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Processo n.º 270/11
3.ª Secção
Relatora: Conselheira Ana Maria Guerra Martins
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos do Supremo Tribunal Administrativo, a Relatora proferiu a Decisão Sumária n.º 265/2011:
“I – RELATÓRIO
1. Nos presentes autos, em que é recorrente A. e recorrida Ordem dos Advogados, o primeiro apresentou o seguinte requerimento:
“(…) vem interpor recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 70º n.º 1, alínea a) da Lei do Tribunal Constitucional, Lei n.º 18/82” (fls. 1089).
Juntamente com o referido requerimento, foram juntas alegações escritas, através das quais o recorrente reitera que pretende interpor um recurso ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, mas através das quais conclui nos seguintes termos:
“3 – Na decisão ora recorrida junto do STA, Tribunal «a quo», foi decidido não admitir o recurso de revista, cfr. o disposto no n.º 4 do art. 381º do C.P.C.
4 – E o recorrente nest[a] peça, revertendo-se ao caso concreto, o que se constata é que a aplicação do n.º 4 do art. 381º do CPC ao acórdão recorrido está ferido de inconstitucionalismo material.
(…)
Pelo exposto, concedendo provimento ao recurso:
a) julgar inconstitucional a norma que se extrai do n.º 4 do art. 381º do CPC, e a revogação do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA) - «Tribunal a quo».” (fls. 26 e 27)
2. Para melhor compreensão da questão ora em apreço, importa notar que, pela 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo, em conferência, foi proferido acórdão, em 13 de Janeiro de 2011 (fls. 144 a 149), que rejeitou a admissão de recurso ordinário então interposto pelo recorrente. Deste acórdão, foi apresentada reclamação (fls. 3 a 6), ao abrigo do artigo 144º, n.º 3, do CPTA, para o Presidente do Supremo Tribunal Administrativo, que foi alvo de despacho de não conhecimento, proferido em 15 de Fevereiro de 2011, por absoluta inadmissibilidade legal daquele meio processual (fls. 15 a 17).
Cumpre, então, apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
3. Mesmo tendo o recurso sido admitido por despacho do tribunal “a quo” (cfr. fls. 31) com fundamento no n.º 1 do artigo 76º da LTC, essa decisão não vincula o Tribunal Constitucional, conforme resulta do n.º 3 do mesmo preceito legal, pelo que se deve começar por apreciar se estão preenchidos todos os pressupostos de admissibilidade do recurso previstos nos artigos 75º-A e 76º, nº 2, da LTC.
Se o Relator verificar que algum, ou alguns deles, não foram preenchidos, pode proferir decisão sumária de não conhecimento, conforme resulta do n.º 1 do artigo 78º-A da LTC.
4. Vários motivos justificam a prolação da presente decisão sumária de não conhecimento.
Desde logo, verifica-se uma evidente e manifesta contradição entre o pedido formulado pelo recorrente e o tipo de recurso de constitucionalidade interposto. Assim é porque o recurso foi interposto ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70º da LTC e, portanto, pressupunha a verificação de uma decisão de desaplicação de norma jurídica. Sucede, porém, que é o próprio recorrente que vem expressamente desmentir a existência de tal desaplicação normativa.
É certo que o recorrente nem sequer indica, em sede de requerimento de interposição de recurso – como lhe cabia, nos termos do n.º 1 do artigo 75º-A da LTC –, qual a norma jurídica pretende ver apreciada por este Tribunal. Não é menos certo que as alegações juntas ao referido requerimento são manifestamente extemporâneas, já que, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 79º da LTC, aquelas apenas podem ser proferidas perante o próprio Tribunal Constitucional – e nunca perante o tribunal recorrido –, para além de se encontrarem dependentes de prévio despacho do Relator para o efeito. Contudo, independentemente de as alegações serem extemporâneas, não pode deixar de constatar-se que delas decorre que, afinal, o que o recorrente pretende é ver apreciada a inconstitucionalidade de uma determinada interpretação do artigo 381º, n.º 4, do CPC, alegadamente aplicada pela decisão recorrida. Significa isto que o recurso de constitucionalidade deveria ter sido interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC e não da respectiva alínea a).
Assim sendo, ao analisar-se a decisão recorrida – in casu, o despacho proferido pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, em 15 de Fevereiro de 2011 (fls. 15 a 17) – verifica-se que aquele nunca aplicou (ou sequer desaplicou) a norma extraída do referido n.º 4 do artigo 381º do CPC, segundo qualquer interpretação normativa. Pelo contrário, aquele despacho limita-se a apreciar da validade de reclamação de acórdão de conferência, deduzida ao abrigo do artigo 144º, n.º 3, do CPTA, pelo que sempre seria forçoso concluir pela impossibilidade legal de conhecimento do objecto do presente recurso, por falta de aplicação (ou de desaplicação) efectiva da norma jurídica que – hipoteticamente – corresponderia a interpretação acolhida (ou afastada) pela decisão recorrida.
III – DECISÃO
Nestes termos, ao abrigo do n.º 1 do artigo 78º-A da LTC, e pelos fundamentos expostos, decide-se não conhecer do objecto do presente recurso.
Custas devidas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 UC´s, nos termos do n.º 2 do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de Outubro.”
2. O recorrente vem agora reclamar para a conferência, ao abrigo do artigo 78º-A, nº 3, da LTC, podendo extrair-se as seguintes conclusões:
“1 — O reclamante no objecto do recurso para o Tribunal Constitucional, veio solicitar a apreciação da inconstitucionalidade da interpretação do artigo 381º n.º 4 do C.P.C, ao recurso interposto junto do Supremo Tribunal Administrativo.
2 — Fê-lo, e por lapso, requereu tal recurso constitucional tendo a alínea a) do n.º 1 do art. 70º da L.T.C, quando deveria ter sido a alínea b) da mesma norma (n.º 1 da art. 70º LT.C.).
3 — Ora, é manifestamente claro tal lapso tendo em conta o teor do recurso constitucional (apreciação constitucional da interpretação do art. 384º n.º 4 do C.P.C..
4— Perante tal manifesto lapso da alínea e dentro dos poderes atribuídos no n.º 1 do artigo 78º - B da LT.C., o recorrente/reclamante deveria ter sido convidado a aperfeiçoar e corrigir tal lapso e erro, tendo em conta o objecto e pedido suscitado no recurso constitucional (pedido da apreciação de inconstitucionalidade duma norma).”
3. Notificada para o efeito, a recorrida deixou expirar o prazo sem que tenha vindo aos autos apresentar qualquer resposta.
II – Fundamentação
4. Através da presente reclamação, o recorrente apenas invoca um alegado lapso de escrita, relativo à identificação da alínea do n.º 1 do artigo 70º da LTC, ao abrigo da qual foi interposto o recurso.
Sucede porém que, conforme já registado pela decisão ora reclamada, a contradição na identificação do tipo de recurso não constituiu o único fundamento, antes configurando um entre vários fundamentos que justificaram o não conhecimento do objecto do recurso. Entre tais fundamentos, encontram-se a falta de identificação da norma reputada de inconstitucional e – ainda que concedendo-se a possibilidade de dedução de tal norma a partir de alegações escritas extemporaneamente entregues – a falta de aplicação efectiva de interpretação normativa extraída do n.º 4 do artigo 381º do CPC.
Ora, conforme decorre da presente reclamação, o recorrente não invocou um único argumento que afastasse aquele juízo de falta de aplicação efectiva da norma que aquele reputa de inconstitucional (ainda que em sede de alegações escritas extemporâneas). Na medida em que o artigo 79º-C da LTC impede o Tribunal Constitucional de conhecer de questões de inconstitucionalidade de normas que não tenham sido efectivamente aplicadas pelos tribunais recorridos, andou bem a decisão reclamada.
Assim, não subsistem quaisquer fundamentos para reforma da decisão reclamada.
III – Decisão
Em face do exposto, decide-se indeferir a presente reclamação.
Fixam-se as custas devidas pelo recorrente em 20 UC´s, nos termos do artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de Outubro.
Lisboa, 14 de Julho de 2011. – Ana Maria Guerra Martins – Vítor Gomes – Gil Galvão.