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Processo nº 449/91
1ª Secção Rel. Cons. Tavares da Costa
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
I
1.- A. requereu no Tribunal Cível da Comarca do Porto expropriação por utilidade pública urgente de uma parcela de terreno pertencente a B. e mulher, C..
Procedeu-se a vistoria ad perpetuam rei memoriam e os árbitros fixaram o valor da indemnização em 16.374.188$00.
Adjudicada a parcela, recorreram os expropriados que entenderam ser aquele valor de 136.574.455$00, desde logo suscitando a inconstitucionalidade do artigo 33º, nº 1, do Decreto-Lei nº 845/76, de 11 de Dezembro - o anterior 'Código das Expropriações' - nas respectivas alegações. E efectuada avaliação, o Senhor Juiz do 3º Juízo Cível da mesma comarca fixou em 86.280.000$00 o valor da indemnização referente à parcela expropriada.
Do assim decidido recorreram tanto os expropriados como a expropriante e a Relação do Porto, por acórdão de 24 de Outubro de 1991, confirmou inteiramente a decisão da 1ª instância.
Com efeito, a Relação do Porto, colocada perante a invocada inconstitucionalidade, não a deu por verificada.
O artigo 30º do Código das Expropriações (de 1976), argumenta-se no acórdão, foi, na sua totalidade, declarado inconstitucional dado que impunha um critério de valorização restritivo e não conducente a uma adequada restauração da lesão patrimonial sofrida pelos expropriados, devendo atender-se a todos os factores idóneos à concretização do valor venal e não do valor de mera produtividade, decisão essa que se compreende 'porque o valor encontrado para um terreno com aplicação dos critérios que em tal artigo estavam fixados não correspondia normalmente ao seu valor real e corrente'.
Logo, aquele preceito violava os princípios constitucionais plasmados nos artigos 13º e 62º, nº 2, da CR, o que já não sucede, na tese da Relação, quanto ao artigo 33º, ora em apreço.
E ponderou-se, a este propósito:
'Na verdade, nele [artigo 33º] não se limita o valor do terreno em si; apenas se estabelece um critério para a sua livre determinação. Sabido como é que o valor do terreno e das construções que nele se podem implantar andam sempre intimamente ligados, pretendeu o artigo em causa estabelecer um critério auxiliar bastante flexível para se alcançar tal determinação a partir do valor da construção. Os peritos são absolutamente livres na fixação do valor da construção possível, e a partir daí têm campo de manobra suficientemente vasto, e condizente com a realidade, para encontrarem o valor real e corrente do terreno expropriado'.
E, a rematar:
'Poderia, sim, haver inconstitucionalidade se se limitasse o valor da construção possível.
Assim, e apesar do esclarecimento não convincente nem suficientemente fundamentado dos Senhores Peritos do Tribunal e dos Expropriados a fls. 117, entendemos que o artigo 33º do Código das Expropriações não é inconstitucional'.
Ou seja, para o Tribunal da Relação, a norma não é constitucionalmente censurável (na perspectiva em foco), pois não impõe uma limitação ao poder decisório do julgador na fixação da justa indemnização, actuando, sim, como critério auxiliar na determinação do valor da construção.
Desse modo, a norma do nº 1 do artigo 33º, na parte em que fixa para o valor dos terrenos expropriados situados em aglomerado urbano um tecto de 15% do custo provável da construção que neles seja possível implantar, não foi interpretada como limite inultrapassável pelo juiz encarregado de fixar o montante indemnizatório, antes se recortando como meio ou critério auxiliar para se atingir aquele desiderato, com flexibilidade: a essa luz, os peritos são livres na fixação do valor da construção possível e, a partir daí, poderá encontra-se o valor real e corrente do terreno expropriado.
Inconformado, B. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional por considerar que a norma do artigo 33º, nº 1, do Decreto-Lei nº
845/76, de 11 de Dezembro - o 'Código das Expropriações', aplicável ao concreto caso - viola o disposto nos artigos 13º e 62º, nº 1, da Constituição da República (CR), questão por si suscitada nas alegações de recurso da decisão arbitral e nas do recurso de apelação (na realidade, pretende referir-se ao nº 2 do artigo 62º, como resulta das alegações de recurso para este Tribunal e como tal foi compreendido pela recorrida).
2.- Nas alegações apresentadas neste Tribunal, sustenta o recorrente, em síntese:
a) a Constituição da República permite a expropriação se for atribuída ao expropriado uma justa indemnização;
b) é jurisprudência assente do Tribunal Constitucional ter a justa indemnização de corresponder ao valor de mercado do bem expropriado.
No desenvolvimento desta linha argumentativa conclui do seguinte modo:
a) o artigo 33º, nº 1, do C. E. é inconstitucional, por ofensa à norma do artigo 62º, nº 2, da CR, dado impor um coeficiente máximo para a determinação do valor dos terrenos em aglomerado urbano sobre o valor da construção que é possível nele erigir-se;
b) é do conhecimento público que há terrenos, como os das melhores zonas de Lisboa e Porto, situados em zonas nobres que, por isso, valem muito mais do que a construção que neles é possível erigir-se;
c) é vulgar existirem terrenos, como o dos autos, cujo valor real e de mercado é bem superior aos 15% sobre o custo da construção possível;
d) o artigo 33º, nº 1, é impeditivo de se atingir o valor real e corrente, de mercado, da justa indemnização, devendo, assim, o recurso ser julgado procedente e por via dele 'declarada' inconstitucional a norma em referência.
A expropriante, por sua vez, apresentou alegações como recorrida, formulando as seguintes conclusões:
a) o princípio constitucional, ínsito no nº
2 do artigo 62º da CR, ao determinar que à expropriação por utilidade pública há-de corresponder a justa indemnização, não pode permitir que esta seja condicionada por factores especulativos;
b) daí que o legislador ordinário haja fixado os critérios conducentes ao resultado visado por aquele preceito, recorrendo, para tal, a regras técnicas e ditadas pela experiência;
c) que, na sua óptica, conduzem à fixação da justa indemnização, obviando à intervenção de factores especulativos.
Assim,
d) o nº 2 do artigo 33º do Código das Expropriações aprovado pelo Decreto-Lei nº 845/76 - e transportado, com algum aperfeiçoamento, para o actual Código, aprovado pelo Decreto-Lei nº 438/91, de 9 de Novembro - destinando-se a regulamentar e a permitir que se alcance o cumprimento daquele princípio constitucional, não está inquinado de inconstitucionalidade, por isso que o não viola.
Para a recorrida deve, como tal, ser negado provimento ao recurso.
Foram corridos os vistos legais e, tendo em consideração que a referência ao nº 2 do artigo 33º em causa nas alegações da expropriante se deve a mero lapso material, cumpre, agora, decidir.
II
A questão de constitucionalidade respeita à norma do nº 1 do artigo 33º do Decreto-Lei nº 845/76.
Na sistemática do diploma trata-se de preceito englobado no Título IV - Da indemnização - sob a epígrafe 'Valor de terrenos situados em aglomerado urbano', e dispõe assim, na parte que interessa:
'1.- O valor dos terrenos situados em aglomerado urbano será calculado nos termos dos artigos 27º e 28º, mas não poderá exceder, em qualquer caso, o valor de 15% do custo provável da construção que neles seja possível, determinado nos termos seguintes:
a) Calcula-se primeiramente o volume e o tipo de construção ou construções que será possível erigir no terreno, num aproveitamento economicamente normal, no estado actual, em face do desenvolvimento local e dos regulamentos em vigor, não devendo ter-se em conta, para o efeito, quaisquer projectos, planos ou estudos que por alguma forma alterem essa possibilidade;
b) Apura-se em seguida o custo provável da construção, sem o terreno, pelo custo médio correspondente ao tipo de construção e à região;
c) Se o custo da construção dever ser sensivelmente agravado pelas especiais condições do local, a importância do acréscimo daí resultante será abatida ao valor máximo a atribuir ao terreno.
2.---------------------------------
3.-------------------------------'.
Importará considerar aqueles preceitos para os quais a norma remete.
Assim, o artigo 27º, relativo ao direito à indemnização, diz-nos, no nº 1, que a expropriação por utilidade pública de quaisquer bens ou direitos confere ao expropriado o direito de receber uma justa indemnização, a qual, segundo o nº 2, será fixada com base no valor real dos bens expropriados e calculada em relação à propriedade perfeita; por sua vez o artigo 28º, versando o âmbito da justa indemnização, diz-nos não visar esta compensar o benefício alcançado pelo expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação. 'O prejuízo do expropriado
[consoante o nº 1] mede-se pelo valor real e corrente dos bens expropriados, e não pelas despesas que haja de suportar para obter a substituição da coisa expropriada por outra equivalente'.
O conceito de 'aglomerado urbano' é-nos dado, por sua vez e mercê do disposto no artigo 131º do 'Código das Expropriações', pelo nº 1 do artigo 62º do Decreto-Lei nº 794/76, de 5 de Novembro, conhecido por
'Lei dos Solos', sendo como tal entendido 'o núcleo de edificações autorizadas e respectiva área envolvente, possuindo vias públicas pavimentadas e que seja servido por rede de abastecimento domiciliário de água e de drenagem de esgoto, sendo o perímetro definido pelos pontos distanciados 50 m das vias públicas onde terminam aquelas infra-estruturas urbanísticas'.
Este enquadramento legal tem como parâmetro constitucional as normas dos artigos 13º e 62º, nº 2, da CR.
A primeira consagra o princípio da igualdade em termos de, sendo todos os cidadãos dotados da mesma dignidade social e iguais perante a lei (nº 1), ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social (nº 2).
A segunda, garante a todos o direito à propriedade privada e à sua transmissão em vida ou por morte, nos termos da própria Constituição (nº 1), acrescentando o nº 2:
'A requisição e a expropriação por utilidade pública só podem ser efectuadas com base na lei e mediante pagamento de justa indemnização'.
Dir-se-á que se entrelaçam as duas normas invocadas da Lei Fundamental: a exigência constitucional do pagamento de uma indemnização justa (nº 2 do artigo 62º) constitui manifestação do princípio geral da igualdade, acolhido no artigo 13º. Não se estabelecendo critério indemnizatório, os critérios definidos por lei têm de respeitar os princípios materiais da Constituição, como o da igualdade ou o da proporcionalidade (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira - Constituição da República Portuguesa Anotada, 2ª ed., 1º vol., Coimbra, 1984, pág. 337).
III
1.1.- O comando da norma do artigo 62º, nº 2, da CR determina que a expropriação por utilidade pública implica o pagamento da justa indemnização.
Certo é, porém, que o legislador constituinte não avançou com a definição de um critério de aplicação directa ou objectiva nem indicou o método ou mecanismo de avaliação do prejuízo derivado da medida expropriativa, como observa Alves Correia (in O Plano Urbanístico e o Princípio da Igualdade, Coimbra, 1989, págs. 532 e 546).
Surge, assim, uma certa aporia de conceituação, que, proporciona ser parametrizada constitucionalmente em função de várias referências, mas que hoje, nomeadamente em sede de elaboração jurisprudencial, revela um grau de sedimentação não desprezível.
Com efeito, o pagamento da justa indemnização configura-se como pressuposto constitucional da expropriação, pois representa a expressão particular do princípio geral, ínsito no princípio do Estado de direito democrático, da indemnização pelos actos lesivos de direitos e pelos danos causados a terceiros.
Existe um limite mínimo inderrogável na determinação da medida da indemnização expropriativa, abaixo do qual a indemnização será irrisória, simbólica ou meramente aparente, numa desadequação que trairá intenção confiscatória.
O conceito há-de, então, como se ponderou no Acórdão 3/88 (in - Diário da República - II Série - de 14 de Março de 1988), determinar que o valor do imóvel expropriado, sem esquecer o carácter constitucionalmente relativo da propriedade privada, seja calculado em função de um ou vários índices económicos, desde que, marginalizando-se factores de ordem especulativa, não se posterguem elementos valorativos do prédio que, numa análise objectiva da situação, e segundo a opinião geral do mercado, não possam deixar de ser considerados.
Complementando, no Acórdão nº 131/88 (in Diário da República, I Série, de 29 de Junho de 1988), que declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma do nº 1 do artigo
30º do diploma de 1976, escreveu-se, com o apoio de Gomes Canotilho e Vital Moreira - Constituição da República Portuguesa Anotada, 2ª ed., 1º vol., Coimbra, 1984, pág. 337 - que a Constituição, embora estabelecendo que a indemnização há-de ser justa, não define um concreto critério indemnizatório, sendo, no entanto, evidente que os critérios definidos por lei têm de respeitar os princípios materiais da Constituição (igualdade, proporcionalidade), não podendo conduzir a indemnizações irrisórias ou manifestamente desproporcionadas
à perda do bem requisitado ou expropriado.
Por sua vez, o Acórdão nº 52/90 (na I Série do mesmo jornal oficial, de 30 de Março de 1990), ao declarar também a inconstitucionalidade com força obrigatória geral da norma do nº 2 do mesmo preceito, seguiu orientação afim:
'Em termos gerais, deve entender-se que a justa indemnização há-de corresponder ao valor adequado que permita ressarcir o expropriado da perda que a transferência do bem que lhe pertencia para outra esfera dominial lhe acarreta, devendo ter-se em atenção a necessidade de respeitar o princípio da equivalência de valores: nem a indemnização pode ser tão reduzida que o seu montante a torne irrisória ou meramente simbólica, nem, por outro lado, nela deve atender-se a quaisquer valores especulativos ou ficcionados, por forma a distorcer (positiva ou negativamente) a necessária proporção que deve existir entre as consequências da expropriação e a sua reparação'.
E um pouco mais adiante:
'O pagamento da justa indemnização, para além de ser uma exigência constitucional da expropriação, é também a concretização do princípio do Estado de direito democrático, nos termos do qual se torna obrigatório indemnizar os actos lesivos de direitos ou causadores de danos.
Tal indemnização tem como medida o prejuízo que para o expropriado resulta da expropriação. E, se esta indemnização não pode estar sujeita ou condicionada por factores especulativos, por, muitas vezes, artificialmente criados, sempre deverá representar e traduzir uma adequada restauração da lesão patrimonial sofrida pelo expropriado (v. o Acórdão nº 381/89)'.
1.2.- Pode, assim, formular-se um juízo de desconformidade entre a norma constitucional do artigo 62º, nº 2, da CR, ao implicar a garantia ao expropriado de uma compensação plena da perda patrimonial suportada, e a do artigo 33º, nº 1, do 'Código das Expropriações' de 1976, ao dispor que o valor dos terrenos situados em aglomerado urbano não poderá exceder, em qualquer caso, o valor de 15% do custo provável da construção que neles seja possível erigir, desse modo estabelecendo um limite ao quantum indemnizatur insusceptível de ser ultrapassado, proporcionando situações em que o dano patrimonial sofrido pelo expropriado não seja integralmente ressarcido, o que valerá dizer não ser justa a indemnização que lhe venha a ser atribuída.
Neste sentido, aliás, se vêm pronunciando os autores: cfr., Alves Correia, O Plano Urbanístico... cit., pág. 545, nota 147, que já em obra anterior, As Garantias do Particular na Expropriação por Utilidade Pública, Coimbra, 1982, considerava o limite do artigo 33º quanto ao montante da indemnização como 'meramente arbitrário' e tem insistido que, na densificação de justa indemnização, o respectivo montante deve traduzir-se além do mais em indemnização integral ou compensação integral do dano infligido - Formas de Pagamento da Indemnização na Expropriação por Utilidade Pública - Algumas Questões, separata dos Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor António de Arruda Ferrer Correia, Coimbra, 1991, pág. 19; Osvaldo Gomes que, comentando o Acórdão nº 341/86, deste Tribunal, um dos que julgou inconstitucional a norma do nº 1 do artigo 30º, considerou serem inconstitucionais outras normas do diploma de 1976 entre as quais, no tocante à justa indemnização a norma do nº 1 do artigo 33º (cfr. Revista da Ordem dos Advogados, ano 47, 1987, pág. 125).
2.- Referiu-se, já, a imbricação entre a exigência constitucional do pagamento de justa indemnização, consubstanciada no artigo
62º, nº 2, da CR, e o princípio da igualdade a que alude o artigo 13º, nº 1, da Lei Fundamental.
No Acórdão nº 109/88 (publicado no Diário da República, II Série, de 1 de Setembro de 1988) este Tribunal, apreciando a conformidade constitucional dos nºs. 1 e 2 do artigo 30º do 'Código das Expropriações', adiantou não existir razão válida justificativa de que 'em regra se atenda ao valor real e corrente dos prédios expropriados e que nas situações particulares dos nºs. 1 e 2 do artigo 30º do Código das Expropriações se considere, em muitos casos, um valor abaixo do real e corrente', assim se privilegiando desrazoavelmente casos que, não obstante, partem de premissas comuns - privação por acto de império de um bem que ao expropriado pertencia e titularidade do correspectivo direito de indemnização.
Esta perspectiva de argumentação tem inteira validade no caso sub judicio.
Como se observou em recente acórdão da 2ª Secção deste Tribunal, o nº 210/93, de 16 de Março último, ainda inédito, versando a norma em apreço, 'comparando a posição jurídica dos vários sujeitos expropriados, verifica-se que aqueles que são indemnizados de acordo com os
índices valorativos constantes do nº 1 do artigo 33º do Código das Expropriações de 1976 são colocados numa situação de desfavor, sem fundamento razoável ou material bastante, em confronto com os expropriados cuja indemnização é calculada com base no critério geral do valor real e corrente do bem, a que se referem os artigos 27º, nº 2, e 28º, nº 1, do mesmo Código'.
E se a descrita ordem de considerações se desenrola e se legitima ao nível da chamada relação interna da expropriação, não se depara com resposta diferente no âmbito da relação externa da expropriação, ou seja, e nas palavras do citado aresto, 'realizando uma análise comparativa da situação jurídico-patrimonial dos proprietários expropriados e não expropriados, conclui-se que o particular atingido por um acto expropriativo ao qual seja atribuída uma indemnização calculada com base no artigo 33º, nº 1, do Código das Expropriações de 1976 não vê, em certos casos, o seu prejuízo patrimonial total ou integralmente compensado, pelo que suporta, desse modo, sem fundamento razoável, um dano ou um sacrifício patrimonial não exigido aos sujeitos não expropriados'.
Assim considerando, observou mais:
'A norma do nº 1 do artigo 33º do Código das Expropriações de 1976 implica, assim, uma violação do princípio da igualdade dos cidadãos perante os encargos públicos, princípio este que constitui uma dimensão do conceito constitucional de 'justa indemnização' por expropriação (cfr. o Acórdão nº
108/92, in Diário da República, II Série, nº 161, de 15 de Julho de 1992)'.
3.- No caso sub judice a medida indemnizatória foi cerceada pela limitação imposta no nº 1 do artigo 33º.
É certo que os peritos aplicaram, na determinação do valor do terreno, um coeficiente inferior, o de 13%.
Mas não só consideraram, na resposta ao quesito 31º formulado pelos expropriados, ser a percentagem de 15% a que alude aquela norma insuficiente para determinar o valor real e corrente do terreno (fls. 87), esclarecendo mais tarde que o coeficiente adequado seria o de 30% (fls. 117), afastando-se destes valores tão só o perito da expropriante, como se cuidou de justificar a diferença de dois pontos percentuais relativamente àquele máximo pela necessidade de realização de obras de interligação às infra-estruturas existentes na rua com que o terreno confronta, de valor a deduzir ao total (cfr. fls, 92).
E se, por outro lado, é exacto, como se diz no acórdão recorrido, serem os peritos livres de fixar o valor da construção possível - valor de base e móvel - não menos certo é que, em segundo momento, sempre o texto da norma do nº 1 do artigo 33º funciona como medida-limite na fixação do valor indemnizatório.
IV
Em face do exposto decide-se:
a) julgar inconstitucional a norma do nº 1 do artigo 33º do Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei nº 845/76, de 11 de Dezembro, na parte em que determina que o valor dos terrenos situados em aglomerado urbano não poderá exceder, em qualquer caso, o valor de 15% do custo provável da construção que neles seja possível erigir, por violação do disposto nos artigos 62º, nº 2, e 13º, nº 1, da Constituição da República;
b) consequentemente, conceder provimento ao recurso, determinando-se a reforma do acórdão recorrido, na parte impugnada.
Lisboa, 30 de Março de 1993
Alberto Tavares da Costa
Maria da Assunção Esteves
Armindo Ribeiro Mendes
Antero Alves Monteiro Dinis
Vítor Nunes de Almeida
José Manuel Cardoso da Costa