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Proc. Nº 362/92 Sec. 1ª Rel. Cons. Vítor Nunes de Almeida
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
I - RELATÓRIO
1. - A. veio propor contra a B., uma acção declarativa emergente de contrato individual de trabalho invocando a ilicitude do despedimento de que foi vítima, devendo ser declarada improcedente a justa causa invocada para o despedimento e a autora reintegrada no seu posto de trabalho e indemnizada de todas as prestações pecuniárias que deveria ter auferido desde o despedimento até à data da sentença.
Após a contestação da Ré e depois de ter sido proferido o despacho do juiz em que se designava data para o julgamento, a autora veio com um requerimento ao processo em que pedia a aplicação ao caso dos autos da amnistia constante da norma do artigo 1º, alínea ii), da Lei nº 23/91, de 4 de Julho.
Na resposta, a firma C.,(S.A.), (ex-B., S.A.), veio invocar a inconstitucionalidade de tal norma, por violação do artigo 13º da Constituição - princípio da igualdade.
Em seguida, foi proferido pelo juiz um despacho em que conheceu da questão suscitada e, afastando a alegação de inconstitucionalidade suscitada pela ré, veio a aplicar a referida lei da amnistia e, em consequência, declarou amnistiada a infracção de que a autora fora acusada e que tinha motivado o seu despedimento, com as legais consequências.
2. - Desta decisão foi interposto recurso para o Tribunal da Relação pela Ré, invocando a inconstitucionalidade material da alínea ii) do Artigo 1º da Lei nº 23/91, de 4 de Julho, por violação do artigo
13º da Constituição.
O Tribunal da Relação, em acórdão de 8 de Abril de 1992, decidiu negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida, afastando a alegação de inconstitucionalidade invocada pela recorrente.
3. - Não se conformando com tal decisão, a C., (S.A.),
(ex-B., S.A.), interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, pretendendo que se aprecie a inconstitucionalidade da alínea ii) do Artigo 1º da Lei nº 23/91, de 4 de Julho, por violação do artigo 13º da Constituição.
4. - Neste Tribunal a recorrente apresentou alegações e aí formulou as seguintes conclusões:
'1. A al.ii) do artº 1º da Lei 23/91, de 4 de Julho, que aprovou uma 'amnistia' laboral para determinadas infracções disciplinares é materialmente inconstitucional, pelo que é vedado aos Tribunais proceder à sua aplicação (ARTº 206 da CRP), ao contrário do que sustentou o Tribunal recorrido, que se pronunciou pela não inconstitucionalidade da mencionada disposição legal.
2. A inconstitucionalidade da referida norma existe na medida em que atinge, sem compensação, o poder disciplinar da ora recorrente, o qual tem natureza privada e está protegido constitucionalmente (Artº 62-1 da CRP).
3. A inconstitucionalidade radica também na violação do artº 87-2, na medida em que constitui uma interferência na gestão da empresa inadmissível e um tratamento de privilégio aos trabalhadores de empresas públicas e de capitais públicos, que a Constituição não consente.
4. A inconstitucionalidade da norma contida na al.ii) do artº 1º da Lei 23/91, de 4 de Julho está também evidenciada na parte em que atenta contra o princípio da igualdade, inserido no Artº 13º da CRP, pois tratou de modo diferente situações materialmente iguais, não havendo qualquer valor material que justifique e permita a diferenciação a que procedeu, sendo certo que os trabalhadores das empresas públicas e de capitais públicos têm no ordenamento jurídico português posição inteiramente idêntica aos demais trabalhadores do Sector privado, uma vez que, quer aos primeiros, quer aos segundos se aplica o regime jurídico do contrato individual de trabalho, anexo ao Dec.Lei 49408.
5. Nunca à recorrente se aplicou o regime de direito administrativo, baseado no Estatuto do Funcionalismo Público, quer enquanto EP, quer após o Dec.Lei 12/90, de 6 de Janeiro, quando passou a Sociedade Anónima de capitais públicos. De resto, e estatuto pessoal consagrado no artº 30 do Dec.Lei 260/76, de 8 de Abril e o artº 32 do Dec.Lei 427-A/76, de 1 de Junho, são suficientemente claros, para que não se consinta a interpretação sustentada no douto Acórdão sob recurso'.
A recorrida não apresentou contra-alegações.
Corridos que foram os vistos legais, cumpre apreciar e decidir a questão de constitucionalidade suscitada nos autos.
II - FUNDAMENTOS
5. - A questão da constitucionalidade da alínea ii) do Artigo 1º da Lei nº 23/91, de 4 de Julho (Lei da Amnistia), foi já objecto de duas decisões tiradas pelo Tribunal Constitucional, em plenário e ao abrigo do preceituado no Artigo 79º-A, nº 1, da Lei do Tribunal Constitucional (Lei nº
28/82, de 15 de Novembro, na redacção da Lei nº 85/89, de 7 de Setembro) - os Acórdãos nº 152/93 e 153/93, de 3 de Fevereiro de 1993 e publicados no D.R., II Série, de 16.03.93 e 23.03.93, respectivamente, decisões estas que, expressamente abrangem os trabalhadores das empresas públicas ou de capitais públicos.
A presente acção foi proposta contra a B. (S.A.), empresa resultante da transformação da D. (E.P.) em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, por força do Decreto-Lei nº 12/90, de 6 de Janeiro. Nos termos do que se dispõe no artigo 9º deste diploma, a B. procederá, por meio de cisões simples, à formação de novas sociedades anónimas, sendo o capital social destas exclusivamente por si subscrito ou realizado, pelo que a firma C., (S.A.), cujos estatutos se encontram publicados na IIIª série do Diário da República, nº 145, de 27 de Junho de 1991, tendo resultado de uma cisão prevista no referido artigo 9º, continua a ser uma empresa de capitais exclusivamente públicos.
A doutrina que se extrai das decisões atrás mencionadas, designadamente, do Acórdão nº 153/93 que se refere especificamente também a um caso de despedimento, deve ser acatada pelo Tribunal. Dada a jurisprudência assim firmada, em caso em tudo idêntico ao dos autos, mantém-se o teor da mesma, remetendo-se de forma integral para fundamentos e conteúdo decisório daquele acórdão, que aqui se dão por reproduzidos.
III - DECISÃO
7. - Nestes termos, decide o Tribunal Constitucional negar provimento ao presente recurso e em consequência, confirmar a decisão recorrida.
Lisboa,1993.05.11
Vítor Nunes de Almeida
Alberto Tavares da Costa
Armindo Ribeiro Mendes
Antero Alves Monteiro Dinis
Luís Nunes de Almeida