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Proc. nº 363/92
1ª Secção Rel.: Cons. Ribeiro Mendes
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. – Herdeiros de A., representados por B., vieram, de harmonia com os arts. 668º e 716º do Código de Processo Civil, disposições aplicáveis por força do art. 69º da Lei do Tribunal Constitucional, arguir a nulidade do Acórdão nº 187/93 deste Tribunal, que indeferiu - segundo invocam,
'contraditoriamente' - a reclamação por eles apresentada do despacho de Desembargador Relator no Tribunal da Relação de Évora, que não admitiu o recurso oportunamente interposto para o Tribunal Constitucional. Afirmam ainda que a presente arguição de nulidade é feita 'sem prejuízo do disposto no art. 79º/D da Lei nº 28/82, aditado pela Lei nº 85/89, de 7 de Setembro (Recurso para o Plenário)' (a fls. 220 dos autos). Com este requerimento juntaram cópias não autenticadas de um despacho de admissão de um recurso para o Supremo Tribunal de Justiça proferido num outro processo de expropriação por utilidade pública, de um despacho do Conselheiro Relator no Supremo Tribunal de Justiça a considerar que não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça no caso, ainda que sendo aplicado o novo Código das Expropriações de 1991 - por não serem admissíveis quatro instâncias de recurso - do despacho do Desembargador Relator no Tribunal da Relação de Évora a admitir recurso para o Tribunal Constitucional nos mesmos autos, de harmonia com o despacho transitado de não admissão de recurso no Supremo Tribunal de Justiça, e de uma notificação nos autos entretanto chegados ao Tribunal Constitucional a fixar prazo para alegações.
Na presente reclamação, sustentam que o Acórdão nº 187/93 é nulo porque os seus fundamentos estarão em oposição com a decisão e porque o Tribunal se terá deixado de pronunciar sobre questões que devia apreciar:
- Por um lado, o art. 37º do Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei nº 438/91, de 9 de Novembro 'não pode ter a interpretação que lhe dá o Acórdão do T.C. em crise, pois do referido preceito não resulta a admissibilidade de recurso para o STJ', porque não há quatro graus de jurisdição, o que foi reconhecido por um despacho proferido em 30 de Novembro de 1992 pelo Supremo Tribunal de Justiça, conforme cópia junta aos autos;
- Por outro lado, invoca-se que o 'Tribunal Constitucional não especificou devidamente os fundamentos de direito que justificam a decisão de admitir 4 graus de jurisdição (Art. 668º/1/b) do CPC)';
- Finalmente o Tribunal Constitucional deveria mandar seguir os autos em recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, 'o que também omitiu e não podia omitir já que o recurso foi interposto ou para o Tribunal Constitucional ou para o STJ'.
Em jeito de remate, afirma-se o seguinte:
'Então se Vossas Excelências ao mais alto nível judiciário não se entendem como
é que os Advogados podem saber o que os Exmos Conselheiros querem das partes ?!'
(a fls. 250 e vº).
2. É manifesto que improcedem as arguidas nulidades.
Os reclamantes apenas logram demonstrar que num outro processo especial de expropriação, com outras partes (embora representadas pelo mesmo Senhor Advogado), a Relação de Évora entendeu que cabia recurso de certo acórdão por ela proferido para o Supremo Tribunal de Justiça, ponto de vista que não foi aceite pelo Conselheiro Relator neste último Tribunal, solução que não parece ter sido contestada através de reclamação para a conferência e, por isso, terá transitado em julgado. Resulta dos documentos juntos pelos reclamantes que existe uma divergência de interpretações sobre o art. 37º do novo Código das Expropriações, divergência que, no caso concreto, foi definitivamente resolvida pelo despacho proferido pelo tribunal hierarquicamente superior.
Mas estes documentos e as vicissitudes processuais a que se referem, nada têm a ver com a situação a que se dirige o acórdão agora impugnado.
Da leitura do mesmo acórdão resulta que o Tribunal Constitucional teve presente o entendimento jurisprudencial maioritariamnete perfilhado pelos tribunais superiores da ordem judicial, quanto ao sistema de recursos no Código de Expropriações de 1976, tendo tido o cuidado de deixar expresso que tinha considerado dever 'recebê-lo, ainda que não se revelasse
‘manifestamente inequívoc’', por entender que não deveria intervir ou resolver contendas jurisprudenciais em matérias que escapam à sua função específica de controlo de constitucionalidade (no acórdão impugnado remete-se para a doutrina acolhida no Acórdão nº 279/92). E no que se refere ao novo Código das Expropriações, o Tribunal Constitucional entendeu, na ausência de um entendimento jurisprudencial firme dos tribunais judiciais, explicável pela novidade do diploma, que a interpretação da Relação de Évora do art. 37º deste diploma lhe parecia inteiramente adequada. E daí o ter-se escrito no Acórdão nº
187/93 que havia de concluir-se que o entendimento da Relação de Évora 'se afigura juridicamente aceitável, num domínio que escapa aos poderes de fiscalização do Tribunal Constitucional'.
Uma leitura atenta deste acórdão mostra que o Tribunal Constitucional não tinha que especificar detalhadamente os fundamentos do juízo sobre a inexistência de uma proibição constitucional de quatro graus de jurisdição, visto que lhe bastava concluir não ser a interpretação perfilhada por Évora manifestamente errada ou patentemente inconstitucional.
Não se cometeu, por isso, a nulidade prevista na alínea b) do nº 1 do art. 668º do Código de Processo Civil.
3. Tão-pouco podia o Tribunal Constitucional admitir um recurso interposto para um tribunal da ordem dos tribunais judiciais, por não ter competência para tal matéria (arts. 71º e 79º-C da Lei do Tribunal Constitucional).
A questão da eventual admissão do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça só pode ser decidida pelo Tribunal da Relação de
Évora, quando transitar em julgado o acórdão impugnado e os autos voltarem a este Tribunal. No processo de reclamação nos termos do art. 76º, nº 4, da Lei do Tribunal Constitucional, o poder de cognição do próprio Tribunal Constitucional está limitado a confirmar ou revogar o despacho de indeferimento (art. 77º, nº
4, da mesma Lei).
Não foi, assim, cometida qualquer nulidade prevista no art. 668º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil, não tendo o mínimo fundamento o desabafo dos reclamantes sobre interpretações divergentes do art.
37º do novo Código das Expropriações que possam surgir na ordem dos tribunais judiciais.
4. Nestes termos e pelos fundamentos expostos, decide o Tribunal Constitucional desatender integralmente a presente reclamação.
Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em cinco (5) unidades de conta.
Lisboa,30 de Março de 1993
Armindo Ribeiro Mendes
Vítor Nunes de Almeida
Alberto Tavares da Costa
Maria da Assunção Esteves
Antero Alves Monteiro Dinis
José Manuel Cardoso da Costa