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Processo n.º 234/11
2.ª Secção
Relator: Conselheira Catarina Sarmento e Castro
Acordam, em Conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação do Porto, A. e B. vieram interpor recurso de constitucionalidade, visando o acórdão de 27 de Setembro de 2010, que determinou a declaração de insolvência dos recorrentes.
Tal recurso foi interposto, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, com as alterações posteriores (Lei do Tribunal Constitucional, doravante, LTC).
No requerimento de interposição de recurso, os recorrentes referiram pretender a apreciação da “inconstitucionalidade da interpretação dada aos artigos 685º-A e 685º-C, nº2, alínea b) do CPC”
Mais referiram que “a interpretação dada (…) ao artigo 685º-A, do CPC, que considera as conclusões apresentadas pelo Recorrente em conformidade com o estatuído no referido preceito legal, não obstante as denominar de imperfeitas e dispensando-o, assim, do cumprimento de elementares deveres processuais que impendem sobre as partes e das sanções daí decorrentes, violou o disposto no artigo 13º, da CRP.
(…) sabendo-se que para o exercício do direito de defesa dos aqui Recorrentes, por via da apresentação de contra-alegações, era fundamental que as conclusões cumprissem os requisitos legais previstos, o Acórdão em apreço, ao não ordenar que o Recorrente suprisse as deficiências e imperfeições detectadas, violou o disposto no artigo 20º, da CRP, dado que impediu o cabal exercício do direito dos Recorridos contra-alegarem.”
2. Em 12 de Abril de 2011, foi proferida Decisão Sumária, com a seguinte fundamentação:
“(…) Enquadrando-se a situação sub judicio no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, é caso de proferir decisão sumária, termos em que se passa a decidir.
(…) O Tribunal Constitucional tem entendido, de modo reiterado e uniforme, serem requisitos cumulativos da admissibilidade do recurso, previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, a existência de um objecto normativo – norma ou interpretação normativa - como alvo de apreciação; o esgotamento dos recursos ordinários (artigo 70.º, n.º 2, da LTC); a aplicação da norma ou interpretação normativa, cuja sindicância se pretende, como ratio decidendi da decisão recorrida; a suscitação prévia da questão de constitucionalidade normativa, de modo processualmente adequado e tempestivo, perante o tribunal a quo (artigo 280.º, n.º 1, alínea b), da CRP; artigo 72.º, n.º 2, da LTC).
Vejamos se tais pressupostos – de verificação cumulativa – estão presentes no caso concreto.
(…) Começando por analisar a natureza do objecto do presente recurso de constitucionalidade, teremos de concluir que o mesmo não consubstancia uma verdadeira questão normativa.
Na verdade, os recorrentes não autonomizam um qualquer critério ou padrão normativo - entendido como regra abstracta vocacionada para uma aplicação genérica - utilizado como ratio decidendi da decisão recorrida.
Não obstante se reportarem, repetidamente, à “interpretação” dos preceitos legais que identificam como objecto da pretendida apreciação de constitucionalidade, resulta claro que os recorrentes centram o alvo da sindicância na própria decisão jurisdicional, enquanto acto de julgamento ou de ponderação casuística da singularidade própria do caso concreto.
Inconformados com a circunstância de o tribunal a quo não ter considerado que as concretas características das conclusões do recurso – de que veio a resultar decisão desfavorável para os recorrentes - se integravam na fattispecie da alínea b) do n.º 2 do artigo 685.º-C, ou, pelo menos, do n.º 3 do artigo 685.º A, ambos do Código de Processo Civil, os recorrentes invocam as razões da sua discordância com tal decisão – na sua vertente de juízo subsuntivo - aduzindo argumentos baseados na violação de princípios constitucionais.
Esquecem os recorrentes que o Tribunal Constitucional apenas pode sindicar a constitucionalidade de normas ou interpretações normativas e não de decisões, nomeadamente jurisdicionais, não compreendendo o nosso ordenamento jurídico a figura do recurso constitucional de amparo ou queixa constitucional.
Nestes termos, atenta a inidoneidade do objecto, decide-se não conhecer do presente recurso.”
É desta Decisão Sumária que os recorrentes vêm agora reclamar.
3. Os reclamantes, admitindo que deveriam ter enunciado e especificado a interpretação normativa, cuja sindicância pretendiam, de forma clara e inequívoca, defendem que deveriam ter sido notificados para aperfeiçoarem as deficiências do requerimento de interposição do recurso, nos termos do n.º 5 do artigo 75.º-A da LTC.
A reclamada, pugnando pelo indeferimento da reclamação, refere que os reclamantes não suscitaram qualquer questão de constitucionalidade normativa, nas alegações do recurso para o Tribunal da Relação, pelo que incumpriram o ónus de suscitação prévia da questão perante o tribunal a quo.
Conclui, pelo exposto, pela confirmação da Decisão Sumária proferida.
II – Fundamentos
4. Os reclamantes centram a sua discordância, relativamente à decisão reclamada, na circunstância de a respectiva prolação não ter sido precedida de um convite ao aperfeiçoamento, nos termos do n.º 5 do artigo 75.º-A da LTC.
Tal entendimento, porém, só pode partir de um equívoco quanto à natureza e alcance de tal convite.
Na verdade, só faz sentido formular um convite ao aperfeiçoamento quando o recorrente tiver omitido a indicação de qualquer dos elementos referidos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 75.º-A da LTC, conforme resulta expressamente dos n.ºs 5 e 6 do mesmo normativo.
Ao invés, uma errada indicação de tais elementos, nomeadamente a enunciação de uma questão desprovida de conteúdo normativo, como objecto do recurso, só poderá conduzir à inadmissibilidade do mesmo.
Sempre se dirá que, como bem salienta a reclamada, nas alegações do recurso para o Tribunal da Relação do Porto – peça processual em que os reclamantes deveriam ter suscitado ou renovado a suscitação de qualquer questão de constitucionalidade normativa que pretendessem ver ulteriormente apreciada – não foi problematizada a constitucionalidade de qualquer critério normativo, susceptível de ser utilizado como ratio decidendi da decisão recorrida, pelo que ficou indelevelmente prejudicada a possibilidade de posterior recurso de constitucionalidade vir a ser admitido. Tal circunstância sempre determinaria a inutilidade de qualquer convite ao aperfeiçoamento, ainda que se verificassem os seus abstractos pressupostos, previstos nos n.ºs 5 e 6 do artigo 75.º-A da LTC, o que – reiteramos – não sucede.
Em face do exposto, reafirmando e dando por reproduzida toda a fundamentação constante da decisão reclamada, resta apenas concluir pela impossibilidade de conhecer do objecto do recurso e, em consequência, pelo indeferimento da reclamação da decisão sumária, proferida nestes autos a 12 de Abril de 2011.
III – Decisão
5. Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, confirmar a decisão sumária reclamada no sentido do não conhecimento do objecto do recurso.
Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta, ponderados os critérios referidos no artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de Outubro (artigo 7.º do mesmo diploma).
Lisboa, 6 de Julho de 2011. – Catarina Sarmento e Castro – João Cura Mariano – Rui Manuel Moura Ramos.