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Processo n.º 386/2011
3ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Cadilha
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. Pela decisão sumária n.º 339/2011, proferida nos autos, não se tomou conhecimento do recurso de constitucionalidade interposto pelos recorrentes A. e B., por inidoneidade do seu objecto e inobservância do ónus de suscitação prévia de questão que, por normativa, obrigasse à pronúncia do Tribunal recorrido.
Os recorrentes, inconformados, dela reclamam para a conferência, invocando, de essencial, que, quer no requerimento aperfeiçoado de interposição do recurso, quer nas alegações que apresentaram perante o Tribunal recorrido, expressamente enunciaram, como princípios constitucionais violados pela decisão recorrida, «o princípio constitucional da presunção de inocência, garantias de defesa do arguido e princípio do inquisitório» subjacentes à norma do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), pelo que, tendo o Tribunal recorrido confirmado a decisão de primeira instância que, em violação do artigo 340.º do Código de Processo Penal (CPP), não promoveu a realização de diligências de prova essenciais à descoberta da verdade e boa decisão da causa, incorreu em inconstitucionalidade sindicável perante o Tribunal Constitucional.
O Ministério Público, em resposta, pugna pela manutenção do julgado, pelos fundamentos em que assentou.
2. Cumpre apreciar e decidir.
Embora reproduzam, na presente reclamação, sem os contrariar, os fundamentos de direito que sustentaram a decisão sumária reclamada, no que respeita à estruturação normativa em que assenta o sistema do recurso de constitucionalidade, afigura-se claro que os reclamantes, ao defenderem a verificação de tais premissas processuais no recurso que concretamente interpuseram perante o Tribunal Constitucional, laboram num equívoco.
Com efeito, quando a lei restringe os poderes de fiscalização do Tribunal Constitucional à aferição da constitucionalidade das normas jurídicas, isto é, da sua conformidade com tais parâmetros fundamentais de valia jurídica, quer significar que o que pode ser sujeito a um tal controlo são apenas normas jurídicas ou, no máximo, interpretações, de alcance geral e abstracto, extraídas de dada fonte legal, que o Tribunal recorrido, apesar das suspeitas de inconstitucionalidade sobre elas lançadas pela parte ou recorrente, aplicou como fundamento jurídico da decisão.
Mas uma coisa são os princípios ou normas constitucionais violados; outra, as normas jurídicas que integram o ordenamento jurídico infra-constitucional e lhe devem obediência.
O que constitui o objecto do recurso de constitucionalidade, ou deve integrá-lo, para que possa ser conhecido pelo Tribunal Constitucional, são aquelas últimas e essas os recorrentes, apesar de expressamente notificados para o efeito, não indicaram.
Na verdade, ao esclarecerem no requerimento aperfeiçoado de interposição do recurso que este foi interposto «(…) por violação das garantias de defesa do arguido, da presunção de inocência e princípio do contraditório previstos no artigo 32.º da C.R.P., violação consubstanciada na não aplicação do artigo 340.º do C.P.P. (Princípio da investigação oficiosa) (…)», limitaram-se a indicar os princípios e normas constitucionais, legalmente vertidos naquele último preceito legal, que consideram ter sido violados, ou seja, os parâmetros (constitucionais) de aferição da alegada inconstitucionalidade.
Mas, no que se refere à imposta e decisiva enunciação da norma violadora, nada indicaram de processualmente prestável pois que, tal como sumariamente sustentado, não constitui questão de inconstitucionalidade normativa susceptível de reapreciação pelo Tribunal Constitucional a de saber «se o Tribunal recorrido, ao não aplicar alegadamente o artigo 340.º do Código de Processual Penal (CPP), ordenando a produção de diligências probatórias que os recorrentes reputam de essenciais à descoberta da verdade, violaram a Lei Fundamental», por exclusivamente atinente ao exercício da função jurisdicional cujo controlo directo extravasa o âmbito das suas competências de fiscalização.
Assim sendo, é manifesto que a reclamação, que apenas se limita a insistir no contrário, não pode proceder, reiterando-se, com a decisão sumária reclamada, que o objecto do recurso, tal como delimitado pelos ora reclamantes, não é, por carecido de conteúdo normativo, idóneo a suscitar a intervenção fiscalizadora deste Tribunal Constitucional.
Por outro lado, assentando a alegação feita perante o Tribunal recorrido na mesma linha de argumentação, dirigida à decisão perante este sindicada e não a qualquer critério normativo por esta efectivamente aplicado em violação da Constituição, como facilmente se constata da sua leitura, é de manter, também por inobservância do ónus de prévia suscitação de questão de inconstitucionalidade normativa (artigos 70.º, n.º 1, alínea b), e 72.º, n.º 2, da Lei do Tribunal Constitucional), a decisão de não conhecimento do objecto do recurso.
3. Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação.
Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça, para cada um deles, em 20 (vinte) unidades de conta.
Lisboa, 3 de Outubro de 2011. – Carlos Fernandes Cadilha – Maria Lúcia Amaral – Gil Galvão.