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Processo nº 416/99
3ª Secção Rel. Cons. Tavares da Costa
Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. - Nos presentes autos de recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade, instaurados ao abrigo do artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que são recorrentes JM e CF e é recorrido o Ministério Público, foi proferido acórdão em 17 de Janeiro último, com o nº 11/2001, a não tomar conhecimento dos recursos interpostos.
Pretendem agora, os requerentes, a aclaração desse aresto.
O magistrado recorrido, notificado, veio aos autos pronunciar-se no sentido da rejeição da pretensão deduzida.
Em seu entendimento, a decisão proferida, no tocante à inutilidade da questão de constitucionalidade suscitada face ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 17 de Fevereiro de 2000 (o segundo dos arestos recorridos, em relação ao qual se coloca o problema da aclaração) é
'perfeitamente clara e inteligível', não se vislumbrando 'obscuridade' que seja necessário aclarar.
Cumpre decidir.
2. - Observam os requerentes, num primeiro momento, não conseguir entender certa passagem do texto, não obstante 'lida e relida e lida ainda por uma terceira vez'.
Referem-se ao trecho do ponto II – 2.2. (fls. 513 dos autos) do acórdão, onde, após se afirmar, em parágrafo anterior, que a argumentação desenvolvida no acórdão em referência não permite afirmar ter sido postergado o princípio da lei penal mais favorável ao arguido, se escreveu:
'É que, como a transcrição feita revela, o procedimento criminal sempre teria de considerar-se interrompido, seja em conformidade com a versão inicial do Código de 1982, seja de acordo com as alterações que posteriormente lhe foram autorizadas.'
Confessam os requerentes não enxergar uma transcrição, de modo a dar sentido àquela passagem.
No entanto, é óbvio que, lido o acórdão no seu todo e não de modo segmentado e descontextualizado, se está a aludir à passagem desse acórdão reproduzida um pouco antes, no ponto I – 1.4. e que, de resto, por ser
única, não permite confusão.
Escreveu-se, nesse ponto (fls. 503 e 504 dos autos):
'Recebidos os autos neste Tribunal Constitucional, atravessaram os arguidos requerimento em que pedem a remessa dos mesmos ao Supremo Tribunal de Justiça, a fim de aí ser declarado extinto o procedimento criminal, por prescrição. Os autos foram remetidos àquele Supremo, após despacho do relator, de 7 de Janeiro de 2000 e aí, por acórdão de 17 de Fevereiro seguinte, não se considerou prescrito o procedimento criminal quanto aos recorrentes. Como, então, se escreveu, ocorreu uma causa interruptiva da prescrição do procedimento criminal, ao ser o arguido notificado do 'despacho de pronúncia ou equivalente, nos termos do apontado artigo 120º, nº 1, alínea c), do CP, o que teve lugar por despacho de 21 de Setembro de 1995, notificação levada a efeito
'muito antes de 16 de Dezembro de 1998' (data em que, segundo os recorrentes, teria ocorrido a prescrição). Aliás, para o Supremo, sempre essa interrupção da prescrição se verificaria,
'quer se considere aplicável o regime constante do Código Penal de 1982, quer se aplique o regime em vigor instituído pela Lei nº 65/98 e pelas alterações decorrentes do Decreto-Lei nº 48/95, porquanto se se considerar aplicável o regime vigente à data do cometimento dos factos, a prescrição interrompe-se com a notificação ao arguido do despacho de pronúncia ou equivalente, nos termos do artigo 120º, nº 1, alínea c), do Código Penal, proferido em 21-9-95; e se se considerar aplicável o regime actual da interrupção da prescrição do procedimento criminal, também esta se interrompeu com a notificação da acusação, nos termos do artigo 121º, nº 1, alínea b), do Código de Processo Penal
[rectius: do Código Penal] deduzida em 22-6-95 e seguidamente notificada'. Sendo certo que, para o Supremo, em qualquer das vias possíveis o procedimento criminal não se extinguira, aquele Tribunal optou, no entanto, pelo aplicação do preceito de 1982, por ser esse o sentido da jurisprudência fixada anteriormente e por não se 'mostrar adequado' aplicar retroactivamente o novo regime.'
Não se vê, em face do exposto, que o acórdão nº 11/2001 peque por falta de clareza.
3. - Num segundo momento, consideram os requerentes obscura a passagem do acórdão na qual, após se observar ter o Supremo entendido ser aplicável ao caso concreto o regime decorrente da primitiva redacção [do artigo
120º, nº 1, alínea c), do Código Penal], se acrescentou: 'E compreende-se porquê: a aplicação desta última redacção [ou seja, a actual], implicaria considerar-se interrompida a prescrição com a notificação ao arguido da acusação'.
A certo passo do acórdão aclarando escreveu-se, após se observar ter o Supremo entendido ser aplicável ao caso concreto o regime decorrente da primitiva redacção do artigo 120º, nº 1, alínea c), do Código Penal:
'[...] entendeu-se [no acórdão do Supremo] ser aplicável ao caso concreto o regime decorrente da primitiva redacção [...] não sendo de observar o texto actual, fixado pelo Lei nº 65/98. E compreende-se porquê: a aplicação desta
última redacção implicaria considerar-se interrompida a prescrição com a notificação ao arguido da acusação [...]ocorrida obviamente em momento anterior e, como tal, configurando-se mais desfavoravelmente aos arguidos.'
O trecho é claro, exprime, de resto, uma ponderação meramente adjuvante, e a sua leitura não proporcionou dúvidas aos requerentes, na medida em que a interrogação feita por estes subentende uma correcta interpretação. Como sublinha judiciosamente o magistrado do Ministério Público, na sua resposta, é evidente que a aplicação, ao caso dos autos, da lei nova implicaria interrupção da prescrição em momento anterior ao que decorreria da aplicação da lei precedentemente em vigor.
Ora, a ininteligibilidade não se casa com a evidência e, por sua vez, não se surpreende ambiguidade no acórdão.
No seu estilo linear, ensinava Alberto dos Reis que a sentença é obscura quando contenha algum passo cujo sentido seja ininteligível, ou seja, quando não se sabe o que o juiz quis dizer, e é ambígua quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes, hesitando-se entre dois sentidos diferentes e porventura opostos (cfr. Código de Processo Civil Anotado, vol. V, Coimbra, 1981, pág. 151).
No caso sub judice não se detecta nem obscuridade, nem ambiguidade.
4. - Em face do exposto, decide-se indeferir o requerido.
Custas pelos requerentes, com taxa de justiça que se fixa, para cada um, em 10 unidades de conta. Lisboa, 28 de Março de 2001 Alberto Tavares da Costa Maria dos Prazeres Pizarro Beleza José de Sousa e Brito Messias Bento Luís Nunes de Almeida