Imprimir acórdão
Proc.º n.º 72/2001.
2.ª Secção. Relator:- BRAVO SERRA.
1. Em 26 de Fevereiro de 2001 o relator proferiu nos presentes autos decisão sumária com o seguinte teor:-
'1. T... e mulher, J..., interpuseram junto do Tribunal Administrativo de Círculo do Porto recurso contencioso de anulação dos despachos proferidos em 24 de Junho, 18 e 19 de Outubro de 1994 pelos Vereadores substitutos do Presidente da Câmara Municipal de Marco de Canaveses, Licenciados A... e C..., despachos esses que, no exercício de poderes delegados pelo Presidente daquela edilidade, na sequência do requerido por M..., deferiu a viabilidade e condicionalmente licenciou a construção de uma habitação a que correspondeu a emissão do Alvará nº 471/94, cuja nulidade também foi peticionada pelos recorrentes.
Tendo, por sentença prolatada em 7 de Novembro de 1994 pela Juíza daquele Tribunal Administrativo de Círculo, sido dado provimento ao recurso e, em consequência, declarado nulo o acto administrativo praticado em 19 de Outubro de 1994, da mesma recorreram para o Supremo Tribunal Administrativo o Vereador substituto do Presidente da Câmara Municipal de Marco de Canaveses e M... e mulher.
Na alegação adrede produzida, escreveram, inter alia, os recorrentes:-
‘............................................................................................................................................................................................................................................ VI
Os recorridos alegaram também que de acordo com o decreto lei 289/73, artigo 70, a Câmara não podia indeferir o pedido de loteamento com fundamento em afastamento lateral inferior a 3 metros o que denota o carácter secundário de tal requisito, não determinativo de nulidade. Na verdade, os motivos de indeferimento são taxativos. Nem podia ser de outra forma, sob pena de se inviabilizar a construção em banda contínua.
A exigência de tal requisito de afastamento de 3 metros, como essencial, representa uma autêntica revogação dos artigos 1360, 1362 e 1363, como arbitrária restrição ao direito de propriedade.
Tal requisito, a ser tido como essencial, viola o princípio da proporcionalidade que deve presidir à feitura e aplicação das leis e, consequentemente, das situações que visa regular, definindo as respectivas situações.
O afastamento de 1,5 m representa a consagração de um princípio geral que permite dar satisfação a todos os interesses em jogo - privados e não privados. Até o facto de ser permitida a construção em banda confirma a total razoabilidade desse princípio.
Daí que a imposição de um afastamento de 3 metros constitua uma restrição arbitrária e injustificada ao direito de propriedade e, em certa medida, uma revogação do estatuído nos citados artigos do Código Civil, o que é inconstitucional por violar o disposto nos artigos 62 e 266 da Constituição, o que se invoca expressamente. VII
A estipulação do afastamento de 3 metros da linha divisória não dimana de qualquer disposição legal por inexistir, pelo que resulta de uma prática que não tem suporte legal imperativo. Daí que possa ser alterada respeitando-se o mínimo de 1,5 m consagrado pelo Código Civil, atinente a permissão de aberturas. No caso em apreço e face ao já invocado abuso de direito, atenta a realidade existente e comprovada documentalmente, o afastamento de 1,5 acabou por ser consagrado e como suficiente para dar plena satisfação aos interesses em jogo. Nem a Câmara Municipal podia impor um distanciamento de 3 metros por carência do necessário suporte legal, face à ausência da sua consagração em diploma legislativo idóneo. .........................................
.............................................................................................................................................................................................................................................. Conclusões:
..............................................................................................................................................................................................................................................
13) o afastamento de 3 metros é uma imposição arbitrária e violadora do direito de propriedade consagrada no Código Civil;
..............................................................................................................................................................................................................................................
15) o afastamento de 3 metros implica a revogação dos artigos 1360,
1362 e 1363 do Código Civil o que constitui inconstitucionalidade por violação do disposto nos artigos 62 e 266 da Constituição;
..............................................................................................................................................................................................................................................
18).............................................................................................................................................................................................................................
- a douta sentença violou o disposto nos artigos 72 do dec. lei
448/91 de 29/11, 334 do Código de Processo Civil, 668, nº 1, al. d) do Código de Processo Civil e o P.D.M. do concelho de Marco de Canaveses publicado no D.R. I série, nº 116 de 19/5/94, 62 e 266 da Constituição, além de outras disposições legais.
............................................................................................................................................................................................................................................’
O Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão de 4 de Abril de 2000, negou provimento ao recurso interposto da sentença lavrada no Tribunal Administrativo de Círculo do Porto.
Para o que agora interessa, releva transcrever desse aresto os seguintes passos:-
‘............................................................................................................................................................................................................................................
Apreciando os vicios que eram imputados a tal acto, a sentença sob recurso concluiu ‘ que a obra licenciada a pedido do recorrido particular, não respeita as prescrições do alvará de loteamento, relativamente à área e local de implantação’, concretamente ‘no que se refere aos afastamentos laterais a distância é de apenas 1,50 (referindo-se 1,30 por lapso), quando pelo alvará de loteamento o afastamento exigido é de 3’, o que violou o disposto no alvará de loteamento e, consequentemente, o disposto no n.º 1 do art.º 17.º e na alínea a) do n.º 1 do art.º 63.º do DL 445/91’, o que integra a nulidade enunciada na alínea b) do n.º 2 do art.º 52.º do citado DL 455/91.
..............................................................................................................................................................................................................................................
Como se viu o decidido assentou na consideração de que a obra licenciada em causa não respeitou as especificações do alvará de loteamento no que se refere aos afastamentos laterais cuja distância era apenas de 1,50 quando pelo alvará tal afastamento era de 3 metros, o que constituía nulidade. A propósito da invocação dos recorridos no sentido de que ocorrera alteração ao loteamento quanto ao referido afastamento lateral, alteração ocorrida ‘ao licenciar todas as construções’ quanto ‘ao afastamento mínimo de 1,5 m’ (cf. contestações, a fls. 70 e segs. e fls 83-84), foi decidido que ‘para que haja alteração válida de alvará de loteamento é necessário que haja processo idêntico ao pedido inicial de loteamento’, sendo designadamente ‘necessário o parecer das entidades que foram ouvidas aquando da operação de loteamento’, o que não sucedeu. Por outro lado, ‘tal alteração teria de constar expressamente no alvará de loteamento e mapa anexo’, o que também não sucedeu. Assim, segundo a sentença, porque não se verificaram, nos aludidos termos, os requisitos necessários a uma alteração válida, no condicionalismo indicado não ocorreu tal alteração e, portanto, o alvará de loteamento a que a entidade recorrida devia obediência era o inicial, documentado no apenso.
..............................................................................................................................................................................................................................................
Deve dizer-se que o aludido entendimento no sentido de que as alterações ao que consta no alvará de loteamento deverão seguir formalismo idêntico ao seguido para este, e como logo o inculca o disposto no art. 36.º do DL 448/91, mostra-se em consonância com reiterada jurisprudência deste STA, podendo a propósito ver-se, por mais recentes, os seguintes arestos: de 11/07/95
(rec. 37116), de 7/03/96 (rec. 35437), de 9.07/96 (rec. 31321), de 27/05/97
(rec. 39279), de 10/12/98 (rec. 42528), de 16/12/98 (rec. 38030), e de 23/11/99
(rec. 45420).
..............................................................................................................................................................................................................................................
Independentemente do que se deixou exposto, nem no DL 448/91, nem PDM de Marco de Canavezes, se enxerga qualquer disposição (que, aliás, os recorrentes nem sequer citam) que desonere as alterações ao loteamento de seguirem as formalidades prescritas para o licenciamento das operações de loteamento que o art. 36.º daquele DL 448/91, e como se viu, prescreve.
..............................................................................................................................................................................................................................................
Os ora recorrentes reeditam o entendimento de que ‘a imposição de um afastamento de 3 metros constitui uma restrição arbitrária e injustificada ao direito de propriedade e, em certa medida, uma revogação do Código Civil, o que
é inconstitucional por violar o disposto nos arts. 62.º e 266.º da CRP’.
Vejamos:
Antes do mais refira-se que, como a doutrina (e jurisprudência do TC e deste STA) vêm reiteradamente afirmando, o jus aedificandi (mais propriamente ainda o direito de urbanizar lotear e edificar) não se incluiu no direito de propriedade privada, sendo antes o resultado de uma atribuição jurídico pública do proprietário decorrente do ordenamento jurídico urbanístico, designadamente dos planos - ou seja, um poder que acresce à esfera jurídica do proprietário, nos termos e nas condições definidas pelas normas jurídico-urbanísticas ... apesar de o direito de propriedade ser um direito de natureza análoga aos direitos liberdades e garantias (in Ac. do TC de 22/09/99 - DR. II. 263, de
11/11/99), afirmando-se ali ainda que se não incluem na dimensão essencial do direito de propriedade, os direitos de urbanizar, lotear e edificar. No mesmo sentido e por mais recentes poderão ver-se os seguintes acórdãos deste STA: de
8/10/98 (rec. 34722-P), 16/11/2000 (rec. 35723), de 23/01/2000 (rec. 44287), e de 1/03/2000 (rec. 43993).
Ora, à luz do exposto, deve concluir-se, na linha do decidido, e desde que respeitado o afastamento mínimo de 1,5 m imposto por lei (cf. citadas disposições do C.C.), pode a Câmara, atentas as características do loteamento, alterar tal distância sem que tal implique, nos termos expostos, violação do direito de propriedade. Por outro lado, relativamente à especificação constante do alvará de loteamento, quanto à aludida distância de 3 metros não se mostra que a mesma atente contra algum princípio constitucional, nomeadamente que se considere como desproporcionada ou materialmente infundada.
Daí que, e como já acima se referiu, não poderia na valoração do acto impugnado deixar de se levar em conta a mesma especificação, e considerar, como se fez na sentença, como inquinado de nulidade o acto de licenciamento que a desrespeitou, atento o disposto na al. b) do n.º 2 do art.º 52.º do DL 445/91.
............................................................................................................................................................................................................................................’
Do acórdão de que partes se encontram transcritas arguiram os recorrentes a sua nulidade, dizendo em dados pontos do respectivo requerimento consubstanciador dessa arguição:-
‘............................................................................................................................................................................................................................................
No recurso interposto em primeira instância os recorrentes T... e mulher requereram a citação dos dois referidos vereadores.
..............................................................................................................................................................................................................................................
E constataram, também, que o recorrido e Segundo Vereador Dr C... não foi citado para os termos do recurso interposto no TAC do Porto, apesar de ter sido requerida expressamente, falta que constitui a nulidade prevista no disposto na alínea a) do artigo 194º do Código de Processo Civil e que acarreta a nulidade de todo o processado após a petição inicial. II)
Na verdade, só agora e da consulta dos autos os arguentes vieram a verificar tal falta que é insuprível e viola os princípios constitucionais da defesa, da igualdade e do contraditório.
.............................................................................................................................................................................................................................................. IV)
O disposto no artigo 194º do Código de Processo Civil tem por fim assegurar, de forma absoluta, o direito de defesa, o princípio da igualdade e o princípio do contraditório, assegurados constitucionalmente - vd. artigo 13º da Constituição da república Portuguesa - e imanentes ao nosso sistema jurídico, pelo que a sua interpretação no sentido de poder ser suprida tal nulidade, implicará necessariamente a sua inconstitucionalidade material, o que por mera cautela se invoca.
............................................................................................................................................................................................................................................’
O Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão de 28 de Novembro de
2000, indeferiu a arguida nulidade, escrevendo-se ali, no que agora interessa:-
‘...........................................................................................................................................................................................................................................
Tendo presente o exposto deve concluir-se que a entidade recorrida não pode ser senão o Presidente da Câmara.
Assim quando através do aludido despacho de fls. 69 foi ordenada a citação da entidade recorrida e em resultado da mesma interveio nos autos o aludido primeiro substituto legal do Presidente Câmara Municipal de Marco de Canavezes, tudo deve continuar a passar-se, como se fosse o presidente da câmara a intervir.
Foi assegurada pois nos enunciados termos, a legitimidade passiva da relação processual contenciosa, e bem assim o cumprimento do contraditório.
Deste modo, e porque a anunciada conclusão não sanciona qualquer desaplicação dos preceitos legais que impõem a chamada ao processo do autor do acto contenciosamente impugnada (cf. artºs 840.º do Cód. Adm.º e 194.º do Cód. Proc. Civ.) ou qualquer interpretação dos mesmos em desconformidade com algum princípio constitucional, nomeadamente o do contraditório.
............................................................................................................................................................................................................................................’
Destes acórdãos recorreram para o Tribunal Constitucional os Vereador substituto do Presidente da Câmara Municipal de Marco de Canaveses e M... e mulher, o que fizeram por intermédio de requerimento com o seguinte teor:-
‘M... e mulher e o Vereador Substituto do Presidente da Câmara Municipal de Marco de Canaveses, Dr..., não se conformando com os aliás doutíssimos acordãos de 04 de Abril de 2000 e 28 de Novembro de 2000 que julgou improcedentes as alegadas inconstitucionalidades, deles vêm interpor recurso para o Venerando Tribunal Constitucional, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo, sob pena de inutilidade - artigo 78º, nº 4 da Lei do Tribunal Constitucional.
O presente recurso fundamenta-se no disposto nas alíneas a) e b) do artigo 70º da referida Lei, por entender-se que os doutos acordãos e decisões antecedentes violaram o disposto nos artigos 62º, 266º e 13º da Constituição da República Portuguesa por serem materialmente inconstitucionais os artigos 1360º,
1362º e 1363º do Código Civil e 194º do Código de Processo Civil no entendimento que foi perfilhado nas aliás doutíssimas decisões proferidas.
Requerem , pois, a V.Exª a admissão do presente recurso, seguindo-se os ulteriores termos’.
Os recursos vieram a ser admitidos por despacho proferido em 10 de Janeiro de 2001 pelo Conselheiro Relator do Supremo Tribunal Administrativo.
Não obstante tal despacho, porque o mesmo não vincula este Tribunal
(cfr. nº 3 do artº 76º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro) e porque se entende que os recursos não deveriam ter sido admitidos, elabora-se, ex vi do nº 1 do artº 78º-A da mesma Lei, a presente decisão, através da qual se não toma conhecimento do objecto das vertentes impugnações.
2. Comecemos pelos normativos constantes dos artigos 1360º, 1362º e
1363º do Código Civil.
Sem embargo de se fazer notar que o requerimento de interposição dos recursos para este Tribunal não obedece aos requisitos consagrados nos números 1 e 2 do artº 75º-A da Lei nº 28/82, deve, desde logo, notar-se que nem sequer é perceptível a razão de ser da impugnação intentada efectuar referentemente
àquelas normas.
Na realidade, como à saciedade deflui das transcrições que acima se efectuaram, os ora recorrentes defenderam nos autos que, tendo em conta as prescrições constantes daqueles artigos (com mais precisão dir-se-ia, por um lado, a imposição de estabelecimento do intervalo mínimo de metro e meio a que se reportam os números 1 e 2 do artº 1360º, o esclarecimento definitório ínsito na primeira parte do seu nº 3 e o nº 2 do artº 1362º e, por outro, as derrogações àquela imposição que se extraem da segunda parte do dito nº 3 e do artigo 1363º), não poderia a Câmara Municipal em questão, aquando da passagem de um alvará de loteamento, impor que o distanciamento lateral das construções a licenciar fosse superior àquele mínimo, sob pena de o acto (administrativo) que permitisse esse licenciamento constituir revogação daquelas disposições legais, incorrendo o mesmo, assim, em inconstitucionalidade por violação do direito de propriedade consagrado no artigo 62º da Constituição.
Decorre imediatamente daqui que o vício de contraditoriedade com a Lei Fundamental assacado pelos recorrentes não se poderia dirigir, como é óbvio, aos preceitos do Código Civil, mas sim ao acto (administrativo) que impusesse um distanciamento maior que o estipulado naqueles preceitos (ou ainda, numa outra perspectiva, a qualquer norma ou quaisquer normas de onde se extraísse a possibilidade conferida à entidade administrativa para impor um distanciamento superior ao consagrado nos aludidos preceitos).
E daí que não se entenda porque motivo é que, por intermédio do vertente recurso, se deseja ver questionada a constitucionalidade dos artigos do Código Civil, os quais, antecedentemente à prolação do acórdão tirado em 4 de Abril de 2000, até foram tido como parâmetro da própria solução adequada e proporcionada à garantia da propriedade, representando eles ‘a consagração de um princípio geral que permite dar satisfação a todos os interesses em jogo - privados e não privados’.
Para além disso, e mesmo que se viesse eventualmente a aceitar que, antes de ser lavrado o acórdão de 4 de Abril de 2000, os ora impugnantes tinham suscitado, e de modo adequado, a inconstitucionalidade das normas vertidas nos falados artigos 1360º, 1362º e 363º - o que somente se aceita para efeitos meramente argumentativos - o que não deixa de ser evidente é que aquele aresto não conferiu qualquer interpretação normativa (ou outra) de harmonia com a qual era imposto à entidade recorrida o estabelecimento de um distanciamento lateral entre construções e edificações superior a um metro e meio e, consequentemente, que lhe estivesse vedado estabelecer um distanciamento inferior àquela distância, nomeadamente aquele mínimo estabelecido pelos ditos artigos.
Isso resulta inequivocamente da parte final do mencionado acórdão, acima transcrita, no ponto em que, como se viu, ali se disse que ‘[o]ra, à luz do exposto, deve concluir-se, na linha do decidido, e desde que respeitado o afastamento mínimo de 1,5 m imposto por lei (cf. citadas disposições do C.C.), pode a Câmara, atentas as características do loteamento, alterar tal distância sem que tal implique, nos termos expostos, violação do direito de propriedade’. O que aquele aresto entendeu foi que, uma vez estabelecido no alvará de loteamento que as distâncias entre as construções ou edificações não poderiam ser inferiores a três metros, não poderia ser concedida autorização de construção da qual resultasse um distanciamento concreto inferior, a menos que aquele alvará fosse objecto de alteração o que, no caso então em apreciação, não acontecia.
Do exposto se concluiu que não se congregam os requisitos do recurso consagrado na alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82.
2.1. E, tocantemente ao recurso estribado na alínea a) dos mesmos número e artigo, é por demais claro que do mesmo se não podia lançar mão, justamente porque o acórdão desejado impugnar não recusou, com fundamento em inconstitucionalidade, a aplicação de qualquer norma jurídica constante do ordenamento infra-constitucional.
2.2. Vejamos agora o recurso dirigido à norma do artº 194º do Código de Processo Civil e ao acórdão prolatado em 28 de Novembro de 2000.
Igualmente é por demais claro que não poderia colher o recurso fundado na referida alínea a) do nº 1 do artº 70º, pois que aquele acórdão não recusou, ao caso em apreço, a aplicação da norma ínsita no artº 194º.
2.3. E quanto ao recurso baseado na alínea b), também não se assiste a que, na situação em análise, estejam reunidos os requisitos permissores dessa forma de impugnação.
De facto, os ora recorrentes, no requerimento em que solicitaram a arguição de nulidade do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 4 de Abril de 2000, sustentaram que uma interpretação do artº 194º do Código de Processo Civil, da qual resultasse que era possível ser suprida a nulidade decorrente da falta de citação, era contrária a determinados princípios constitucionais.
Independentemente de se saber se poderia ser suscitado, relativamente
àquela norma, o vício de inconstitucionalidade da forma como o foi (e isso pela singela razão segundo a qual não é o artº 194º do Código de Processo Civil que cura do suprimento ou sanação das nulidades), o que é evidente é que no acórdão de 28 de Novembro de 2000 não foi, de todo em todo, considerado que a eventual nulidade decorrente da alegada falta de citação de um dos vereadores substitutos do Presidente da Câmara Municipal de Marco de Canaveses estava, fosse porque forma fosse, suprida ou sanada.
Na verdade, o que aquele acórdão entendeu foi que a citação daquele concreto vereador substituto não era devida, pois que, para o recurso em causa, tinha apenas de ser citado o indicado Presidente da Câmara.
Vale isto por dizer que o acórdão de 28 de Novembro de 2000 o que entendeu foi que, in casu, houve a citação de quem deveria e teria de ser citado, desta arte não perfilhando a óptica segundo a qual a nulidade consistente em uma citação que deveria ter ocorrido mas que, contudo, não ocorreu, se havia de considerar como já sanada ou suprida.
Por esta razão se haverá que concluir que, por banda do acórdão em causa, não houve a aplicação de uma dimensão normativa que, antecedentemente ao seu proferimento, foi questionada, do ponto de vista da sua compatibilidade constitucional, pelos ora recorrentes. E por isso também se concluirá que não seria possível que o recurso se ancorasse na alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82.
3. Termos em que se não toma conhecimento do objecto dos recursos, condenando-se os impugnantes M... e mulher nas custas processuais, fixando-se a taxa de justiça em quatro unidades de conta, não se procedendo a igual condenação referentemente ao Vereador substituto do Presidente da Câmara Municipal de Marco de Canaveses dado que esta entidade está isenta de custas'.
Da transcrita decisão sumária reclamaram para a conferência os recorrentes dizendo, em síntese:-
- que arguiram na 1ª instância a inconstitucionalidade material dos números 1 e 2 do artº 54º da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos, sendo que o acórdão proferido no Supremo Tribunal Administrativo não foi entendido que essa norma padecesse de tal vício;
- o recurso interposto para o Tribunal Constitucional '...visou o conhecimento de todas as alegadas inconstitucionalidades, por que foram apreciadas nos doutíssimos acórdãos de 4-4-2000 e 28/11/2000', tendo a decisão sumária reclamada 'omitido o conhecimento de tal inconstitucionalidade...';
- continuam os recorrentes a entender que existe '...a alegada inconstitucionalidade dos artigos 1360, 1362 e 1363 do Código Civil, porque a não aceitação do afastamento lateral de 1,5 colide com a essência do direito de propriedade', pelo que 'um afastamento superior mas não devidamente justificado ofende o que a Constituição defende e que os citados artigos consagram na prática...';
- no acórdão recorrido foi entendido que não existia qualquer nulidade, decisão que foi indevida, pois que no '...caso em apreço há delegação de poderes expressa e como tal tem de ser entendida, pelo que não têm cabimento as aliás doutas considerações doutrinais referidas no também douto acórdão...', não podendo aceitar-se nem entender-se, num 'estado de direito democrático ... que o autor de acto administrativo cuja nulidade foi decretada não seja citado nem possa defender-se'.
Os recorridos, ouvidos sobre a reclamação, propugnaram pelo respectivo indeferimento.
Cumpre decidir.
2. Na reclamação ora em apreço não foram carreados quaisquer motivos, razões ou argumentos que, ainda que remotamente, sejam susceptíveis de abalar o que se contém na decisão sumária sub iudicio, com a qual, na sua essencialidade, o Tribunal concorda.
Consequentemente, no tocante aos normativos constantes do requerimento de interposição de recurso, é aqui reeditada a argumentação que foi aduzida naquela decisão, anotando-se que o que se contém no requerimento consubstanciador da reclamação só reforça o entendimento de que aquilo que os ora reclamantes, verdadeiramente, questionam, é a decisão ou são as decisões qua tale tomadas por intermédio do aresto pretendido impugnar, e não qualquer normativo que serviu de suporte ao decidido.
Adite-se ainda que, não constando do requerimento de interposição de recurso as normas ínsitas nos números 1 e 2 do artº 54º da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos, logo por aí [ou seja, independentemente da questão de saber se, quanto a ela, se congregariam os requisitos do recurso a que alude a alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82] seria vedado a este Tribunal delas tomar conhecimento. Consequentemente, não se pode falar em qualquer omissão em que, nesse particular, teria incorrido a decisão sumária reclamada.
Termos em que se indefere a reclamação.
Custas pelos reclamantes M... e mulher (já que o Vereador Substituto da Câmara Municipal de Marco de Canaveses delas está isento), fixando-se a taxa de justiça em quinze unidades de conta. Lisboa, 18 de Abril de 2001 Bravo Serra Maria Fernanda Palma José Manuel Cardoso da Costa