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Processo n.º 136/11
2ª Secção
Relator: Conselheiro Joaquim de Sousa Ribeiro
Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
I - Relatório
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos do Tribunal da Relação de Coimbra, em que é recorrente A., o relator proferiu decisão sumária de não conhecimento do objecto do recurso, com os seguintes fundamentos:
«(…) 2. A primeira dificuldade perante o teor do requerimento apresentado, é perceber qual a norma ou interpretação normativa que o recorrente pretende que o Tribunal Constitucional aprecie. Começa por se referir a uma questão de inconstitucionalidade referente ao artigo 127.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil (CPC), alegadamente suscitada no decurso do processo; passa depois a mencionar a inconstitucionalidade de uma dada interpretação do artigo 32.º do CPC; e termina pedindo que “seja declarada” a inconstitucionalidade desta norma.
Independentemente de se saber se a alegada questão de constitucionalidade referente ao artigo 127.º, n.º 1, alínea c), do CPC, tem natureza normativa e foi suscitada de modo adequado perante o tribunal recorrido, o certo é que no requerimento de interposição do presente recurso, o recorrente abandonou tal questão e delimitou o objecto do recurso à “inconstitucionalidade da norma constante do artigo 32.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, aplicada pelo Tribunal da Relação de Coimbra com a interpretação que resulta da Decisão Singular ora recorrida e em consequência que seja ordenado aquele tribunal que se pronuncie sobre a questão de direito suscitada.”
Ora, para além de esta última não ser uma questão de constitucionalidade idónea a constituir objecto de um recurso de constitucionalidade, certo é também que o recorrente não a suscitou no decurso do processo, perante o tribunal recorrido.
Razões pelas quais não pode ser conhecido o objecto do recurso.
3. Pelo exposto, ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, decide-se não conhecer do objecto do recurso. (…)»
2. Notificado da decisão, o recorrente veio reclamar para a conferência, ao abrigo do artigo 78.º-A, n.º 3, da LTC, nos seguintes termos:
«(…) A — A decisão agora reclamada vem decidir pelo não conhecimento do objecto do recurso, por o Recorrente não ter suscitado a questão perante o tribunal recorrido.
B — Ora, no requerimento de suspeição veio o Recorrente, por si e sem patrocínio, invocar a decisão contida no douto Acórdão do Tribunal Constitucional, Processo 92/96, publicada em Diário da Republica, que decidiu que “no entendimento que vem de expor-se, é esse núcleo essencial do ius postulandi das partes – e, assim, do direito de aceder aos tribunais sem necessidade de assistência de advogado - que se atinge quando se !interpreta a norma constante do artigo 34.° do Código de Processo Civil (conjugado com as alíneas a), h) e c) do n.º 1 do artigo 32.° do mesmo Código), em termos de impor às partes, nas acções em que lhes é permitido pleitear por si próprias e ser representadas por solicitador, a sua representação por advogado, para o efeito de poderem suscitar e discutir questões de direito. De acordo com o referido entendimento, com essa interpretação, violar-se-ia, pois, o artigo 20.º, n° 1, da Constituição”.
C — Recorde-se que o Recorrente agiu por si e sem patrocínio, pelo que a não utilização da melhor técnica de pleitear deverá ser, para estes efeitos relevada, porquanto este utilizou a expressão “cifra”, pretendendo, que todo o conteúdo da remissão efectuada fizesse parte integrante do requerimento apresentado.
D — Refere ainda a referida decisão ora reclamada que o objecto do recurso não é idóneo para uma questão de inconstitucionalidade.
E — Ora, o objecto do recurso encontra-se definido e delimitado e não existe abandono de qualquer questão de inconstitucionalidade: o Recorrente referiu a inconstitucionalidade do artigo 127.°, n.° 1 alínea c) do C.P.C. alegada também pelo Autor para descrever o requerimento que suscitou a decisão do Tribunal da Relação de Coimbra, sendo que neste último duas inconstitucionalidades são levantadas, a do 127.° e a do 32.°, n.° 2, ambos do C.P.C., como já atrás se referiu.
F — Mais ainda se não houve delimitação do objecto do recurso como o Digníssimo Juiz Relator, como pode ao mesmo tempo considerar que a inconstitucionalidade invocada não o foi perante o tribunal recorrido-
Concluindo-se pois que,
Face ao alegado, houve delimitação de objecto de recurso de inconstitucionalidade idóneo e o mesmo foi suscitado no decurso do processo.
Termos em que requer a V. Ex.ªs que se pronunciem sobre o objecto do Recurso apresentado, conhecendo da inconstitucionalidade invocada. (…)»
Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
3. A decisão sumária ora reclamada pronunciou-se pelo não conhecimento do objecto do recurso, interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, com fundamento, por um lado, na não inclusão da questão referente ao artigo 127.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil, no objecto do recurso, tal como delimitado, pelo recorrente, no requerimento de interposição do mesmo; e na não suscitação da questão referente ao artigo 32.º, n.º 2, do CPC, que, de qualquer forma, sempre seria inidónea a constituir objecto de um recurso de constitucionalidade.
A presente reclamação em nada abala estes fundamentos.
Desde logo, são irrelevantes as considerações tecidas na reclamação a respeito de eventuais requerimentos apresentados no decurso do processo e subscritos pelo próprio recorrente, sem estar patrocinado por mandatário judicial. No que aqui releva, o requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade foi subscrito por mandatário judicial – em cumprimento, aliás, do disposto no artigo 83.º, n.º 1, da LTC – sendo certo que nele se conclui pedindo a apreciação da constitucionalidade de uma única norma, a do citado artigo 32.º, n.º 2, do CPC. O que significa que o recorrente limitou o objecto do recurso à apreciação da constitucionalidade da «norma constante do artigo 32.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, aplicada pelo Tribunal da Relação de Coimbra com a interpretação que resulta da Decisão Singular ora recorrida e em consequência que seja ordenado aquele tribunal que se pronuncie sobre a questão de direito suscitada». Ora, para além de esta questão, tal como enunciada, não ser idónea a constituir objecto de um recurso de constitucionalidade, certo é também que o recorrente não suscitou, no decurso do processo, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa atinente àquele preceito legal.
Deve, por isso, manter-se na íntegra a decisão reclamada.
III. Decisão
Pelo exposto, acordam em indeferir a presente reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta.
Lisboa, 4 de Maio de 2011.- Joaquim de Sousa Ribeiro – J. Cunha Barbosa – Rui Manuel Moura Ramos.