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Processo nº 717/92
1ª Secção Rel. Cons. Tavares da Costa
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
Nos presentes autos em que são recorrentes A. e mulher, B., e recorridos C. e mulher, D., neles identificados, concordando-se com a exposição prévia oportunamente elaborada, ao abrigo do disposto no artigo
78º-A, nº 1, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, a qual se dá aqui por reproduzida para todos os efeitos legais, decide-se não tomar conhecimento do objecto do recurso.
Custas pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em 4 (quatro) unidades de conta.
Lisboa, 30 de Junho de 1993
Alberto Tavares da Costa
Vítor Nunes de Almeida
Armindo Ribeiro Mendes
Antero Alves Monteiro Dinis
José Manuel Cardoso da Costa
Exposição a que se refere o nº 1 do artigo 78º-A da Lei nº 28/82 de 15 de Novembro.
1.- Nos autos de execução ordinária para entrega de coisa certa que, no Tribunal Judicial da Comarca de Viseu (1º Juízo), C. e mulher instauraram contra A., e mulher, todos identificados no processo, recorreram estes últimos do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), de 27 de Outubro de 1992, que, em conferência, lhes indeferiu arguição de nulidade de anterior acórdão que não conhecera do recurso então interposto, por inadmissibilidade do mesmo.
O Senhor Conselheiro Relator, por despacho de 11 de Novembro último, embora considere que, em sua opinião pessoal, não seria de admitir recurso para o Tribunal Constitucional, acabou por o receber, processado nos próprios autos, com efeito suspensivo, 'para evitar duplicação de processado e perda de tempo' (fls. 114).
Trata-se de decisão não vinculativa deste Tribunal
(cfr. o artigo 76º, nº 3, da Lei nº 28/82) pelo que cumpre, neste momento, ponderar sobre a possibilidade de conhecimento do objecto do recurso, ratificado que foi o acto de interposição pelo Senhor Advogado constituído.
2.- Compulsados os autos, verifica-se que os exequentes pediram a entrega judicial de um determinado andar de prédio urbano, cuja propriedade lhes fora reconhecida por acórdão do STJ, ocupado pelos executados.
Tendo o Senhor Juiz mandado proceder à entrega e subsequente notificação - Código de Processo Civil, artigos 928º, nº 2, e
930º, nº 3 - do respectivo despacho agravaram, com efeito suspensivo, os executados e ora recorrentes, após reclamação que lhes foi favorável.
O Tribunal da Relação de Coimbra, por acórdão de 15 de Outubro de 1991, negou provimento ao agravo, não só por não considerar verificado o alegado direito de retenção, uma vez que os exequentes prestaram caução suficiente - Código Civil, alínea d) do artigo 756º -, mas também por apresentação extemporânea das alegações (cfr. cota de fls. 49).
Inconformados, recorreram os executados para o STJ, mas nesse Tribunal, o Senhor Conselheiro Relator, após se inteirar do valor da acção de que a execução é apensa, suscitou a questão prévia de inadmissibilidade do recurso, considerando o disposto nos artigos 20º da Lei nº 38/87, de 23 de Dezembro, sobre os valores das alçadas - normativo já em vigor à data da instauração da acção executiva, 24 de Janeiro de 1991 - e 678º, nº 1, do Código de Processo Civil, não sendo caso de ocorrência de qualquer das excepções previstas no nº 2 da mesma norma, nomeadamente ofensa de caso julgado, invocada pelos agravantes.
A conferência da 1ª Secção, por acórdão de 26 de Maio de 1992, aderiu à fundamentação do despacho e, em consequência, decidiu não conhecer do recurso.
Reagiram ainda os executados arguindo a nulidade daquele aresto, dado que, em seu entender, o decidido repousou no facto de o valor da causa ser inferior à alçada da Relação quando, na verdade, ao tempo em que a decisão que serve de base à execução foi proferida, o valor dado à mesma era superior.
Novamente a conferência, agora pelo ora recorrido acórdão de 27 de Outubro de 1992, se pronunciou, julgando no sentido de inexistência de nulidade e indeferindo o requerido, com o fundamento de que a acção executiva é autónoma e não a continuação da declarativa pelo que, para efeitos de recurso, importa o valor da alçada na data em que foi promovida a execução e não o da data em que foi proposta a acção declarativa onde se proferiu a sentença exequenda.
Finalmente, recorreram os interessados, como se consignou já, para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, visto discordarem do acórdão e considerarem violado o artigo 20º, 'o qual não citado embora expressamente no acórdão ora em crise está no mesmo douto aresto obviamente implícito, dada a remissão feita para o parecer do Exmo. Relator a fls. 90 e segs.'.
3.- A admissão do recurso de inconstitucionalidade com base na citada alínea b) depende, fundamentalmente, da concorrência de vários pressupostos: a) suscitação prévia da inconstitucionalidade da norma pelo recorrente; b) utilização da norma na decisão; c) inadmissibilidade de recurso ordinário da decisão aplicativa da norma, por a lei o não prever ou por já se haverem esgotado os que no caso cabiam.
Ora, no caso vertente, a jurisprudência constantemente reiterada deste Tribunal entende que o primeiro dos apontados pressupostos não se verifica, o que desde logo torna o recurso inadmissível.
O Tribunal entende, com significativa uniformidade, que a suscitação atempada deve ser entendida não num sentido formal, bastando a sua ocorrência em momento anterior à extinção da instância, mas sim num sentido funcional, que permita ao tribunal a quo conhecer da questão antes de esgotado o seu poder jurisdicional relativo à matéria a que respeita a questão de constitucionalidade (cfr., por todos, o Acórdão nº 439/91, publicado no Diário da República, II Série, de 24 de Abril de 1992).
Em conformidade com esta orientação, relativamente
à qual não se vislumbra razão válida para dela nos afastarmos, considera-se que o requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional já não constitui momento adequado para suscitar questão de constitucionalidade, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº
28/82, ou seja, em termos de ter tais questões por pertinentemente suscitadas
'no decurso do processo', (cfr., entre os mais recentes, os Acórdãos nºs. 40/92,
58/92 e 60/92, o primeiro já publicado, no Diário da República, II Série, de 20 de Maio de 1992).
No caso sub judicio, a questão de constitucionalidade foi pela primeira vez suscitada no requerimento de interposição de recurso para este Tribunal, quando nada se disse sobre o assunto nas alegações do recurso para o STJ do acórdão da Relação nem, muito especialmente, quando se invocam nulidades processuais face ao acórdão, tirado em conferência, que aderiu à fundamentação do Senhor Relator para não admitir o recurso.
E não se está, claramente, perante uma daquelas situações excepcionais que impossibilitam uma suscitação atempada, nem tão pouco a decisão assentou em interpretação anómala ou bizarra que, num contexto de razoabilidade, justificasse, por imprevisível, o tardio equacionamento da questão.
Os recorrentes usufruiram, na verdade, de tempo e oportunidade processuais para o fazer, por um lado, e, por outro, a interposição feita pelo tribunal a quo insere-se no entendimento pacífico quanto à natureza distinta e autónoma da acção executiva perante a acção declaratória, com estrutura inteiramente diversa (cfr. por todos, Anselmo de Castro - A Acção Executiva Singular, Comum e Especial, 3ª ed., Coimbra, 1977, pág. 7).
4.- Em face do exposto, por se entender que não pode conhecer-se do objecto do recurso, cumpra-se o disposto no nº 1 do artigo 78º-A da Lei nº 28/82.
Lisboa, 19 de Fevereiro de 1993
Alberto Tavares da Costa