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Processo n.º 107/03
2.ª Secção Relator: Cons. Mário Torres
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,
1. Relatório
Contra A e B, foi deduzida pelo Ministério Público acusação por crime de fraude na obtenção de subsídio ou subvenção, previsto e punido pelo artigo 36.º, n.ºs 1, alíneas a) e c), e 2, por referência aos artigos 5.º, alínea a), e 3.º, n.º 1, todos do Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de Janeiro.
Conclusos os autos ao Juiz da 3.ª Vara Criminal de Lisboa, este, por despacho de 15 de Abril de 2002, declarou esse tribunal territorialmente incompetente, ordenando a remessa do processo às Varas Mistas da Comarca de Sintra, reputadas competentes, por se haver considerado que o crime em causa se consuma quando o dinheiro é entregue ao beneficiário ou depositado à sua ordem ou por qualquer forma colocado sob o seu poder de disposição e, no presente caso, os montantes concedidos a título de subsídio foram sempre depositados em conta da Agência do Cacém, em Sintra, do Banco Espírito Santo e Comercial de Lisboa.
Contra este despacho interpôs o arguido A recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, sustentando que o crime em causa se consuma no momento em que é aprovado o pedido de subsídio e, por isso, territorialmente competente é o Tribunal de Lisboa.
Este recurso não foi admitido pelo Juiz da 3.ª Vara Criminal de Lisboa, por despacho do seguinte teor:
'Vem o arguido interpor recurso do nosso despacho de fls. 1367 e verso no qual se declarou territorialmente incompetente esta Vara Criminal de Lisboa e se ordenou a remessa dos autos à distribuição pelas Varas Mistas de Sintra por serem as competentes para o julgamento dos autos. Entendemos, porém, na esteira do já decidido pelo Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 14 de Janeiro de 1998, publicado na Colectânea de Jurisprudência, ano XXIII, tomo I, pág. 141 e verso, que o único meio de reacção contra uma decisão que declara a incompetência do tribunal é a resolução em sede de conflito, e mesmo este limitado às partes, face ao disposto no artigo 34.°, n.°
2, do Código de Processo Penal.
Na verdade, o conhecimento do presente recurso à partida é inútil pois ele só resolveria a questão parcialmente, e na hipótese de ser provido
(declarando a competência do tribunal a quo), uma vez que não vincularia qualquer outro tribunal para além do recorrido, mantendo-se ou criando-se o impasse processual na hipótese inversa (ao declarar a competência de um outro tribunal).
Apenas em sede de resolução de conflito há um tribunal cuja decisão se impõe a todos os tribunais intervenientes, por ter sobre eles jurisdição – artigo 36.°, n.° l, do Código de Processo Penal.
O princípio de que não há conflito sem pelo menos duas decisões transitadas deve ser entendido no sentido de que a questão da competência, para ser resolvida, deve aguardar a prolação de tantas decisões quantos os tribunais intervenientes.
Conforme o decidido no supra citado Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, da conjugação do disposto nos artigos 33.°, 34.° e 36.° do Código de Processo Penal resulta que as decisões sobre a competência, cujo trânsito em julgado não impede a sua modificabilidade, não devem ser objecto de recurso, não tanto por força de uma inadmissibilidade legal, mas sobretudo pela sua inutilidade e pelas desvantagens a nível da desejada celeridade processual.
A questão da competência está, portanto, em larga medida subtraída à litigância das partes, cabendo a estas tão-só a legitimidade para a denúncia do conflito e devendo elas conformar-se com que a ele seja posto fim nos termos do citado artigo 34.°, n.° 2, do Código de Processo Penal.
Termos em que não se admite o recurso interposto a fls. 1381 e seguintes.'
O mesmo arguido reclamou deste despacho para o Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, sustentando nessa reclamação a recorribilidade das declarações de incompetência territorial e aduzindo que:
'Entender, como entendeu o Tribunal a quo, que «... da conjugação do disposto nos artigos 33.º, 34.º e 36.º do Código de Processo Penal resulta que as decisões sobre a competência, cujo trânsito em julgado não impede a sua modificabilidade, não devem ser objecto de recurso ...» é violador do preceito legal contido no artigo 399.º do Código de Processo Penal e, sobretudo, entendimento deste preceito legal desconforme à Constituição da República Portuguesa, tendo em conta o disposto no artigo 32.º, n.º 1, da Lei Fundamental, que estatui que «o processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso»'.
Esta reclamação foi indeferida por despacho de 13 de Dezembro de
2002 do Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, do seguinte teor:
'O arguido A reclama do despacho que não admitiu o recurso do despacho a fls.
1367 e verso, pelo qual a 3.ª Vara Criminal da Comarca de Lisboa se declarou incompetente em razão do território – declarando competente o Tribunal da Comarca de Sintra –, para conhecer da presente causa.
Segundo o despacho reclamado, alicerçado nas normas dos artigos 33.°,
34.° e 36.° do Código de Processo Penal (CPP) e no acórdão desta Relação de 14 de Janeiro de 1998 (in Colectânea de Jurisprudência, ano XXIII, tomo I, pág.
141), só em sede de conflito, e não mediante recurso, é admissível a reacção contra a decisão em que um tribunal se declara incompetente para a causa.
O ora reclamante defende a admissibilidade do recurso invocando o artigo 399.° do Código de Processo Penal e o artigo 32.°, n.° 1, da Constituição.
O despacho reclamado foi mantido e o Ministério Público não respondeu.
A questão a decidir é a de saber se em processo penal admite recurso a decisão em que um tribunal criminal se declara incompetente.
A matéria com interesse é a que resulta do que ficou descrito.
Em reclamações para o Presidente da Relação de Lisboa em que se suscita a mesma questão, tem-se entendido que admite recurso a decisão em que um tribunal criminal se declara incompetente.
Na decisão proferida em 29 de Maio de 2002, na reclamação n.°
5198/02, da 9.ª Secção desta Relação, escreveu-se:
«Entre nós vigora o princípio da recorribilidade das decisões judiciais que, no processo penal, tem assento no artigo 399.° do Código de Processo Penal. O princípio sofre os desvios indicados no artigo 400.° do Código de Processo Penal, e ainda nos casos previstos noutras disposições legais, como resulta da norma em branco da alínea g) do n.° 1 do mesmo artigo 400.°.
E uma vez que, nem no artigo 400.° do Código de Processo Penal, nem em qualquer outra norma legal, é afastado o recurso das decisões em que um tribunal se declare incompetente, a questão enunciada tem de ser decidida no sentido da admissibilidade do recurso.
Portanto, em processo penal, admite recurso a decisão em que um tribunal se declara incompetente em razão do território.
É certo que a questão da competência dos tribunais pode ser definida em sede de conflito de competência, a ser dirimido, como se vê do artigo 36.°, n.° 1, do Código de Processo Penal, pelo tribunal de menor hierarquia com jurisdição sobre os tribunais em conflito.
No entanto, salvo o devido respeito, a solução da questão da competência não se esgota no processo de conflito.
Com efeito, como se alcança do artigo 34.°, n.° 1, do Código de Processo Penal (e da norma do artigo 115.°, n.° 3, do Código de Processo Civil, que, nos termos do artigo 4.° do Código de Processo Penal, constitui direito subsidiário), para haver conflito, positivo ou negativo, de competência, tem que haver duas decisões transitadas em que dois tribunais se consideram competentes ou incompetentes para conhecer dos mesmos factos. E, importa sublinhar, as decisões sobre a competência têm de estar transitadas porque, de contrário, podendo ainda haver recurso de uma delas, o conflito não pode ser suscitado. Os dois meios – o conflito suscitado nos termos do artigo 35.°, n.°s 1 e 2, e o recurso – não podem coexistir, mas não se excluem: a existência de conflito supõe que já não é possível recorrer e a existência de recurso significa que não se verificam as condições para o conflito poder ser suscitado.
No caso, a decisão que declarou o Tribunal territorialmente incompetente não transitou por via do recurso interposto (e aqui em causa, por não ter sido admitido).
Assim, não há ainda condições para o conflito poder ser suscitado. E só as haverá depois de a decisão recorrida transitar e no caso de o Tribunal declarado competente (o da Comarca de Oliveira do Bairro) se declarar também, por sua vez, incompetente.
Deste modo, não havendo ainda condições para o conflito ser suscitado, como se disse, o recurso é admissível. Não se ignora que a questão é discutível ... mas, precisamente porque a questão
é discutível, deve caber ao Tribunal de recurso, nos termos do artigo 420.°, n.°
1, do Código de Processo Penal, a decisão sobre a rejeição ou não do recurso...»
Relendo agora o referido acórdão de 14 de Janeiro de 1998, para o qual se remete para evitar repetições inúteis, reconhece-se que à luz dos princípios que enformam o processo penal são inteiramente válidas as proposições em que o mesmo se baseia. Por outro lado, tanto quanto se sabe, a jurisprudência desta Relação tem seguido o entendimento expresso nesse acórdão de 14 de Janeiro de 1998. Daí que seja inútil mandar admitir um recurso que de antemão se sabe irá depois ser rejeitado pelo Tribunal da Relação. Diga-se ainda que a interpretação agora adoptada de forma alguma viola o artigo
32.°, n.° 1, da Constituição. É certo que a lei constitucional garante o recurso em processo penal – ou, como gongoricamente agora se diz, o duplo grau de jurisdição em matéria penal –, mas o legislador ordinário tem o poder de conformação dessa garantia. E essa garantia é assegurada com o recurso da decisão final. Pelo exposto, indefere-se a reclamação em apreço.'
É contra este despacho que, pelo mesmo arguido, vem interposto o presente recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, alterada, por último, pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro.
Neste Tribunal Constitucional, o recorrente apresentou alegações, que terminam com a formulação da seguinte conclusão:
'A não admissão de recurso de decisão sobre a incompetência territorial em processo penal viola o entendimento, conforme à Constituição e imposto pelo disposto nos artigos 20.º, n.ºs 1 e 4, e, sobretudo, 32.º, n.º 1, in fine, da Lei Fundamental, do artigo 399.º do Código de Processo Penal, o qual permite que tal tipo de decisões judiciais seja recorrível, e que o recurso seja devidamente apreciado; e, por isso, tal entendimento viola também as «... garantias de defesa, incluindo o recurso» e os princípios do «acesso ao direito», da «tutela jurisdicional efectiva» e de «sindicabilidade das decisões judiciais».'
O representante do Ministério Público neste Tribunal Constitucional apresentou contra-alegações, concluindo:
'1 – Não infringe nenhuma norma ou princípio constitucionais não admitir a faculdade de recorrer da decisão proferida em processo penal sobre a incompetência territorial do Tribunal, ao qual foi distribuído determinado processo.
2 – Termos em que deverá improceder o presente recurso.'
Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
2. Fundamentação
Importa começar por salientar que não incumbe ao Tribunal Constitucional pronunciar-se sobre qual a mais correcta interpretação do direito ordinário relativamente à questão da admissibilidade de recurso das decisões sobre a competência territorial dos tribunais criminais, mas tão-só apurar se a interpretação acolhida na decisão recorrida, no sentido da irrecorribilidade desse tipo de decisões, é, ou não, constitucionalmente conforme.
Ora, a jurisprudência deste Tribunal Constitucional, embora não especificamente sobre a interpretação normativa agora em causa, já se consolidou no sentido de que a Constituição da República Portuguesa (CRP) não impõe a admissibilidade de recurso de toda e qualquer decisão judicial proferida ao longo do processo criminal.
Como se lê no Acórdão n.º 216/99 (Diário da República, II Série, n.º 182, de 6 de Agosto de 1999, pág. 11 659; e Acórdãos do Tribunal Constitucional, 43.º vol., pág. 239), a propósito da constitucionalidade da interpretação dos artigos 310.º, n.º 1, e 308.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, adoptada na decisão então recorrida, de que resultava a irrecorribilidade das decisões sobre questões prévias ou incidentais constantes do despacho de pronúncia:
'9. O problema da conformidade constitucional do artigo 310.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, em face dos princípios do duplo grau de jurisdição e da plenitude das garantias de defesa, foi já por diversas vezes abordado pelo Tribunal Constitucional, no que respeita à recorribilidade do despacho instrutório na parte em que pronuncia o arguido, tendo o Tribunal concluído no sentido da não inconstitucionalidade. Entende-se que as razões então aduzidas são transponíveis para a questão agora em discussão.
9.1. Começando por confrontar o artigo 310.º, n.º 1, do Código de Processo Penal com o artigo 20.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, e com o direito, que o recorrente invoca, a um duplo grau de jurisdição, remete-se para a doutrina do Acórdão n.º 265/94 (in Diário da República, II Série, de 19 de Julho de 1994, pág. 7239 e seguintes):
«A Constituição da República não estabelece em nenhuma das suas normas a garantia de existência de um duplo grau de jurisdição para todos os processos das diferentes espécies.
É certo que a Constituição garante a todos o 'acesso ao direito e aos tribunais, para defesa dos seus direitos e interessas legítimos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos' (artigo 20.º, n.º 1) e, em matéria penal, afirma que 'o processo criminal assegurará todas as garantias de defesa' (artigo 32.º, n.º 1). Destas normas, porém, não retira a jurisprudência do Tribunal Constitucional a regra de que há-de ser assegurado o duplo grau de jurisdição quanto a todas as decisões proferidas em processo penal. A garantia do duplo grau de jurisdição existe quanto às decisões penais condenatórias e ainda quanto às decisões penais respeitantes à situação do arguido face à privação ou restrição da liberdade ou de quaisquer outros direitos fundamentais. Sendo embora a faculdade de recorrer em processo penal uma tradução da expressão do direito de defesa (veja-se, nesse sentido, o Acórdão n.º 8/87 do Tribunal Constitucional, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 9.º vol., pág. 235), a verdade é que, como se escreveu no Acórdão n.º 31/87, do mesmo tribunal, 'se há-de admitir que essa faculdade de recorrer seja restringida ou limitada em certas fases do processo e que, relativamente a certos actos do juiz, possa mesmo não existir, desde que, dessa forma, se não atinja o conteúdo essencial dessa mesma faculdade, ou seja, o direito de defesa do arguido'.»
9.2. A lei assegura, como lhe compete para dar cumprimento aos objectivos constitucionais, que o arguido tenha possibilidade de recorrer de uma decisão condenatória. Multiplicar as possibilidades de recurso ao longo do processo seria comprometer outro imperativo constitucional: o da celeridade na resolução dos processos-crime (artigo 32.º, n.º 2, in fine, da Constituição da República Portuguesa). Ou seja, entre assegurar sempre o duplo grau de jurisdição, arrastando interminavelmente o processo, e permitir apenas o recurso das decisões condenatórias, permitindo uma melhor fluência do processo, o legislador optou decididamente pela segunda via. Esta opção foi aliás confirmada pela revisão constitucional de 1997, que aditou ao n.º 1 do artigo 32.º o segmento «incluindo o recurso». Como se escreveu no Acórdão n.º 101/98 (inédito) deste Tribunal, a intenção do legislador constituinte não foi «significar que haveria de ser consagrada, sob pena de inconstitucionalidade, a recorribilidade de todas as decisões jurisdicionais proferidas em processo criminal, mas sim que do elenco das garantias de defesa que tal processo há-de assegurar se contará a possibilidade de impugnação das decisões judiciais de conteúdo condenatório, na esteira do que já era entendido pela jurisprudência deste órgão de fiscalização» (veja-se também, no mesmo sentido, o Acórdão n.º 299/98, inédito). O arguido pode sempre, pois, recorrer da decisão condenatória que lhe seja dirigida, e aí contestar todos os vícios que derivem de uma má apreciação de qualquer questão interlocutória.
9.3. Quanto à compatibilidade entre a solução do artigo 310.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, com o princípio da plenitude das garantias de defesa, mais uma vez em equação se colocam os princípios da celeridade e da protecção dos direitos do arguido. Afirmou-se, a este propósito, no Acórdão n.º 610/96 do Tribunal Constitucional (in Diário da República, II Série, de 6 de Julho de
1996, pág. 9117 e seguintes):
«[...] o que se questiona no presente recurso é se o desígnio de celeridade, que
é consagrado constitucionalmente, legitima a irrecorribilidade de certas decisões instrutórias: justamente os despachos de pronúncia que não alteram os factos constantes da acusação do Ministério Público. E a resposta a esta questão indica que a celeridade não só é compatível com as garantias de defesa, podendo coincidir com os fins de presunção de inocência, como é instrumental dos valores
últimos do processo penal – a descoberta da verdade e a justa decisão da causa
–, próprios de um Estado democrático de direito.
[...] Apenas é irrecorrível, portanto, a decisão instrutória que pronunciar o arguido pelos factos constantes da acusação do Ministério Público. Ora, este regime especial não é arbitrário, encontrando fundamento na existência de indícios comprovados, de modo coincidente, em duas fases do processo: pelo Ministério Público, dominus do inquérito, e pelo juiz de instrução. E o Ministério Público é configurado constitucionalmente como uma magistratura autónoma (artigo 221.º, n.º 2, da Constituição), sendo concebido, no processo penal, como um sujeito isento e objectivo que pode, nomeadamente, determinar o arquivamento do inquérito em caso de dispensa da pena, propugnar, findo o julgamento, a absolvição do arguido e interpor recurso da decisão condenatória em exclusivo benefício do arguido [...].»
10. Conclui-se, assim, que não existe na interpretação dada pelo Tribunal da Relação de Lisboa aos artigos 310.º, n.º 1, e 308.º, n.º 3, do Código de Processo Penal qualquer violação do princípio da plenitude das garantias de defesa constitucionalmente consagrado. A irrecorribilidade da parte do despacho de pronúncia que decide questões prévias ou incidentais não é portanto contrária à Constituição da República Portuguesa.'
Esta orientação jurisprudencial tem sido reiterada a propósito de outras situações, como, por exemplo, a da não inconstitucionalidade da norma do artigo 291.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, na redacção dada pela Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto, no segmento em que considera irrecorrível o despacho do juiz que indefira actos requeridos que não interessarem à instrução: cf. Acórdãos n.ºs 371/00 (Diário da República, II Série, n.º 280, de 5 de Dezembro de 2000, pág. 19 578; Boletim do Ministério da Justiça, n.º 499, pág.
66; e Acórdãos do Tribunal Constitucional, 47.º vol., pág. 691), 375/00 (Diário da República, II Série, n.º 265, de 16 de Novembro de 2000, pág. 18 607; e Acórdãos do Tribunal Constitucional, 47.º vol., pág. 731), 459/00 (Diário da República, II Série, n.º 284, de 11 de Dezembro de 2000, pág. 19 811; e Acórdãos do Tribunal Constitucional, 48.º vol., pág. 317), 78/01 e 176/02 (Diário da República, II Série, n.º 131, de 7 de Junho de 2002, pág. 10 740, rectificado no n.º 147, de 28 de Junho de 2002, pág. 11 764).
A fundamentação desta orientação jurisprudencial é perfeitamente transponível para o caso presente, sendo certo que o recorrente nada aduz no sentido de a efectivação do seu julgamento no Tribunal de Sintra
(se este eventualmente aceitar a competência territorial que o Tribunal de Lisboa lhe atribuiu) ser susceptível de afectar, em termos intoleráveis, o seu direito de defesa.
3. Decisão Em face do exposto, acordam em:
a) Não julgar inconstitucionais as normas dos artigos
33.º, 34.º, 36.º e 399.º do Código de Processo Penal, interpretadas no sentido da irrecorribilidade da decisão de tribunal criminal que se declare territorialmente incompetente; e, em consequência,
b) Negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida, na parte impugnada.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em
15 ( quinze ) unidades de conta.
Lisboa, 19 de Março de 2003.
Mário José de Araújo Torres (Relator)
Benjamim da Silva Rodrigues
Paulo Mota Pinto
Maria Fernanda Palma
Luís Nunes de Almeida