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Processo nº 211/96 ACÓRDÃO Nº 757/96
1ª Secção Rel. Cons. Tavares da Costa
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
1.- J..., D ..., P..., C... e R..., todos identificados nos autos, foram condenados por sentença de 2 de Março de 1995 do Tribunal do Círculo Judicial de Torres Vedras, a penas de prisão, pela co-autoria material de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelas disposições combinadas dos artigos 296º e 297º, nºs. 1, alínea g), e 2, alíneas c), d) e h), do Código Penal.
Inconformados com o decidido, interpuseram recurso por simples declaração na acta, recurso esse que foi logo admitido, a subir imediatamente, nos próprios autos, com efeito suspensivo, nos termos do disposto nos artigos 406º, nº 1, 407º, nº 1, alínea a), e 408º, nº 1, alínea a), do Código de Processo Penal.
O Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 8 de Novembro de 1995, decidiu:
a) rejeitar o recurso interposto pelo coarguido D..., dado não ter apresentado a respectiva motivação e o disposto no nº 1 do artigo 420º do Código de Processo Penal;
b) negar provimento aos demais recursos, confirmando, na íntegra, o acórdão recorrido.
2.- Do assim decidido interpuseram os arguidos, à excepção do D... da Conceição, recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, pretendendo ver 'declarada' a inconstitucionalidade das normas dos artigos 410º, nºs. 1, 2 e 3 e 433º do Código de Processo Penal, por violação do disposto nos artigos 12º, 13º, 32º, nºs. 1 e 5, e 212º, nº 5, da Constituição da República.
Alegam ter suscitado a questão de inconstitucionalidade na motivação do recurso e, por remissão, nas alegações apresentadas.
A pretensão formulada mereceu, no entanto, ser indeferida, por despacho do Senhor Conselheiro Relator, de 20 de Janeiro de
1996, nos termos que se passam a transcrever:
'Em parte alguma do processo, designadamente na motivação do recurso
(fls. 179 e segs.) e nas alegações (fls. 214) suscitaram os recorrentes a inconstitucionalidade ou a ilegalidade das normas dos artigos 410º, nºs. 1, 2 e
3 e 433º do Código de Processo Penal.
Embora na parte final da motivação tenham aludido à violação do artigo 32º da Constituição da República, certo é que daquela motivação nenhum argumento consta em apoio de tal alusão.
O acórdão recorrido não se debruçou sobre a inconformidade das referidas normas do Código de Processo Penal (artigo 410º, nº 1) com a lei fundamental justamente por tal questão lhe não ter sido posta à sua apreciação, antes pelo contrário, elas foram invocadas no recurso no pressuposto de que o tribunal da instância as não aplicou correctamente.
Donde se conclui que o recurso agora interposto está manifestamente mal fundado.
Assim, em cumprimento do disposto no artigo 76º, nºs. 1 e 2, parte final, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, indefiro o requerimento de interposição de fls. 205 [...]'.
Notificados, reclamaram os arguidos, à excepção do referido D... da Conceição, para o Tribunal Constitucional, nos termos do nº 4 do artigo 76º citado, considerando que, tendo arguido na motivação do recurso 'a inconstitucionalidade', ao indicarem como norma violada o artigo 32º da CR, tal basta para que se considere suscitada durante o processo a questão de inconstitucionalidade.
Os autos foram logo remetidos ao Tribunal Constitucional e, aqui, o Senhor Procurador-Geral adjunto pronunciou-se nos seguintes termos:
'Sendo evidente que o ora reclamante não suscitou, antes da prolação da decisão recorrida, qualquer questão de inconstitucionalidade de normas ou de concretas e apontadas interpretações normativas, é manifesta a inexistência dos pressupostos de admissibilidade do recurso de constitucionalidade que se pretendeu interpor, nenhuma censura merecendo, em consequência, o despacho que o rejeitou'.
Foram corridos os vistos a que se refere o nº 3 do artigo 77º da Lei nº 28/82.
Importa decidir.
3.- Constitui jurisprudência pacífica do Tribunal Constitucional depender a admissibilidade do recurso de constitucionalidade, com fundamento na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, da verificação de determinados requisitos: a) que a questão da constitucionalidade da norma tenha sido suscitada durante o processo; b) que o tribunal a quo tenha aplicado a norma como uma das rationes decidendi; c) que no caso já não caiba recurso ordinário; d) que tenha sido o reclamante ou recorrente a suscitar a questão de constitucionalidade.
Ora, no caso sub judice, de imediato se conclui faltar o primeiro dos requisitos enunciados, relativo a uma idónea suscitação da questão de constitucionalidade durante o processo.
Com efeito, alegam os reclamantes que o acórdão que os condenou, ao aplicar as normas contidas nos referidos artigos 410º (nºs. 1, 2 e 3) e 433º do Código de Processo Penal, terá, nessa medida, violado os preceitos constitucionais dos artigos 12º, 13º, 32º, nºs. 1 e 5, e 212º, nº 5.
No entanto, para além de se poder entender que a questão é reportada a uma decisão judicial e não a normas - e só destas ou de uma sua interpretação se pode recorrer com base na alínea b) do nº 1 do artigo
70º da Lei nº 28/82, o que, porém, não justificará, in casu, maior ponderação -
certo é que os reclamantes nas alegações apresentadas, ao reportaram-se à motivação do recurso, mais não fizeram do que protestar a sua inocência, invocar contradição insanável na fundamentação e questionar a medida da pena. E, na sequência lógica dessa postura, pediram a anulação do acórdão da 1ª instância ou, se assim não se entendesse, a absolvição ou, em última análise, a substituição da pena de prisão efectiva pela sua suspensão.
Nessa linha argumentativa, ao decidir-se como se decidiu, ter-se-á violado o disposto no artigo 410º do Código de Processo Penal, nos artigos 48º, 71º e 72º do Código Penal e no artigo 32º da Constituição da República, segundo defendem.
Não obstante, a invocação desta norma constitucional, a rematar a motivação do recurso, desagregadamente em relação ao contexto - como se pretendesse dizer que o decidido afectou as garantias do processo criminal constitucionalmente reconhecidas - não é, manifestamente, suficiente para se ter como verificado o requisito da suscitação. Na verdade, não apontam os então recorrentes e ora reclamantes as razões que os levaram a concluir pela violação daquele artigo 32º, o que, de resto, passou lateralmente
à decisão recorrida. É que não basta alegar a violação de norma constitucional, mister é que a suscitação de eventual questão de inconstitucionalidade seja feita de forma clara e perceptível, em termos que não permitam dúvida sobre a colocação da questão, o que passa pela sua adequada equacionação. Ou seja, mesmo que se entendesse imputado o suposto vício a uma norma, ou sua interpretação, e não a uma decisão judicial - o que, por desnecessário, não se cuidará de analisar - sempre haveria que enquadrar clara e perceptivelmente o problema de modo a permitir a sua correcta configuração: não basta proclamar, genericamente, uma desconformidade à Constituição sem minimamente fundamentar a afirmação, como ainda recentemente se considerou no acórdão 607/96 deste Tribunal (ainda inédito), como expressão de jurisprudência assente (cfr., inter alia, o acórdão nº 269/94, publicado no Diário da República, II Série, de 18 de Junho de 1994).
4.- O exposto permite concluir pela inexistência de um dos pressupostos processuais de verificação obrigatória para a admissibilidade do recurso de constitucionalidade previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82.
O que, do mesmo passo, conduz a que se decida indeferir a presente reclamação.
Custas pelos reclamantes, com taxa de justiça que se fixa em 4 (quatro) unidades de conta.
Lisboa, 11 de Junho de 1996
Ass) Alberto Tavares da Costa Antero Alves Monteiro Dinis Maria Fernanda Palma Maria da Assunção Esteves Vitor Nunes de Almeida Armindo Ribeiro Mendes José Manuel Cardoso da Costa