Imprimir acórdão
Processo nº 650/93 P/Eleitoral Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
Acordam, em sessão plenária, no Tribunal Constitucional:
1. No processo eleitoral de candidatura à Assembleia de Freguesia de Vila das Aves, o Mmº Juiz do Tribunal Judicial da comarca de Santo Tirso proferiu, com a data de 20 de Outubro de 1993, o seguinte despacho:
'Freguesia de Vila das Aves. Afixe as listas, à porta do Edifício do Tribunal.
Processo Principal
Candidato nº 22 A., vem indicada a sua profissão como sendo funcionário Público. Notifique o Mandatário da respectiva lista para no prazo de três dias esclarecer que funções exerce o candidato na função pública.
Processo 2C
Verificam-se as seguintes anomalias: a) Candidato nº 2 – B., vem indicada a profissão como sendo funcionário Público. Notifique a C.D.U. para em três dias indicar mandatário e morada onde pode ser notificado, bem como para no referido prazo esclarecer que funções exerce o candidato B., na função pública'.
Na sequência desse despacho foi lavrada no processo a cota relativamente à afixação das listas, com a mesma data de 20 de Outubro, e certificada, no dia seguinte, a notificação dos mandatários das listas do Partido Socialista e da C.D.U. (seguiu-se uma cota lavrada no processo, no dia
23 de Outubro, e relativa à realização do 'sorteio nos termos do artº. 23 do Dec-Lei 701-B/76 de 29 de Setembro').
Com a data de 27 de Outubro o Mmº Juiz proferiu outro despacho de seguinte teor:
'Admito as listas apresentadas. Proceda às rectificações das listas em conformidade com os elementos ora juntos aos autos. Afixe as listas devidamente corrigidas'.
No mesmo dia foi lavrada no processo a cota dando
'cumprimento ao douto despacho antecedente' e, em 9 de Novembro, o Mmº Juiz admitiu 'efectivamente as listas' e mandou cumprir 'o disposto no artº 22º, nº
5 e 24º, nº 1 do DL. 701-B/76 de 29/9', seguindo-se uma cota no processo a dar também 'cumprimento ao douto despacho antecedente'.
Veio então C., 'na qualidade' de Presidente da Comissão Política do Centro Democrático Social/Partido Democrático, do concelho de Santo Tirso e Candidato à Câmara Municipal do mesmo concelho', em requerimento que deu entrada na Secretaria Judicial de Santo Tirso em 10 de Novembro de 1993, sob o nº 35 564, recorrer 'da decisão da admissão de candidaturas' - 'atento o disposto nos artºs 25º e 26º do Dec-Lei nº 701-B/76, de 29 de Setembro' - e sustentar no essencial que da 'lista do Partido Socialista para as eleições autárquicas que terão lugar no próximo dia 12 de Dezembro, consta como candidato à Presidência da Junta de Freguesia de Vila das Aves, do Concelho de Santo Tirso, o Sr. D., residente naquela freguesia' e este candidato 'é sócio e gerente da E., com sede na --------------------, sita na Rua ---------------------, na dita freguesia de -------------'. ('Pelo exposto, entende o Signatário que o supra citado candidato à Presidência da Junta de Freguesia de Vila das Aves é inelegível, uma vez que os factos acima descritos violam o previsto no artigo no artº 4,al. f) do referido Dec-Lei nº 701-B/76, de 29/9' - assim termina o requerimento).
Com a mesma data de 10 de Novembro, o Mmº Juiz admitiu o recurso e mandou notificar 'o mandatário da lista do P S para responder, querendo, no prazo de dois dias - art. 22º nº 2 do Dec-Lei 701-B/76, de 29/9', o qual apresentou uma 'contestação', sustentando que 'deverá o recurso ser julgado improcedente e em consequência declarar elegível o candidato D.'. (foi junto um documento, para além da procuração e duplicados legais, consistindo numa certidão emitida pelo Secretário da Junta de Freguesia de Vila das Aves, a comprovar que 'esta autarquia não tem qualquer contrato com a Firma E., nem com o cidadão D.').
2. Interessa, prima facie, analisar a admissibilidade do presente recurso, e, talqualmente se fez no recente Acórdão nº719/93,há que recordar a tramitação prevista na lei eleitoral dos órgãos das autarquias locais (Decreto-Lei nº 701-B/76, de 29 de Setembro):
'Findo o prazo de apresentação de candidaturas previsto no artigo 17º, nº 1
(entre o 80º e o 55º dias anteriores ao dia da eleição), o juiz manda, desde logo, proceder à afixação de cópias das listas apresentadas à porta do edifício do Tribunal (nº 3 do mesmo preceito).
Inicia-se então um período de tempo (até ao 50º dia anterior ao da eleição) durante o qual o juiz vai apreciar a regularidade do processo, a autenticidade dos documentos que o integram e a elegibilidade dos candidatos (artigo 19º). No exercício desta incumbência que lhe é legalmente cometida, se o juiz verificar a existência de irregularidades processuais, manda notificar imediatamente o mandatário da lista para as suprir no prazo de três dias (artigo 20º). Neste período o juiz actua, em princípio, 'sponte sua', no exercício de um poder/dever legalmente cominado e com o objectivo de criar as condições que lhe permitam decidir sobre a admissão das candidaturas apresentadas, proferindo o despacho previsto no artigo 21º: despacho este de rejeição de candidatos inelegíveis, comportando a faculdade de suprimento prevista no nº 2 do mesmo artigo, e a possibilidade de rejeição da lista no caso de ausência deste suprimento ou de o número de suplentes não perfazer o número legal de candidatos efectivos, e de introdução nas listas das rectificações ou aditamentos requeridos pelos mandatários, após o que as listas assim corrigidas serão afixadas à porta do edifício do Tribunal (artigo 21º, nº 4).
Das decisões do juiz relativas à apresentação de candidaturas cabe a reclamação, a deduzir no prazo de 48 horas, prevista no nº 1, do artigo 22º. Os números 2 e
3 do mesmo preceito regulam o processo contraditório de apreciação das reclamações, sobre as quais o juiz decide no prazo de dois dias a contar do termo dos prazos de intervenção no processo ao abrigo do aludido contraditório
(nº 4). Na ausência de reclamações ou, havendo, depois de as mesmas terem sido resolvidas, o juiz voltará a mandar afixar à porta do edifício do Tribunal uma relação completa das listas admitidas (artigo 22º, nº 5).
Esta afixação é relevante para efeitos de interposição de recurso, para o Tribunal Constitucional, da decisão final do juiz sobre a apresentação de candidaturas (artigo 25º, nº 1), que assim terá que ser interposto num prazo de
48 horas (nº 2 do preceito). Sendo o recurso interposto no tribunal que proferiu a decisão final quanto à admissão de candidaturas (artigo 27º, nº 1), nele se desenrola um específico processo contraditório (regulados nos números 2 e 3 do mesmo artigo 27º) e será decidido pelo T.C. no prazo de dez dias a contar do termo do prazo de vinda ao processo dos diversos intervenientes a que se referem os aludidos nºs 2 e 3 (artigo 28º, nº 1)'.
3. Perante o registo feito da sequência processual seguida no presente recurso, com a transcrição dos despachos do Mmº Juiz a quo, ressalta que inexiste aqui uma decisão final recaindo sobra a reclamação prevista no nº 1 do artigo 22º. Há apenas um recurso do cidadão C., 'na qualidade de Presidente da Comissão Política do Centro Democrático Social/ Partido Democrático, no concelho de Santo Tirso e Candidato à Câmara Municipal do mesmo concelho', com expressa invocação dos artigos 25º e 26º e dizendo
'recorrer da decisão da admissão de candidaturas', o qual foi aceite pelo Mmº Juiz a quo remetido a este Tribunal Constitucional.
Ora, como é repetidamente afirmado na jurisprudência do Tribunal Constitucional, só a decisão do juiz que recai sobre a reclamação configura uma decisão final, nos termos e para os efeitos do artigo 25º do Decreto-Lei nº 701-B/76. Para que a decisão recorrida se pudesse constituir em decisão final era, in casu, necessário que ela houvesse sido proferida sobre reclamação apresentada contra a admissão da candidatura do D. na lista dos candidatos do Partido Socialista à Assembleia de Freguesia de Vila das Aves, o que se não verifica, pois a decisão pretensamente em causa é a que admitiu
'definitivamente as listas' e mandou cumprir 'o disposto no artº 22º, nº 5 e
24º, nº 1 do DL. 701-B/76 de 29/9' e nela não se decidiu qualquer reclamação.
O cumprimento da determinação contida no artigo 22º do Decreto-Lei nº 701-B/76 constitui-se, assim, em pressuposto processual de recorribilidade: das decisões do juiz relativas à apresentação de candidaturas, contra as quais se não deduz reclamação não há recurso para o Tribunal Constitucional (cfr., por exemplo, o Acórdão nº 526/89, nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 14º volume, pág. 309 e seguintes).
4. Termos em que, DECIDINDO, não se toma conhecimento do recurso.
Lisboa, 17 de Novembro de 1993
Guilherme da Fonseca Bravo Serra Maria da Assunção Esteves Fernando Alves Correia Armindo Ribeiro Mendes Vítor Nunes de Almeida Luís Nunes de Almeida Messias Bento Antero Alves Monteiro Dinis António Vitorino Alberto Tavares da Costa José Manuel Cardoso da Costa