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Proc. nº 367/92
1ª Secção Rel. Cons. Assunção Esteves
Acordam no Tribunal Constitucional:
I
No Tribunal Judicial da Comarca de Silves, em processo de expropriação por utilidade pública, sendo expropriante a Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais e expropriado A., foi por este interposto recurso da decisão arbitral que fixara em 137.336.00 o valor da parcela de terreno expropriada. Propugnou a fixação da indemnização em
6.548.000.00 e requereu a realização das seguintes diligências instrutórias: avaliação, inspecção judicial e inquirição de testemunhas.
Em despacho de 6 de Abril de 1990, o senhor juiz designou o dia e hora para 'a inspecção e avaliação a que se refere o artigo 77º do Código das Expropriações'.
Elaborado o relatório dos peritos que, por maioria, atribuíram à parcela expropriada o valor de 214.800.00, e notificado às partes para que formulassem os esclarecimentos que entendessem necessários, arguiu o expropriado a nulidade daquele relatório e das respostas aos quesitos, com fundamento em ilegalidade e inconstitucionalidade dos critérios adoptados.
O senhor juiz indeferiu o pedido de arguição de nulidade, em despacho de 5 de Julho de 1990, e notificou os peritos para fornecerem os elementos de facto em que basearam as respostas ao quesito 6. Daquele despacho o expropriado interpôs recurso de agravo para o Tribunal da Relação de Évora.
Em sentença de 9 de Novembro de 1990, fixou-se em
214.800.00 o valor da indemnização da parcela expropriada e condenou-se o expropriado em custas, com base no valor de 6.333.200.00, valor que no recurso fora por ele reclamado. E indeferiu-se ainda o pedido de inquirição de testemunhas que fora formulado na resposta ao esclarecimento dos peritos.
O expropriado interpôs recurso de apelação desta sentença para o Tribunal da Relação de Évora. Em alegações, sustentou a inconstitucionalidade do artigo 73º, nº 2, do Código das Expropriações e a ilegalidade e inconstitucionalidade do critério utilizado na sentença recorrida para fixação da indemnização. Considerou também que o cálculo das custas com base no valor de 6.333.200.00 correspondia a um enriquecimento sem causa do Estado.
A Relação de Évora, por acórdão de 17 de Dezembro de 1991, negou provimento aos recursos de agravo e de apelação, confirmando as decisões recorridas.
O expropriado pretendeu interpor recurso deste acórdão para o Tribunal Constitucional, invocando o artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro. Arguiu a inconstitucionalidade das normas do Título IV e do artigo 73º, nº 2, face ao artigo 82º, nº 1, do Decreto-Lei nº
845/76, de 11 de Dezembro (Código das Expropriações), dos artigos 523º, 524º e
580º, nº 3, do Código de Processo Civil, do artigo 126º, nº 2, do Código das Custas Judiciais, e do Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro, por violação das normas dos artigos 12º, nº 1, 13º, nºs 1 e 2, 18º, nºs 1, 2 e 3, 20º, nº 1,
62º, nº 2, 205º, nº 2 e 207º, da Constituição da República.
O recurso foi admitido por despacho do Sr. Desembargador da Relação de Évora, apenas quanto à norma do artigo 73º, nº 2, do Decreto-Lei nº 845/76, nos seguintes termos:
'O expropriado, A., vem, através do antecedente requerimento, interpor recurso do acórdão de fls. 246 a 254 - julgando improcedentes o agravo (da decisão de fls. 160 e 161, indeferindo a sua arguição de nulidade do laudo dos peritos do tribunal e da expropriante) e a apelação (da decisão final do processo a fls. 203 e seguintes) que interpusera - para o Tribunal Constitucional na base de que ele aplicou normas cuja inconstitucionalidade fora suscitada durante o processo.
E não há dúvidas de que, nos termos do artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro - Lei de Organização, funcionamento e processo daquele Tribunal - para ele são recorríveis as decisões dos tribunais relativamente às quais aqueles dois pressupostos se verifiquem, aliás mesmo
(vide Acórdão nº 122/84 do mesmo Tribunal, no Boletim do Ministério da Justiça, nº 357, pág. 176) que o segundo (suscitação da inconstitucionalidade da norma durante o processo) o tenha sido só implicitamente.
No presente caso, diz o recorrente, as normas cuja inconstitucionalidade pretende ver apreciada pelo Tribunal Constitucional seriam as do Título IV, bem como a do artigo 73º, nº 2, face ao artigo 82º, nº 1, do Decreto-Lei nº 845/76, de 11 de Dezembro (Código das Expropriações), e ainda as dos artigos 524º e
580º, nº 3, do Código de Processo Civil e o artigo 126º, nº 2, do Código das Custas Judiciais, bem como o Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro.
Sucede que de todas estas normas, a respectiva inconstitucionalidade só foi suscitada, expressa ou implicitamente, quanto às dos artigos 30º, nº 2, 33º, nº
1, 33º, nº 3, e 73º, nº 2, do Decreto-Lei nº 845/76 e que delas o Tribunal só fez aplicação da última.
Nesta conformidade admito o recurso interposto, restritamente à medida em que o acórdão recorrido, de normas cuja inconstitucionalidade foi suscitada durante o processo, só aplicou a do artigo 73º, nº 2, do Decreto-Lei nº 845/76'.
É contra este despacho, na parte em que não admitiu o recurso quanto às restantes normas indicadas, que vem deduzida pelo expropriado a presente reclamação. Afirma, nomeadamente:
'O expropriado ao longo dos autos suscitou a inconstitucionalidade das referidas normas legais, designadamente em sede de interposição de recurso, nas exposições/requerimentos apresentados a fls. 148 e ss., e em 9-8-90, na arguição de nulidade e alegações de 20-8-90, na exposição/requerimento de 30-10-90, nas alegações de 15-2-91 (...).
A sentença de 9-11-90, de fls. 203 a 205 aplicou expressamente o art. 30º/1 do DL 845 e implicitamente as demais normas recorridas de inconstitucionalidade, pois serviu-se de um relatório maioritário e de respostas aos quesitos elaborados por Srs. Peritos/Funcionários da Direcção-Geral, que receberam da mesma um padrão de valores restritivo da justa indemnização (...).
Também o acórdão de 17-12-91, de fls. 246 a 254, aplicou as referidas normas inconstitucionais, expressamente a do artº 73º/2 do DL 845/76 e implicitamente as demais, pois não seguiu os critérios mercantis normais de compra e venda de propriedades naquela zona expropriada e preteriu a prova documental carreada para os autos pelos expropriados (...).
Deve, assim, ser admitido o recurso para o TC, quanto a todas as normas indicadas e não restritivamente (...)'.
Por acórdão de 23 de Abril de 1992, o Tribunal da Relação manteve o despacho reclamado.
O Senhor Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal pronunciou-se no sentido do indeferimento da reclamação. Concluiu assim:
'1) - a única norma cuja inconstitucionalidade foi suscitada durante o processo e que a decisão recorrida aplicou foi a do artigo 73º, nº 2, do Código das expropriações, e, quanto a ela, o recurso foi admitido;
2) - das restantes normas que o recorrente pretendia ver apreciadas pelo Tribunal Constitucional:
a) apesar de haver sido suscitada a sua inconstitucionalidade durante o processo, não foram aplicadas na decisão recorridas as normas dos artigos 30º, nºs 1 e 2, 31º, 32º e 33º, nºs 1 e 3, do Código das Expropriações;
b) não foi adequadamente suscitada durante o processo a questão da inconstitucionalidade das restantes normas do Título IV do Código das Expropriações, dos artigos 523º, 524º e 580º, nº 3, do Código de Processo Civil, do artigo 126º, nº 2, do Código das Custas Judiciais, e do Decreto-Lei nº
387-B/87, de 29 de Dezembro;
pelo que, quanto a elas, bem se decidiu ao rejeitar o recurso na parte em que as tinha por objecto ...'.
II - A fundamentação
O recurso de constitucionalidade previsto no artigo
70º, nº 1, alínea b), da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, (recurso de decisões que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo) depende dos seguintes pressupostos: 1) a inconstitucionalidade da norma (ou normas) há-de ter sido previamente invocada pelo recorrente; 2) a mesma norma (ou normas) há-de ter sido, depois, objecto de aplicação pela decisão recorrida; 3) dessa decisão já não é admissível recurso ordinário.
No quadro de avaliação destes pressupostos, põe-se o problema de saber se as normas arguidas de inconstitucionais pelo reclamante, relativamente a que não foi admitido o recurso para o Tribunal Constitucional, foram suscitadas durante o processo por modo adequado, e depois, se foram aplicadas na decisão recorrida.
Sublinha-se, desde logo, que a suscitação da questão de constitucionalidade durante o processo envolve a identificação clara da norma ou normas a ser apreciadas pela instância de controlo. Outro não é, de resto, o sentido da norma do artigo 75º-A, nº 1, da Lei do Tribunal Constitucional: 'O recurso para o Tribunal Constitucional interpõe-se por meio de requerimento, no qual se indique a alínea do nº 1 do artigo 70º ao abrigo da qual o recurso é interposto e a norma cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade se pretende que o Tribunal aprecie'.
Como se afirmou no Acórdão nº 199/88 deste Tribunal: '(...) ao suscitar-se uma questão de inconstitucionalidade, [deve deixar-se] claro qual o preceito legal cuja legitimidade constitucional se questiona, ou, no caso de se questionar certa interpretação de uma dada norma, qual o sentido ou a dimensão normativa do preceito que se tem por violador da lei fundamental' (DR, II série, de 28 de Março de 1989; e, no mesmo sentido, o Acórdão nº 123/89, DR, II série, de 29 de Abril de 1989).
Na mesma linha de entendimento do pressuposto a que se refere o artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº 28/82, vai o Acórdão nº
170/92: '(...) o objecto da fiscalização de constitucionalidade são as normas e não os diplomas legais. O Tribunal Constitucional tem entendido, pelo menos nos processos de fiscalização concreta da constitucionalidade, que a menção de todo um diploma legal não vale como identificação da norma (ou normas), requerida no artigo 75º-A, nº 1, da Lei nº 28/82' (DR, II série, de 18-9-1992; cf., igualmente, os Acórdãos nºs 393/91, inédito, e os Acórdãos nºs 442/91 e 21/92, DR, II série, de, respectivamente, 2-4-1992 e 11-6-1992).
Do que precede há-de concluir-se, com evidência, que não foi adequadamente suscitada a questão de constitucionalidade do Título IV do Código das Expropriações, título que, como oportunamente sublinha o Sr. Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal, 'engloba os artigos 27º a 38º, vários deles incompatíveis entre si porque visando realidades distintas e não justaponíveis'.
E pela mesma razão, não foi adequadamente suscitada a questão de constitucionalidade do Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro.
Diferente é a impugnação das normas dos artigos
523º, 524º e 580º, nº 3, do Código de Processo Civil e do artigo 126º, nº 2, do Código das Custas Judiciais. Estas normas estão claramente identificadas, mas em relação a elas não foi a questão de constitucionalidade suscitada durante o processo.
Com efeito, por forma reiterada e pacífica tem a jurisprudência constitucional entendido que, no enunciado da norma do artigo
70º, nº 1, alínea b), da Lei nº 28/82, a locução 'durante o processo', há-de ser entendida, não num sentido formal (tal que a inconstitucionalidade pudesse ser suscitada até à extinção da instância), mas num sentido funcional (tal que essa suscitação haveria de ter lugar em momento em que o tribunal a quo pudesse ainda conhecer da questão, isto é, antes de se haver esgotado o poder jurisdicional do juiz sobre a matéria (cf., entre outros, os Acórdãos nºs 62/85, 94/88, 439/89 e
479/89, DR, II série, de, respectivamente, 31-05-1985, 22-8-1988, 13-7-1989 e
24-4-1992). E só não é assim, nas hipóteses excepcionais em que o interessado não dispôs de oportunidade processual para levantar a questão antes de proferida a decisão [cf. Acórdão nº 90/85, (Acórdãos do Tribunal Constitucional, volume
5º, págs. 668-669); Acórdãos nºs 391/89 e 61/92, (DR., II Série, de, respectivamente, 14-09-1989 e 18-08-1992) e Acórdão nº 188/93, (inédito); cf., ainda, J. M. Cardoso da Costa, A Jurisdição Constitucional em Portugal, 2ª ed., revista e actualizada, Coimbra, 1992, pág. 51, nota 50].
Ora, o reclamante, podendo contar com a aplicação das normas dos artigos 523º, 524º e 580º, nº 3, do Código de Processo Civil, bem como do artigo 126º, nº 2, do Código das Custas Judiciais, não suscitou, porém, a sua inconstitucionalidade durante o processo. Fê-lo apenas no requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional, ou seja, num momento em que o tribunal a quo já não podia conhecer da questão.
Ao contrário do que se afirma na reclamação, a suscitação atempada da questão de constitucionalidade só se verifica relativamente às normas dos artigos 30º, nºs 1 e 2, 31º, 32º, 33º, nºs 1 e 3, e
73º, nº 2, do Código das Expropriações. E, aqui, cabe indagar se tais normas foram ou não aplicadas na decisão recorrida, de modo a fazer concluir ou não pelo preenchimento do pressuposto a que se refere a norma do artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional. Atente-se, para o efeito, no acórdão recorrido, da Relação de Évora. Aí se afirma, nomeadamente:
'Como improcede a segunda [questão do recurso de apelação do expropriado, assim formulada: `A parcela expropriada, uma vez considerados todos os elementos valorativos legais - o que só sucedeu no laudo do perito de sua nomeação -, designadamente a sua potencialidade edificativa - potencialidade esta existente em qualquer terreno desde que a construção seja tecnicamente possível, economicamente viável e administrativamente autorizada, o que no caso da parcela expropriada se verifica, por destinada à construção de um Estabelecimento Prisional - é de avaliar à razão de 2 500$00/m2, valor este real, corrente e de mercado na zona], supra mencionada.
Com efeito, em matéria de facto, que o apelante não põe em causa, a sentença
(decisão sobre o mérito do recurso do expropriado da arbitragem), ora recorrida, deu como assente, com interesse, o seguinte:
a) A parcela expropriada, com a área de 360m2, é destacada do prédio rústico sito na --------------, matricialmente inscrita sob o art. ----º, Secção
--- (----) e descrita na Conservatória do Registo Predial de Silves sob os nºs
------ e -----------;
b) Dista ela cerca de 40 metros da Estrada Nacional nº ------ e 1,5 Kilómetros da -----------, localidade dotada de rede de distribuição pública de electricidade, mas não de rede de distribuição domiciliária de água nem de drenagem de esgotos;
c) Em 2 de Dezembro de 1988 - data da vistoria ad perpetuam rei memoriam
(fls. 13 a 15) - havia nela plantadas oito amendoeiras e duas oliveiras, de porte médio, não apresentando então qualquer cultura;
d) Sendo o seu solo de natureza argilo-calcária com declive suave, tem ela boas aptidões para a exploração agrícola, especialmente para a cultura hortícula e para a plantação de árvores de fruta.
Para além desta factualidade é de assentar ainda - por revestido de interesse e até subentendido na decisão recorrida - em que - pois disso há abundantes elementos no processo - o remanescente do prédio rústico de que a parcela é destacada tem a área de 1280m2 e fica de algum modo prejudicado para a exploração agrícola.
Ora, face a estes factos, temos como certo e seguro que a parcela expropriada não se situa em aglomerado urbano - e muito menos servido de duas das três fundamentais infra-estruturas urbanísticas (redes de distribuição domiciliária de água e electricidade e de drenagem de esgotos) - e nem sequer em zona diferenciada dele.
E isto porque, segundo o artigo 62º do já citado Decreto-Lei nº 794/76, para efeitos deste diploma, como para o efeito de indemnização por expropriação por utilidade pública (citado artigo 131º do Código das Expropriações), por aglomerado urbano se entende o núcleo de edificações autorizadas e respectiva
área envolvente, possuindo vias públicas pavimentadas e que seja servido por rede de abastecimento de água ao domicílio e de drenagem de esgotos, sendo o seu perímetro definido pelos pontos distanciados de 50 metros das vias públicas onde terminam aquelas infra-estruturas, entendendo-se por zona diferenciada daquele o conjunto de edificações autorizadas e terrenos contíguos marginados por vias públicas urbanas pavimentadas que não disponham de todas as infra-estruturas urbanísticas do aglomerado.
Ora, face á distância - 1,5Km - do povoado mais próximo (-------------) e à não dotação dele daquelas duas infra-estruturas, é evidente que a parcela expropriada não se encontra sita no perímetro de aglomerado urbano.
E também não se encontra sita, obviamente, em zona dele - dito povoado - diferenciada porque nem ele chega a ser um aglomerado tal.
De resto, nem o expropriado tem a pretensão do contrário.
Mas sendo assim - e até porque nem sequer o terreno da parcela expropriada é contíguo a qualquer núcleo de edificações urbanas, as quais na zona, segundo os peritos dão notícia (resposta ao quesito 4º do expropriado), são apenas alguns prédios antigos, dispersos e isolados, estando os mais próximos a cerca de 400 metros daquela - é evidente que o seu terreno não podia ser tido como terreno apto para construção - que tão é só o sito em aglomerado urbano - nem sequer dotado de potencialidade edificativa.
Potencialidade esta que, contra o que o expropriado sustenta, não decorre, obviamente, da possibilidade técnica de se construir - pois esta possibilidade existe nos sítios ermos e até desertos -, nem da viabilidade económica da construção - que pode verificar-se em lugar solitário, como uma herdade -, nem da autorização administrativa - que pode até não ser necessária.
Deste modo, o jus aedificandi não tinha, como não tem, de, no presente caso, constituir factor de ponderação valorativa, visto que, manifestamente, a parcela expropriada se não encontra em situação susceptível de lhe conferir aquela potencialidade.
Sendo assim, como factores de tal ponderação, apenas são pertinentes, como na decisão recorrida foram justamente considerados, aqueles que os peritos do tribunal e o do expropriante tiveram em conta, a saber: os rendimentos efectivo e possível, tendo em vista o seu estado no momento da expropriação, a natureza do terreno e do subsolo, a sua configuração e as condições de acesso, as culturas predominantes e o clima da região.
Tendo concluído, face a estes factores, que o solo da parcela tem boas aptidões para a exploração agrícola, especialmente a cultura hortícola e plantação de árvores de fruta, que as árvores nela existentes se encontram devidamente tratadas e apresentam as características médias para produções razoáveis e que a proximidade com a Estrada Nacional - proximidade essa que até poderá eleger-se como embrião de uma potencialidade edificativa não longíqua - justifica, para o encontro do seu valor real e corrente, a afectação do valor do terreno com o coeficiente de 1,5, procederam então aqueles peritos avisadamente, encontrando, como valor real e corrente do terreno da parcela expropriada, o de
150 800$00.
Como avisadamente procederam ao, no cômputo da indemnização devida pela expropriação, fazerem acrescer àquele o valor da depreciação que, por via desta, o remanescente do prédio do expropriado sofre, o que calcularam em 64.000$00.
Valor este que, como aquele, se apresenta correcto, como de resto na sentença recorrida bem se reconheceu.
E sendo assim correctamente nela se procedeu ao arbitrar ao expropriado, como justa indemnização do prejuízo que a expropriação lhe causou, a soma daqueles dois valores, isto é, a quantia de Esc. 214 800$00.
Termos em que se nega provimento aos recursos, confirmando-se as decisões recorridas.
Custas pelo recorrente, com base na diferença entre o produto da área da parcela expropriada pelo valor unitário do m2 que o expropriado sustenta ser o da base de cálculo - produto esse igual a 850.000$00 - e o valor fixado na decisão recorrida - 214 800$00 -, diferença essa igual a 635.200$00.'
Verifica-se, pois, que as normas dos artigos 30º, nºs 1 e 2, 31º, 32º e 33º, nºs 1 e 3, do Código das Expropriações, não foram aplicadas na decisão recorrida. Assim: a do artigo 30º, nº 1, porque assentou a mesma decisão na inexistência de facto da potencialidade edificativa do terreno expropriado e não na desconsideração dessa qualidade para a determinação do quantum da indemnização; a do artigo 30º, nº 2, porque não se tratava de terreno situado em zona diferenciada de aglomerado urbano; do artigo 31º, porque para o terreno expropriado não estava em vigor licença de construção ou aprovação do projecto; a do artigo 32º, porque no mesmo terreno não havia nem estavam em curso obras de urbanização, nem licença de loteamento; a do artigo 33º, porque não se tratava de terreno situado em aglomerado urbano.
A única norma impugnada na interposição de recurso para o Tribunal Constitucional cuja questão de constitucionalidade foi suscitada durante o processo e que a decisão recorrida aplicou foi a do artigo 73º, nº 2, do Código das expropriações, mas quanto a ela, o recurso foi admitido.
As restantes normas, ou seja, as dos artigos 30º, nº1 e 2, 31º, 32º e 33º, nºs 1 e 3, do Código das Expropriações, dos artigos
523º, 524º, 580º, nº 3, do Código de Processo Civil, do artigo 126º, nº 2, do Código das Custas Judiciais, e do Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro, não podem constituir-se em objecto do recurso de constitucionalidade, porque, pelas razões que antecedem, em relação a elas se não encontra preenchido o pressuposto a que se refere o artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional.
III - Decisão
Nestes termos, decide-se indeferir a presente reclamação. Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 6 UCS.
Lisboa, 30 de Março de 1993
Maria da Assunção Esteves
Armindo Ribeiro Mendes
Antero Alves Monteiro Dinis
Vítor Nunes de Almeida
Alberto Tavares da Costa
José Manuel Cardoso da Costa