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Processo n.º 828/10
1ª Secção
Relator: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Notificada do Acórdão n.º 134/2011, pelo qual este Tribunal decidiu indeferir reclamação da decisão de não conhecimento do objecto do recurso de constitucionalidade interposto, vem agora a reclamante A., Ld.ª, ao abrigo do disposto nos artigos 669.º e 670.º do Código de Processo Civil, requerer a aclaração e, porventura, a reforma do acórdão, com os fundamentos seguintes:
«O acórdão proferido que indeferiu a reclamação para a conferência e, em consequência, confirmou a decisão reclamada no sentido de não tomar conhecimento do recurso interposto, assentou totalmente em aspectos formais, designadamente “por não se ter verificado o requisito da suscitação prévia da questão da constitucionalidade posta no respectivo requerimento de interposição”.
Ora, acontece, porém, o que se pretende com a presente aclaração e o que, efectivamente, se pretendeu com o douto recurso para o Tribunal Constitucional, é e sempre foi requerer a V. Exas. que apreciassem a (in) constitucionalidade material da norma constante da alínea b) do nº1 do art. 377.º do Código de Trabalho, na interpretação segundo a qual os créditos laborais garantidos por privilégio imobiliário especial sobre os bens imóveis do empregador nos quais o trabalhador preste a sua actividade prevalecem sobre os créditos garantidos por hipoteca constituída sobre esses bens em data anterior à data da entrada em vigor do Código de Trabalho – Lei nº 99/2003 de 27 de Agosto
(…)
Ora, tal como foi referido no recurso apresentado para este Ilustre Tribunal, em sede do recurso apresentado para o Supremo Tribunal de Justiça, e de resto transcrito na reclamação apresentada,
(…)
Atente-se no enquadramento em que a mesma é escrita, sempre por remissão para o n.º 1, alínea b) do dito art.º 377.º do C Trabalho à data e sempre por contraponto ccom as hipotecas registadas antes da entrada em vigor de tal normativo.
Veja-se que a alegação “o” até esta colocada a negrito.
Veja-se ainda a conclusão “S”
(…)
Ou seja, atesta-se da parte final que se pretende o conhecimento último das situações das hipotecas registadas antes da entrada em vigor do dito Código de Trabalho.
Até porque mais se disse:
(…)
Ora atendendo ao supra exposto, não se depreende de que modo é que a constitucionalidade do artigo 377º do Código de Trabalho não foi questionada de forma adequada, tal como é imposto pelo nº2 do artigo 72º daquela lei, pois continua a aqui reclamante com a firme convicção que as normas invocadas em sede das alegações para o STJ e de recurso para V. Exas são as mesmas e assim deverá ser conhecido por V. Exas.
Ora, revela-se totalmente incongruente a douta decisão de indeferimento da reclamação e, por consequência, a douta decisão confirmatória do acórdão recorrido, pois, de facto, sempre os recorrentes suscitaram uma questão de inconstitucionalidade normativa.
Suscitação esta que foi, efectivamente, operada ao longo das várias instancias judiciais, designadamente, em sede de recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça.
Também, não pode deixar de dizer-se que a verdadeira questão de mérito, com relevância constitucional, não foi apreciada nestes autos. De facto, todo o merecimento do douto recurso e da douta reclamação foi a violação dos princípios da confiança e seguranças jurídicas, que encerra na violação da própria constituição!
Proferir outra decisão que não sendo apreciar o mérito constitucional e ao invés, debruçar sobre meros aspectos formais, será, tão só, sobrevalorizar a forma em detrimento da justiça material.
Pelo que, não se compreende o sentido e teor do douto acórdão de que ora se requer a aclaração, visto que, salvo melhor opinião em contrário, os requisitos formais de violação de normativo constitucional foram oportunamente invocados e arguidos, sendo que as normas invocadas em sede das alegações para o STJ e de recurso para V. Exas são as mesmas e assim deverá ser conhecido por V. Exas.
Nestes termos, afigura-se-nos, e assim se requer, que o douto acórdão seja esclarecido no que toca à falta de requisitos formais que obstaram à tutela constitucional e, porventura, devidamente rectificado, com as devidas consequências legais.»
2. Notificados os recorridos, respondeu apenas o Ministério Público, o que fez nos termos seguintes:
«1º
O Tribunal, pelo Acórdão n.º 134/2011, que confirmou a Decisão Sumária n.º 29/2011, decidiu não tomar conhecimento do objecto do recurso interposto por A., Lda.
2º
O Tribunal decidiu dessa forma, porque entendeu que durante o processo, não tinha sido devidamente suscitada a questão da inconstitucionalidade normativa que, pelo requerimento de interposição do recurso, se pretendia que agora o Tribunal Constitucional apreciasse.
3.º
Quer na Decisão Sumária, quer no Acórdão, explica-se o porquê desse entendimento.
4.º
Pode discordar-se dele, mas o Acórdão é perfeitamente claro e insusceptível de dúvida, não padecendo de qualquer obscuridade que, a reclamante, aliás, não concretiza, começando até por afirmar que o que pretende com o pedido de aclaração era o que se pretendia com o recurso para o Tribunal Constitucional.
5.º
Na verdade, analisando o pedido, aí, em larga medida, reeditam-se os argumentos que já constavam da reclamação da Decisão Sumária.
6.º
Pelo exposto, deve indeferir-se o que vem requerido.»
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
1. Decorre do disposto nos artigos 669.º, n.º 1, alínea a), e 716.º do Código de Processo Civil e 69.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC) que, proferida decisão, o recorrente pode pedir o esclarecimento de alguma obscuridade ou ambiguidade que a mesma contenha.
Atendendo ao teor do acórdão aclarando e ao que devemos entender por obscuridade ou ambiguidade da decisão – “a decisão judicial é obscura quando, em algum passo, o seu sentido seja ininteligível; é ambígua quando alguma passagem se preste a interpretações distintas” (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 533/2004, disponível em www.tribunalconstitucional.pt) – é de concluir que pelo indeferimento do requerido. Do teor do requerimento de aclaração resulta até que acaba por não ser imputado ao acórdão em causa qualquer vício de obscuridade ou ambiguidade, sendo antes expressão da discordância da requerente quanto ao definitivamente decidido por este Tribunal. Isso mesmo é assumido quando se afirma que o que se pretende, com o presente pedido, é a apreciação da constitucionalidade material de determinada interpretação da alínea b) do n.º 1 do artigo 377.º do Código do Trabalho.
2. Segundo o disposto no n.º 2 do artigo 669.º do Código de Processo Civil, aplicável à tramitação dos recursos para o Tribunal Constitucional (artigo 69.º da LTC), pode ser requerida a reforma da decisão, quando tenha ocorrido manifesto lapso do juiz na determinação da norma aplicável ou na qualificação jurídica dos factos ou quando constem do processo documentos ou quaisquer elementos que, só por si, impliquem necessariamente decisão diversa da proferida e que o juiz, por lapso manifesto, não haja tomado em consideração.
Do teor do requerimento não se extrai qualquer argumento no sentido haver uma qualquer razão para reformar o Acórdão n.º 134/2011. Mais uma vez é de concluir que toda a argumentação da requerente é significativa da sua discordância quanto ao decidido relativamente à não verificação de um dos requisitos do recurso de constitucionalidade interposto.
3. Não há, pois, qualquer razão para aclarar ou para reformar o Acórdão n.º 134/2011.
III. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir o requerido.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 unidades de conta.
Lisboa, 17 de Maio de 2011.- Maria João Antunes – Carlos Pamplona de Oliveira – Gil Galvão.