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Proc. nº 181/91
2ª Secção Rel. Cons.º Sousa e Brito
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
I Relatório
1. A. veio, nos termos do artigo 76º, nº 4, da Lei do Tribunal Constitucional, reclamar do despacho do Conselheiro Relator no Supremo Tribunal Administrativo que não admitiu recurso interposto para o Tribunal Constitucional, através de requerimento apresentado neste Supremo Tribunal em
25 de Janeiro de 1991.
Fundamentou a reclamação do seguinte modo:
- Através do requerimento de fls. 109 dos autos principais, interpôs recurso para o Tribunal Constitucional do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do disposto nos artigos 70º, nº 1, alínea b), 72º, nº 1, alínea b) e nº 2, da Lei do Tribunal Constitucional;
- Em tal requerimento, não indicou a norma ou princípio constitucional violado, nem a peça em que havia suscitado a questão de inconstitucionalidade, pelo que foi convidado a prestar essa indicação, de harmonia com o artigo 75º-A, nº 5, da Lei do Tribunal Constitucional;
- O reclamante correspondeu ao convite formulado no Supremo Tribunal Administrativo, através do requerimento de fls. 113, indicando quais as normas ou princípios constitucionais violados e as peças processuais onde invocara tais violações;
- Apesar de tal indicação ter sido prestada, o Relator indeferiu, por despacho de fls. 115, o requerimento de interposição do recurso, fundamentando tal decisão no facto de o ora reclamante não ter indicado, além do mais, a peça processual em que suscitara a questão da inconstitucionalidade, 'pois que na sua resposta de fls. 113 nada consta a esse respeito.';
- O ora reclamante requereu então a aclaração desse despacho, mas tal pedido foi indeferido pelo despacho de fls. 140;
- O indeferimento do pedido de aclaração teve como consequência a manutenção do despacho de não admissão do recurso, iniciando-se a partir da notificação do despacho que indeferiu o pedido de aclaração a contagem do prazo para interpor tal reclamação;
- Mostrando-se supridas as deficiências do primitivo requerimento de interposição do recurso, mostram-se, assim, satisfeitos todos os elementos previstos no citado artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional, pelo que deve ser admitido o recurso interposto.
O reclamante pediu certidão de várias peças processuais.
2. O representante do Ministério Público teve vista da reclamação, tendo-se pronunciado no sentido de que deveria manter-se o indeferimento da reclamação, mesmo a serem considerados procedentes os fundamentos desta última, 'por ser manifestamente infundado [o recurso], conforme se demonstra na 2ª parte da nossa promoção de fls. 114, que aqui damos por reproduzida' (a fls. 7; nessa promoção, considera-se que o recorrente não dera 'integral cumprimento ao despacho de fls. 111 v., pois que nele não indicou a peça processual em que terá suscitado a questão de inconstitucionalidade' e, na parte final da mesma, afirmou-se que tal indeferimento haveria de decorrer do facto de 'baseando (- se) o recurso na al. b), nº 1 do art. 70º da Lei nº
28/82, ele (ser) ... manifestamente infundado, pois que o douto acórdão recorrido de fls. 102 não apreciou nem aplicou norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada pelo Recorrente, limitando-se antes, para a decisão dos pressupostos processuais da eventual posição de julgados, a afirmar, com alguma atinência à questão de inconstitucionalidade, que os acórdãos não perfilharam soluções opostas relativamente ao mesmo fundamento de direito, pois que em nenhum deles foi emitido qualquer juízo de inconstitucionalidade').
Por acórdão de fls. 9 a 11 vº, o Supremo Tribunal Administrativo confirmou o despacho de não admissão do recurso de constitucionalidade do Conselheiro Relator, embora com fundamentação diversa. Nesse acórdão, de 26 de Fevereiro de 1991, afirma-se o seguinte:
'2. O recurso para o Tribunal Constitucional foi interposto nos termos do artigo
70º, nº 1, alínea b), da Lei nº 28/82, ou seja, por o acórdão deste tribunal, de
5 de Abril de 1990, ter aplicado norma cuja inconstitucionalidade fora suscitada durante o processo.
De harmonia com o disposto no artigo 75º-A daquela Lei, aditado pela Lei nº 85/89, de 7 de Setembro, no requerimento de interposição do recurso devia ter sido indicada a norma cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade se pretendia ver apreciada pelo Tribunal Constitucional, e bem assim a norma ou princípio constitucional ou legal que se considerava violado, e ainda a peça processual em que o recorrente tinha suscitado a questão de inconstitucionalidade ou ilegalidade.
Acontece que, no requerimento de fls. 113, o recorrente fez a indicação das normas e/ou princípios constitucionais violados, e indicou também as peças processuais (petição inicial de recurso e alegações apresentadas na 1ª instância) em que tinha suscitado a questão de inconstitucionalidade.
Não se justifica, pois, que no despacho de fls. 115 se tenha indeferido o requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional com fundamento em não ter o recorrente indicado a peça processual em que suscitara a questão de inconstitucionalidade.
Tal despacho é, no entanto, de manter, mas por outro fundamento.
É que no acórdão deste Tribunal de 5 de Abril de 1990, que decidiu sobre a oposição de acórdãos, não se aplicou qualquer norma cuja inconstitucionalidade tivesse sido suscitada durante o processo, tendo-se apenas procedido à comparação entre as hipóteses contidas no acórdão recorrido e no acórdão-fundamento, para se concluir que, embora em nenhum dos acórdãos tivesse sido emitido qualquer juízo de inconstitucionalidade, se tratava de hipóteses muito diferentes, perante as quais não se podia entender que se tivessem perfilhado soluções opostas quanto ao mesmo fundamento de direito.
O recurso interposto para o Tribunal Constitucional é, portanto, manifestamente infundado, motivo pelo qual, atendendo ao disposto no nº 2 do artigo 76º da Lei nº 28/82, na redacção da Lei nº 85/89, tinha que ser, como foi, indeferido.'
3. Subiram os autos ao Tribunal, após terem sido juntas certidões de várias peças processuais, tendo tido vista do processo o Procurador-Geral Adjunto.
No parecer subscrito pelo Representante do Ministério Público no Tribunal Constitucional preconiza-se o indeferimento da reclamação sem deixar de se reconhecer que os autos de reclamação vêm deficientemente instruídos. De facto, segundo este parecer, o ora reclamante omitiu a indicação, no requerimento de correcção apresentado na sequência do convite que lhe fora endereçado ao abrigo do artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional, da norma cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade pretendia que o Tribunal Constitucional apreciasse. Com a resposta certificada a fls. 26 destes autos, o ora reclamante apenas indicou as normas ou princípios constitucionais violados e as peças processuais em que suscitara a questão de inconstitucionalidade:
'Isto é: nunca - nem no requerimento de interposição de recurso de fls. 23, nem na resposta de fls. 26 ao convite que lhe foi formulado ao abrigo do artigo
75º-A da Lei nº 28/82 - o recorrente indicou a norma cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade pretendia que o Tribunal Constitucional apreciasse.' (fls. 36)
De harmonia com a parte final deste parecer, considera-se que, para a eventual apreciação do carácter manifestamente infundado do recurso de constitucionalidade interposto, seria necessário obter ulteriores elementos instrutórios constantes dos autos ainda pendentes no Supremo Tribunal Administrativo.
4. Foram corridos os vistos legais.
Cumpre decidir.
II Fundamentação
5. Considera-se não merecer deferimento a presente reclamação.
De facto, o ora reclamante foi convidado a completar o requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade, ao abrigo do artigo 75º-A, nº 5, da Lei do Tribunal Constitucional, pelo Relator do processo no Supremo Tribunal Administrativo.
Tratando-se de um recurso interposto nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, o ora reclamante deveria ter indicado no requerimento de interposição os seguintes elementos:
a) alínea do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional ao abrigo do qual o recurso é interposto;
b) norma cuja inconstitucionalidade se pretende que o Tribunal aprecie;
c) indicação da norma ou princípio constitucional que se considera violado;
d) peça processual em que o recorrente suscitou a questão de inconstitucionalidade (nºs 1 e 2 do artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional).
Mesmo depois do convite formulado ao abrigo do referido
artigo 75º-A, nº 5, o ora reclamante não indicou a norma cuja inconstitucionalidade pretendeu que o Tribunal apreciasse.
Quer dizer, no requerimento constante da certidão de fls. 26, o ora reclamante limitou-se a indicar 'os elementos previstos no nº 2 do artigo 75º-A aditado à Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, pela Lei nº 85/89, de
7 de Setembro'. Mas não indica qual a norma de direito ordinário que violara o princípio de hierarquia das normas regulamentares, o artigo 148º da Constituição de 1976 e o princípio de igualdade.
Ora, segundo o artigo 76º, nº 2, da Lei do Tribunal Constitucional, o requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional 'deve ser indeferido quando não satisfaça os requisitos do artigo 75º-A, mesmo após o suprimento previsto no seu nº 5'.
É, assim, manifesto que o recurso não pode ser mandado admitir pelo Tribunal Constitucional, contrariamente ao fim visado pelo reclamante através do uso desse meio processual.
Não há, assim, que pedir quaisquer elementos documentais para apreciar se foi correcto o juízo do Supremo Tribunal Administrativo de que o recurso de constitucionalidade era manifestamente infundado.
III Decisão
6. Nestes termos e pelos fundamentos expostos, decide-se
indeferir a presente reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em seis unidades de conta.
Lisboa, 30 de Março de 1993
José de Sousa e Brito Luís Nunes de Almeida Messias Bento Mário de Brito Bravo Serra Fernando Alves Correia José Manuel Cardoso da Costa