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Processo n.º 126/11
1ª Secção
Relator: Carlos Pamplona de Oliveira
Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. Notificado do Acórdão n.º 199/2011, o recorrente A. apresentou reclamação do seguinte teor:
[...] ao abrigo dos dispositivos dos art.º 69.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, e art.ºs 668.º, n.º 1, alíneas b) e d), 716.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (com correspondência no art.º 379.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal) arguir a sua nulidade, ancorada, com todo o respeito devido, e salvo melhor opinião, em falta de fundamentação clara e perceptível e omissão de pronúncia, pelas razões seguintes:
O aresto ora arguido de nulidade limita a sua fundamentação a três muito escassos parágrafos onde se conclui haver “(...) uma crítica ao conteúdo (expresso ou implícito) da decisão recorrida, mas não concretiza a identificação das normas jurídicas para efeitos de poderem ser fiscalizadas pelo Tribunal Constitucional (...)” para alcançar juízo de que “(...) os enunciados formulados pelo recorrente como objecto do recurso não representam normas jurídicas e, por isso, o Tribunal não pode conhecer do recurso.”.
Ora, o item 2 do requerimento de interposição de recurso ante este Tribunal faz declaração expressa e formal de que:
“Pretende-se com ele ver apreciada a inconstitucionalidade interpretativa das normas contidas:
a) no art.º 78.º, n.º1, da Lei n.º28/82, de 15 de Novembro e art.ºs 406.º, n.º 2, 407.º, n.º 1, e 408.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, invocados na conclusão 1.ª do recurso apreciado pelo tribunal a quo;
b) no art.º 303.º, n.º 4, da mesma lei adjectiva, como arguido na conclusão 7.ª da mesma peça processual; e
c) no art.º 308. ‘ n.º 1, do citado C.P.P., apontado nas conclusões 20.ª e 21.ª do aludido recurso;(...)”
deixando assim expressas, na nossa modesta opinião, todas as normas legais arguidas de inconstitucionalidade interpretativa, para, de seguida, indicar as vícios apontados, pela mesma ordem de referência:
a) quanto à primeira das supra elencadas a tese não expressa mas emergente da actuação do tribunal de primeira instância ao fazer prosseguir a tramitação instrutória sem atender ao recurso interposto – sem que a Veneranda Relação sobre essa questão se tenha pronunciado invocando posterior decisão passada em julgado inadmitindo o recurso por razões meramente formais (cf. pág. 17, ah a, do acórdão TRG) - de que mesmo durante a pendência do recurso para o Tribunal Constitucional cujo objecto material seria supervenientemente inútil e, por isso, com efeito suspensivo do processo, como expressamente requerido no item 6 do correspondente requerimento de interposição e previsto na norma do art.º 408.º, n.º 3, do C.P.P.;
b) no que tange à segunda a tese expressa afinal da página 1 do acórdão tirado sobre a nulidade, exprimindo que o tribunal de instrução não estava obrigado a remeter ao Ministério Público o acórdão da Relação que fixava a tipologia agravada ao imputado crime de difamação – retirando o impulso processual ao assistente – porque tal matéria não constituía qualquer alteração (substancial ou não) da factualidade indiciada;
c) e no que diz respeito à terceira e última das questões supra a interpretação que o tribunal de instrução faz quanto à falta do elemento subjectivo tipficante do ilícito, em critério arbitrário e desviante dos elementos probatórios relativos às relações de amizade entre a arguida e um dos sujeitos processuais dos autos onde foi praticado o denunciado crime, impedindo-os, ignorando-os, e/ou subvertendo-os, para além do entendimento da Relação a quo quanto a que os vícios respeitantes a erro notório na apreciação da prova indiciária não terem aplicação em sede de instrução por a norma do n.º 2 do art.º 410.º se reportar a “do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum.”
consignando com a mesma clareza e suficiência que esses entendimentos eram:
“(...)sempre em reporte aos entendimentos transparecentes nas sucessivas decisões que foram proferidas mesmo quando imperfeitamente expressas, e/ou com posterior explicitação no derradeiro acórdão e que, num esforço de percepção se sumariam:(...)”.
Destarte afigura-se ao ora arguente que, ao contrário do anotado no acórdão aqui objecto da arguição de nulidade, salvo melhor opinião, e o merecido respeito, indicou com precisão e rigor as normas legais violadas e a interpretação que delas era feita como se lhe alcançava perceber da escassa, ou mesmo inexistente, fundamentação nas decisões recorridas.
É que apesar de imperfeita ou insuficientemente invocadas essas normas estavam ali aplicadas, na percepção que se conseguia, e em sentido errado em razão da solução jurídica final.
Jamais poderia o arguente cumprir o dever processual de adequar o seu recurso ante este Tribunal com a vinculação do entendimento que delas faziam os tribunais a quo sem fazer referência ao texto das decisões respectivas.
Porém, isto não implica que o seu recurso houvesse sido formulado sobre a decisão em si mesma mas apenas e só tirado sobre aquelas normas que se manifestam aplicadas nesse percepcionado sentido.
E assim que o acórdão sob respeitosa crítica apesar de cumprir as premissas processualmente exigidas acaba por não conhecer da questão que cerceava in limine essa adequação formal, afectando assim o objecto e motivo recursivo.
Uma tal omissão de pronúncia, importante para a boa apreciação do recurso e aceitação pelo arguente da correspondente decisão é cominada, na nossa modesta opinião, com nulidade, a sanar devidamente, bem como, respeitosamente, a falta de fundamentação ao não se deixar ali expresso, quais os enunciados formulados, dos apresentados pelo arguente e supra transcritos, que não representam normas jurídicas e que, por isso, impedem o conhecimento do recurso este Subido Tribunal.
Aliás, a indicação dessa fundamentação, modestamente e respeitosamente, impede o arguente de avaliar a potencialidade dessa decisão poder, eventualmente, colidir com jurisprudência que possa estribar recurso para o plenário do Tribunal Constitucional cerceando-se o direito do arguente ao recurso legal e constitucionalmente garantido.
Em suma se dirá que existe nulidades a sanar por:
a) omissão de pronúncia impedindo, assim, muito respeitosamente, de o recorrente ter que se socorrer de presunções sobre o entendimento dos tribunais recorridos por falta, na nossa modesta opinião, de fundamentação bastante quanto à interpretação das normas legais efectivamente aplicadas, ainda que nem sempre invocadas e, também respeitosamente;
b) falta de fundamentação sobre quais os enunciados recursivos que não se reportam a normas jurídicas concretas.
Termos em que se requer, com o maior respeito, o integral provimento do presente requerimento com a sanação das nulidades arguidas através de acórdão corrector que expresse claramente os motivos, de facto e de direito, que conduzem à decisão formulada.
2. O representante do Ministério Público neste Tribunal respondeu à reclamação nos seguintes termos:
1º Pela Decisão Sumária n.º 141/2011, não se conheceu do recurso porque o recorrente não enunciara qualquer questão de natureza normativa, que pudesse constituir objecto idóneo do recurso de constitucionalidade.
2º O recorrente reclamou para a conferência tendo o Tribunal proferido o Acórdão n.º 199/2011, que indeferiu a reclamação e manteve a Decisão Sumária.
3º Na Decisão Sumária e posteriormente no Acórdão transcreve-se a parte pertinente do requerimento de interposição do recurso, donde resultava, com evidência, que “nenhuma das asserções corresponde à realidade que, no direito constitucional português se chama norma jurídica ainda que pretensamente retiradas dos preceitos do Código de Processo Penal”.
4.º Por outro lado, entendeu-se – e bem – que a reclamação não exprimia uma verdadeira crítica aquele entendimento, como, aliás, já resultava do que dissemos na resposta que apresentámos à reclamação para a conferência (fls. 1027).
5.º O Acórdão pronunciou-se sobre a questão que devia e encontra-se devidamente fundamentado, constituindo a presente arguição, no essencial, uma discordância com o decidido.
6º Pelo exposto, deve indeferir-se a pretensão do recorrente.
3. Cumpre decidir. Invoca, em suma, o requerente que o Acórdão n.º 199/2011 seria nulo por não especificar os fundamentos que justificam a decisão e porque não tratou de todas as questões que deveria conhecer.
Mas não é verdade.
Ao Tribunal cumpria unicamente analisar as razões que fundamentaram a decisão de não conhecimento do objecto do recurso interposto. E fê-lo no seguinte trecho:
(...) Cumpre, no entanto, reafirmar o entendimento já expresso na Decisão Sumária n.º 141/2011, segundo o qual, tendo o presente recurso carácter normativo, ao Tribunal apenas cabe apreciar normas jurídicas. Ora, os enunciados formulados pelo recorrente como objecto do recurso não representam normas jurídicas e, por isso, o Tribunal não pode conhecer do recurso.(...)
Esta asserção revela, também, que não foi omitido o fundamento da decisão de não conhecer do recurso. A decisão foi tomada porque, na verdade, os enunciados formulados pelo recorrente como objecto do recurso não representam normas jurídicas e, por isso, o Tribunal não pode conhecer do recurso.
Deduz-se, aliás, da reclamação que o recorrente efectivamente se apercebeu do motivo que suporta a decisão em causa. O que se passa é que não está de acordo com esse julgamento, por entender que se mostram plenamente verificados os requisitos a que a lei subordina o conhecimento do recurso. No entanto, deverá aceitar que se mostra precludida a oportunidade processual para debater tal questão, por força do disposto no n.º 1 do artigo 666º do Código de Processo Civil, razão pela qual já não é possível voltar a discutir essa matéria.
4. Termos em que se decide indeferir a reclamação.
Custas pelo reclamante – sem prejuízo do benefício com que litiga – fixando-se a taxa de justiça em 15 (quinze ) unidades de conta.
Lisboa, 1 de Junho de 2011.- Carlos Pamplona de Oliveira – Maria João Antunes – Gil Galvão.