Imprimir acórdão
Processo n.º 295/2014
3ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. Por acórdão proferido no processo comum (coletivo) n.º 431/10.8GAPRD, o 3.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Penafiel decidiu, além do mais, condenar o arguido A., ora reclamante, pela prática de um crime de extorsão, na forma tentada, previsto e punível pelo artigo 223.º, n.º 1, do Código Penal (CP), na pena de 2 anos de prisão, um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punível pelos artigos 143.º, 145.º, n.º 1, alínea a), e n.º 2 ex vi artigo 132.º, n.º 2, alínea h), do CP, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão, um crime de detenção de arma proibida, previsto e punível pelo artigo 86.º, n.º 1, alínea d), ex vi alínea p) do n.º 3 do artigo 2.º da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, na pena de 6 meses de prisão, e um crime de tráfico e mediação de arma, previsto e punível pelo artigo 87.º, n.º 1, da mesma Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, na pena de 4 anos de prisão. Em cúmulo jurídico, condenou-se o arguido na pena única de 6 anos de prisão.
O arguido, inconformado, recorreu da decisão condenatória para o Tribunal da Relação do Porto que, por Acórdão de 13 de novembro de 2013, negou provimento ao recurso. Arguiu, ainda, a nulidade deste acórdão, o que foi indeferido por Acórdão de 11 de dezembro de 2013.
Não se conformando com o Acórdão de 13 de novembro de 2013, que negou provimento ao recurso, dele interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, mas o tribunal recorrido, por despacho do relator, não admitiu o recurso, por aplicação do Acórdão de Fixação de Jurisprudência n.º 14/2013 do Supremo Tribunal de Justiça e artigos 432.º, alínea b), e 400.º, alínea f), do Código de Processo Penal (CPP), na redação da Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto.
O arguido reclamou, então, da decisão de rejeição do recurso, ao abrigo do artigo 405.º do CPP, tendo o Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, por decisão de 10 de fevereiro de 2014, indeferido a reclamação, por considerar que, tal como julgado pela instância recorrida, o recurso é inadmissível, nos termos do artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP.
Desta decisão do Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, recorreu o arguido para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), apresentando, para o efeito, dois requerimentos autónomos, a fim de ver apreciada, por um lado, a «inconstitucionalidade da aplicação do artigo 350.º, n.º 1, do CC [Código Civil]», por violação do artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, e, por outro, a inconstitucionalidade da norma do artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP, «na aceção de não permitir o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça em caso de arguição de nulidades de acórdão».
O Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, em apreciação liminar de ambos os recursos de constitucionalidade, decidiu admitir o recurso que tem por objeto a norma do artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP, e indeferir aqueloutro onde se invoca a inconstitucionalidade do artigo 350.º, n.º 1, do CC, por ser norma não aplicada pela decisão recorrida.
É desta última decisão de rejeição do recurso que o arguido agora reclama, ao abrigo do n.º 4 do artigo 76.º da LTC, alegando, em síntese, de relevante, que observou os requisitos processuais impostos pelo artigo 75.º-A da LTC, e, caso assim se não entenda, deveria ter sido convidado a aperfeiçoar o requerimento de interposição do recurso nos termos do n.º 5 do referido artigo 75.º-A da LTC.
O Ministério Publico emitiu parecer no sentido do indeferimento da reclamação, pela razão que determinou a rejeição do recurso, pois que a decisão de indeferimento da reclamação deduzida ao abrigo do artigo 405.º do CPP, de que o reclamante recorreu, apenas aplicou a norma do artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP, e não a norma, ora sindicada, do artigo 350.º, n.º 1, do CC, revelando o recurso, neste contexto, manifestamente inútil.
2. Cumpre apreciar e decidir.
Como relatado, o reclamante recorreu para o Tribunal Constitucional da decisão do Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de fevereiro de 2014, que indeferiu a reclamação por si deduzida ao abrigo do artigo 405.º do CPP. Considerou o Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, para assim decidir, que o recurso interposto do acórdão condenatório do Tribunal da Relação do Porto para o Supremo Tribunal de Justiça era irrecorrível, nos termos do artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP, tal como sustentado pelo relator no Tribunal da Relação, pois que «o arguido-reclamante foi condenado na 1.ª instância e na Relação – em dupla conformidade – na pena única de 6 anos de prisão».
É, pois, manifesto que a decisão recorrida não aplicou o disposto no artigo 350.º, n.º 1, do Código Civil, seja em que sentido for, pelo que é inútil aferir da questão da inconstitucionalidade, objeto do recurso rejeitado pela decisão ora em reclamação, que versa o referido preceito legal.
Com efeito, ainda que o objeto do recurso fosse idóneo à formulação de um juízo de inconstitucionalidade normativa – e não se afigura que assim seja, pois que nem sequer se sindica a inconstitucionalidade da norma do artigo 350.º, n.º 1, do CC, mas da sua alegada aplicação ao caso concreto, o que, como é sabido, extravasa os poderes de cognição do Tribunal Constitucional -, o certo é que a eventual procedência do recurso, com pronúncia no sentido da inconstitucionalidade do citado preceito legal, não teria a virtualidade de operar modificação do julgado, que nele se não fundamenta juridicamente.
Impõe-se, por isso, e sem necessidade de mais considerações, o indeferimento da presente reclamação, sendo certo que, estando em causa pressuposto processual insuprível de que depende o conhecimento do recurso de constitucionalidade (artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC) – e não mero requisito formal do requerimento de interposição do recurso -, nunca seria de aplicar o invocado n.º 5 do artigo 75.º-A da LTC, preordenado ao suprimento de omissões formais do requerimento de interposição do recurso.
3. Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta.
Lisboa, 25 de Março de 2014.- Carlos Fernandes Cadilha – Maria José Rangel de Mesquita – Maria Lúcia Amaral.