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Processo nº.38/93
2ª Secção Relator: Cons. Mário de Brito
1. A., capitão do Q P V da Guarda Fiscal, na situação de reserva, requereu perante a 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo, em 2 de Julho de 1992, a suspensão da eficácia do despacho do Ministro da Administração Interna de 16 de Maio desse ano que, em recurso hierárquico, agravou para 30 dias a pena de 10 dias de prisão disciplinar agravada que lhe havia sido imposta pelo Comandante-Geral da Guarda Fiscal. Mas, por acórdão de 19 de Agosto, o Supremo Tribunal Administrativo indeferiu o requerido, por 'inverificação dos requisitos estabelecidos nas alíneas a) e b) do nº. 1 do artigo 76º. da L.P.T.A.'.
Pedida a aclaração da decisão, o Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão de 29 de Setembro, indeferiu o pedido, por nada haver a aclarar.
O requerente arguiu a seguir, ao abrigo do artigo 668º., nº. 1, alínea d), 1ª parte, do Código de Processo Civil, a nulidade do acórdão de 19 de Agosto, 'integrado' pelo acórdão de 29 de Setembro. O Supremo desatendeu, porém, a reclamação, por acórdão de 27 de Outubro.
Recorreu então o mesmo requerente para o Tribunal Constitucional do acórdão de 19 de Agosto ('integrado' pelo acórdão de
29 de Setembro) e do acórdão de 27 de Outubro, ao abrigo do artigo 70º., nº. 1, alínea b), da Lei nº. 28/82, de 15 de Novembro.
Chegado o processo a este Tribunal, o relator convidou o recorrente a indicar a norma cuja inconstitucionalidade pretendia ver apreciada, bem como a peça processual em que havia suscitado a questão da inconstitucionalidade. Notificado do respectivo despacho, respondeu o recorrente: a) a norma cuja inconstitucionalidade se pretende ver apreciada é o artigo 1º. do Decreto-Lei nº. 143/80, de 21 de Maio - que aplica à Guarda Fiscal o Regulamento de Disciplina Militar -, quando não exclui dessa aplicação as penas de prisão; b) a norma e o princípio constitucionais 'que o venerando Supremo Tribunal Administrativo violou' são respectivamente o nº. 2 e o nº. 1 do artigo 27º. da Lei Fundamental; c) a questão da inconstitucionalidade foi suscitada no pedido de aclaração e na arguição de nulidade do acórdão do Supremo de 19 de Agosto.
Recebida a resposta, fez o relator a seguinte exposição, nos termos do artigo 78º.-A da Lei nº. 28/82:
O recurso de que se trata é o previsto no artigo 70º.,nº. 1, alínea b),da Lei nº.28/82, de 15 de Novembro.
Mas nem a questão da constitucionalidade da norma do artigo
1º. do Decreto-Lei nº.143/80, de 21 de Maio, foi suscitada 'durante o processo', nem se pode dizer que essa norma tenha sido 'aplicada' no acórdão recorrido.
Sou, pois, de parecer que se não pode conhecer do recurso.
Ouvido sobre essa exposição, o recorrente limitou--se a afirmar que a inconstitucionalidade do artigo 1º. do Decreto-Lei nº. 143/80 foi arguida 'implicitamente' durante a pendência do processo no Supremo Tribunal Administrativo e que tal norma foi realmente 'aplicada' pelo acórdão recorrido. Por sua vez, o Ministro da Administração Interna respondeu, no que aqui interessa, que a questão da inconstitucionalidade da norma do artigo
1º. do Decreto-Lei nº. 143/80 não foi suscitada no 'incidente de suspensão de eficácia' e que o Supremo Tribunal Administrativo, ao decidir o incidente, se limitou a aplicar a norma do artigo 76º. da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos.
Cumpre decidir.
2. O recurso em causa é o previsto no artigo
70º., nº. 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, ou seja, o recurso das decisões dos tribunais 'que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo'.
Para além de outros que aqui não importa referir, são requisitos deste recurso: a) que a inconstitucionalidade da norma tenha sido suscitada 'durante o processo'; b) que essa norma tenha sido
'aplicada' na decisão recorrida.
Verificar-se-ão esses requisitos?
Como resulta do exposto, o recorrente, além de interpor recurso contencioso do despacho do Ministro da Administração Interna que lhe aplicou pena (disciplinar) de prisão, pediu a suspensão da eficácia desse acto, ao abrigo do disposto nos artigos 76º. e seguintes do Decreto-Lei nº. 267/85, de 16 de Julho (Lei de Processo nos Tribunais Administrativos).
O nº. 1 do artigo 76º. desse diploma faz depender a concessão desse meio processual da verificação dos seguintes requisitos:
a) A execução do acto cause provavelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público;
c) Do processo não resultem fortes indícios da ilegalidade da interposição do recurso.
Como decorre desde logo da respectiva letra e tem sido jurisprudência constante do Supremo Tribunal Administrativo, o preceito exige a verificação cumulativa dos requisitos nele enunciados.
E foi de acordo com essa orientação que no acórdão recorrido - e recorrido só pode ser, dado o disposto no artigo 670º. do Código de Processo Civil, o acórdão de 19 de Agosto - se indeferiu o pedido. Lê-se, com efeito, nesse acórdão:
-Face a tudo o que se disse há que concluir que 'a inverificação dos requisitos estabelecidos nas alíneas a) e b) do nº. 1 do artigo 76º da L.P.T.A.' é quanto basta para que a pedida suspensão não possa ser concedida, assim se indeferindo o pedido.
É exacto que o mesmo acórdão fez ainda apelo ao princípio de que todo o acto administrativo - e portanto o acto administrativo impugnado - 'goza da presunção de legalidade'. Mas logo acrescentou que isso (isto é, a questão da legalidade do acto) 'só poderá ser apreciado no recurso contencioso'.
A questão da legalidade do despacho impugnado não foi, pois, apreciada e, assim, não se pode dizer, como consta da exposição do relator, que a norma do artigo 1º. do Decreto-Lei nº. 143/80 tenha sido
'aplicada' no acórdão recorrido.
Quanto ao outro requisito:
Considerou-se na exposição do relator que a questão da constitucionalidade da referida norma não foi suscitada 'durante o processo'.
Na verdade, de acordo com a jurisprudência do Tribunal, tanto o pedido de aclaração como a arguição de nulidades são meios inidóneos para se suscitar a questão.
3. Pelo exposto, não se conhece do recurso.
Custas pelo recorrente, com a taxa de justiça de 5 unidades de conta.
Lisboa, 30 de Março de 1993 Mário de Brito Bravo Serra Fernando Alves Correia José de Sousa e Brito Messias Bento Luís Nunes de Almeida José Manuel Cardoso da Costa