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Processo n.º 122/11
2.ª Secção
Relator: Conselheira Catarina Sarmento e Castro
Acordam, em Conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do 3.º Juízo Criminal da Comarca de Lisboa, o Ministério Público veio interpor recurso de constitucionalidade, nos termos do artigo 70.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (Lei do Tribunal Constitucional, doravante designada por LTC).
2. Tal recurso fundamenta-se na circunstância de, por decisão de 27 de Maio de 2010, o tribunal a quo ter recusado a aplicação da norma constituída pela conjugação dos artigos 348.º, n.º 1, al. a), do Código Penal e 152.º, n.ºs 1, al. a) e 3, e 153.º, n.º 8, do Código da Estrada, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 44/2005, de 23 de Fevereiro, invocando inconstitucionalidade orgânica.
3. No Tribunal Constitucional, foi proferida Decisão sumária, que, remetendo para jurisprudência anterior, julgou não inconstitucional a norma extraída da conjugação dos artigos 152.º, n.º 1, alínea a), n.º 3, e 153.º, n.º 8, ambos do Código da Estrada, com a redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 44/2005, de 23 de Fevereiro.
Tal decisão baseou-se na aplicação da fundamentação constante dos Acórdãos deste Tribunal Constitucional, com os n.os 397/2011 e 479/2010.
4. Inconformado, vem o recorrido apresentar reclamação para a conferência.
Invoca, para fundamentar a sua posição, que o Acórdão do Tribunal Constitucional, com o n.º 485/2011, declarou, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma do artigo 153.º, n.º 6, do Código da Estrada, na redacção do Decreto-Lei n.º 44/2005, de 23 de Fevereiro, na parte em que a contraprova respeita a crime de condução em estado de embriaguez e se consubstancia em exame de pesquisa de álcool no ar expirado.
Não obstante o aludido aresto não se referir ao n.º 8 do artigo 153.º do Código da Estrada, considera o reclamante que a fundamentação utilizada se aplica ao “processo legislativo que globalmente editou (…) o regime do exame de contraprova de alcoolemia.”
Mais refere que o que verdadeiramente está em causa, quanto à inconstitucionalidade do artigo 153.º, n.º 8, do Código da Estrada, “diz respeito à modalidade interpretativa que vincula o diagnóstico do estado de influenciado pelo álcool ao exame médico através da colheita de sangue”, porquanto, no caso concreto, o reclamante recusou a colheita de sangue por ser “Testemunha de Jeová”. Assim, defende o reclamante que o Tribunal deverá apreciar igualmente a inconstitucionalidade da norma, por contrariar a liberdade religiosa, consagrada no artigo 41.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, aspecto não focado na decisão sumária reclamada.
5. O Ministério Público, na sua resposta, pugna pelo indeferimento da reclamação.
Refere que a questão de constitucionalidade colocada, nos presentes autos, consiste em saber se são organicamente inconstitucionais as normas do Código da Estrada – em conjugação com o artigo 348.º do Código Penal – na interpretação segundo a qual o condutor não pode recusar-se à colheita de sangue para detecção do grau de influenciado pelo álcool, constituindo essa recusa um crime de desobediência.
No Acórdão n.º 485/2011, aludido pelo reclamante, o objecto de apreciação é totalmente distinto, reportando-se a uma determinada dimensão do artigo 153.º, n.º 6, do Código da Estrada, na redacção do Decreto-Lei n.º 44/2005, que estabelece que o resultado da contraprova prevalece sempre sobre o resultado do exame inicial.
Assim, a invocação da fundamentação referida neste último aresto não tem relevância, quanto ao presente recurso de constitucionalidade.
II – Fundamentos
6. Analisada a reclamação apresentada, conclui-se que o reclamante não aduziu qualquer argumento que infirme a correcção do juízo efectuado, na decisão sumária proferida.
Na verdade, o Acórdão do Tribunal Constitucional, com o n.º 485/2011, incide sobre questão de constitucionalidade diversa da tratada neste recurso, não sendo a sua fundamentação transponível para a presente situação.
Acresce que a competência do Tribunal Constitucional, no presente tipo de recursos, se encontra restrita à sindicância de normas ou interpretações normativas utilizadas como ratio decidendi da decisão recorrida.
Assim, a apreciação dos concretos factos que o recorrente alegou como justificativos da recusa a recolha de sangue para análise, nomeadamente a sua relevância jurídica, constitui matéria que, - não tendo ainda sido alvo de específica apreciação pelo tribunal a quo, atenta a fase processual em que os autos se encontram – em todo o caso, nessa específica dimensão casuística, se encontra subtraída à sindicância deste Tribunal.
Nestes termos, não tendo sido carreado qualquer argumento que afecte a manutenção da decisão reclamada, damos por reproduzida a sua fundamentação e, em consequência, concluímos pelo indeferimento da reclamação apresentada.
III – Decisão
7. Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, decide-se confirmar a decisão sumária reclamada, proferida a 23 de Novembro de 2011, e, em consequência, indeferir a reclamação apresentada.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta, ponderados os critérios referidos no artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de Outubro (artigo 7.º do mesmo diploma).
Lisboa, 21 de Dezembro de 2011.- Catarina Sarmento e Castro – João Cura Mariano – Rui Manuel Moura Ramos.