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Proc.º n.º 28/2001.
2.ª Secção. Relator:- BRAVO SERRA.
1. Em 29 de Janeiro de 2001 o relator preferiu a fls. 243 a 247 destes autos decisão sumária com o seguinte teor:-
'1. Pelo Tribunal Administrativo de Círculo do Porto e contra a Câmara Municipal de Braga intentaram AA e mulher, TA, acção, seguindo a forma de processo ordinário, solicitando a condenação da ré a pagar-lhes a quantia de Esc.
5.100.000$00 a título de indemnização.
Por sentença proferida naquele Tribunal em 8 de Maio de 1996 foi a acção julgada improcedente por não provada e, em consequência, absolvida a ré do pedido.
Não se conformando com essa sentença da mesma recorreram os autores para o Supremo Tribunal Administrativo, sendo que na alegação que adrede apresentaram os mesmos, minimamente, não colocaram qualquer questão de desconformidade com a Lei Fundamental reportadamente a norma ou normas constantes do ordenamento jurídico infra-constitucional.
Na verdade, pode ler-se naquela alegação e para o que ora releva:-
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6. Recordar-se-á aqui que foi desde logo a clara constatação do vício de forma em que incorreu a Câmara Municipal de Braga (ao licenciar sem a mínima fundamentação exigível a construção impugnada) que baseou a anulação daquele licenciamento.
7. Mas isto não significa que não tivessem sido postos em destaque pelos AA., junto do T.A.C. do Porto diversos outros vícios que, de resto, este Tribunal logo enumerou, a saber:
- violação de lei: artigo 121º do REGEU;
- violação de lei: artigo 51º, 2, c) do DEc.Lei 100/84, de 19 de Março;
- violação de lei: artigo 13º da Constituição, princípio da igualdade;
- violação de lei: artigo 26º da Constituição, princípio constitucional do di-
reito à intimidade da vida privada e familiar.
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22. A ‘anos luz’ da consumação dos prejuízos imputados à Ré e alegados pelos AA.
(e quando de aguardava apenas a definição judicial da sua quantificação, face à matéria de facto PROVADA), dói ver decidido que os AA. - litigando em dificílimas condições de flagrante desigualdade processual que fazem tábua raza do princípio da igualdade de partes - sejam ainda mais penalizados, ao cabo de tão arrastado processo!
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Por acórdão de 31 de Maio de 2000 negou o Supremo Tribunal Administrativo provimento ao recurso e, tendo esse aresto sido objecto de um pedido de reforma por banda dos autores, foi ele indeferido por acórdão de 18 de Outubro do mesmo ano.
Notificados deste último aresto, os autores fizeram juntar aos autos requerimento com o seguinte teor:-
‘............................................................................................................................................................................................................................................ AA e Mulher, recorrentes no processo em epígrafe, inconformados com o Acórdão nele proferido, vêm dele intepôr recurso para o Tribunal Constitucional, o que fazem nos seguintes termos:
1. O recurso é interposto ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº
28/82, de 15 de novembro, na radacção dada pela Lei nº 13-A/98.
2. Pretende-se suscitar a verificação sobre se à luz do princípio constitucional da tutela jurisdicional efectiva é admissível que o Supremo Tribunal Administrativo deixe de pronunciar-se sobre todas as questões suscitadas no processo - in casu, abrangendo os antecedentes dos autos nº 1976 do TAC/Porto - invocando, designadamente, que nestes últimos autos o mesmo Tribunal que julgou o recurso houve por bem ‘parar’ no vício de falta de fundamentação, apesar de assacados pelos recorrentes de então - como de agora - diversos outros vícios de legalidade, alguns envolvendo graves ofensas a direitos que lhes estão, a eles recorrentes, constitucionalmente assegurados, como o direito à não discriminação e o direito à intimidade da vida privada e familiar - artigo 26º da CRP.
3. Isto, após longo tempo de espera sobre o resultado da respectiva apreciação que era suposto ser o mais abrangente possível, dotado como está o Supremo Tribunal Administrativo de poder de apreciação de facto e de direito e do direito à coadjuvação das outras autoridades - Cf., designadamente, artigo 202º da CRP - entre as quais a própria demandada, câmara Municipal de Braga.
4. E sabendo-se que os princípios constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantis são directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas - Cf. nº 1 do artigo 18º da CRP:
5. A matriz constitucional dos direitos dos recorrentes postergados pela demandada em todo o processo (que envolve, repete-se, os seus directos antecedentes, incluino processo instrutor) foi repetidamente invocada pelos então (e agora) recorrentes, designadamente nos seus petitórios. Peças em que, insitamente, se clama pela inconstitucionalidade de diversos comportamentos comissivos e omissivos da demandada.
6. Mas comportamentos que não chegaram a ser apreciados judicialmente, visto que o que essencialmente foi objecto de análise se limitou ao vício formal da deliberação inicialmente impugnada e suas (parciais) decorrências para a acção intentada subsequentemente pelos recorrentes.
7. O presente recurso é de apelação, com subida imediata nos próprios autos e de efeito suspensivo.
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Tendo o Conselheiro Relator do Supremo Tribunal Administrativo convidado os recorrentes a indicarem a norma ou as normas que os mesmos pretendiam ver apreciadas, as normas ou princípios constitucionais que consideravam violados e a peça ou as peças processuais em que suscitaram a questão de inconstitucionalidade, vieram os mesmos a dizer em requerimento que ora se encontra junto aos autos a fls. 237 e 238:-
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1. Conquanto tenham sido invocados pelos recorrentes naqueles e nos presentes autos diversos vícios de violação de lei, por banda da recorrida Câmara de Braga
- vícios esses claramente referenciados em sede judicial - o facto é que acabaram eles por não serem objecto de concreta aplicação judicial nem, consequentemente, sobre eles recaiu qualquer decisão.
Cf. exemplificativamente, os que ofenderam in casu, alegadamente, o direito à não descriminação e à intimidade da vida privada e familiar dos então e aqui recorrentes, consignados, respectivamente, nos artigos 13º e 26º da Constituição da República Portuguesa.
Mas tais vícios - e outros, igualmente alegados pelos recorrentes - não foram objecto de pronúncia judicial - conforme, aliás, foi reconhecido nos autos - visto que o mesmo Tribunal que julgou o recurso houve por bem ‘parar’ no vício de falta de fundamentação.
Face ao que se pretende ver compaginado tal comportamento judicial com o princípio constitucional da tutela EFECTIVA consignado quer no número 5 do artigo 20º quer no número 4 do artigo 268º da vigente CRP.
2. Do que antecede, sustenta-se que ocorreu, in casu, uma tutela jurisdicional de natureza meramente formal, não efectiva, sem o esperado aprofundamento factual global apesar de as instâncias judiciais terem ao seu dispor diversos meios oficiosos de concentração de elementos dos dois processos conexionados e para tal terem sido repetidamente alertados pelos aqui recorrentes, sempre na compreensível ansia da efectiva tutela dos seus alegados direitos e pugnando pelo sancionamento das invocadas acções e omissões lesivas da demandada Câmara de Braga.
Sustentam, pois, os recorrentes que se tivesse ocorrido, como era suposto ao fim de imensos anos, o pretendido aprofundamento material da questão estariam criadas condições para a aplicabilidade do preceito responsabilizador da demandada consignado no artigo 22º da CRP, face a acções e omissões suas que acabaram, porém, por não serem apreciadas no seu alegado conjunto.
3. Foram, designadamente, suscitadas questões de constitucionalidade - expressa ou insitamente - nas seguintes peças processuais: a) Alegações do recorrente AA nos autos de recurso contencioso de anulação nº
1976/89, TAC/Porto, directo antecedente destes autos. b) petição da conexa acção ordinária de indemnização por responsabilidade extra-
-contratual, designadamente in seu anexado documento nº 1 e Ponto III, páginas 3 e 4 c) Sentença de 14 de Fevereiro de 1991 do Exmo Senhor Juiz (então do TAC/Porto), Dr. Rui Torres Veiga, naqueles referidos autos conexionados nº 1976/89, in
‘Conhecimento do Mérito do Recurso’. d) Requerimento de interposição do presente recurso para o Tribunal Constitucional. e) Presente resposta à notificação de V.Exª recebida em 16 do corrente.
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O recurso veio a ser admitido por despacho prolatado pelo Conselheiro Relator do Supremo Tribunal Administrativo em 6 de Dezembro de 2000.
2. Não obstante tal despacho, porque o mesmo não vincula este Tribunal (cfr. nº 3 do artº 76º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro), e porque se entende que o recurso não deveria ter sido admitido, elabora-se, ex vi do nº 1 do artº 78º-A da mesma Lei, a presente decisão sumária, por intermédio da qual se não toma conhecimento do objecto da vertente impugnação.
Na realidade, como à saciedade resulta do relato acima efectuado, os ora recorrentes, antecedentemente ao proferimento do acórdão intentado colocar sob a censura deste órgão de fiscalização concentrada da constitucionalidade normativa, nunca, em passo algum destes autos, suscitaram qualquer questão de desconformidade com os preceitos ou princípios constantes do Diploma Básico por parte de qualquer normativo ínsito no ordenamento jurídico infra-constitucional.
O que era mister fazerem, caso desejassem lançar mão do recurso a que se reporta a alínea b) do nº 1 do artigo 280º da Constituição e da alínea b) do nº 1 do artº 70º da falada Lei nº 28/82.
É que, como se sabe, o recurso estribado naquelas disposições legais
é incidente sobre normas e não sobre quaisquer outros actos do poder público tais como, verbi gratia, os actos da administração ou as sentenças judiciais, o que, em rectas contas, é, afinal, o desiderato dos ora impugnantes, como deflui do seu requerimento de interposição de recurso acima transcrito.
Falta, desta arte, um dos requisitos da impugnação prevista da aludida alínea b) do nº 1 do artº 70º, pelo que se não tomará conhecimento do objecto do recurso.
Custas pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em quatro unidades de conta'.
Da transcrita decisão sumária reclamaram os recorrentes para a conferência dizendo que, à luz do '...princípio constitucional da tutela jurisdicional efectiva, consignado quer no nº 5 do artigo 20º quer no nº 4 do artigo 268º da vigente CRP',:-
- pretendiam suscitar que era '... inconstitucional que o Supremo Tribunal Administrativo deixe de pronunciar-se sobre todas as questões suscitadas no processo, in casu abrangendo os antecedentes dos autos nº 1976 do TAC/Porto...';
- sustentam que '...o disposto no artigo 57º da Lei do Processo dos Tribunais Administrativos e fiscais (Dec.Lei nº 267/85, de 16 de Julho - ordem de conhecimento dos vícios - não dispensa o Tribunal perante o qual hajam sido suscitados de os apreciar a todos, ainda que começando pela apreciação de alguns deles';
- no 'exercício dessa tutela jurisdicional efectiva deverá o Supremo Tribunal Administrativo - que conhece de facto e de direito - socorrer-se de todas as suas prerrogativas e do direito à colaboração de todas as entidades públicas, incluindo a da entidade demandada quanto a elementos constantes do processo instrutor ou outros julgados convenientes (artigo 202º, número 3 da CRP)', pois só 'assim a causa a que se reportam estes autos - ... - poderá ter processo equitativo (artigo 20º, número 4 da CRP)'.
De seu lado, a Câmara Municipal de Braga, ouvida sobre a reclamação, nada veio dizer.
Cumpre decidir.
2. O Tribunal anui ao que, na sua essencialidade, se contém na transcrita decisão sumária.
E, assim, haverá que decidir que se impõe o indeferimento da reclamação sub iudicio.
Aliás, tendo em conta as razões utilizadas no requerimento corporizador da reclamação em apreço e que acima se expuseram, torna-se nítido que os reclamantes continuam a atacar a decisão jurisdicional tomada no Supremo Tribunal Administrativo e não a ou as normas constantes do ordenamento jurídico infra-constitucional que, afinal, são, elas mesmas, o único objecto dos recursos visando a fiscalização concreta da constitucionalidade.
Termos em que se indefere a reclamação, condenando-se os reclamantes nas custas processuais, fixando a taxa de justiça em quinze unidades de conta. Lisboa, 14 de Março de 2001 Bravo Serra Maria Fernanda Palma Luís Nunes de Almeida