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Processo n.º 57/11
1ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira
Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. Em 23 de Novembro de 2010 o Supremo Tribunal de Justiça lavrou o seguinte acórdão:
Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça:
Neste recurso de agravo, em que é recorrente A., advogado, e recorrida B., S.A., foi proferido o Acórdão de 7-7-10 ( fls 439 e segs), que decidiu:
1 Não tomar conhecimento do objecto do 1º agravo, julgando findo tal recurso, por o mesmo ser inadmissível;
2 - Considerar prejudicado o conhecimento do 2º agravo;
3 - Indeferir o pedido de conhecimento das pretensas nulidades do Acórdão recorrido, proferido pela Relação, bem como o pedido de determinação da baixa dos autos à 2.ª instância, para tais pretensas nulidades serem agora apreciadas pela mesma Relação.
Por Acórdão do Supremo de 21-9-10 (fls. 509), foi indeferido o pedido de reforma daquele primeiro Acórdão deste Supremo Tribunal de 7-7-10, pedido esse formulado, além do mais, para efeito do agravo ser admitido com fundamento em violação do caso julgado, nos termos do art. 678, nº 2, do C.P.C.
Agora, através do seu requerimento de fls. 522, o recorrente insiste no pedido de conhecimento do recurso com fundamento em violação do caso julgado.
A recorrida pronunciou-se pelo desentranhamento do mesmo requerimento, por manifesta inadmissibilidade legal.
Pede condenação do recorrente como litigante de má fé.
Cumpre decidir.
Com a prolação dos referidos Acórdãos de 7-7-10 e de 21-9-10, ficou decidida a inadmissibilidade do pretendido agravo, tendo-se esgotado o poder jurisdicional deste Tribunal quanto à inadmissibilidade do recurso, com fundamento em ofensa do caso julgado, nos termos do art. 666, nº 1, aplicável por força das disposições conjugadas dos arts 716, nº 1, 726, 749 e 762, nº 1, todos do C.P.C.
Assim, sem necessidade de outras considerações, acordam em indeferir o infundado e repetido pedido para conhecimento do agravo, com base em ofensa do caso julgado, por estar esgotado o poder jurisdicional sobre a respectiva matéria.
Custas pelo recorrente, com taxa de justiça que fixam em 5 UCS.
O recorrente, Dr. A., vem suscitando diversos incidentes, manifestamente infundados, que obstam ao trânsito em julgado da decisão proferida nestes autos de recurso de agravo.
Por isso, se o mesmo recorrente suscitar, nestes autos de recurso, futuramente, qualquer outro incidente, obstando ao trânsito da decisão, determinam que, nessa ocasião, o processo baixe à 1ª instância, nos termos do art. 720, nºs 1 e 2, do C.P.C., ficando traslado neste Tribunal, onde serão processados os eventuais incidentes futuros, se vier a ser caso disso.
Não se justificando, para já, a condenação do recorrente como litigante de má fé, será apreciada em eventual e futuro incidente, se for caso disso, a respectiva actuação, para efeito de litigância de má fé – art. 456, nº 2, do C.P.C.
2. Notificado, o recorrente A. apresentou o seguinte requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional:
A., não se conformando com o douto Acórdão de fls...., nem com o douto Acórdão proferido na sequência do pedido de aclaração daquele, nem com o douto Acórdão proferido na sequência da arguição de nulidades, vem muito respeitosamente interpor recurso para o Tribunal Constitucional,
por violação dos artigos 2.º, 90, alínea b), 18.º, 20.º, 26.º, 27.º, 44.º, 61.º, 62.º e 205.º, n.º l da Constituição da República Portuguesa, ao abrigo das alíneas b), c) e 1) do artigo 70.º da Lei Orgânica do dito Tribunal Constitucional,
entendendo, salvo o devido respeito, terem sido violados os princípios do caso julgado, proibição de excesso de pronúncia, do dever de pronúncia sobre todas as questões suscitadas ou de que o Tribunal devesse conhecer ex officio, e pedidos formulados na configuração dada pelo ora requerente, do conhecimento oficioso do caso julgado e de litispendência, princípios de interesse e ordem pública, da aplicação do direito aos factos provados, da legitimidade, do interesse em agir e da legalidade, princípio da igualdade e do contraditório, princípio da fundamentação das decisões, tendo sido dada daqueles princípios — bem como dos dispositivos legais que os plasmam, verbi gratiae, artigos 494.º e seguintes, 660.º, 668.º, 659.º, 664.º, 2.º, 3.º, 4.º, 10.º, n.º 2, 156.º, n.º 4, 158.º, 199.º, n.º 1, 264.º, 265.º, 265º-A, 266º, 659.º, 666.º, 667.º, 668.º, 678.º, n.º 2 e n.º 3, 687, n.º 1 e n.º 3, 688.º, n.º 5, 700.º, n.º 3, 702.º, n.º 1, 716.º, 723.º, 734.º, n.º 1, alínea a), 740.º, n.º 2, alínea d) e n.º 3, 754.º, n.º 2 e n.º 3, 758.º, 813.º, alíneas d), e) e f) e 26.º do Código de Processo Civil e 240.º e 1268.º do Código Civil e, ainda, os artigos 176.º, 201.º, 204.º e 205.º do CPEREF — interpretação que desvirtua o direito e denega a justiça, não assegurando a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos.
As inconstitucionalidades e ilegalidades referidas tiveram a sua sede nos doutos acórdãos de Agravo no Venerando Tribunal da Relação e de Agravo neste Supremo Tribunal, foram suscitados nas alegações respectivas, bem como nos requerimentos de aclaração e de arguição de nulidades em cada um dos mencionados doutos Acórdãos.
Termos em que, muito respeitosamente requer a Vossas Excelências que se dignem admitir o presente Recurso, seguindo-se os demais termos.
O recurso foi admitido por despacho do Relator, no Supremo Tribunal de Justiça, e o processo foi remetido a este Tribunal onde o recorrente foi convidado, nos termos do artigo 75º-A da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro (LTC), a esclarecer o sentido das normas impugnadas. Respondeu nos seguintes termos:
(...) 1. Nas suas alegações de ’recurso’ para o Supremo Tribunal de Justiça o ora requerente, nos pontos 1 a 5; reclama contra a falta de fundamentação da parte da douta decisão recorrida que dá por provados os factos que constam da aí denominada “Fundamentação de facto” de fls. 76, quando o que está em causa é tão somente uma decisão proferida nos autos depois de correr em julgado a sentença dos autos principais, nos quais o ora recorrente não teve intervenção por não ter sido citado.
2. Dada a não intervenção nos autos principais do ora recorrente, e estando sub judice uma decisão proferida após se ter esgotado o poder jurisdicional do Juiz no que questão principal diz respeito; fica-se sem se saber a origem da convicção do Venerando Tribunal de Relação para dar por demonstrados os factos arrolados na aludida “Fundamentação de facto”.
3. Pelo que; no item 4.º das suas alegações, o recorrente invocou a postergação do «princípio de fundamentação dos decisões judiciais insiro nos artigos 158.º e 659;º do Código de Processo Civil e 205º da Constituição da República»
4. E no item 5:º referiu «que no se pode deixar de considerar inconstitucional uma norma que resulte da interpretação dos citados normativos de que os factos constantes de qualquer peça processual correspondem à verdade sem se fazer o exame crítico da sua génese».
5 No item 51.º das ditas alegações; o recorrente invoca a postergação do «princípio do processo equitativo que prevê o respeito pelo itinerário processual previsto para cada processo».
6 Porque, na douta decisão recorrida, garantiu-se recorrida uma execução nos autos falimentares que esta anda não tinha alcançado nos autos de execução fiscal.
7. Ao assim se decidir deu-se uma interpretação ao artigo 201.º do CPEREF não consentida pelo que dispõe a parte final do n.º 4 do artigo 20.º da Constituição da República.
8. Por outro lado, no requerimento de reclamação de nulidades o ora recorrente alega que «ao admitir-se a “usurpação” do imóvel que o requerente habite por autorização de seus pais; sem dar a este direito de apresentar a defesa que nas acções executivas é garantida ao executado pelo artigo 813.º do C. do P. Civil, nomeadamente nas alíneas d); e) e f), é coarctar-lhe os seus direitos de defesa legal constitucionalmente consagrados no artºs 9.º b), 18º e 20.º, nº 4 da CRP, sendo por isso, inconstitucional a interpretação da lei falimentar seguida no dito douto acórdão»
9. Nos itens 85.º e 86.º das aludidas alegações, o ora recorrente reclama de falta de fundamentação da decisão revogatória do bem fundamentado douto despacho objecto da douta decisão do Venerando Tribunal da Relação; invocando a violação do referido artigo 205.º da Constituição da República Portuguesa.
10. O Supremo Tribunal de Justiça não conheceu do recurso por decidir não estar em causa nenhum dos casos previstos nos n.º 2 e 3 do artigo 754.º do Código de Processo Civil.
11. Por isso, o ora recorrente; por considerar estar-se perante uma decisão substantiva, logo prevista naquele dispositivos processuais reclamou do que considerou nulidades, dizendo em tal requerimento, nos itens 14.º a 17.º, que douta decisão falta a devida fundamentação, do que resulta a aplicação de uma norma extraída da interpretação do artigo 158.º, n.º 1 do Código de Processo CMI que viola o disposto no n.º 1 do artigo 205.º da Constituição da República Portuguesa
12. Por outro lado; o Supremo Tribunal de Justiça, não atendeu às nulidades arguidas. nem remeteu os autos ao Venerando Tribunal da Relação por entender que tais nulidades, arguidas no prazo das alegações, não o fora no prazo de dez dias.
13. Reclamando desta decisão, o ora recorrente referiu que: «com o devido respeito por esta decisão, entende-se que a mesma não é consentânea com o direito do recorrente a um processo equitativo sob os auspícios do acesso ao direito e da tutela jurisdicional efectiva garantido pelo art. 20.º da Constituição da República Portuguesa».
14. Pelo que se deixou alegada a inconstitucionalidade da norma aplicada resultante da interpretação que foi dada ao n.º 3 do artigo 68.º do C.P.C. de onde resultou que se o recurso aí referido não for admitido, fica precludido o respectivo conhecimento.
15. Também no mesmo requerimento; referiu-se: «Por um fado, o recorrente; no seu requerimento de recurso, arguiu «as nulidades previstas nos artigos 68.º e 716.º do Código de Processo Civil». «… em homenagem ao princípio geral da cooperação ínsito nas disposições dos artigos 265.º e 266º do Código de Processo Civil e ao aludido princípio constitucional do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva; impor-se-ia o convite ao aperfeiçoamento daquela peça processual».
16 Neste requerimento de reclamação de nulidades diz-se que: «parece ser injusto vedar-se o acesso ao alto escrutínio deste Supremo tribunal de questão sub judice, só pela mera razão de ela, adjectivamente, ter sido suscitada depois da sentença final. Se o fora antes nomeadamente se alguns dos intervenientes no processo – que não o requerente que nem para ele foi citado tivessem previsto o problema; tinham o direito de sobre ele ver uma decisão com recurso a este Supremo Tribunal, juntamente com a decisão final, Esta discrepância de armas dobre afectado o principio da igualdade perante a lei que o artigo 13.º da Constituição de República Portuguesa salvaguarda.»
17. Salvo o devido respeito deixou-se aqui alegada a inconstitucionalidade da norma aplicada extraída da interpretação que foi feita do artigo 3º-A do Código de Processo Civil.
18. Por não ter o Supremo Tribunal de Justiça tomado conhecimento oficioso da excepção de caso julgado invocada e demonstrada nos autos documentalmente, disse o ora recorrente no seu requerimento do 13 de Outubro de 2010 que «haveria este Supremo tribunal de Justiça de ter conhecido oficiosamente da referida excepção; porque entender-se que o dispositivo do artigo 495º do Código de Processo Civil não se aplica a este Supremo Tribunal, seria fazer uso de uma norma resultante da interpretação deste artigo que contraria o princípio de acesso ao direito consagrado no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa
Termos em que; com o douto suprimento que se invoca, R. que seja admitido o recurso o que será de
Justiça
Foi então proferida a Decisão Sumária 176/2011, pela qual se decidiu não conhecer do recurso, com o seguinte teor:
Nos termos do n.º 1 do artigo 78.º-A da Lei do Tribunal Constitucional, decide-se:
A. recorre ao abrigo das alíneas b), c) e f) do n.º 1 do artigo 70.° da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), aprovada pela Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro.
Mas é de recusar conhecer do recurso no âmbito das alíneas c) e f) do n.º 1 do referido artigo 70.° da LTC, por não estar em causa qualquer norma cuja aplicação foi recusada com fundamento na sua ilegalidade por violação de lei com valor reforçado, ou que teria sido aplicada apesar de haver sido invocada a sua ilegalidade «com qualquer dos fundamentos referidos nas alíneas c), d) e e)» do n.º 1 do artigo 70º da LTC. No que respeita ao recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, apura-se que não foram aplicadas as normas que o recorrente afirma serem as que constituem objecto do recurso. Na verdade, não foram aplicadas normas com o sentido de que os factos constantes de qualquer peça processual correspondem à verdade sem se fazer o exame crítico da sua génese; ou o artigo 495º do Código do Processo Civil com o sentido de não se aplica ao Supremo Tribunal de justiça; ou a norma resultante do n.º 3 do artigo 668.º do C.P.C. com o sentido de que se o recurso aí referido não for admitido, fica precludido o respectivo conhecimento; ou o artigo 201.º do CPEREF com o sentido de garantir à recorrida uma execução nos autos falimentares que esta ainda não tinha alcançado nos autos de execução fiscal, assim o interpretando contra o que dispõe a parte final do n.º 4 do artigo 20.º da Constituição; ou o artigo 3.º- A do Código de Processo Civil com o sentido alegado; ou o artigo 158.º, n.º 1 do Código de Processo Civil com o sentido de autorizar a falta de fundamentação da decisão, o que violaria o n.º 1 do artigo 205.º da Constituição; ou norma com o sentido de admitir-se a “usurpação” do imóvel que o requerente habite por autorização de seus pais, sem dar a este direito de apresentar a defesa que nas acções executivas é garantida ao executado pelo artigo 813.º do C. do P. Civil, nomeadamente nas alíneas d), e) e f).
É, assim, de não conhecer do objecto do recurso. Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 UC.
Inconformado, o recorrente reclama para a Conferência nos seguintes termos:
A., recorrente nos autos à margem referenciados, não se podendo conformar com a douta decisão proferida pelo Exmo. Senhor Juiz Conselheiro Relator, vem da mesma reclamar para a Conferência, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 78.º - A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro e com os fundamentos que passa a expor:
1. Sempre com o devido respeito, o reclamante não pode concordar com o entendimento exposto pelo Exmo. Senhor Juiz Conselheiro Relator no qual procura justificar a inadmissibilidade do recurso interposto pelo recorrente, aqui reclamante, decidindo pelo não conhecimento do mesmo.
2. Ora, salvo melhor opinião, e com todo o devido respeito, entende o reclamante que tal decisão se mostra indevidamente ajuizada, na medida em que decide não tomar conhecimento do recurso interposto porquanto « [...] apura-se que não foram aplicadas as normas que o recorrente afirma serem as que constituem objecto do recurso».
3. No entanto, no que se refere ao recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da L.T.C., discorda o aqui reclamante do entendimento sufragado na douta decisão sumária em apreço. Na verdade,
4. O ora reclamante interpôs este recurso
«por violação dos artigos 2.º, 9.º, alínea b), 18.º, 20.º, 26.º, 27.º, 44.º, 61.º, 62. ºe 205.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa, ao abrigo das alíneas b), c) e f) do artigo 70.º da Lei Orgânica do dito Tribunal Constitucional, entendendo, salvo o devido respeito, terem sido violados os princípios do caso julgado, proibição de excesso de pronúncia, do dever de pronúncia sobre todas as questões suscitadas ou de que o Tribunal devesse conhecer ex officio, e pedidos formulados na configuração dada pelo ora requerente, do conhecimento oficioso do caso julgado e de litispendência, princípios de interesse e ordem pública, da aplicação do direito aos factos provados, da legitimidade, do interesse em agir e da legalidade, princípio da igualdade e do contraditório, princípio da fundamentação das decisões, tendo sido dada daqueles princípios – bem como dos dispositivos legais que os plasmam, verbi gratiae, artigos 494.º e seguintes, 660.º, 668.º, 659. º, 664.º, 2.º, 3.º, 4.º, 10.º, n. º2, 156.º, n.º 4 158.º, 199.º, n.º 1, 264.º, 265.º, 265º-A, 266º, 659.º, 666.º, 667.º, 668.º, 678.º, n.º 2 e n.º 3, 687.º, n.º 1 e n.º 3, 688.º, n. º5 700.º n.º 3, 702.º, n.º 1, 716.º, 723.º, 734.º, n.º 1 alínea a), 740. º, n.º 2, alínea d) e n.º 3, 754.º, n.º 2 e n.º 3, 758. º, 813.º, alíneas d), e) e f) e 26.º do Código de Processo Civil e 240.º e 1268.º do Código Civil e, ainda, os artigos 176.º, 201.º, 204.º e 205.º do CPEREF – interpretação que desvirtua o direito e denega a justiça, não assegurando a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos.
As inconstitucionalidades e ilegalidades referidas tiveram a sua sede nos doutos acórdãos de Agravo no Venerando Tribunal da Relação e de Agravo neste Supremo Tribunal, foram suscitados nas alegações respectivas, bem como nos requerimentos de aclaração e de arguição de nulidades em cada um dos mencionados doutos Acórdãos».
5. Sendo certo que o ora reclamante nas suas alegações de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça invocou a inconstitucionalidade da interpretação dada ao disposto nos artigos 158.º e 659.º do Código de Processo Civil e 205.º da Constituição da República Portuguesa pelo Venerando Tribunal da Relação ao colher e utilizar factos dados como demonstrados nos chamados autos principais, no qual o recorrente não teve qualquer intervenção por para eles não ter sido citado. Na verdade, o “thema decidendum” no recurso subido ao Venerando Tribunal da Relação restringia-se a um douto despacho do Tribunal a quo proferido a propósito de um incidente processual, já que, no que aos autos principais diz respeito, já o poder jurisdicional do julgador se havia esgotado. Todavia, são enunciados vários factos dados por demonstrados sem que se lhes aponte fundamento ou a respectiva origem, pelo que outra não pode ter sido se não a acção principal que não foi contestada por o ora reclamante para ela não ter sido citado. Esta utilização de tais factos é uma decisão que haveria de ter sido fundamentada, já que, não o sendo, faz mau uso do disposto no n.º 1 do artigo 158.º do Código de Processo Civil, aplicando-se norma daí extraída, que contraria o princípio da «fundamentação das decisões judiciais”, ínsito no n.º 1 do artigo 205.º da Constituição da República Portuguesa.
A utilização destes factos, extraídos de uma acção onde não fora exercido o princípio do contraditório, para servirem de fundamento de uma decisão contra o postergado em tal princípio, além de injusta e ilegal fere, também, o princípio da “igualdade substancial das partes” representando o decidido a aplicação de uma interpretação inconstitucional do artigo 3-ºA do Código de Processo Civil, não consentida pelo artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa.
6. Invocou também o ora reclamante que permitir-se à recorrida a entrega de um bem que alega ter adquirido, o qual nunca fora, efectivamente, apreendido e integrado na massa falida, quando estão, ainda, a decorrer as diligências fiscais/administrativas no processo fiscal, aceitando que a dita recorrida «salte» de processo para processo para obter o mesmo efeito, seria postergar o “princípio do processo equitativo” que prevê o respeito pelo itinerário processual previsto para cada processo, fazendo uma aplicação da lei – in casu, o disposto no artigo 201.º do CPEREF – não permitida pela parte final do n.º 4 do artigo 20.º do referido diploma fundamental.
7. O ora reclamante, em seu requerimento para conhecimento de nulidades, alegou ser inconstitucional a execução da decisão proferida ao abrigo do disposto no aludido artigo 201.º, sem que ao detentor do bem fosse dada a hipótese de se defender, em igualdade de circunstâncias que o executado, que tem ao seu dispor o disposto nas alíneas d), e) e 1) do artigo 813.º do Código de Processo Civil, por ferir os princípios ínsitos na alínea b) do artigo 9.º, 18.º e n.º 4 do artigo 20.º da C.R.P..
8. Porque o Supremo Tribunal de Justiça fundou o não conhecimento do recurso por não estar em causa nenhum dos casos previstos nos n.º 2 e 3 do artigo 754.º do Código de Processo Civil e porque o recorrente considerava estar-se perante uma decisão substantiva, clamou este pelo conhecimento da nulidade de tal decisão por não estar a mesma fundamentada em termos de não ficar ocultado o itinerário da convicção dos Julgadores, invocando a inconstitucionalidade da interpretação do n.º 1 do artigo 158.º do Código de Processo Civil assim aplicada em concreto contra o disposto do n.º 1 do artigo 205.º da C.R.P..
9. Porque o Supremo Tribunal de Justiça não atendeu às nulidades invocadas sob o pretexto de a decisão ser irrecorrível e não ordenou a baixa do processo ao Venerando Tribunal da Relação, por ser este o competente para delas conhecer face à não admissão do recurso, por a invocação de tais nulidades ter ocorrido no prazo das alegações, mas fora dos 10 dias que a lei prevê para a arguição das mesmas quando a decisão é insusceptível de recurso, o ora reclamante invocou a inconstitucionalidade da interpretação do n.º 3 do artigo 668.º do C.P.C. aplicada em concreto, já que a mesma feria os princípios do “acesso ao direito» e da “tutela jurisdicional efectiva» garantidos pelo artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa.
10. O Supremo Tribunal de Justiça não tomou conhecimento oficioso da excepção de caso julgado alegando que, aquando do reparo do ora reclamante, já o seu poder jurisdicional se esgotara. Todavia, o artigo 495.º do Código de Processo Civil não exclui que o Julgador esteja impedido de conhecer de tal excepção até ao curso em julgado da decisão, o que, então, ainda não ocorrera, pelo que o reclamante invocou a inconstitucionalidade da norma extraída da interpretação do aludido artigo 495.º aplicada no caso concreto por infracção ao princípio do acesso ao direito previsto no aludido artigo 20.º da C.R.P..
Termos em que, com o suprimento que expressamente se invoca, sopesados os argumentos acabados de aduzir, vem a aqui reclamante requerer a V. Ex.as se dignem revogar a douta decisão sumária proferida pelo Exmo Senhor Juiz Conselheiro Relator, aceitando-se o recurso, dando-se oportunidade ao reclamante de melhor explicar as suas razões através das alegações e na sequência das mesmas, tomando-se conhecimento do objecto do recurso por si interposto para este Tribunal Constitucional.
A sociedade recorrida, B., LDA. respondeu à reclamação nos seguintes termos:
1. O conhecimento do recurso foi merecidamente recusado.
2. O ora reclamante não se conforma com ele na medida do disposto na al. b) do n.º 1 do art.º 70 da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro.
3. Mas a sua reclamação não tem sombra de razão.
4. O ora reclamante defende que o objecto do recurso deve ser conhecido porque, segundo diz, nele foi efectivamente invocada a aplicação das normas legais discriminadas na douta decisão ora reclamada.
5. Mas desta forma o ora reclamante revela não ter compreendido a fundamentação da douta decisão de não conhecimento do recurso, nem tão pouco o sentido da referida al. b) do n.º 1 do art.º 70 da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro.
6. Neste segmento da douta decisão reclamada, o conhecimento do recurso não foi recusado por nele não se ter invocado a aplicação daquelas normas legais.
7. Mas sim porque, contrariamente ao que diz o ora reclamante, na verdade tais normas não foram aplicadas ao longo do processo. Isto é,
8. A possibilidade de recurso facultada pela supra referida al. b) do n.º 1 do art.º 70 da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro pressupõe que, na decisão de que se pretende recorrer, tenham efectivamente sido aplicadas normas cuja inconstitucionalidade tenha anteriormente sido invocada ao longo do processo.
9. Tal possibilidade de recurso não é facultada aos casos em que, sem razão, se invoca a aplicação dessas normas.
10. O conhecimento do recurso foi recusado porque o Venerando Senhor Conselheiro Relator julgou e bem que na decisão recorrida não foram aplicadas aquelas normas.
11. Trata-se de uma triagem feita antes do conhecimento do recurso.
12. Dada a especificidade da natureza e funções do Tribunal Constitucional, primeiro é apurado se a previsão legal da possibilidade de recurso foi efectivamente preenchida. No caso em apreço, se a decisão recorrida efectivamente aplicou aquelas normas legais.
13. E só confirmado o preenchimento desta previsão se pronuncia então esse Digníssimo Tribunal sobre o efectivo mérito do recurso. Isto é, se tais normas padecem ou não de inconstitucionalidade.
Em suma,
14. Ao conhecimento do recurso interposto ao abrigo da referida al. b) do n.º 1 do art.º 70 da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro não basta a invocação da sua previsão.
15. É necessário que essa previsão esteja efectivamente preenchida.
16. E no caso em apreço não está.
Nestes termos:
Deve a reclamação ser julgada improcedente, (...).
Decidindo:
3. O recorrente ora reclamante interpôs recurso ao abrigo das alíneas b), c) e f) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), aprovada pela Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro. Decidiu-se, na Decisão Sumária n.º 176/2011, não conhecer do recurso no âmbito das alíneas c) e f) do n.º 1 do referido artigo 70.º da LTC, por não estar em causa norma cuja aplicação fora recusada com fundamento na sua ilegalidade por violação de lei com valor reforçado, ou que teria sido aplicada apesar de haver sido suscitada a sua ilegalidade «com qualquer dos fundamentos referidos nas alíneas c), d) e e)» do n.º 1 do artigo 70º da LTC.
Nesta parte, mostra-se transitada a referida Decisão Sumária, visto que o reclamante nada nela contesta.
4. No que respeita ao recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, entendeu o Tribunal, na referida Decisão, que não teriam sido aplicadas, pelo tribunal recorrido, as normas que o recorrente afirma serem as que constituem objecto do recurso.
Cumpre começar por esclarecer que a reclamação verdadeiramente não impugna o juízo que está subjacente à aludida Decisão Sumária, pois não revela, por exemplo, os textos em que o tribunal recorrido aplicou efectivamente tais normas. O que o reclamante faz é repetir os termos do seu anterior requerimento, recordando a matéria que suscitou à conta de inconstitucionalidade de normas. Mas a referida invocação reporta-se a normas que manifestamente o Supremo Tribunal de Justiça não aplicou, visto que recusou conhecer do mérito do recurso para ele interposto. Aliás, o que é criticado pelo recorrente é precisamente a circunstância de aquele tribunal não ter dado cumprimento a determinados preceitos legais, o que resultaria na violação da Constituição; mas, assim expressa, a questão não tem natureza normativa, como exige a alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, pois visa directamente a regularidade e a correcção da decisão recorrida.
Há, assim, que reafirmar o entendimento – que se afigura absolutamente certo – de que o tribunal recorrido não aplicou as normas enunciadas pelo reclamante como objecto do recurso.
5. Termos em que se decide indeferir a reclamação. Custas pelo reclamante, fixando a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta.
Lisboa, 27 de Abril de 2011.- Carlos Pamplona de Oliveira – Maria João Antunes – Gil Galvão.