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Processo n.º 218/11
1ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira
Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. A fls. 1261 foi proferida a Decisão Sumária n.º 257/11 com o seguinte teor:
«Nos termos do n.º 1 do artigo 78.º-A da Lei do Tribunal Constitucional, decide-se:
1. A., S.A. recorre do acórdão da Relação de Lisboa de 2 de Fevereiro de 2011 ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro (LTC). Invoca o seguinte:
[...] Tendo surgido dúvidas a este Tribunal relativamente às normas cuja constitucionalidade a Recorrente pretende questionar, vem esta, por via do presente requerimento, clarificar o teor de tais normas.
I. Primeira norma cuja apreciação se requer
8. A Recorrente pretende, em primeiro lugar, ver apreciada a (in)constitucionalidade da norma que resulta da conjugação dos artigos 1.º do RGCO, 31.º n.ºs 1 e 2 alínea b) do CP e 108.º n.º 1 e 113.º n.º 1 alínea ttt), ambos do REGICOM, na interpretação seguida pelos Tribunais que neste processo apreciaram a questão (Tribunal do Comércio de Lisboa e Tribunal da Relação de Lisboa).
9. Mais concretamente, a interpretação normativa que se questiona é aquela segundo a qual constitui ilícito típico (artigo 1.º do RGCO), para efeitos do disposto nos artigos 108.º n.º 1 e 113.º n.º 1 alínea ttt), ambos do REGICOM, o comportamento que consiste na não prestação, por um particular, de informações solicitadas pelo ICP-ANACOM, quando esse particular – em tempo e na pendência do prazo de cumprimento da ordem – exerce os seus direitos de resistência e de acção relativamente à ordem de prestação de informações (artigo 31 .º n.ºs 1 e 2 alínea b) do CP), recorrendo, para o efeito, aos meios administrativos e judiciais ao seu dispor.
10. As normas constitucionais violadas são, na perspectiva da Recorrente, as constantes dos artigos 21 º e 29.º n.º 1 da CRP, ou seja, respectivamente, a norma que atribui aos particulares o direito de resistirem a ordens que consideram ilegais e a norma que determina que só é punível o comportamento cuja punibilidade não se encontre excluída pela ordem jurídica na sua totalidade.
II. Segunda norma cuja apreciação se requer
11. A Recorrente pretende, em segundo lugar, ver apreciada a (in)constitucionalidade da norma que resulta da conjugação dos artigos 8.º n.º 1 do RGCO e 108.º n.º 1 e 113.º n.º 1 alínea ttt), ambos do REGICOM, na interpretação seguida pelos Tribunais que neste processo apreciaram a questão (Tribunal do Comércio de Lisboa e Tribunal da Relação de Lisboa).
12. Mais concretamente, a interpretação normativa que se questiona é aquela segundo a qual sindicar uma ordem do ICP-ANACOM que determina a prestação de informações a esta Autoridade (artigo 108.º n.º 1 do REGICOM), requerendo a respectiva suspensão de eficácia, corresponde a representar, ainda que na pendência do pedido de suspensão (e, portanto, antes de a ordem se tomar eficaz), o incumprimento dessa ordem e, nessa medida, corresponde a incumprir a obrigação de prestar informações com dolo (artigos 8.º n.º 1 do RGCO e 113.º n.º 1 alínea ttt) do REGICOM).
13. As normas constitucionais violadas são, na perspectiva da Recorrente, as constantes dos artigos 2.º, 20.º e 21.º da CRP, ou seja, respectivamente, a norma que institui a separação do poder administrativo do poder judicial, a norma que atribui aos particulares o direito de acesso aos Tribunais e a norma que confere o direito de os particulares resistirem a ordens que consideram ilegais.
III. Terceira norma cuja apreciação se requer
14. A Recorrente pretende, em terceiro lugar, ver apreciada a (in)constitucionalidade da norma que resulta da conjugação dos artigos 33.º e 54.º n.º 2 do RGCO e 112.º e 115.º ambos do REGICOM, na interpretação seguida pelos Tribunais que neste processo apreciaram a questão (Tribunal do Comércio de Lisboa e Tribunal da Relação de Lisboa).
15. Mais concretamente, a interpretação normativa que se questiona é aquela segundo a qual os artigos 112.º e 115.º do REGICOM e 33.º e 54.º n.º do RGCO atribuem ao ICP-ANACOM poderes para aplicar coimas aos particulares por infracções que correspondem ao incumprimento de ordens por si dadas, quando a legitimidade dessas ordens foi tempestivamente posta em causa perante os Tribunais e o comportamento punido é anterior ao conhecimento da decisão dos Tribunais sobre a legitimidade das ordens.
16. As normas constitucionais violadas são, na perspectiva da Recorrente, as constantes dos artigos 2.º e 32. n.º 5 da CR.P, ou seja, respectivamente, a norma que institui a separação do poder administrativo do poder judicial e o princípio do acusatório em direito sancionatório.
IV. Quarta norma cuja apreciação se requer
17. A Recorrente pretende, em quarto e último lugar, ver apreciada a (in)constitucionalidade da norma que corresponde ao artigo 113.º n.ºs 1 e 2 do REGICOM, na aplicação seguida pelos Tribunais que neste processo condenaram a Recorrente com base nesta norma (Tribunal do Comércio de Lisboa e Tribunal da Relação de Lisboa).
18. Mais concretamente, o que se questiona é a (in)constitucionalidade de tal norma por ser excessivamente aberta nos seus limites e aplicável a um universo de casos de gravidade absolutamente díspar.
19. As normas constitucionais violadas são, na perspectiva da Recorrente, os artigos 29.º nºs 1 e 3 da CRP (princípios da segurança jurídica e da tipicidade), 30.º da CRP (princípio da proibição das sanções de duração ilimitada ou indefinida) e 2.º (princípio da separação de poderes) e 9.º alínea b) (norma que atribui ao Estado a obrigação de garantir o respeito pelos direitos e liberdades fundamentais) também do Texto Fundamental.
2. As três primeiras 'normas' enunciadas pela recorrente não apresentam estrutura normativa. Na primeira, a recorrente «questiona» que se considere «ilícito típico» o comportamento que consiste na não prestação de informações solicitadas pelo ICP-ANACOM, «quando esse particular – em tempo e na pendência do prazo de cumprimento da ordem – exerce os seus direitos de resistência e de acção relativamente à ordem de prestação de informações (artigo 31 .º n.ºs 1 e 2 alínea b) do CP), recorrendo, para o efeito, aos meios administrativos e judiciais ao seu dispor». Trata-se, na verdade de uma censura dirigida à decisão recorrida e não à norma. O que, através de deste enunciado, a recorrente questiona, é facto de o tribunal haver sancionado a recorrente pela não prestação de informações, apesar de «em tempo e na pendência do prazo de cumprimento da ordem» ter recorrido «aos meios administrativos e judiciais ao seu dispor».
Na segunda, questiona o entendimento segundo o qual «sindicar uma ordem do ICP-ANACOM que determina a prestação de informações» a esta Autoridade, «requerendo a respectiva suspensão de eficácia, corresponde a representar, ainda que na pendência do pedido de suspensão (e, portanto, antes de a ordem se tomar eficaz), o incumprimento dessa ordem e, nessa medida, corresponde a incumprir a obrigação de prestar informações com dolo». É igualmente evidente que esta formulação visa censurar a actuação do tribunal em vez do critério normativo que lhe está subjacente.
De seguida, pretende a recorrente questionar a competência do ICP-ANACOM «para aplicar coimas aos particulares por infracções que correspondem ao incumprimento de ordens por si dadas, quando a legitimidade dessas ordens foi tempestivamente posta em causa perante os Tribunais e o comportamento punido é anterior ao conhecimento da decisão dos Tribunais sobre a legitimidade das ordens». Trata-se, aliás, da mesma realidade descrita da 'norma' anterior, embora apresentada com outro enunciado.
Em qualquer destes casos, os normativos invocados não sustentam a existência de critérios jurídicos de onde hajam sido retiradas as ponderações jurisdicionais em causa; de resto, a decisão recorrida orientou-se em sentido claramente divergente da situação que a recorrente pretende retratar nestes enunciados, designadamente quanto à prevalência do comportamento omissivo censurável.
Por último, visa a recorrente questionar a norma do artigo 113.º n.ºs 1 e 2 do REGICOM, por ser «excessivamente aberta nos seus limites e aplicável a um universo de casos de gravidade absolutamente díspar». Mas é evidente que esta 'norma' é, na verdade, um vasto conjunto de normas, que especifica detalhadamente diversíssimos comportamentos que constituem contra-ordenações, e não pode ser sindicada – sob o ponto de vista da sua constitucionalidade – com a alegação de ser «excessivamente aberta nos seus limites e aplicável a um universo de casos de gravidade absolutamente díspar». Na verdade, desse conjunto normativo foi retirada uma específica norma que foi aplicada ao caso concreto, mediante a preexistência de determinados pressupostos de facto, e com um âmbito próprio. A censura admissível traduzir-se-ia na impugnação desse segmento normativo, efectivamente aplicado ao caso concreto: não é possível sindicar, em sede de fiscalização concreta, um conjunto normativo por ser, na diversidade da previsão de situações que contempla, «excessivamente» aberta nos seus limites e aplicável a um universo de casos de «gravidade absolutamente díspar», porque, na verdade, tal norma não foi sequer aplicada, com essa extensão, ao caso.[...]»
2. Inconformada, a A. reclama desta decisão para a conferência na peça junta aos autos a fls. 1275/1297, concluindo:
Nestes termos, vem a Recorrente apresentar sua Reclamação para a Conferência do Tribunal Constitucional, requerendo que seja revogada a Decisão Sumária 257/2011 e que o seu requerimento de interposição de recurso, apresentado ao abrigo do disposto no artigo 70.º n.º 1 alínea b) da LTC, seja admitido e a Recorrente seja notificada para apresentar as suas alegações.
3. A Autoridade Nacional de Comunicações (ICP-ANACOM) respondeu. Considera «totalmente improcedente» a reclamação apresentada. Também o representante do Ministério Público neste Tribunal conclui o seu parecer sustentando que a reclamação, «por improcedente, deve ser indeferida» e, em consequência, confirmada a decisão sumária ora reclamada.
4. Cumpre decidir. Comecemos, por facilidade de exposição, pela última norma cuja conformidade constitucional a recorrente pretende questionar. A A. invoca que a «norma que corresponde ao artigo 113.º n.ºs 1 e 2 do REGICOM» é inconstitucional. O preceito, o artigo 113.º do regime jurídico aprovado pela Lei das Comunicações Electrónicas, (Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro, alterada pelo Decreto-Lei n.º 176/2007, Lei n.º 35/2008, Decreto-lei n.º 123/2009 e Decreto-Lei n.º 258/2009) tem o seguinte teor:
Artigo 113.º
Contra-ordenações e coimas
1 - Sem prejuízo de outras sanções aplicáveis, constituem contra-ordenações:
a) O incumprimento da decisão da ARN tomada no processo de resolução de litígios, em violação do n.º 1 do artigo 10.º e do n.º 2 do artigo 12.º;
b) A falta de cooperação com a ARN, em violação do n.º 5 do artigo 10.º;
c) O incumprimento das obrigações previstas nos n.ºs 1, 2 e 6 do artigo 21.º;
d) A violação dos termos do artigo 23.º;
e) O incumprimento da obrigação de comunicação dos acordos prevista no n.º 1 do artigo 25.º;
f) O incumprimento da determinação de partilha a que se refere o n.º 2, bem como o desrespeito das condições determinadas nos termos dos n.ºs 3 e 4, todos do artigo 25.º;
g) O incumprimento das obrigações previstas nos n.ºs 1, 3 e 4 do artigo 26.º;
h) O incumprimento de qualquer das condições definidas nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 27.º, com excepção da constante da alínea r) do n.º 1 do mesmo artigo;
i) O incumprimento de qualquer das obrigações específicas previstas no artigo 28.º;
j) O incumprimento de normas e especificações obrigatórias, em violação dos n.ºs 1 e 5 do artigo 29.º;
l) A utilização de frequências sem obtenção do respectivo direito de utilização, quando exigível, ou em desconformidade com os seus termos, em violação do n.º 1 do artigo 30.º;
m) O incumprimento de qualquer das condições definidas nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 32.º, com excepção da constante da alínea f) do n.º 1 do mesmo artigo;
n) A utilização de números sem obtenção do respectivo direito de utilização ou em desconformidade com os seus termos, em violação do n.º 1 do artigo 33.º;
o) O incumprimento de qualquer das condições definidas nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 34.º, com excepção da constante da alínea f) do n.º 1 do mesmo artigo;
p) A transmissão de direitos de utilização de frequências sem comunicação, em violação do n.º 2 do artigo 37.º, bem como a transmissão desses direitos em violação do n.º 4 do mesmo artigo;
q) A transmissão de direitos de utilização de números, em violação dos termos e condições definidos pela ARN previstos no artigo 38.º;
r) A violação dos direitos dos utilizadores e dos assinantes, em incumprimento dos n.ºs 1 e 2 do artigo 39.º;
s) O incumprimento da obrigação prevista no n.º 3 do artigo 39.º;
t) A utilização de contratos de adesão sem prévia aprovação, em violação do n.º 4 do artigo 39.º;
u) A violação da obrigação definida nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 40.º;
v) O incumprimento das obrigações previstas nos n.ºs 1 e 3 do artigo 41.º;
x) O incumprimento das medidas previstas nos n.ºs 1 e 3 do artigo 42.º;
z) O incumprimento da obrigação de transporte prevista no n.º 1 e nos termos do n.º 3 do artigo 43.º;
ah) O incumprimento da obrigação de barramento, em violação do n.º 1 do artigo 45.º;
bb) A recusa de contratar, em violação do n.º 5 ou do n.º 6 do artigo 46.º;
cc) O incumprimento das condições previstas nos n.ºs 3 e 4 do artigo 46.º;
dd) O incumprimento da obrigação de informação prevista nos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 47.º;
ee) O incumprimento das obrigações previstas nos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 48.º;
ff) O incumprimento das obrigações previstas nos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 49.º;
gg) A violação da obrigação prevista no n.º 4 do artigo 50.º;
hh) A violação do direito dos utilizadores a que se refere o n.º 1 e a violação da obrigação prevista no n.º 2 do artigo 51.º;
ii) A suspensão ou extinção do serviço em violação dos n.ºs 1, 2, 3 e 4 do artigo 52.º;
jj) O incumprimento da obrigação prevista no n.º 1 do artigo 53.º;
ll) A violação do direito dos assinantes à portabilidade previsto no n.º 1 do artigo 54.º e o incumprimento das obrigações que sejam estabelecidas nos termos previstos nos n.ºs 2, 3 e 5 do artigo 54.º;
mm) O incumprimento das obrigações nos termos previstos no n.º 3 do artigo 63.º;
nn) O incumprimento das obrigações previstas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 64.º;
oo) A violação das obrigações de confidencialidade previstas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 65.º;
pp) O incumprimento de qualquer das obrigações previstas nos n.ºs 1, 3 e 4 do artigo 66.º;
qq) O incumprimento das condições impostas ao abrigo do n.º 1 do artigo 73.º;
rr) A oposição à realização da auditoria, em violação do n.º 1 do artigo 76.º;
ss) A violação das obrigações impostas nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 77.º;
tt) O incumprimento das obrigações previstas nos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 78.º;
uu) O incumprimento da obrigação prevista no n.º 1 do artigo 79.º;
vv) O incumprimento das condições previstas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 80.º;
xx) O incumprimento das obrigações impostas nos termos do n.º 4 do artigo 81.º;
zz) A violação das obrigações impostas nos termos do n.º 1 e da alínea a) do n.º 2, bem como a alteração das condições de oferta em violação da alínea b) do n.º 2, todos do artigo 82.º;
aaa) O desrespeito dos princípios previstos no n.º 1 em violação de qualquer dos termos fixados nos n.ºs 2 a 5 do artigo 83.º;
bbb) O incumprimento das obrigações previstas nos n.ºs 1, 3 e 4 do artigo 84.º;
ccc) O incumprimento das obrigações previstas nos n.ºs 1, 3 e 5 do artigo 85.º;
ddd) A oposição à realização da auditoria, em violação do n.º 6 do artigo 85.º;
eee) A violação das obrigações previstas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 88.º;
fff) A violação das obrigações e condições previstas nos n.ºs 1 a 3 e nos termos do n.º 5 do artigo 89.º;
ggg) O incumprimento das obrigações previstas nos n.ºs 1, 3 e 4 do artigo 90.º;
hhh) O incumprimento das obrigações previstas nos n.ºs 1, 3 e 4 do artigo 91.º;
iii) O incumprimento das obrigações previstas nos n.ºs 1 a 5 do artigo 92.º;
jjj) A oposição à realização da auditoria, em violação do n.º 6 do artigo 92.º;
lll) O incumprimento das determinações previstas nos n.ºs 2 e 4 e das obrigações previstas no n.º 3 do artigo 93.º;
mmm) O incumprimento das obrigações previstas nos n.ºs 1 e 6 do artigo 94.º;
nnn) O incumprimento da obrigação de contribuição em violação do n.º 2 do artigo 97.º;
ooo) A violação das obrigações previstas no artigo 101.º;
ppp) O incumprimento das obrigações previstas nos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 102.º;
qqq) A violação das obrigações previstas nos n.ºs 1 a 4 do artigo 103.º;
rrr) A prática das actividades previstas nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 104.º;
sss) A violação das obrigações de prestação de informações ao abrigo dos n.ºs 1 e 3 do artigo 108.º;
ttt) O desrespeito por decisões que decretem medidas provisórias nos termos do n.º 1 do artigo 111.º;
uuu) O incumprimento da obrigação prevista no n.º 2 do artigo 121.º;
vvv) O incumprimento de ordens ou mandados legítimos da ARN regularmente comunicados aos seus destinatários.
2 - As contra-ordenações previstas na presente lei são puníveis com coima de (euro) 500 a (euro) 3740 e de (euro) 5000 a (euro) 5000000, consoante sejam praticadas por pessoas singulares ou colectivas, respectivamente.
3 - Sempre que a contra-ordenação resulte da omissão do cumprimento de um dever jurídico ou de uma ordem emanada da ARN, a aplicação das sanções ou o seu cumprimento não dispensam o infractor do cumprimento do dever ou da ordem, se este ainda for possível.
4 - Nos casos referidos no número anterior, o infractor pode ser sujeito pela ARN à injunção de cumprir o dever ou a ordem em causa, cujo incumprimento no prazo fixado pode determinar a aplicação de uma sanção pecuniária compulsória nos termos do artigo 116.º
5 - Nas contra-ordenações previstas na presente lei são puníveis a tentativa e a negligência.
A recorrente pretende ver apreciada a «norma» dos n.ºs 1 e 2 desta disposição que seria inconstitucional por ser «excessivamente aberta nos seus limites e aplicável a um universo de casos de gravidade absolutamente díspar.» Explicou-se, na Decisão Sumária n.º 257/11 ora em reclamação, que a 'norma' impugnada é, na verdade, um vasto conjunto de normas, que especifica detalhadamente diversíssimos comportamentos que constituem contra-ordenações, e não pode ser sindicada – sob o ponto de vista da sua constitucionalidade – com a alegação de ser «excessivamente aberta nos seus limites e aplicável a um universo de casos de gravidade absolutamente díspar». Na verdade, desse conjunto normativo foi retirada uma específica norma que foi aplicada ao caso concreto, mediante a preexistência de determinados pressupostos de facto, e com um âmbito próprio. A censura admissível traduzir-se-ia na impugnação desse segmento normativo, efectivamente aplicado ao caso concreto: não é possível sindicar, em sede de fiscalização concreta, um conjunto normativo por ser, na diversidade da previsão de situações que contempla, «excessivamente» aberta nos seus limites e aplicável a um universo de casos de «gravidade absolutamente díspar», porque, na verdade, tal norma não foi sequer aplicada, com essa extensão, ao caso.
Ora, este entendimento é absolutamente de manter.
Com efeito, é manifesto que os n.ºs 1 e 2 do artigo 113.º não foram aplicados ao caso; o que efectivamente a decisão aplicou foi um segmento do n.º 1 do preceito, que a reclamante, aliás, não chega a identificar, ao qual fez corresponder uma determinada sanção, nos termos do n.º 2. Mas não é possível, em sede da fiscalização concreta, impugnar genericamente uma norma sob a alegação de ser excessivamente aberta nos seus limites e aplicável a um universo de casos de gravidade absolutamente díspar, quando se sabe que, no caso, foi aplicado um segmento bem preciso da norma, à qual correspondeu uma concreta sanção. Nada há, em suma, que censurar à decisão em reclamação.
5. O errado entendimento da recorrente quanto ao âmbito do recurso de inconstitucionalidade disciplinado pela alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC transparece igualmente das restantes questões colocadas no requerimento de interposição e que, na verdade, se reduzem a um mesmo problema, enunciado de forma distinta. Com efeito, pretende-se impugnar as seguintes 'três' normas:
(i) – a interpretação de que constitui «ilícito típico o comportamento que consiste na não prestação, por um particular, de informações solicitadas pelo ICP-ANACOM, quando esse particular – em tempo e na pendência do prazo de cumprimento da ordem – exerce os seus direitos de resistência e de acção relativamente à ordem de prestação de informações recorrendo, para o efeito, aos meios administrativos e judiciais ao seu dispor.»
(ii) – a interpretação de que «sindicar uma ordem do ICP-ANACOM que determina a prestação de informações a esta Autoridade, requerendo a respectiva suspensão de eficácia, corresponde a representar, ainda que na pendência do pedido de suspensão (e, portanto, antes de a ordem se tornar eficaz), o incumprimento dessa ordem e, nessa medida, corresponde a incumprir a obrigação de prestar informações com dolo.»
(iii) – a interpretação de que o ICP-ANACOM «tem poderes para aplicar coimas aos particulares por infracções que correspondem ao incumprimento de ordens por si dadas, quando a legitimidade dessas ordens foi tempestivamente posta em causa perante os Tribunais e o comportamento punido é anterior ao conhecimento da decisão dos Tribunais sobre a legitimidade das ordens.»
Estes enunciados, pretensamente retirados de diversos e distintos preceitos legais representam, na verdade, a mesma questão. E essa questão consiste, pura e simplesmente, em saber se o comportamento da ora reclamante, apurado pela autoridade administrativa e comprovado na decisão recorrida, pode ser qualificado como um «ilícito típico» sancionável; ou seja, o que verdadeiramente se questiona, por via destas questões, é se os factos apurados permitem a condenação da reclamante. Exposta assim a questão, é patente que o seu objecto tem a ver directamente com o conteúdo da decisão recorrida e não com os preceitos legais artificialmente invocados como seu suporte normativo.
6. É, assim, de manter integralmente a decisão sumária reclamada. Decide-se, em consequência, indeferir a reclamação e não conhecer do objecto do recurso. Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta.
Lisboa, 1 de Junho de 2011.- Carlos Pamplona de Oliveira – Maria João Antunes – Gil Galvão.