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Procº nº 168/01 ACÓRDÃO Nº 190/01
1ª Secção Consº Vítor Nunes de Almeida
ACORDAM NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:
I – RELATÓRIO
1. – F..., notificado da decisão sumária de não conhecimento do recurso interposto, veio reclamar para a conferência, nos termos do nº3 do artigo 78º A da Lei do Tribunal Constitucional (LTC).
Como fundamento da reclamação aduz o reclamante que 'a interpretação dada pelo acórdão recorrido à norma ínsita no artigo 256º, nº1, a), do Código Penal, estende o seu âmbito normativo a situações gerais e abstractas de impossível radicalização na letra do preceito. E foi através e por força dessa interpretação sem correspondência na letra da lei que se condenou o arguido, ora recorrente'. E acrescenta o reclamante: 'o que se indaga, ou pretende ver indagado, é se o resultado da interpretação daquele conceito que foi feita pelos Senhores Juízes Desembargadores cabe ou não no âmbito normativo do artigo 256º, nº1, a), do Código Penal, e, em caso de resposta negativa, como em sede de alegações pretende demonstrar o recorrente, se, em violação do artigo
29º, nºs 1 e 3, da Constituição da República Portuguesa, se sentenciou criminalmente o arguido sem que vigorasse lei anterior que declarasse punível a sua acção.'
2. – Notificado o representante do Ministério Público junto deste Tribunal veio responder à reclamação dizendo que a reclamação é manifestamente improcedente, pois ' (...)está perfeitamente sedimentada na jurisprudência maioritária deste Tribunal Constitucional, na sequência da prolação do Acórdão nº 674/99, que não integra uma verdadeira questão de inconstitucionalidade normativa a pretensa aplicação extensiva ou de cariz analógico de elementos de um tipo, em áreas submetidas aos princípios da tipicidade e da legalidade'.
Vejamos como vem equacionada a questão.
3. – Nas conclusões das alegações do ora reclamante escreveu-se, a respeito da questão de inconstitucionalidade, o seguinte:
'As demais condutas do arguido relativas aos restantes veículos não configuram crime de falsificação, porquanto não foi alterada a individualidade e identidade de cada um daqueles veículos, antes se tratou de meras reparações mais ou menos intensas, com aplicação e substituição de peças ou de parte de peças. Além do mais, não existe definição legal, ou até mesmo jurisprudencial, do que seja quadro e/ou que permita estabelecer clara e precisamente a fronteira entre a simples reparação de um veículo monobloco e a sua transformação ou falsificação resultante de tal reparação. Assim, violou o douto Ac. recorrido o princípio da legalidade consagrado no artigo 29º da CRP e 1º do CP, pelo que, deve o recorrente ser absolvido de todos os crimes de falsificação, sendo que a aplicação do art. 256º C.P. ao caso sub judice é, pelos motivos apontados, inconstitucional, inconstitucionalidade que se invoca para todos os efeitos legais.' (sublinhado agora)
Na decisão sumária proferida nos autos justificou-se o decidido pela forma seguinte:
'No caso em apreço, a transcrição que se fez atrás das alegações e do nº 8 das conclusões do recorrente é suficiente para permitir que se conclua que o recorrente imputa a inconstitucionalidade à aplicação normativa que a decisão recorrida fez. De facto, o que o recorrente questiona são os problemas de subsumpção dos factos provados ao artigo 256º do Código Penal (CP), criticando a forma como tal aplicação foi feita. Outra coisa não se pode concluir do seguinte excerto das alegações: 'violou assim o acórdão recorrido, ao aplicar aquela norma ao caso sub judice, o princípio constitucional legalmente consagrado do «nullum crimen sine lege», da legalidade, aqui na vertente da ilicitude (...)'.
É portanto a aplicação que o acórdão recorrido faz do artigo 256º ao caso em apreço que o recorrente questiona. Ora, como se disse, as decisões judiciais consideradas em si mesmas, não podem, no sistema português de fiscalização concreta de constitucionalidade, ser objecto de recurso de constitucionalidade.
Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
II - FUNDAMENTOS:
4. - Segundo o recorrente e ora reclamante, com a alegação que atrás se transcreveu, pretendia ver apurado se o resultado daquela interpretação feita na decisão cabe ou não no âmbito normativo do artigo 256º, nº1, a), do CP.
A ser assim, o que o reclamante questiona ou censura ao acórdão recorrido é ter qualificado como crime de falsificação previsto no artigo 256º a prática das 'transformações' e 'alterações' a que procedeu nos veículos identificados, designadamente, o número de quadro e/ou as chapas de matrícula.
O reclamante entende, de facto, que o princípio da legalidade penal tem forçosamente de se manter nos limites da tipicidade imposta pelo artigo 29º da Constituição, pelo que qualquer interpretação que extravase tais limites será inconstitucional.
Mas, se assim for, então o que o reclamante verdadeiramente questiona é claramente o processo interpretativo que permitiu ao tribunal recorrido incluir no conceito de documento autêntico não só a chapa de matrícula e/ou o quadro do veículo e não se o legislador podia tipificar como crime agravado a falsificação dos elementos identificadores dos veículos automóveis.
Questiona-se, por conseguinte, a própria decisão judicial que chegou a tal resultado.
Da reclamação apresentada nada resulta em contrário do que fica referido.
Assim, tal reclamação tem de ser indeferida.
III - DECISÃO
Nestes termos, o Tribunal Constitucional decide indeferir a reclamação apresentada por F....
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em
15 unidades de conta.
Lisboa, 3 de Maio de 2001 Vítor Nunes de Almeida Maria Helena Brito Luís Nunes de Almeida