantendo-me fiel à interpretação que avancei no
memorando.
De facto, apesar da inserção sistemática, creio que o n.º 5 do artigo 53.º prevê
um novo ilícito contravencional, não contemplado no artigo 33.º da mesma Lei.
Um acto de não cumprimento de uma decisão judicial determina a aplicação de uma
sanção contravencional, a prevista no artigo 33.º, «por cada edição posterior
publicada sem inclusão do extracto decisório e da resposta» (deve notar-se que a
remissão para a «multa do artigo 33.º» é ambígua, visto que o n.º 1 contempla
multas com limites mais baixos e o n.º 2 multas com limites francamente mais
elevados). Em tal entendimento, afigura-se que este n.º 5 do artigo 53.º está
afectado de inconstitucionalidade pelas mesmas razões com que sustentei a
inconstitucionalidade do n.º 2 do artigo 33.º (porventura, o limite mínimo, em
vez de 500 000$00, seria neste caso de 240 000$00). Por outro lado, o n.º 6 do
artigo 53.º estabelece que, para a hipótese do incumprimento referido no n.º 5
desse artigo, «o juiz fixará, desde logo, na sentença a multa que deverá
acrescer à da condenação».
Ora, não obstante o engenho interpretativo de maioria do Tribunal
Constitucional, tenho para mim que o legislador previu uma multa antecipadamente
fixada que acrescerá à multa da condenação, ou seja, a multa contravencional que
vier a ser aplicada pela infracção ao disposto no n.º 4 do artigo 53.º E, por
outro lado, não se vê como terá havido uma revogação implícita ou de sistema da
norma incriminadora da alínea b) do n.º 1 do artigo 30.º da Lei de Imprensa, só
porque deixam de intervir na decisão de publicação ou de recusa da resposta os
membros do conselho de redacção, anteriormente susceptíveis de incriminação, e
porque o novo n.º 1 do artigo 53.º passa a falar de satisfação «integral», em
vez de se referir à situação de «recusa infundada», por esta deixar de ter
relevo prático no novo sistema… Dizer que há uma «profunda modificação» parece
um injustificável exagero!
Não me parece aceitável uma outra tese que parta da ideia de que, a par da multa
contravencional, haverá uma sanção compulsória cível, do tipo da prevista no
artigo 829.º-A do Código Civil, ou então apenas uma sanção compulsória, a
prevista no n.º 5 do artigo 53.º e regulada, do ponto de vista processual, no
n.º 6 desse artigo, com descriminalização da conduta.
Na interpretação por mim perfilhada, afigura-se-me que o sistema sancionatório
aqui gizado é desproporcionado e violador do princípio da culpa.
Ora, como se sustentou sem contestação no debate parlamentar, viola o princípio
da culpa a fixação antecipada, ainda que através de decisão judicial, de uma
pena de multa ex ante facto. O princípio da culpa implica sempre um juízo sobre
o grau da mesma culpa, após a comissão da infracção, para determinar a eventual
aplicação da pena e a sua graduação.
Existe, pois, inconstitucionalidade por violação dos artigos 1.º, 2.º e 25.º,
n.º 1, da Constituição, bem como violação do princípio da proporcionalidade, na
medida em que as multas já sem o agravamento do n.º 6 foram reputadas, nos seus
limites máximo e mínimo, como desproporcionadas.
Mas ainda que se sustentasse que, in casu, o legislador não pretendeu consagrar
uma multa contravencional agravada ou um acréscimo de multa antecipadamente
fixado, antes estabelecendo uma multa de natureza não criminal, de finalidade
compulsória, ter-se-ia de concluir pela inconstitucionalidade da norma, por
violação do princípio da precisão ou determinabilidade da lei sancionatória
(sobre este princípio constitucional, vejam-se, na jurisprudência
constitucional, os Acórdãos n.os 285/92 e 358/92, este último referente a uma
autorização legislativa, publicados no Diário da República, I Série-A, n.os 188,
de 17 de Agosto de 1992, e 21, de 26 de Janeiro de 1993). Na verdade, nesta
ordem de ideias ficariam por determinar os limites mínimo e máximo dessa sanção
compulsória, visto não haver nesse n.º 6 do artigo 53.º qualquer remissão para
outra norma (nomeadamente, o n.º 1 ou n.º 2 do artigo 33.º).
De facto, da formulação desta norma não resulta qualquer critério densificado de
fixação da sanção compulsória aplicável, nem se estabelecem quais os limites da
sua variação, e se deveria aplicar-se, enquanto medida coerciva, relativamente a
cada um dos actos de violação (neste último sentido, com alguma dificuldade,
poderia supor-se ser esse o significado da qualificação «de acréscimo»
relativamente à multa da condenação). E as mesmas considerações serão
sustentáveis, ainda que se trate de uma multa contravencional.
E além da violação do princípio da precisão ou determinabilidade da lei,
ocorreria também uma manifesta violação do princípio da proporcionalidade
(cumulação de responsabilidade criminal pela prática de um crime de
desobediência qualificado, com responsabilidade contravencional punível com
multa de 500 000$00 a 5 000 000$00, ainda agravada por uma sanção compulsória
indeterminada que acresceria à multa contravencional que viesse a ser fixada).
Por estas razões concluo pela inconstitucionalidade da norma, em qualquer das
suas interpretações alternativas. — Armindo Ribeiro Mendes.
DECLARAÇÃO DE VOTO
1 — Não acompanhei o acórdão nas soluções adoptadas nas alíneas a), d) e e) da
respectiva decisão, suportando-me para tanto nas razões que a seguir se deixam
sumariamente expostas.
2 — Em consonância com a posição assumida no Acórdão n.º 320/89, Diário da
República, I Série, de 4 de Abril de 1898, por remissão para a declaração de
voto aí produzida pelo Ex.mo Conselheiro Luís Nunes de Almeida, posição que
continuo a ter por inteiramente correcta, e não foi, aliás, objecto de qualquer
argumentação de sinal contrário no presente acórdão, votei no sentido da
inconstitucionalidade formal de todas as normas do Decreto n.º 183/VI, da
Assembleia da República, por entender que tal decreto haveria de ser confirmado
— o que não aconteceu — nos termos do artigo 139.º, n.º 2, da Constituição, por
maioria absoluta dos deputados em efectividade de funções.
3 — Do mesmo modo me pronunciei no sentido da inconstitucionalidade do artigo
1.º do mesmo decreto, na parte em que confere nova redacção ao n.º 2 do artigo
33.º e em que adita os n.os 5 e 6 ao artigo 53.º do Decreto-Lei n.º 85-C/75, de
26 de Fevereiro, e em ambos os casos por considerar excessivo e desproporcionado
o aumento constante das multas cominadas pelas normas em apreço, particularmente
no que ao seu limite mínimo respeita (500 000$00 a 5 000 000$00).
Com efeito, perspectivando o princípio da proibição do excesso ao nível da
definição em abstracto da moldura das sanções relacionadas com a violação do
regime do direito de resposta, pode concluir-se que tais penas, na concreta
dimensão prevista naqueles preceitos, não se apresentam como toleráveis, isto é,
proporcionais em sentido estrito, não se mostrando equilibrada a protecção de
bens, interesses e valores em causa face ao sacrifício imposto a alguns deles.
Se a compressão do direito à informação como meio de garantir com maior eficácia
o usufruto do direito de resposta e, indirectamente, dos direitos à imagem, ao
bom nome e outros em que se insinua o direito geral de personalidade não se
afigura constitucionalmente ilícita, tendo em conta a pauta de valores imanente
à Constituição e a margem de conformação de que o legislador goza nesse domínio,
o mesmo não se poderá já afirmar a propósito da delimitação da carga patrimonial
resultante da multa e do interesse público do cumprimento da lei.
Tratando-se de uma operação de ponderação de bens, interesses e valores importa
antever as repercussões ao nível da justiça concreta das penas, isto é, ao nível
da possibilidade que a lei deixa às sentenças de aplicação de penas de serem
elas próprias respeitadoras do princípio da proibição do excesso.
E se quanto ao limite máximo não se vê que a lei tolha, por completo, a
capacidade de o juiz preferir decisões desproprocionadas à lesão dos bens que se
visa punir, e à culpa do agente, já quanto ao limite mínimo a orientação poderá
ser diferente, quando se entenda que a lei não deixa ao juiz aplicador da pena
outra hipótese que não a de determinar uma censura no mínimo de 500 000$00, uma
ou mais vezes, consoante as situações em apreço.
Ora, se no plano abstracto, tendo em conta o peso dos direitos em causa, poderia
não haver justificação para dúvidas da razoabilidade de semelhante limite
mínimo, já as repercussões que isso possa ter ao nível da justiça concreta
exigem uma apreciação de sinal contrário.
Em certas situações bem configuráveis — periódicos locais de reduzida tiragem,
jornais mensais ou semanais de pequena circulação — a lei obrigará a imposição
de cargas patrimoniais intoleráveis, para os respectivos transgressores, fora de
uma adequada ponderação dos interesses em jogo.
E por força deste entendimento, contra o qual o acórdão não desenvolveu qualquer
argumentação sustentável, pronunciei-me também no sentido da
inconstitucionalidade das normas dos artigos 33.º, n.º 2, e 53.º, n.os 5 e 6, na
formulação que agora lhes é dada pelo decreto sujeito à fiscalização de
constitucionalidade deste Tribunal. — Antero Alves Monteiro Diniz.
DECLARAÇÃO DE VOTO
I
Votei a inconstitucionalidade formal do Decreto n.º 183/VI da Assembléia da
República, que altera o Decreto-Lei n.º 85-C/75, de 26 de Fevereiro, por
entender que viola o artigo 139.º, n.º 2, da Constituição.
Existindo veto político, a Constituição impõe a subordinação do diploma vetado a
uma confirmação por maioria absoluta dos Deputados em efectividade de funções.
Só a introdução de alterações substanciais justifica a abertura de um novo
processo legislativo. Mudanças formais (como, por exemplo, meros
aperfeiçoamentos de redacção ou sistematização) não dispensam o mecanismo da
confirmação.
A exigência de confirmação do diploma vetado, quando não sofra alterações
substanciais, é uma decorrência da separação de poderes e da articulação entre
os poderes do Presidente da República e da Assembléia da República, tal como é
configurada constitucionalmente.
A possibilidade de, através de alterações, se impedir ad perpetuam o
encerramento de um processo legislativo e se permitir o exercício reiterado do
veto político contraria os fins constitucionais dos institutos do veto político
e da confirmação e seria fonte de graves conflitos entre órgãos de soberania.
Ao admitir-se, porém, que a Assembleia da República altere substancialmente o
decreto vetado, dispensando-se então a confirmação, está a reconhecer-se,
simplesmente, que a sua competência em determinada matéria não é precludida pelo
veto presidencial. A Assembleia da República poderá, evidentemente, acatar o
veto, excluindo as soluções censuradas pelo Presidente da República [cfr. o
Acórdão n.º 320/89, Acórdãos do Tribunal Constitucional, 13.º Vol., Tomo I
(1989), pp. 7 e segs.; Jorge Miranda, Funções, Órgãos e Actos do Estado, 1990,
pp. 438-9; e Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República
Portuguesa Anotada, 3.ª ed., 1993, p. 600].
O «acatamento do veto», de que depende a dispensa de confirmação, não obrigará a
Assembleia da República a adoptar, positivamente, quaisquer soluções sugeridas
pelo Presidente da República. Mas deverá traduzir-se, necessariamente, na
superação de todas as críticas que fundamentaram o veto, através da aprovação de
normas materialmente inovatórias distintas ou da simples eliminação das normas
censuradas.
No caso em apreço, o «novo decreto» da Assembleia da República não elide as
críticas que fundamentaram o veto do Presidente da República, já que apenas
introduz uma alteração de pormenor (artigo 16.º, n.º 4) que não modifica o
regime anterior nem elimina quaisquer normas censuradas. Por isso, não se
trata, substancialmente, de novo decreto, que exima a Assembleia da República da
confirmação prevista no n.º 2 do artigo 139.º da Constituição.
Por estas razões, considero que o diploma está globalmente ferido de
inconstitucionalidade formal.
II
Votei a não inconstitucionalidade material do artigo 1.º do Decreto n.º 183/VI
da Assembleia da República, na parte em que dá nova redacção ao artigo 16.º do
Decreto-Lei n.º 85-C/75 aditando-lhe um n.º 9 [alínea c) da decisão], no
pressuposto de que é possível uma interpretação do preceito conforme à
Constituição. Segundo uma tal interpretação, o ilícito contravencional derivado
da recusa de publicação da resposta delimita-se nos termos gerais do direito
penal. Assim, uma causa de exclusão da ilicitude, como, por exemplo, o conflito
de deveres ou a legítima defesa, poderá justificar a recusa de publicação da
resposta.
Deste modo, não é constitucionalmente sustentável uma interpretação do artigo
16.º, n.º 9, segundo a qual não seria oponível um direito de recusa de
publicação da resposta a um exercício abusivo do direito de resposta. Uma
interpretação que concluísse que a defesa contra esse exercício abusivo (que
inclua na resposta, por exemplo, injúrias, difamações, ameaças ou outros
comportamentos criminais) não poderia ser exercida através de uma auto-tutela,
mas apenas mediante o recurso aos tribunais após a publicação da resposta, seria
contrária à igualdade na protecção jurídica dos direitos, que é imposta pelo
princípio da igualdade (artigo 13.º, n.º 1, da Constituição), e colidiria com o
direito geral de defesa contra agressões ilícitas (artigo 21.º da Constituição).
Na verdade, o recurso à via judicial é posterior à consumação das agressões
(contra a honra ou a liberdade) associadas à publicação de resposta abusiva e
não pode prosseguir as finalidades preventivas que caracterizam os institutos de
auto-tutela de direitos. Negar a validade destes institutos equivaleria a
reconhecer um dever de suportar agressões ilícitas.
III
Votei vencida relativamente à decisão de não inconstitucionalidade material
contida na alínea e) do acórdão, referente ao artigo 1.º do Decreto n.º 183/VI
da Assembleia da República, na parte em que adita os n.os 5 e 6 ao artigo 53.º
do Decreto-Lei n.º 85-C/75, pelas seguintes razões:
1.ª — Divergi, desde logo, do entendimento maioritário do Tribunal quanto à
interpretação dos referidos preceitos. Na realidade, entendo que o artigo 53.º
passa a consagrar, agora, um processo de efectivação judicial do direito de
resposta, em conexão com o artigo 33.º, constituído por três momentos lógicos:
a) Em primeiro lugar, o artigo 53.º, n.os 1 e 4, prevê uma infracção
contravencional pela violação do direito de resposta, a que corresponde a multa
do artigo 33.º, n.º 2;
b) Em segundo lugar, o artigo 53.º, n.º 5, prevê uma nova infracção
contravencional e a respectiva condenação (sentença condenatória a que se refere
o artigo 53.º, n.º 6) pela recusa de acatamento da decisão judicial de
efectivação do direito de resposta — haverá então lugar à publicação da resposta
e da sentença que a ordene, até à segunda edição do periódico posterior ao
trânsito em julgado da sentença condenatória;
c) Em terceiro lugar, o artigo 53.º, n.º 6, prevê uma última infracção
pela persistência, após a segunda edição posterior ao trânsito em julgado da
sentença condenatória, na desobediência relativamente a tal sentença.
Relativamente a esta última situação jurídica, que o preceito em causa não
identifica claramente como infracção autónoma, prevê-se que, antecipadamente, na
própria sentença condenatória pela desobediência ao tribunal (não ainda na que
condene pela mera recusa de publicação da resposta, anterior à fase judicial),
se determine a aplicação automática da multa do artigo 33.º, n.º 2, por cada
edição do periódico em que não se cumpra a determinação judicial, a partir do
segundo número após o respectivo trânsito em julgado.
Sustentei esta interpretação como a que melhor dará conta da multiplicidade e da
autonomia das prescrições jurídicas e das correspondentes infracções. Uma outra
interpretação, que reduza a intervenção judicial à condenação pela violação do
direito de resposta, negando a autonomia da condenação pela violação do dever de
acatamento daquela decisão judicial promove a supressão das garantias de defesa
e abdica de fundamentar a sanção na determinação de um ilícito culposo.
Isto é, abreviadamente, a interpretação que rejeitei (e que o Tribunal veio a
seguir) suscita, ela própria, uma «monstruosa inconstitucionalidade» do artigo
53.º, n.os 5 e 6, na medida em que admite a aplicação de uma sanção pelo não
acatamento da sentença logo no momento da condenação pela violação do direito de
resposta. Pretende tal interpretação que as normas dos n.os 1, 4, 5 e 6 do
artigo 53.º contemplam uma única sentença condenatória, que aplica sanções
respeitantes a um facto passado (violação originária do direito de resposta) e a
um facto futuro (violação do dever de acatar a condenação).
Segundo a interpretação que perfilhei, a aplicação da multa prevista no artigo
33.º pelo não cumprimento da sentença que determina a publicação da resposta é
decretada por decisão judicial autónoma. Assim, a sentença que determine a
publicação da resposta (artigo 53.º, n.º 4) não se confunde com a sentença que
condene em multa pela desobediência (artigo 53.º, n.º 5).
Mas, mesmo seguindo esta interpretação, o princípio da legalidade será violado
porque a possibilidade, admitida pelo artigo 53.º, n.os 5 e 6, de determinar, na
segunda sentença condenatória, que o periódico seja, automaticamente, condenado
pela persistência na não publicação da resposta ignora a exigência
constitucional de fundamentar a sanção penal na prática comprovada de uma
infracção anterior (nulla poena sine crimen). Com efeito, a condenação
antecipada na multa prevista no artigo 33.º, n.º 2, por cada edição futura em
que o agente persista na não publicação da resposta dispensa a prova da prática
de qualquer facto típico, ilícito e culposo.
2.ª — Considero, por maioria de razão, feridos de inconstitucionalidade os n.os
5 e 6 do artigo 53.º, se se perfilhar a interpretação do Tribunal quanto ao
número de juízos decisórios, vindo a caracterizar-se a sanção (através da multa
prevista no artigo 33.º, n.º 2) como compulsória e não fundamentada, em
absoluto, na prática anterior de um facto típico, ilícito e culposo.
Na realidade, a classificar-se a referida multa como sanção de constrangimento,
meramente destinada a motivar o jornal à efectivação do direito de resposta após
a sentença condenatória, ela violará, ainda assim, os princípios da igualdade,
da culpa, da necessidade, da adequação e da proporcionalidade.
A referida multa violará os princípios da culpa e da igualdade, emanados dos
artigos 1.º e 27.º, n.º 1, e 13.º da Constituição, na medida em que uma sanção
de gravidade contravencional, ainda que justificada pela coacção dos
destinatários relativamente a factos futuros, não se poderá aplicar sem qualquer
controlo pelos critérios de ilicitude e de culpa penais.
A aplicação de pena de prisão em alternativa à multa, prevista no artigo 46.º,
n.º 3, do Código Penal com uma notória finalidade de constrangimento, depende do
não pagamento culposo da multa (artigo 47.º, n.º 4). E, de um modo geral, as
sanções penais puramente preventivas, como as medidas de segurança, não se
aplicam quando não foi praticado um facto típico e ilícito (seu pressuposto, nos
termos do disposto no artigo 91.º, n.º 1, do Código Penal) e até quando se
admita que facto idêntico não seria censurável se fosse praticado por imputável
(Figueiredo Dias, Direito Penal Português, 1993, pp. 461 e segs.), por razões de
igualdade. Deste modo, os critérios de responsabilidade que condicionam a
aplicação de penas valem ainda para restringir a aplicação de sanções de
gravidade idêntica não fundamentadas na culpa.
Não é admissível, por outro lado, que, por força do «baptismo conceptual» como
sanção compulsória, se venha a negar a natureza contravencional a uma sanção de
gravidade idêntica à das restantes multas contravencionais. Na realidade, o que
caracteriza as chamadas sanções compulsórias, que têm como fonte histórica as
figuras francesa da astreinte e germânica das Zwangsgeld/Zwangshaft e das
Ordnungsgeld/Ordnungshaft, é serem sanções puramente preventivas (a que inere
uma especial técnica coercitiva), dirigidas a coagir os destinatários a
adoptarem uma certa conduta (cfr. Calvão da Silva, Cumprimento e sanção
pecuniária compulsória, 1987, pp. 370 a 406).
Porém, esta razão não retira a qualificação como penais às sanções compulsórias,
se efectivamente possuírem essa natureza. Não só há sanções penais puramente
preventivas como também as próprias penas pretendem, segundo a perspectiva
consagrada explicitamente na reforma penal, evitar a lesão de bens jurídicos.
Já hoje as penas se justificam, em última instância, pelo princípio da
necessidade, visando assegurar direitos ou interesses tutelados
constitucionalmente (artigo 18.º, n.º 2, da Constituição).
A legitimação preventiva geral (e especial) das penas só as faria divergir desta
sanção compulsória, na medida em que se entendesse que ela deixaria de se
aplicar para sancionar factos passados, quando o destinatário adoptasse a
conduta prescrita, o que, obviamente, não sucede. A aplicação da medida
fundamenta-se em factos passados tal como uma vulgar pena e apenas apresenta a
especialidade de a sua aplicação cessar para o futuro, a partir do momento em
que o destinatário cumpra.
A natureza substantiva das sanções compulsórias não poderá resultar da sua
finalidade preventiva-especial sui generis, mas sim da sua gravidade e da
gravidade do ilícito a que se referem, que neste caso é a desobediência à
sentença que determina a publicação (prevista na lei, presentemente, como crime
de desobediência qualificada). A eventual qualificação da própria injunção
jurídica de publicação de sentença nos crimes de expressão como efeito da pena
ou sua consequência acessória (cfr. artigo 189.º da Lei n.º 35/94, de 15 de
Setembro, que autoriza o Governo a rever o Código Penal) é, hoje, aceita pela
doutrina penal (como refere Jescheck, Lehrbuch des Strafrechts, Allgemeiner
Teil, 4.ª ed., 1988, p. 714). A natureza contravencional ou análoga da referida
sanção compulsória impõe-se contra uma perspectiva que a tente reduzir a uma
sanção civil. Na realidade, não é meramente civil o efeito coercitivo
relativamente à desobediência de publicação da resposta e da sentença, pois ele
contém um significado manifesto de prevenção da lesão da ordem jurídica
produzida pela desobediência. Por outro lado, a gravidade daquela sanção
compulsória não deriva da necessidade de reparar o concreto dano do ofendido
(quanto ao direito de resposta), mas sim do desvalor para a ordem pública da
violação do referido direito e da desobediência a uma decisão judicial (à
natureza quase penal da própria consequência acessória de publicação da sentença
se refere Preisendanz, Strafgesetzbuch, 30.ª ed., 1978, § 200, anot. 1, citado
por Jescheck; Schmidhaüser, Allgemeiner Teil, 2.ª ed., 1975, p. 772, trata
igualmente como penas acessórias estes efeitos das penas; cfr., ainda, no
sentido da qualificação da publicação da sentença como pena, Manzini, Trattato
di Diritto Penale Italiano, 1981, vol. 3, pp. 210 e segs.; cfr., em geral,
Figueiredo Dias, ob. cit., pp. 93 e 85, que admite que os efeitos das penas
possuam carácter penal). Pode haver, por conseguinte, sanções de
constrangimento ou compulsórias civis, administrativas, contravencionais e
penais. A pena sucedânea de prisão no caso de não pagamento da multa, que é
cominada pelo artigo 46.º, n.º 3, do Código Penal, é, como já referi, um exemplo
de sanção penal de constrangimento (assim, Figueiredo Dias, ob. cit., p. 147).
A sanção contravencional compulsória ou de constrangimento prevista nos n.os 5 e
6 do artigo 53.º da Lei de Imprensa violará os princípios da necessidade, da
adequação e da proporcionalidade, inferidos dos artigos 18.º, n.º 2, e 13.º, n.º
1, da Constituição, na medida em que se admite, abstraindo da concreta gravidade
do facto típico, ilícito e culposo, a aplicação de uma multa que pode, à razão
máxima de 5 000 000$00 por cada edição, atingir uma quantia pecuniária
elevadíssima. No caso de um jornal diário, passado um ano de desobediência
continuada, poderá atingir-se um valor de cerca de 1 800 000 000$00. Na
prática, esta sanção acarretará a eliminação do periódico.
Não é razoável, igualmente, o argumento de que a sanção compulsória se
individualiza, quanto a cada decisão de não publicação manifestada em cada
edição do periódico, e de que não podemos conceber como uma só sanção
compulsória as multas correspondentes a todas as infracções. A um suposto
cúmulo material destas sanções compulsórias (por concurso verdadeiro — e real —
de infracções) opõem-se as figuras do crime continuado (artigos 30.º, n.º 2, e
78.º, n.º 5, do Código Penal) e do próprio concurso efectivo de crimes (artigos
30.º, n.º 1, e 78.º, n.os 1 e 2, do Código Penal), em que nunca se procede a uma
ilimitada adição de penas.
No que respeita às penas privativas ou restritivas da liberdade, estes regimes
constituem uma decorrência imediata do artigo 30.º, n.º 1, da Constituição.
Quanto às restantes sanções penais ou contravencionais, valerão sempre as
exigências de necessidade, adequação e proporcionalidade, incompatíveis com a
inexistência de limites máximos.
Os n.os 5 e 6 do artigo 53.º ofendem ainda a exigência de determinabilidade das
sanções penais, resultante do princípio da legalidade (artigo 29.º, n.º 3, da
Constituição). Com efeito, as sanções previstas naquelas normas serão
aplicadas, ex ante, sem nenhuma referência a critérios de gravidade do facto e
da culpa do agente que permitam uma concreta graduação.
Acresce a tudo isto, por fim, que o artigo 37.º, n.º 3, da Constituição impõe a
subordinação aos princípios do direito criminal das infracções cometidas no
exercício dos direitos de expressão e de informação. Assim, o legislador
constitucional reforçou, neste domínio, as garantias dos agentes de infrações
destituídas de dignidade penal, pela sua natureza. Por conseguinte, a referida
«sanção compulsória» nunca poderia deixar de estar subordinada aos princípios
gerais do direito criminal. — Maria Fernanda Palma.
DECLARAÇÃO DE VOTO
1 — Votei vencido, desde logo, por entender que ocorre inconstitucionalidade
formal ou procedimental de todas as normas do Decreto n.º 183/VI, por não ter
sido dado cumprimento ao preceituado no artigo 139.º, n.º 2, da Constituição da
República Portuguesa, que exige o voto da maioria absoluta dos Deputados em
efectividade de funções para a confirmação dos diplomas vetados pelo Presidente
da República.
Esta questão foi debatida na Assembleia da República na mesma sessão do Plenário
em que foi aprovado o Decreto n.º 183/VI, embora a propósito de um outro decreto
também vetado pelo Presidente da República. Na altura, o Presidente da
Assembleia da República, Deputado Barbosa de Melo, suscitou a questão referindo
ao Plenário que um outro Deputado o alertara para «o facto de a votação, na
generalidade, deste decreto não se destinar à sua confirmação» e que os serviços
jurídicos da Assembleia lhe haviam comunicado não ser habitual a votação na
generalidade versar sobre a confirmação do diploma vetado, tal como está
prescrito, na Constituição e no Regimento; a razão, para tal entendimento
decorreria de terem sido, apresentadas propostas de alteração, o que tornaria
desnecessário, «nos termos regimentais e constitucionais, uma confirmação do
decreto, com 116 votos favoráveis, para passarmos à fase seguinte da discussão
na especialidade». E na sequência desse relato, pediu que se pronunciassem
sobre esta matéria os diversos Deputados juristas de cada grupo parlamentar (in
Diário da Assembleia da República, I Série, n.º 15, de 23 de Novembro de 1994,
p. 521).
Não foi posta em causa pelos Deputados que intervieram a seguir a possibilidade
de introdução de alterações num diploma vetado, na fase da sua reapreciação, tal
como consta do artigo 169.º, n.º 4, do Regimento.
O Deputado Alberto Costa (PS) sustentou que devia haver, em qualquer caso,
confirmação, do diploma vetado pela maioria qualificada constitucionalmente
exigível (artigo 169.º, n.º 3, do Regimento).
Em contrapartida, o Deputado João Amaral (PCP) entendeu que a confirmação por
maioria qualificada só tinha sentido quando a Assembleia da República não
acatasse o veto, pois, se o órgão parlamentar optava por aprovar um novo
decreto, estaria a aceitar o veto, ainda que não houvesse concordância «com
todos os seus fundamentos», recordando mesmo que «um qualquer Presidente da
República, neste sistema constitucional, pode, face ao novo decreto, vetá-lo de
novo nos mesmos termos» (in Diário, cit., p. 522). E, neste último sentido,
pronunciaram-se, também, os Deputados Guilherme Silva (PPD/PSD), sustentando que
a votação na generalidade, no caso concreto, seria uma mera formalidade, em
rigor supérflua, servindo não para confirmar o decreto, mas para se passar
apenas à sua discussão na especialidade, e Narana Coissoró (CDS-PP), que se
referiu a um como que «miniprocesso legislativo», no caso de serem introduzidas
alterações no diploma, havendo apreciação na generalidade e na especialidade e
votação final global.
Face às opiniões expressas, o Presidente da Assembleia da República acatou o
entendimento maioritariamente perfilhado, deixando expressa a sua discordância,
e submeteu o decreto a votação, na generalidade, «para, por maioria simples,
apurar a vontade da Câmara e, de seguida, passarmos à discussão na
especialidade» (ibidem). E o mesmo procedimento foi por ele adoptado, sob
«protesto», como teve ocasião de salientar, na reapreciação do Decreto n.º
177/VI, atinente à alteração da Lei de Imprensa, e que daria origem ao diploma
ora em apreço.
2 — Seguiu, assim, a Assembleia da República procedimento compatível com a tese
que obteve vencimento no Acórdão n.º 320/89 e propugnada por autorizados
constitucionalistas, como Vital Moreira, Gomes Canotilho e Jorge Miranda, que
sufragam o entendimento de que, no caso de haver alterações aprovadas quanto ao
decreto vetado, não é necessária a confirmação do mesmo pela maioria qualificada
prevista nos n.os 2 e 3 do artigo 139.º da Constituição.
Assim, Gomes Canotilho e Vital Moreira, embora em termos cautelosos, sustentam
que o Presidente da República não pode exercer o direito de veto pela segunda
vez em relação a diploma confirmando. Mas acrescentam em seguida:
… mas se a AR, em vez de confirmar o decreto vetado, lhe introduzir alterações —
hipótese que parece não ser de excluir, mediante reabertura do processo
legislativo na base do decreto vetado —, deve entender-se que se trata de um
novo diploma, que dá origem à abertura de um novo processo de promulgação. O PR
pode vetá-lo de novo, mesmo que o novo diploma tenha sido aprovado por maioria
qualificada (Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª ed., Coimbra,
1993, p. 600).
Jorge Miranda, por seu turno, afirma que, em caso de veto político, a votação na
generalidade versa sobre a confirmação do decreto, só havendo lugar a discussão
e votação na especialidade se, até ao termo do debate na generalidade, forem
apresentadas propostas de alteração, incidindo a votação apenas sobre os artigos
objecto das propostas (hoje, artigo 169.º, n.os 3 e 4, do Regimento). E,
peremptoriamente, considera que, entretanto, «se o decreto for aprovado (por
qualquer maioria) e se forem aprovadas alterações, considerar-se-á que existe um
novo diploma e abrir-se-á outro processo de promulgação e de eventual veto (v.
artigo 168.º, n.º 2, do Regimento)» (Funções, Órgãos e Actos do Estado, ed.
policopiada, Lisboa, 1990, pp. 438-439; ao artigo regimental citado
correspondente hoje o artigo 172.º, n.º 2, da versão em vigor do Regimento).
3 — Na esteira da declaração de voto que tive ocasião de lavrar, quando da
assinatura do citado Acórdão n.º 320/85, continuo a sustentar que, em situações
como a dos autos, em que a Assembleia da República é confrontada com um diploma
vetado pelo Presidente da República, só podiam eventualmente ser introduzidas
alterações a esse mesmo diploma, desde que tivesse ocorrido a prévia confirmação
do decreto vetado pela maioria qualificada constitucionalmente prevista (artigo
139.º, n.os 2 e 3). Não só tal solução decorre da Constituição apertis verbis,
como tem expressa e inequívoca consagração regimental (artigo 169.º, n.os 2 e
3).
É que, diferentemente da tese acolhida no Acórdão n.º 320/89, o silêncio da
Constituição, em matéria de veto político, sobre a possibilidade de reformulação
de um diploma, não configura uma lacuna de regulamentação que deva ser
preenchida pelo recurso à analogia com o disposto no n.º 3 do artigo 279.º da
Constituição. Como se demonstrou no mencionado voto de vencido, as profundas
diferenças de regime constitucional entre o veto político e o veto por
inconstitucionalidade inviabilizam o recurso à analogia para o preenchimento da
lacuna, eventualmente existente no artigo 139.º:
Com efeito, enquanto no caso de veto político a Constituição só prevê a
devolução do decreto ao Presidente da República, para promulgação, no caso de
veto por inconstitucionalidade a Constituição prevê, para além dessa hipótese, a
possibilidade de a Assembleia da República devolver o decreto ao Presidente da
República, para promulgação, procedendo tão-só ao expurgo das normas julgadas
inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional, em sede de fiscalização
preventiva. Ou seja, ocorrendo esta última situação o decreto é reenviado ao
Presidente da República, sem que se exija qualquer votação por maioria
qualificada.
Ora, como decorre do mais elementar conhecimento das coisas, o mera expurgo de
uma ou mais normas de um decreto pode, muitas vezes, ter como consequência
afectar a coerência interna do diploma ou, até, despojá-lo de qualquer sentido.
Daí, a necessidade de, em tais casos, se substituírem as normas expurgadas por
outras normas ou de se introduzirem alterações noutras disposições do decreto,
de forma a possibilitar a reconstituição de um texto legislativo integral e
coerente.
Assim sendo, bem se compreende que, no caso do veto por inconstitucionalidade,
permitindo a Constituição o expurgo sem confirmação por maioria qualificada,
também permita a reformulação do decreto sem essa mesma confirmação; tal razão,
porém, já não vale para a caso de veto político.
Aliás, esta diferença de regimes encontra o seu fundamento na profunda
diversidade de natureza existente entre os documentos que consubstanciam ou
servem de suporte, por um lado, ao veto político, e, por outro lado, ao veto por
inconstitucionalidade.
Na verdade, enquanto este último — o veto por inconstitucionalidade — remete
obrigatoriamente para um documento jurídico — o acórdão do Tribunal
Constitucional — que identifica com precisão as normas consideradas
inconstitucionais e, também, o próprio sentido do veto, já o primeiro — o veto
político — consta tão-só de um documento de natureza estritamente política — a
mensagem do Presidente da República — cuja fundamentação não tem de identificar
precisamente as normas que estão na sua origem ou pode, mesmo, basear-se apenas
em razões de oportunidade ou na exigência de requisitos políticos que nada tem a
ver com o conteúdo concreto de quaisquer disposições do diploma vetado.
Consequentemente, enquanto face ao veto por inconstitucionalidade é
perfeitamente possível determinar quais as normas cujo expurgo tem como efeito
eliminar as razões do veto, já face ao veto político tal determinação nem sempre
é possível.
Assim, bem se justifica a diferença de regimes estabelecida nos artigos 139.º e
279.º: aqui, tem de se prever o expurgo de normas, logicamente sem confirmação
do diploma, e, consequentemente, a sua reformulação, também sem confirmação;
ali, porque se não tem de regular o expurgo de normas não se prevê a introdução
de alterações, igualmente sem essa confirmação (Acórdãos do Tribunal
Constitucional, 13.º Vol., Tomo I, pp. 70-71).
4 — No mesmo voto de vencido, e agora numa outra perspectiva, acentua-se que «a
existência de um novo decreto, resultante da introdução de alterações ao decreto
vetado, coloca o Presidente da República perante a alternativa de promulgar ou
de proceder a novo veto». E, a propósito, acrescenta-se um importante argumento
de natureza sistemática:
Ora, desta situação decorre que, a permitir-se, no caso de veto político, que a
Assembleia da República alterasse o decreto vetado sem o confirmar pela maioria
qualificada requerida, se estaria a fomentar um indesejável conflito
institucional entre o Presidente da República e o Parlamento, conflito, aliás,
teoricamente infindável, porquanto se poderia gerar um lamentável círculo
vicioso de vetos e alterações, porventura mínimas ou irrelevantes, iludindo o
processo constitucionalmente estabelecido para pôr fim às divergências
existentes entre aqueles órgãos de soberania, quanto à conveniência da
promulgação de determinado diploma legislativo.
Desta consequência se apercebeu, argutamente, um dos autores que, ainda na
vigência da Constituição de 1993, se pronunciava, aliás, pela possibilidade de a
Assembleia alterar o decreto vetado, sem o confirmar pela maioria qualificada
constitucionalmente exigida.
Com efeito, esse autor, reconhecendo que, nessas hipóteses, «por uma banda, se
ladeia a exigência de maioria qualificada», mas que, «por outra banda, o Chefe
de Estado recupera todo o seu poder de veto», logo acrescentava: «embora seja de
esperar que o não use, porque, a haver terceira deliberação, provavelmente
confirmaria a segunda» (Jorge Miranda, Contributo para uma Teoria da
Inconstitucionalidade, Lisboa, 1965, p. 147). Esta última observação, pelo
reconhecimento da intolerável situação em que a adopção da tese propugnada
colocaria o Presidente da República, é suficiente para fulminar tal tese como
radicalmente incompatível com uma interpretação sistemática da Constituição,
naturalmente tendente, nestas matérias, à busca de soluções que preservem o bom
relacionamento institucional entre os diversos órgãos de soberania.
Acresce ainda que, para além do mais, a adopção da tese sustentada no acórdão
sempre exigiria a verificação, em cada caso concreto, se haviam sido
efectivamente introduzidas «modificações substanciais» no decreto vetado, «para
que não haja fraude à Constituição» (Jorge Miranda, ob. cit., loc. cit.), o que
é, pelo menos, de muito difícil fiscalização.
Por todos estes motivos, não parece que o artigo 139.º permita a introdução de
alterações ao diploma vetado politicamente, sem que a Assembleia da República o
confirme pela maioria qualificada constitucionalmente requerida em cada caso.
Aliás este entendimento é sufragado pelo próprio Regimento da Assembleia da
República, cujo artigo 165.º só admite a apreciação de alterações ao diploma
vetado, na fase da discussão na especialidade, à qual se segue, naturalmente, a
votação na generalidade, que incide sobre a confirmação do decreto vetado (n.º
3). Quer isto dizer que, nos termos regimentais, a aprovação de alterações
pressupõe a prévia confirmação do decreto, confirmação que só se concretiza
quando o diploma é reaprovado pela maioria qualificada constitucionalmente
exigida (ob. cit., pp. 72-73; já se viu que a norma regimental ora em vigor é o
n.º 3 do artigo 169.º).
5 — Tanto bastaria para se concluir por solução diversa da adoptada no acórdão
que obteve vencimento. É que, ou se entende, como na declaração de voto que se
vem seguindo, que o diploma em apreço é, ainda, o mesmo diploma que o decreto
vetado e, então, ocorre a falta de confirmação pela maioria requerida; ou,
então, como o faz o acórdão, se propende a considerar que, quando haja
reformulação, se está perante um novo diploma, e, nesse caso, forçoso é
reconhecer que se verificam insuperáveis entorses às regras constitucionais
sobre o processo legislativo, já que se não descortina a quem tenha podido caber
a iniciativa legislativa, sendo certo que o n.º 2 do artigo 170.º da Lei
Fundamental enumera exaustivamente as entidades a quem ela pode competir.
Assinale-se, ainda, porém, que a tese sufragada no acórdão pode conduzir — e, in
casu, conduziu — a uma grosseira violação do espírito do disposto no n.º 4 do
artigo 170.º da CR, segundo o qual os projectos e as propostas de lei
definitivamente rejeitados não podem ser renovados na mesma sessão legislativa.
É que, como se estabelece no n.º 3 do artigo 170.º do Regimento — e tal decorre
de uma correcta interpretação da Constituição —, a falta de confirmação de um
diploma vetado corresponde a rejeição, para os efeitos do referido artigo 170.º,
n.º 4, da Lei Fundamental. Ora, a admitir-se que a reformulação implica um novo
decreto, a verdade é que, então, pode ocorrer que esse novo decreto, por apenas
se distanciar do decreto vetado em pormenores destituídos de qualquer relevo
suficiente para se poder considerar superada a limitação do referido artigo
170.º, n.º 4, ladeia a proibição constitucional nesta matéria, para além de
constituir «fraude à Constituição» quanto à maioria requerida para a superação
do veto.
Dir-se-á que, em tais hipóteses, haverá que inconstitucionalizar o diploma, pois
que, nele não tendo sido introduzidas «modificações substanciais», não se
verificam os pressupostos que permitiriam concluir estar-se perante um novo
decreto.
Simplesmente, e apesar de, no que se refere à aplicação do artigo 170.º, n.º 4,
se poder recorrer a certos critérios para determinar o que possam ser
modificações substanciais «não terão tal mérito diferenças de conteúdo de
simples pormenor, sem significado bastante para se poder afirmar que não há
identidade intelectual, de sentido prescritivo, entre o diploma já rejeitado, e
o reposto» (Parecer n.º 16/80, Pareceres da Comissão Constitucional, 12.º vol.,
p. 188) — a verdade é que se torna muito difícil proceder a essa determinação,
e, em qualquer caso, na situação dos autos, tal não sucedeu, já que se não
duvida que entre o decreto vetado e o «novo decreto» existe uma identidade
substancial indiscutível, sendo insustentável que ele pudesse, se fosse esse o
caso, ultrapassar o crivo do artigo 170.º, n.º 4; de todo o modo, para se poder
entender, nas situações de veto, que a reformulação dispensaria a confirmação, e
simultaneamente evitar a fraude à Constituição, sempre seria necessário
demonstrar que as «modificações substanciais» correspondiam ao sentido do veto,
dando-lhe na generalidade, resposta, como se assinalava já na declaração de voto
que se vem citando.
6 — No caso concreto, não se verifica, porém, que tenham ocorrido «modificações
substanciais», susceptíveis de justificar a tese mais branda, defendida no
acórdão.
O veto presidencial abrangeu o diploma enviado para promulgação no seu todo.
Depois de destacar o propósito louvável de clarificação e de atribuição de
efectividade ao exercício do direito de resposta nos jornais e de tornar mais
céleres os processos jurídicos relativos aos abusos da liberdade de imprensa, a
mensagem do Presidente da República passou a enunciar os múltiplos fundamentos
por que este entendia que devia haver nova apreciação do diploma pela Assembleia
da República:
— O diploma teria adoptado, «no seu articulado, critérios que podem provocar um
enorme desequilíbrio entre o exercício do direito à informação e o direito de
qualquer cidadão à reserva da intimidade privada e familiar — sobretudo se se
conjugarem as normas do Decreto n.º 177/VI — com as alterações que também se
pretendem introduzir no Código Penal, relativamente aos crimes de difamação e
injúria»;
— Os critérios adoptados poderiam «vir a afectar seriamente o direito à
liberdade de expressão, ao abrirem caminho quer ao abuso do direito de resposta
quer a novas formas de autocensura por parte de jornais e jornalistas,
naturalmente intimidados pelo cariz extremamente repressivo e fortemente
punitivo das normas contidas no decreto em questão»;
— «Não estando em causa a necessidade de clarificar as formas que deve assumir
o direito de resposta, de tornar efectivo o seu exercício e de garantir a
celeridade dos respectivos processos, a verdade é que as soluções adoptadas […]
configuram uma alteração e, mesmo, uma inversão radical no sistema até agora
vigente — aliás, nunca aplicado em todo o seu rigor — privilegiando
desproporcionadamente o exercício do direito de resposta em manifesto prejuízo
do exercício do direito à informação e à liberdade de expressão»;
— Existiriam soluções de desproporção evidente, desde que se tivessem em conta
«quer o pesadíssimo sistema de multas que agora se pretende adoptar, quer os
critérios de celeridade processual que o decreto em questão consagra — sistema e
critérios esses que podem ser considerados excessivamente gravosos e claramente
intimidatórios, seja para os jornais seja para os jornalistas»;
— Tinha-se ainda por «incompreensível» que as preocupações que estavam na
origem da aprovação do decreto em causa não se tivessem tornado extensivas aos
outros meios de comunicação social, designadamente aos audiovisuais,
afirmando-se ser certo que não existe nessa matéria qualquer razão para
distinção entre uns meios de comunicação social e outros;
— Não poderiam ser ignoradas as críticas provenientes de diferentes meios
(forças políticas, jornalistas, advogados e magistrados), concordando os autores
dessas críticas num juízo sobre o carácter inadmissível da adopção «de um
sistema que privilegie e proteja sobretudo as figuras públicas, quando são elas
as ofendidas, e restrinja claramente os direitos de defesa dos jornalistas,
quando são estes os acusados»;
— Tão-pouco poderiam «deixar de causar fundada preocupação as críticas que têm
sido dirigidas pelo Sindicato dos Jornalistas aos Deputados da maioria
parlamentar acusados de não terem respeitado ‘as garantias de defesa do direito
de informar e de ser informado’ que esses mesmos Deputados terão reafirmado, por
duas vezes, quando os representantes daquele Sindicato foram ouvidos na Comissão
de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias da Assembleia da
República».
E a mensagem presidencial terminava nos seguintes termos:
O direito à informação e à liberdade de expressão — que, entre outras formas,
também se traduz na existência de uma imprensa livre, plural e responsável — é
uma das características essenciais de qualquer Estado de direito democrático. E
tão importante é garantir o exercício desse direito, numa sociedade aberta,
livre e democrática, como assegurar o respeito pelos demais direitos, liberdades
e garantias dos cidadãos.
Num domínio tão delicado e sensível como este — em que está igualmente em causa
a credibilidade das instituições democráticas, dos seus titulares e agentes — é
essencial a procura de um grande equilíbrio e rigor. Trata-se, também aqui, de
matéria suficientemente importante e de evidente melindre para a vida
democrática, para merecer da Assembleia da República a reapreciação que agora
solicito» (citado Diário, p. 1101).
Ora, no debate em Plenário sobre a reapreciação do diploma vetado, foram
apresentadas diferentes propostas de alteração ao articulado do Decreto n.º
177/VI (cfr. Diário da Assembleia da República, II Série-A, n.º 7, de 28 de
Novembro de 1994, pp. 76-77). Todavia, só veio a ser aprovada uma única
alteração, relativa ao texto do n.º 4 do artigo 16.º voltando-se ao texto
inicial da comissão com uma modificação de pormenor (supressão da referência «ou
noutro local»).
É, assim, manifesto no caso sub judicio, que o Decreto da Assembleia permaneceu
praticamente inalterado, situação ainda mais nítida do que aquela que foi
apreciada pelo citado Acórdão n.º 320/89.
7 — Pode, pois, dizer-se que o diploma é o mesmo de um ponto de vista
substancial, embora formalmente se apresente como um novo diploma. E, apesar
disso, não houve confirmação ao diploma vetado pela maioria qualificada prevista
na Constituição.
Neste caso, não pode esgrimir-se com o argumento de que a Assembleia da
República procurou ir ao encontro das críticas constantes da mensagem do
Presidente da República, apagando, por assim dizer, as objecções por este
avançadas. E, consequentemente, não pode afirmar-se que seria absurdo impor à
Assembleia da República que confirmasse o diploma vetado pela maioria
qualificada constitucionalmente exigível, já que o órgão parlamentar não acolheu
a esmagadora maioria das críticas constantes da mensagem presidencial.
Nestes termos, todas as normas questionadas sofrem de inconstitucionalidade, por
violação do artigo 139.º, n.º 2, da Constituição.
8 — Para além disso, entendi igualmente que o artigo 1.º do decreto em apreço,
ao dar nova redacção ao artigo 33.º, n.º 2, da Lei de Imprensa, se encontrava
ferido de inconstitucionalidade, por contender com o princípio da
proporcionalidade, quando conjugado com o princípio da igualdade, pelas razões
constantes da declaração de voto do primitivo relator, Ex.mo Conselheiro Armindo
Ribeiro Mendes, que inteiramente acompanho nesse ponto. — Luís Nunes de Almeida.
DECLARAÇÃO DE VOTO
1 — Vencido quanto às matérias constantes das alíneas d) e e) da parte decisória
do acórdão.
Se relativamente às restantes normas sujeitas a fiscalização preventiva não
considerei detectar-se vício de inconstitucionalidade, já divergi da tese do
acórdão quanto à conformidade constitucional da moldura sancionatória prevista
para o n.º 2 do artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 85-C/75 pelo artigo 1.º do
Decreto n.º 183/VI [directamente, no caso da alínea d); por remissão dos n.os 5
e 6 do artigo 53.º do mesmo diploma quanto à outra alínea].
2 — A alteração a introduzir na «Lei de Imprensa» é fruto de uma opção de matriz
político-legislativa que não cabe a este Tribunal censurar, em princípio, ou
seja, desde que se não manche de inconstitucionalidade.
Pretendeu-se disciplinar o exercício do direito de resposta — no âmbito da
imprensa escrita — de modo a densificar-se mais adequadamente a regulamentação
desse direito fundamental tendo em vista a protecção dos direitos e interesses
dos cidadãos.
O que, envolvendo, em princípio, uma limitação da liberdade de imprensa, se
revela tarefa particularmente delicada, não vá gerar-se intolerável
desequilíbrio em prejuízo desta última.
Entre nós — como revela qualquer trabalho de investigação da evolução
legislativa na matéria (cfr., entre outros, Alberto Arons de Carvalho e António
Manuel Monteiro Cardoso, Da Liberdade de Imprensa, Lisboa, 1971, e Maria Manuela
Tavares Ribeiro, Subsídios para a Matéria da Liberdade de Imprensa, Coimbra,
1984) — e desde a Carta de Lei de 4 de Julho de 1821, o melindre das soluções,
na área da liberdade de Imprensa, vem-se revelando, como um Autor sublinhou,
numa perspectiva dicotómica: por um lado, frequência das intervenções do
legislador, «significativa do carácter instável das soluções adoptadas», não
vocacionadas para disciplinarem duradouramente este tipo de relações; por outro,
o balancear constante entre esquemas que privilegiam o livre desenvolvimento das
liberdades de expressão e de informação em detrimento de outros interesses
individuais e colectivos, dignos de tutela (ou vice-versa, acrescenta-se) — cfr.
Manuel António Lopes Rocha, Sobre o Modelo de Responsabilidade Sucessiva nos
Crimes de Imprensa, Alguns Problemas, 1988, p. 4 (separata do vol. iii dos
Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Eduardo Correia, 1984, número especial do
Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra).
Confessadamente, o legislador pretende corrigir o pendor para uma acentuada
fragilização actual na protecção dos direitos à honra e à privacidade,
disciplinando com maior rigor o exercício do direito de resposta.
Este, no entanto, tem os mesmos limites que a liberdade de imprensa em geral,
não podendo reclamar um estatuto privilegiado, como observa Vital Moreira
(Direito de Resposta na Comunicação Social, Coimbra, 1994, p. 117), pelo que o
exercício dos dois há-de fazer-se sem que nenhum deles se descaracterize,
limitadamente se necessário, salvaguardando os demais interesses
constitucionalmente protegidos, de acordo com o n.º 2 do artigo 18.º da
Constituição da República.
Ou seja, têm lugar aqui os instrumentos que, em Estado de direito democrático,
se prestam a ponderar e distribuir os custos de eventual conflito para avaliar a
legitimidade da restrição, com predomínio do princípio da proporcionalidade, não
apenas na exigência expressa de que as restrições «se limitam ao necessário»
para o objectivo de protecção visado, mas ainda de que elas hão-de em qualquer
caso deixar intocado o «conteúdo essencial» do preceito constitucional relativo
ao direito restringido.
3 — Tendo presente a estreita imbricação entre o direito de liberdade de
imprensa e o direito de resposta, pode resultar do exercício deste restrição
daquele. Ora — e independentemente da prevalência valorativa que se possa dar a
um sobre o outro, questão que não importa equacionar agora — a restrição deve
não só ser a menor possível — e adequada e necessária — como deve deixar
intocado o núcleo essencial dos direitos em causa.
Nesta perspectiva e, nomeadamente, considerando que a liberdade de imprensa
deseja-se alicerçada na prática quotidiana de uma tradição viva que a respeite,
entende-se que as sanções particularmente gravosas previstas nas normas em causa
importam um «custo excessivo», susceptível de abalar uma desejável «optimização
equilibrada», e de, assim, lesionar os valores democráticos que assistem à
liberdade de imprensa.
Ou seja, o balanceamento do legislador, desta vez, atingiu desproporcionadamente
o conteúdo essencial deste direito, em termos que se afiguram
constitucionalmente censuráveis.
Muito sumariamente, esta é a razão do meu afastamento pontual do acórdão. —
Alberto Tavares da Costa.
DECLARAÇÃO DE VOTO
1 — Votei vencido quanto à decisão constante da alínea c), por entender estar
ferido de inconstitucionalidade material o artigo 1.º do Decreto n.º 183/V da
Assembleia da República, que altera o Decreto-Lei n.º 85-C/75, de 26 de
Fevereiro (Lei de Imprensa), na parte em que dá nova redacção ao artigo 16.º,
aditando-lhe o n.º 9.
É que, contrariamente à conclusão retirada pelo acórdão, parece-me que a medida
nova que consta desse n.º 9, impedindo a possibilidade de recusa de inserção de
resposta nos casos de uma sua manifesta impertinência, de conter matéria que
envolva responsabilidade civil ou criminal do titular do respectivo direito e de
faltarem os pressupostos legais do seu exercício — e era essa a versão
originária dos n.os 4 e 7 do artigo 16.º —, configura uma claramente
desproporcionada restrição da liberdade de imprensa, na sua vertente de
liberdade editorial, com violação dos artigos 2.º e 18.º, n.º 3, conjugados com
os artigos 37.º, n.º 4, e 38.º, n.os 1 e 2, alínea a), da Constituição.
Neste ponto, relativo a um abuso do direito de resposta, acompanho o «juízo de
censura jurídico-constitucional» adiantado pelo requerente, sendo legítimas as
«dúvidas de natureza jurídico-constitucional» colocadas perante este Tribunal
Constitucional.
No binómio liberdade de imprensa/garantia do direito de resposta, a tutela
exagerada, desadequada e desproporcionada, que o legislador, por via do n.º 9,
quer consagrar para este direito vem permitir um verdadeiro abuso do direito de
resposta, expropriando as páginas dos órgãos de comunicação social a favor das
pessoas, singulares ou colectivas, que são ou pensam ser atingidas pela
«liberdade de expressão e criação dos jornalistas e colaboradores literários»
[alínea a) do n.º 2 do artigo 38.º da Constituição].
E no acórdão dá-se conta da dificuldade de surgirem «hipóteses em que a
limitação da possibilidade de recusa do direito de resposta possa conduzir a
resultados que, do ponto de vista do vigente ordenamento jurídico, seriam, no
mínimo, passíveis de ser perspectivados como aberrantes», só que se devolve, em
tais casos, para a solução da «intervenção de um órgão jurisdicional». O que,
diga-se já, é «curto», pois da limitação da possibilidade de recusa do direito
de resposta e do sancionamento, agora agravado desmesuradamente, com a nova
redacção do artigo 53.º, dessa recusa, resulta que os órgãos da comunicação
social ver-se-ão sempre na contingência de permitirem a inserção da resposta nas
suas páginas, qualquer que seja o modo de exercício dessa resposta (sobretudo
quando possa ser manifestamente impertinente ou descabida, ou até envolvendo
responsabilidade criminal do autor da resposta). Valerá mais aos órgãos de
comunicação verem realmente expropriadas as suas páginas pelos autores das
respostas, mesmo nas tais hipóteses «aberrantes» — ou situações «consideradas
como absurdas» talqualmente se expressa também o acórdão —, do que se sujeitarem
a um sistema sancionatório do tipo agora introduzido com a nova redacção do
citado artigo 53.º
Pergunta Vital Moreira (O Direito de Resposta na Comunicação Social, Coimbra
Editora, 1994):
Quer isso dizer que não se pode recusar em nenhuma circunstância a publicação ou
emissão da resposta? De modo nenhum! Com efeito a lei prevê casos em que a
inserção da resposta pode ser recusada — p. 119.
E o Autor não questiona nas páginas da citada obra a constitucionalidade desses
casos em que a inserção da resposta pode ser recusada, salvo no tocante à
hipótese de recusa «pelo facto de ela (resposta) conter expressões
desprimorosas», pois aí se levanta «um problema constitucional» («O requisito de
abstenção de expressões desprimorosas é deveras insólito e só por si revela um
claro viés desfavorável a quem exerce o direito de resposta» — lê-se a p. 117).
Claramente opina o mesmo Autor:
O direito de resposta não autoriza um direito de acesso sem limites por parte do
interessado ao órgão de comunicação social em causa. Sendo uma limitação da
liberdade editorial do órgão de informação, o direito de resposta deve ser
harmonizado com aquela num justo equilíbrio. Compreende-se assim que ele só
implique uma obrigação de inserção nos casos justificados pela sua função
constitucional e dentro de limites razoáveis, isto é, capazes de satisfazer
aquela sem sacrifícios desnecessários da liberdade de gestão editorial.
Todavia, eles não podem ser tais, que atentem contra o princípio da igualdade e
eficácia do direito de resposta — p. 114.
Também Lopes Rocha, no Estudo citado no acórdão e quando se debruça sobre o
artigo 16.º da Lei de Imprensa, não põe em causa a constitucionalidade da
solução da recusa da resposta e só questiona as hipóteses de «a resposta ser
recusada para além dos casos expressamente referidos naquele preceito».
A resposta negativa — diz Lopes Rocha — parece impor-se, dado que o n.º 1 do
artigo 16.º inculca a ideia de que o respondente é o único juiz e senhor dos
seus interesses e, por isso, não só da decisão ou da oportunidade de exercer o
seu direito, como da própria avaliação do carácter ofensivo, inverídico ou
irróneo da publicação e dos correspondentes efeitos para a sua reputação e boa
fama.
E, em jeito de conclusão, escreve o mesmo Autor:
Não pode duvidar-se do valor e da legitimação de tal instituto, [o instituto do
direito de resposta] na sua veste de mecanismo destinado a proteger direitos
fundamentais da personalidade, com larga tradição histórica entre nós e
consagrado em numerosas legislações.
Certo que constitui um limite à liberdade de informação e de opinião, pelo que
deve ser judiciosamente utilizado, já que o seu fundamento é reagir contra os
abusos daquela liberdade.
Curiosamente, alguns autores concebem-no como um direito excepcional, que
corresponde a uma expropriação por causa de utilidade privada, das colunas do
periódico. É normal, por isso, que a lei e a jurisprudência limitem
cuidadosamente o seu exercício, quer no que respeita ao seu conteúdo, quer
quanto à extensão da resposta, quer mesmo quanto ao processo a utilizar para a
sua efectivação.
Tanto basta para, apoiado nos citados Autores, se concluir, como concluo, que a
solução vigente do artigo 16.º da Lei de Imprensa mostra-se adequada e
proporcionada a resolver a colisão de direitos fundamentais do tipo dos que aqui
se confrontam, sendo, pelo contrário, desadequada e desproporcionada a solução
que se pretende impor com a norma sub specie constitucionis.
Como diz Artur Rodrigues da Costa, «o exercício da liberdade de imprensa não
deve ceder, sistematicamente, sempre que estejam em causa outros bens jurídicos
tutelados pela Constituição, nomeadamente na esfera dos direitos de
personalidade» (Revista do Ministério Público, n.º 37, p. 12).
E é o próprio acórdão que reconhece, implicitamente reconduzindo-se à solução em
causa, «as opções que traduzem apenas, ou sobretudo, um menor acerto desse
legislador» (itálico nosso), para afastar a sindicabilidade dessas opções e
preferir só as que se apresentem «manifesta ou excessivamente
desproporcionadas».
2 — Também votei vencido quanto às decisões constantes das alíneas d) e e) da
parte decisória do acórdão, acompanhando, nesta parte, os votos de vencido dos
Ex.mos Conselheiros Armindo Ribeiro Mendes e Tavares da Costa, cujas razões
subscrevo. — Guilherme da Fonseca.
DECLARAÇÃO DE VOTO
Votei vencido quanto à alínea e) da decisão, por entender que nos n.os 5 e 6 do
artigo 53.º se prevê um meio coercitivo, designado como multa, mas que é uma
sanção pecuniária compulsória do cumprimento da obrigação de publicação do
extracto decisório e da resposta. Trata-se de uma única infracção que consiste
na omissão da publicação, omissão que já se consumou com a não publicação no
segundo número posterior ao trânsito em julgado (n.º 4 do artigo 53.º), mas que
continua como delito continuado, que consiste na realização repetida da
infracção em cada número subsequente. Há nestes casos unidade de omissão
típica, com unidade de ilícito (que no entanto se agrava materialmente em cada
repetição) e unidade de culpa (dado que se mantém a situação motivacional: cfr.
Jescheck, Lehrbuch des Strafrechts, 4.ª ed., 1988, p. 645). Trata-se de uma
multa indeterminada no seu limite máximo, e as mesmas razões que tornariam tal
multa inconstitucional como pena, valem para a mesma multa como meio coercitivo,
uma vez que implica igual sacrifício de direitos. É certo que a sanção sempre
cessaria com o cumprimento de objecção ou com a impossibilidade superveniente da
mesma por cessação da publicação. Mas não impediria o seu carácter
indeterminado embora determinável. E também não impediria que pudesse atingir
facilmente montantes superiores ao do limite máximo geral da multa como pena
criminal. O argumento vale independentemente deste último valor, que é de 3 000
000$00 (300 dias a 100$00 por dia: artigo 46.º do Código Penal, n.os 1 e 2) e
que, segundo a lei de autorização da revisão do Código Penal, deverá passar a
ser de 15 000 000$00.
O meio coercitivo é, assim, claramente excessivo e implica um sacrifício
desproporcionado de direitos.
Há, pois, violação do n.º 1 do artigo 30.º da Constituição (proibição de penas e
de medidas de segurança ilimitadas), aplicável por analogia, e do princípio da
proporcionalidade (n.os 2 e 3 do artigo 18.º da Constituição). — José de Sousa e
Brito.