Imprimir acórdão
Proc. nº 644/93
2ª Secção Rel.: Cons. Sousa e Brito
Acordam no Tribunal Constitucional:
I Relatório
1. O Partido Socialista apresentou, em 18 de Outubro de
1993, no Tribunal Judicial da Comarca de Vila do Conde, as listas de candidatos aos órgãos das autarquias locais da área do Município de Vila do Conde. Constam dessas listas A. e B., em terceiro e quinto lugares, respectivamente, na lista para a Assembleia de Freguesia de Azurara, C., em terceiro lugar na lista para a Assembleia de Freguesia de Gião, D., em décimo lugar na lista para a Assembleia de Freguesia de Modivas, E., em primeiro lugar na lista para a Assembleia de Freguesia de Vila Chã, e F., como segundo suplente na lista para a Assembleia de Freguesia de Vila do Conde.
No dia 19 de Outubro de 1993, o Juiz do Tribunal Judicial da Comarca de Vila do Conde proferiu um despacho pelo qual mandou afixar cópias das listas à porta do edifício do tribunal, em cumprimento do disposto no nº 3 do artigo 17º do Decreto-Lei nº 701-B/76, de 29 de Setembro. Tal despacho foi cumprido em 20 de Outubro de 1993, conforme cota lançada nos autos.
2. No dia 21 de Outubro de 1993, G., mandatário das listas apresentadas pelo Partido Social Democrata - PPD/PSD, requereu a 'declaração de inelegibilidade' dos candidatos supra-mencionados. Invocou, para o efeito, a inelegibilidade de todos eles, ante o disposto no artigo 4º do citado Decreto-Lei (alínea c) do nº 1, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 757/76, de
21 de Outubro), por serem funcionários da Câmara Municipal de Vila do Conde.
O mandatário das listas do Partido Socialista, H., tendo sido notificado, nos termos do disposto no nº 2 do artigo 22º do Decreto-Lei nº
701-B/76, para responder, veio dizer que os referidos candidatos são funcionários da Câmara Municipal de Vila do Conde, mas que, à excepção de E., nenhum é 'cabeça de lista' à respectiva assembleia de freguesia. No que respeita ao candidato E., o mandatário disse ainda que já fora pedida a respectiva substituição como 'cabeça de lista', por troca com o candidato colocado em segundo lugar. E concluiu que deveria ser '... totalmente indeferido o pedido de declaração de inelegibilidade requerido, sendo que quanto ao E. há inutilidade do pedido.'
3. Em 26 de Outubro de 1993, o Juiz do Tribunal Judicial da Comarca de Vila do Conde proferiu um despacho pelo qual indeferiu a
'reclamação', considerando que não se verificava a situação de inelegibilidade prevista na alínea c) do nº 1 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 701-B/76 em relação aos candidatos anteriormente referidos, à excepção de E., por não concorrerem a qualquer lugar da Câmara Municipal de Vila do Conde. O Juiz decidiu ainda que a reclamação estava prejudicada relativamente ao candidato E., devido à sua mudança para o segundo lugar.
Os mandatários do Partido Socialista e do Partido Social Democrata foram notificados do despacho.
4. É deste despacho que vem o presente recurso, interposto pelo mandatário do Partido Social Democrata, em 2 de Novembro de 1993, ao abrigo dos artigos 25º e 27º do Decreto-Lei nº 701-B/76, com a redacção dada pela Lei nº
14/85, de 10 de Julho. O recorrente sustenta a inelegibilidade de todos os candidatos anteriormente mencionados e alega que a troca de lugar do candidato E. deve ser considerada nula e de nenhum efeito.
Por despacho proferido em 3 de Novembro de 1993, o Juiz admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional, determinando que ele subisse imediatamente e nos próprios autos, com
efeito meramente devolutivo. O Juiz determinou ainda que fosse notificado o mandatário da lista impugnada, para responder, querendo, no prazo de dois dias, ao abrigo do disposto no nº 2 do artigo 27º do Decreto-Lei nº 701-B/76. No mesmo despacho, o Juiz mandou afixar as listas propostas, com as correcções entretanto ordenadas, nos termos do disposto no nº 5 do artigo 22º do Decreto-Lei nº 701-B/76, com a redacção dada pela Lei nº 14-B/85, de 10 de Julho.
5. Notificado por carta registada em 4 de Novembro de 1993, o mandatário do Partido Socialista pronunciou-se pela elegibilidade de todos os candidatos acima referidos, à excepção de E., por não serem candidatos à Câmara Municipal de Vila do Conde ou à respectiva Assembleia Municipal - e não se enquadrarem, pois, na situação de inelegibilidade decretada pela alínea c) do nº
1 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 701-B/76, apesar de serem funcionários daquela Câmara. Por outro lado, o mandatário do Partido Socialista reconheceu que E. seria inelegível como primeiro candidato da lista para a Assembleia de Freguesia de Vila Chã, mas alegou que fora substituído, em tal lista, pelo candidato posicionado em segundo lugar (por troca de lugar).
Por despacho de 9 de Novembro de 1993, o Juiz manteve a fundamentação constante do despacho recorrido.
Cumpre agora decidir, começando por apreciar a admissibilidade do presente recurso.
II Fundamentação
6. Só as decisões finais relativas à apresentação de candidaturas para os órgãos autárquicos são impugnáveis perante o Tribunal Constitucional, como decorre do disposto no nº 1 do artigo 25º do Decreto-Lei nº 701-B/76, na redacção que lhe foi dada, pela Lei nº 14-B/85, de 10 de Julho, e tem sido reiteradamente entendido por este Tribunal (cfr., nomeadamente, os Acórdãos nºs
526/89 e 553/89, D.R., II Série, de 23 de Março e de 4 de Abril de 1990, respectivamente).
Por conseguinte, deve determinar-se se o despacho recorrido - o despacho de 26 de Outubro de 1993 do Juiz do Tribunal Judicial da Comarca de Vila do Conde constitui, efectivamente, uma decisão final - isto é, se foi proferido sobre a reclamação apresentada contra a admissão ou a rejeição de candidatura.
Na verdade, 'o contencioso de apresentação de candidaturas, tendo por destinatário o Tribunal Constitucional, passa pela obrigatoriedade de reclamar no tribunal de comarca ... onde não haja reclamação, não há recurso para o Tribunal Constitucional' (cfr. o Acórdão nº 249/85, D.R., II Série, de
12 de Março de 1986, e, no mesmo sentido, o Acórdão nº 697/93 ainda inédito).
7. Ora, no caso vertente, não estamos perante uma decisão final, no sentido anteriormente indicado. Na verdade, tal despacho não constitui decisão de reclamação de despacho judicial proferido nos termos do disposto nos artigos 19º e 21º, nºs 1 e 3, daquele Decreto-Lei (isto é, de despacho que tivesse admitido ou rejeitado candidatura). O despacho ora recorrido decidiu, diferentemente, um 'requerimento de declaração de inelegibilidade de candidatos', negando-lhe provimento.
Esse requerimento, a que o despacho recorrido chama 'reclamação', foi apresentado em 21 de Outubro de 1993 e não podia ser a reclamação referida no nº 1 do artigo 22º do Decreto-Lei nº 701-B/76, porque, nessa data, ainda não fora proferido o despacho a admitir ou a rejeitar candidatura, previsto nos artigos 19º e 21º, nºs 1 e 3, daquele Decreto-Lei. E este despacho também não podia ter-se como tacitamente emitido, visto que, havendo de ser dado 'até ao
50º dia anterior ao da eleição' (artigo 19º do Decreto-Lei nº 701-B/76), decorria ainda, até ao dia 23 de Outubro de 1993, o prazo dentro do qual poderia ser proferido.
Desta sorte, o presente recurso não é admissível, porque não foi precedido de reclamação (a apresentar ao abrigo do disposto no nº 1 do artigo
22º do Decreto-Lei nº 701-B/76) contra despacho judicial que admitisse ou rejeitasse candidatura (artigos 19º e 21º, nºs 1 e 3, do Decreto-Lei nº
701-B/76).
III Decisão
8. Nestes termos, decide-se não conhecer o recurso.
Lisboa, 15 de Novembro de 1993
José de Sousa e Brito Armindo Ribeiro Mendes Luís Nunes de Almeida Messias Bento Antero Alves Monteiro Dinis António Vitorino Alberto Tavares da Costa Guilherme da Fonseca Vítor Nunes de Almeida (vencido, conforme declaração aposta ao Acórdão nº
697/93) Bravo Serra (vencido, de harmonia com as razões expostas na declaração de voto que apus ao Acórdão nº 697/93) Maria da Assunção Esteves (vencida, nos termos da declaração de voto junta ao Acórdão 697/93) José Manuel Cardoso da Costa