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Processo nº 732/93 Plenário Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
1. A. 'mandatária do Partido Socialista para as Eleições Autárquicas-1993 no concelho da Meda', veio interpor recurso das
'decisões tomadas pela respectiva Assembleia de Apuramento Geral', realizada em
16 de Dezembro de 1993, invocando que o 'Partido Socialista ficou a 25 votos de conseguir a eleição do 2º vereador para a Câmara Municipal de Meda' e que a
'Digna Mesa de Apuramento Geral constatou - no decurso dos seus trabalhos - a existência de envelopes (à mesma destinados) provindos das Assembleias de Apuramento Parcial, que, embora fechados na origem, se encontravam abertos; e que, embora lacrados na origem, se apresentavam também violados' (segue-se a identificação dos envelopes), pelo que se lavraram os competentes protestos, mas não mereceram acolhimento.
E conclui assim o articulado da petição:
'Entre os poderes conferidos aos delegados, inclui-se o poder de lacrar documentos (art.41--c, citado) e o de colar documentos.
Os envelopes eleitorais, objecto que sejam desses actos, gozam de igual dignidade e protecção face aos equivalentes dirigidos ao Juiz.
No caso de envelopes com votos nulos, porque pode ocorrer a sua validação, a simples verificação da sua abertura clandestina (violação) põe em causa a autenticidade e a credibilidade dos seus sinais originários.
Tal consequência é do domínio da presunção.
É inexigível, na situação descrita, por materialmente impossível do ponto de vista do então Reclamante, a prova da alteração ou viciação dos boletins.
O art. 105-1 não consente, como se disse, a interpretação dada na Acta.
Verificando a Mesa a existência de 7 (sete) envelopes violados (fechados na origem; alguns lacrados) viciou o apuramento geral ao aplicar o seu critério de validação ou invalidação sobre os boletins de voto neles contidos.
Nestes termos, e sempre com o douto suprimento de V. Exªs, devem as votações referentes às Assembleias de Voto atrás referidas ser anuladas, ao abrigo do disposto no art. 105-1 citado, por necessariamente influírem no resultado da eleição da Câmara Municipal, atento o que se expôs e o que então se requereu.
Se assim se não entender,
deve ser ordenada a contagem global dos votos expressos (válidos, brancos e nulos) àquelas Assembleias respeitantes (o que não se espera, face àquela presumida suspeição sobre os referidos boletins)'.
Acompanharam a petição a acta da 'Assembleia de Apuramento Geral de Meda, com 5 Protestos anexos' e um documento.
2. Inexistindo obstáculos processuais a que se conheça do mérito do recurso, pois a recorrente é parte legítima, o prazo mostra-se respeitado (a afixação dos editais referentes à publicação dos resultados data de 17 de Dezembro e a petição deu entrada neste Tribunal Constitucional no dia 20 do mesmo mês, às 09 horas, sendo que o dia 19 foi domingo), e a decisão ou decisões em causa foram precedidas de protestos, cumpre agora decidir.
Da acta da 'Assembleia de Apuramento Geral das Eleições para os Órgãos Autárquicos Locais do Concelho de Meda, realizadas em 12 de Dezembro de mil novecentos e noventa e três' consta o seguinte, com interesse para a decisão:
'Seguidamente foram apreciadas as condições em que se apresentavam os envelopes remetidos à Assembleia de Apuramento Geral pelas seguintes mesas ou secções de voto:
- Barreira - Mesa 1 - envelope devidamente
fechado e lacrado;
- Aveloso - envelope devidamente fechado e
lacrado;
- Barreira - Mesa 2 - envelope aberto;
- Carvalhal - envelope devidamente fechado
e lacrado;
- Fontelonga - envelope aberto, embora com
vestígios de ter sido lacrado;
- Longroiva - Mesa 1 - envelope aberto, embora
lacrado;
- Longroiva - Mesa 2 - envelope aberto;
- Coriscada - aberto;
- Marialva - fechado através de fita-cola;
- Meda - Mesa 1 - fechado com fita-cola;
- Meda - Mesa 2 - fechado e lacrado;
- Outeiro de Gatos - aberto;
- Paipenela - fechado e lacrado;
- Poço do Canto - envelope aberto;
- Prova - envelope lacrado e fechado;
- Rabaçal - envelope fechado e lacrado;
- Ranhados - Mesa 1 - aberto na reunião para
identificação;
- Ranhados - Mesa 2 - envelope fechado e lacrado;
- Valflor - envelope fechado e lacrado;
Logo após esta fase dos trabalhos foi apresentado um requerimento protesto subscrito pela mandatária do Partido Socialista, a fim de ser apreciado, o qual será apreciado pelas 15 horas da tarde, dada a sua extensão.
Um dos candidatos pelo Partido Socialista requereu, verbalmente que se considere parte integrante do protesto acima referido a lista dos envelopes que foram apresentados à Assembleia de Apuramento Geral, abertos, bem como daqueles que embora fechados não estavam devidamente lacrados.'
E quanto aos resultados:
'Assembleia de voto da freguesia de Barreira:
Câmara Municipal - Eleitores inscritos: Quatrocentos e oito (408); Votantes: duzentos e setenta e dois (272); Votos brancos: Um (1); Votos nulos: oito (8);
Votos por Partidos: PPD//PSD - cento e trinta e um (131); P.S.: Sessenta e sete (67): CDS/PP: sessenta e quatro (64); CDU: UM (1);
Assembleia de voto da freguesia da Coriscada:
Câmara Municipal - Eleitores inscritos: Trezentos e catorze (314); Votantes: Duzentos e quinze (215); Votos brancos: Quatro (4); Votos nulos: Doze (12); Votos por partidos: PPD/PSD: Cem (100); P.S.: Doze (12); CDS/PP: Oitenta e três
(83); CDU: Quatro (4).
Assembleia de voto da freguesia de Fontelonga:
Câmara Municipal - Eleitores inscritos: Duzentos e setenta e seis (276); Votantes: Cento e noventa e quatro (194); Votos brancos: Cinco (5); Votos nulos: Seis (6); Votos por partidos: PPD/PSD: Noventa e três (93); P.S.: Trinta e oito (38); CDS/PP: Cinquenta e um (51); CDU: Um (1).
Assembleia de voto da freguesia de Outeiro dos Gatos:
Câmara Municipal - Eleitores inscritos: Trezentos e vinte e oito (328); Votantes: Duzentos e vinte e três (223); Votos brancos: Cinco (5); Votos nulos: Dois (2); Votos por partidos: PPD//PSD: Cento e vinte e um (121); P.S.: Vinte e três (23); CDS/PP: Setenta (70); CDU: Dois (2).
Assembleia de voto da freguesia de Longroiva:
Câmara Municipal - Eleitores inscritos: Quinhentos e setenta e quatro (574); Votantes: Quatrocentos e dois (402); Votos brancos: Quatro (4); Votos nulos: Oito (8); Votos por partidos: PPD/PSD: Cento e setenta e dois (172); P.S.: Cento e vinte e um (121); CDS/PP: Noventa e quatro (94); CDU: Dois (2).
Assembleia de voto da freguesia de Poço do Canto:
Câmara Municipal - Eleitores inscritos: Seiscentos e trinta e seis (636); Votantes: Quatrocentos e quarenta e nove (449); Votos brancos: Oito (8); Votos nulos: dez (10); Votos por partidos: PPD/PSD: Cento e noventa e três (193); P.S.: Cento e dez (110); CDS/PP: Cento e vinte (120); CDU: Oito (8)'.
E, por fim, quanto 'aos protestos apresentados pela Ilustre mandatária do Partido, a Assembleia do Apuramento Geral decidiu que nenhuma das situações invocadas é susceptível de pôr em causa os resultados eleitorais. Com efeito quanto ao problema suscitado no que respeita a terem surgido envelopes dirigidos à Assembleia que, embora fechados, não estavam lacrados, outros que, achando-se fechados na origem, se apresentavam abertos e outros totalmente abertos. Temos que a lei eleitoral apenas exige que sejam postos em pacotes devidamente lacrados os boletins de voto considerados válidos e a ser confiados à guarda do Juiz de Direito (artº 91º nº 1 do Dec. Lei
701-B/76 de 29/9) e não já no que respeita aos boletins de voto a serem enviados
à Assembleia de Apuramento Geral como se pode ver da confrontação da letra do artº 90º do diploma em questão com a letra do citado artº 91º nº 1.
É certo que o bom senso aponta no sentido de que tais envelopes, em todo o caso, devem vir fechados senão por aquele meio por outro.
No entanto, as actas constantes dos envelopes que apareceram abertos a esta Assembleia não nos favorecem quaisquer suspeitas de irregularidade ou falsidade que, portanto, os aceitou como válidos.
Acresce, por último, que carece de fundamento legal o requerido apuramento global da totalidade de votos expressos nas freguesias a que se reportam os envelopes em questão. Com efeito, por um lado, a apreciação e contagem dos votos nulos estão a ser devidamente feitas; quanto aos boletins de voto em branco chega-se ao seu número pelos elementos constantes da acta; quanto aos votos válidos nada cumpre fazer pois a possível alteração da sua qualificação não pode ser feita sob pena de se pôr em causa o critério adoptado pelas assembleias de apuramento parcial e a contagem dos mesmos efectuada, tendo sido aceite por todos os delegados que não apresentaram no acto qualquer protesto ou reclamação quanto à mesma, mostra-se inatacável atento o princípio da aquisição dos actos processuais.
Quanto ao facto de na secção 1 da Vila da Meda o lugar do Presidente ter alegadamente sido preenchido por um elemento não pertencente à mesa nada cumpre a esta Assembleia apreciar, pois tal irregularidade, a existir, devia ter sido objecto de protesto ou reclamação a apresentar no próprio acto, pelo que não se tendo verificado tal protesto em tempo útil nem sequer é susceptível de apreciação em recurso contencioso.
No que respeita à não coincidência do número de votantes nas assembleias de Poço do Canto e Prova no mapa provisório distribuído, tal discrepância, a existir, será verificada pela Assembleia quando proceder à apreciação de votação em tais mesas.
Quanto aos pontos 1 a 12 do protesto entregue, dando de barato que tais alegadas irregularidades a terem-se verificado consubstanciam uma ilegalidade, não nos parece que as mesmas tenham influído no resultado geral da eleição do respectivo órgão autárquico. Por outro lado invoca-se uma discrepância entre os números fornecidos por informações meramente verbais e os constantes no mapa provisório do apuramento, o que parece não ter relevância por não estarmos ainda na apreciação definitiva dos resultados; por último as invocadas irregularidades, mesmo aceitando que constituam ilegalidades terão ocorrido na fase de apuramento e não já no decurso da votação, havendo quem entenda que o artº 105, nº 1 do Dec. Lei
701-B/76 de 29/9 só é aplicável às irregularidades que constituam ilegalidades ocorridas durante a votação e não já no decurso do apuramento. Veja-se neste sentido o acórdão do Tribunal Constitucional (Plenário) de 6 de Janeiro de
1986, publicado no B.M.J. nº 361 - Pág. 324 e seguintes.
Termos em que, sem necessidade de maiores considerações, decide esta Assembleia não atender os protestos em causa.
(...) Poço do Canto - Analisada a acta das operações verificou-se que esta é omissa quanto ao número de votantes apurados. Feita a contagem das descargas pelo caderno eleitoral junto, verificou-se que estes foram em número de 448. Verifica-se, pois uma discrepância entre os dois números, caso em que prevalece o número de votos contados, nos termos do artº. 88º, nº do Dec. Lei 701--B/76 de
29/9. Nesta altura dos trabalhos a ilustre mandatária do Partido Socialista apresentou dois protestos que vão ficar a fazer parte integrante desta acta os quais entende constituírem complemento dos já apresentados, pois com eles apenas pretende melhor esclarecer e pormenorizar as situações já descritas, nomeadamente a referente à eleição efectuada na freguesia de Poço do Canto.
Após deliberação da Assembleia decidiu esta, por unanimidade, manter a decisão já tomada reafirmando que a acta contida no envelope referente a esta freguesia não suscitou quaisquer suspeitas quanto à sua autenticidade. Por outro lado, reafirma-se, com os presentes protestos parece pretender a ilustra mandatária que seja anulada a eleição respectiva - Poço do Canto - mas as irregularidades invocadas, a terem-se verificado e a constituírem ilegalidade, ocorreram não no decurso da eleição mas já na fase do apuramento e portanto, não prevista no artº 105º, nº 1 do Dec. Lei 701-B/76 de
29/9, que apenas é aplicável às irregularidades ocorridas no acto da votação.
Veja-se neste sentido o já referido acórdão do Tribunal Constitucional de 6 de Janeiro de 86, publicado no Boletim do Ministério da Justiça, nº 361, págs.
304 e seguintes.
Por outro lado desconhece esta Assembleia se as mesmas tiveram influência no resultado geral para a eleição do órgão autárquico'.
3. Vê-se do relato feito que, em obediência ao princípio dispositivo, importa apenas conhecer, em sede do mérito de causa, da matéria das irregularidades verificadas com os envelopes que a recorrente identifica como viciados: os que, 'embora fechados na origem, se apresentavam abertos', e os que, 'embora lacrados na origem, se apresentavam também violados', talqualmente ela se expressa ('Eram mais de 50 os boletins com votos considerados nulos constantes desses envelopes (no seu conjunto' - é a alegação da recorrente). Tudo o mais que consta ou se veja que consta dos protestos apresentados pela recorrente na assembleia de apuramento geral, relativamente a outro tipo de irregularidade, excede o âmbito de cognição do presente recurso: esta uma delimitação dele a ter em conta.
Ora, de acordo com o artigo 94º do Decreto-Lei nº
701-B/76, de 29 de Setembro, compete à assembleia de apuramento geral o
'apuramento da eleição na área de cada município e a proclamação dos candidatos eleitos (...)', o qual 'será realizado com base nas actas das operações das assembleias de voto, nos cadernos eleitorais e demais documentos que o acompanharem' (artigo 96º), sendo que é jurisprudência constante deste Tribunal Constitucional que 'os votos havidos por válidos pelas assembleias de apuramento parcial e relativamente aos quais não foi apresentada qualquer reclamação pelos delegados das listas (cfr. artigo 89º, nº 4) se tornaram definitivos, não podendo ser objecto de reapreciação e modificação da sua validade' (Acórdão nº 322/85,nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 6º vol. pág. 119).
'Na verdade, a distinção entre operações preliminares (artigo 97º), nas quais se analisam os boletins de voto com votos nulos e os boletins de voto sobre que tenham recaído reclamação ou protesto, e operações de apuramento geral (artigo
98º), em que se procede, além do mais, à verificação do número total de votos obtidos por cada lista, dos votos em branco e do número de votos nulos, indicia que as operações de análise material dos boletins de voto, em ordem à sua aceitação ou rejeição, apenas se reportam aos que são referenciados no artigo
97º (votos nulos e votos que foram objecto de reclamação)' - acrescenta o mesmo Acórdão nº 322/85.
In casu, a assembleia de apuramento geral procedeu à análise material dos boletins de voto com votos nulos, em ordem à sua aceitação ou rejeição, conformemente com o disposto no citado artigo 97º, por considerar que os envelopes em causa onde se continham tais boletins de voto não estavam sujeitos à formalidade prescrita no artigo 91º, nº 1, do mesmo Decreto-Lei nº
701-B/76, na medida em que este preceito, em conjunto com o artigo 90º, 'apenas exige que sejam postos em pacotes devidamente lacrados os boletins de voto considerados válidos e a ser confiados à guarda do Juiz de Direito (...) e não já no que respeita aos boletins de voto a serem enviados à Assembleia de Apuramento Geral'. E, considerou ainda a mesma assembleia de apuramento geral que 'as irregularidades invocadas, a terem-se verificado e a constituírem ilegalidade, ocorreram não no decurso da eleição mas já na fase de apuramento, portanto, não prevista no artº 105º, nº 1 do Decreto-Lei 701-B/76. de 29/9, que apenas é aplicável às irregularidades ocorridas no acto da votação'.
São estes dois pontos da decisão ou decisões administrativas ora em questão que importa censurar, para apurar se estão - ambos ou um só - feridos de ilegalidade, avançando depois para o reflexo da ilegalidade quanto ao mérito do recurso.
Que o artigo 90º, reportando-se aos boletins de voto com votos nulos, apenas exige que, depois de rubricados, sejam 'remetidos à assembleia de apuramento geral, com os documentos que lhes digam respeito', sem prever nenhum tipo de formalidade quanto ao modo como se deve processar essa remessa, é um dado inquestionável que ressalta da leitura do preceito.
Mas que isso seja assim tão simples e antes se deva observar uma formalidade do tipo da que prevê o artigo 91º para os 'restantes boletins de voto' - 'metidos em pacotes devidamente lacrados' - é um dado que se pode e deve questionar, e desde logo ressalta que na própria assembleia de apuramento geral se considerou que 'o bom senso aponta no sentido de que tais envelopes, em todo o caso, devem vir fechados senão por aquele meio por outro'.
Ora, considerando os poderes administrativos da assembleia de apuramento geral, em sede de operações preliminares, relativamente aos boletins de votos nulos, à luz do artigo 97º, em ordem à correcção dos resultados das assembleias de apuramento parcial, e considerando que, na presente hipótese, se aceitaram os boletins de voto com votos nulos contidos nos envelopes postos em crise e o seu número verificado entre o número dos votos nulos, é bom de ver que o cuidado a pôr na remessa dos envelopes respectivos deveria passar pelo cumprimento de formalidade do tipo da prevista no artigo 91º ('pacotes devidamente lacrados' ou, se se preferir, e, pelo menos, envelopes devidamente fechados, em termos de garantir que os elementos das assembleias de apuramento parcial, ao serem recebidos pela assembleia de apuramento geral, se encontram no estado em que lá foram introduzidos).
É que, se o rigor de um tal formalismo se justifica na hipótese do artigo 91º, relativamente aos 'restantes boletins de voto', sobre os quais a assembleia de apuramento geral não detem os mesmos poderes de análise material dos boletins de voto, limitando-se à 'verificação do número total de votos obtidos por cada lista' (artigo 98º, b)), também encontra justificação, e até maior justificação, na hipótese do artigo 90º, em que estão presentes aqueles poderes de análise material dos boletins de voto, havendo que assegurar, em toda a sua extensão, a fidedignidade destes boletins.
Tanto basta para concluir existirem irregularidades no apuramento relativamente aos boletins de voto contidos nos envelopes das assembleias de apuramento parcial em causa, que não foram fechados ou lacrados ou que, tendo-o sido, foram entretanto abertos (e, assim, presumivelmente violados).
Quanto à influência 'no resultado geral da eleição do respectivo órgão autárquico' (nº 1 do artigo 105º), a Câmara Municipal de Meda,
é patente, como alega a recorrente, que o Partido Socialista 'ficou a 25 votos de conseguir a eleição do 2º vereador' para aquela Câmara, e os boletins de voto com votos nulos das assembleias de apuramento parcial em causa atingem o número total de 46 boletins de voto. O que significa que qualquer alteração do conteúdo desses boletins de voto poderia implicar com a aceitação ou a rejeição deles, em sede de operações preliminares, projectando-se a alteração nos respectivos resultados eleitorais.
4. Termos em que, e DECIDINDO, concede-se provimento ao recurso e julgam-se nulas as votações nas assembleias de voto das freguesias de Barreira (mesa 2) Coriscada, Fontelonga, Outeiro de Gatos, Longroiva e Poço do Canto.
Lisboa, 28 de Dezembro de 1993
Guilherme da Fonseca Maria da Assunção Esteves José de Sousa e Brito Armindo Ribeiro Mendes Luís Nunes de Almeida Messias Bento Antero Alves Monteiro Dinis António Vitorino Alberto Tavares da Costa
Bravo Serra (vencido, de harmonia com a declaração de voto junta).
Fernando Alves Correia (vencido pelo essencial dos fundamentos constantes da declaração de voto do Ex.mo Conselheiro Bravo Serra).
Vítor Nunes de Almeida (vencido, quanto à decisão de anulação das eleições pelos fundamentos constantes do voto de vencido do Conselheiro Bravo Serra, a que adiro, com a ressalva de que não me não repugna aceitar, em tese geral, a posição constante do acórdão quanto à exigência feita no texto relativo à invenção em envelope fechado e lacrado dos boletins de voto a que se reporta o artigo 91º do Decreto-Lei nº 701-B/76, de 29 de Setembro). José Manuel Cardoso da Costa
DECLARAÇÃO DE VOTO
Votei vencido na decisão que, por maioria, foi tomada no presente Acórdão.
Na realidade, a integração ou interpretação que, pelo aresto a que a presente declaração se encontra apendiculada, foi conferida ao artº 90º do Decreto-Lei nº 701-B/76, de 29 de Setembro, não tem, a meu ver, no teor literal dessa disposição, a mínima correspondência.
Aliás, na minha óptica, uma interpretação que atendesse à sistemática de tal diploma levava, até, a concluir em sentido contrário ao daquele que foi perfilhado no Acórdão.
Efectivamente, quando o legislador da «Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais» desejou que determinados boletins de voto fossem, aquando das operações de apuramento parcial, submetidos a medidas de guarda específicas, como o encerramento em envelope fechado e lacrado, não se escusou de o dizer expressamente. Assim aconteceu nos artigos 87º e 91º, nº 1.
Por isso, entendo que, ao não determinar no artº 90º o encerramento em envelope fechado e lacrado dos boletins de votos nulos, o legislador assim o determinou com consciência, consequentemente não se deparando aqui qualquer lacuna legislativa a carecer de integração ou interpretação.
Por outro lado, na minha perspectiva, é perfeitamente entendível por que motivo, quanto a tais votos e, bem assim, quanto aos demais documentos a enviar ao presidente da assembleia de apuramento geral, não se impõem as medidas de guarda específicas que rodeiam os boletins não utilizados, os inutililizados pelos eleitores e os que foram considerados como validamente expressos.
Na verdade, trata o artº 90º de um destino a conferir a determinados boletins de voto que ainda vão ser sujeitos a uma reapreciação da assembleia de apuramento geral, juntamente com outros documentos que, emanados das assembleias de voto (cfr. artº 96º), vão servir para o apuramento geral. Vale isto por dizer que aqueles boletins fazem parte de um conjunto documental necessário a uma fase ainda não encerrada, o que se não passa com os boletins a que aludem os artigos 87º e 91º, nº 1.
Poder-se-á argumentar, como parece fazer o presente Acórdão, que o não encerramento em envelope fechado e lacrado dos boletins de votos nulos e demais documentos pode acarretar a sua viciação no trânsito entre a assembleia de voto respectiva e a entrega ao presidente da assembleia de apuramento geral.
Todavia, se esse risco, em abstracto ou em mera sede conjuntural, pode ocorrer, é necessário não olvidar que, na ocasião das operações de apuramento parcial, houve já um consenso entre os membros da mesa e os delegados das listas quanto à circunstância de aqueles boletins se não encontrarem validados (se assim não for entendido, logicamente que o voto que, por algum delegado, for tido como não nulo, será objecto de protesto e, consequentemente, sujeito ao formalismo de rubrica previsto no artº 90º).
A isto adite-se que, tendo em conta o disposto no falado artº 89º, sempre seria possível, em tese, serem contados os boletins de voto não utilizados e inutilizados pelos eleitores, contagem que, adicionada ao número de votos validamente expressos, nulos, brancos e protestados, poderia apontar se houve ou não substituição dos votos nulos enviados em envelope aberto e não lacrado (claro que este argumento não servirá para as situações de viviação destes votos sem substituição dos mesmos).
Acresce que, no meu modo de ver, não basta a existência de um perigo potencial ou meramente hipotético para, - por uma integração ou interpretação que, penso, é manifestamente exagerada e não obediente às regras que ditam a interpretação e integração da lei - se determinar a anulação de uma votação ocorrida em uma ou mais assembleias de voto, com toda a corte de consequências que isso acarreta, e isto, que é para mim o mais importante, sem que, minimamente, existam, no presente caso, os menores indícios de que os boletins que se encontravam nos envelopes que chegaram não fechados ou lacrados à assembleia de voto em apreço, tivessem sido adulterados por quem quer que fosse.
Tem sempre o Tribunal exigido que a prova dos factos que suportam as alegadas irregularidades cujo conhecimento lhe é solicitado por intermédio dos recursos contenciosos eleitorais (designadamente em sede de contencioso de votação e apuramento), incumbe ao recorrente.
Não se percebe, por isso, como, agora, recorrendo a uma simples presunção que, repete-se, não deflui minimamente de prova apresentada pelo recorrente, se pode apoiar este Tribunal nessa presunção, nomeadamente quando se sabe qual a gravidade da consequência da decisão tomada.
É um preço demasiado alto a pagar por uma mera suspeição sem qualquer base fáctica a que o Tribunal deva atender, e que, por isso, não podia colher o meu voto que, desta arte, expressei no sentido de o presente recurso não dever obter provimento.
(Bravo Serra)