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Processo n.º 553/11
3ª Secção
Relator: Conselheiro Vítor Gomes
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. No presente recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade, interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC), em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público, o relator proferiu “decisão sumária” julgando o recurso improcedente por simples remissão para o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 109/2006, disponível em www.tribunalconstitucional.pt.
2. O recorrente reclama para a conferência nos termos seguintes:
“(…)
4º - Ora, a decisão sumária ora reclamada fundamenta o não provimento do recurso com base num acórdão já proferido por este Tribunal no ano de 2006.
5º - Todavia, note-se que tal acórdão é, salvo o devido respeito, totalmente desfasado da realidade jurídica actual.
6º - Por outras palavras, releve-se o facto de em Setembro de 2007, através da entrada em vigor da Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto o legislador ordinário ter plasmado o entendimento por nós acolhido atinente à pugnada aplicação subsidiária do diferimento do prazo para a interposição de recurso no próprio art.º 411.º, 4 do Código de Processo Penal.
7º - Ademais, se se defender o contrário, estar-se-á perante uma clara violação das garantias constitucionais conferidas ao arguido em processo penal, mormente no que ao seu direito ao recurso diz respeito.
8º - Assim, face ao exposto, somos de concluir que se torna imperativa a aplicação subsidiária das disposições do Código de Processo Civil, com a redacção que se encontrava em vigor à data, atendendo a que isto mesmo foi até introduzido no nosso ordenamento jurídico processual penal.
9.º - Por conseguinte, não poderá ser tida como justificativa da negação do provimento do recurso tal decisão de 2006.”
3. O Ministério Público responde que a reclamação improcede, pelas seguintes razões:
“(…)
3.º
Na reclamação agora apresentada, o recorrente limita-se a dizer que a jurisprudência do Tribunal se encontra desactualizada face às alterações introduzidas pela Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, ao artigo 411.º do CPP.
4.º
Ora, a simples invocação de posteriores alterações operadas a nível do direito ordinário, não constitui, por si só, sequer, um novo argumento que leve a que o Tribunal tenha de reapreciar a questão.
5.º
Diremos no entanto que, se se pode ver, nessas alterações, uma aproximação dos regimes vigentes em processo civil - na altura em que foi proferido o Acórdão nº 109/2006 - e processo penal, mantiveram-se diferenças substanciais (desde logo o momento de apresentação das alegações, num caso, e da motivação, no outro).
6.º
Ao que se poderá acrescentar que o regime processual civil foi, ele próprio, alterado pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto.
(…).”
Cumpre decidir.
4. Por acórdão de 1 de Julho de 2011, o Supremo Tribunal de Justiça rejeitou, por manifesta improcedência, um recurso interposto de um acórdão do Tribunal da Relação, acórdão este que considerara intempestivo um recurso interposto pelo ora reclamante da sentença condenatória do tribunal de 1ª instância.
A fundamentação do acórdão do Supremo é a seguinte:
“II – A questão da extemporaneidade do recurso interposto, eixo essencial da argumentação do recorrente, encontra-se resolvida com a força que lhe confere o artigo 437.º e seguintes do CPP nos termos do Acórdão do Pleno das Secções criminais n.º 9/2005 o qual decidiu fixar a seguinte jurisprudência: «Quando o recorrente impugne a decisão em matéria de facto e as provas tenham sido gravadas, o recurso deve ser interposto no prazo de 15 dias, fixado no artigo 411.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, não sendo subsidiariamente aplicável em processo penal o disposto no artigo 698.º, n.º 6, do Código de Processo Civil».
É manifesta a improcedência do recurso o qual se rejeita.”
5. O recurso de constitucionalidade tem por objecto (em sentido material) a norma constante do artigo 411.º, 1 do Código de Processo Penal, na interpretação segundo a qual ao prazo de 15 dias não acresce o prazo de 10 dias por aplicação subsidiária ao processo penal do artigo 698.º, do Código de Processo Civil (na redacção em vigor à data). Como na decisão de que se reclama foi referido, esta questão foi apreciada pelo Tribunal no acórdão n.º 109/2006 que julgou, com detalhada fundamentação, que uma tal solução normativa não violava o disposto nos artigos 20.º, 32.º e 202.º da Constituição.
O reclamante nada alega que, em substância, contrarie os fundamentos desse acórdão, que a decisão sumária reclamada assumiu como é permitido pelo n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC. Limita-se a argumentar que essa jurisprudência se encontra desactualizada face às alterações introduzidas ao artigo 411.º do Código de Processo Penal pela Lei n.º 48/2007, que vão no sentido por si propugnado.
Este argumento não é susceptível de justificar a revisão da doutrina do acórdão para que a decisão sumária remete. Com efeito, não compete ao Tribunal saber qual é a norma de direito ordinário aplicável ou a melhor interpretação dela em função dos diversos elementos de interpretação atendíveis. O que lhe cabe decidir é se a norma que a decisão recorrida efectivamente aplicou, tomada como um dado, satisfaz ou não os parâmetros constitucionais pertinentes. Ora, tem-se por evidente que a evolução do direito ordinário, por si mesma, não tem virtualidade para operar a modificação do quadro valorativo constitucional a que determinada solução normativa infra-constitucional deve ser referida.
Consequentemente, a reclamação improcede reiterando-se o entendimento do acórdão n.º 109/2006.
6. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação e condenar o recorrente nas custas, com 20 (vinte) UCs de taxa de justiça.
Lisboa, 28 de Setembro de 2011. – Vítor Gomes – Ana Maria Guerra Martins – Gil Galvão.