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Proc. nº 600/98
1ª Secção Relator: Cons. Vítor Nunes de Almeida
ACORDAM NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:
J. L. vem reclamar arguindo a nulidade por falta de fundamentação de direito, do Acórdão nº 350/99, de 15 de Junho de 1999, que, em conferência, confirmou o despacho do relator que indeferira o pedido de apoio judiciário apresentado pelo requerente. Termina pedindo a declaração de nulidade da sentença e o suprimento da nulidade, ordenando-se o prosseguimento do incidente, de forma a vir a ser-lhe concedido apoio judiciário com dispensa total do pagamento de custas. Na decisão reclamada foi historiado o contexto processual em que surgiu o incidente de pedido de apoio judiciário sobre o qual, aliás, em devido tempo se pronunciara o Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal, no sentido do indeferimento, em posição acolhida pelo relator e depois confirmada em Acórdão. No requerimento de arguição de nulidades vem dizer o reclamante, concluindo, o seguinte:
I. Só em taxa de justiça, e sem que a questão litigiosa – 'estamos perante um tribunal, no sentido determinado pela Constituição, quando os seus juizes (da secção ad hoc do STJ) são nomeados e designados pelo réu (C.S.M), destinando-se o tribunal a julgar só os litígios suscitados contra o réu por um grupo específico de cidadãos?' – tenha sido decidida, o Tribunal Constitucional já condenou o recorrente a pagar taxa de justiça no valor total até agora de 350.000$00 (210.000$00 + 140.000$00), mais de metade do seu ordenado mensal no montante global de 688.540$00.
II. A questão que levou o recorrente a convocar o Tribunal Constitucional em 22.4.98, há mais de um ano, ainda não se mostra decidida, mas já o recorrente foi condenado pelo Tribunal Constitucional a pagar a taxa de justiça no valor total até agora de 350.000$00.
III. Tal circunstância configura uma justiça objectivamente lenta e objectivamente cara o Afigura-se ao recorrente que o Acórdão indefere a sua pretensão por considerar: o que por o recorrente ser rico, pode bem pagar as custas devidas por uma litigância que não inclua reclamações para a conferência, nem arguições de nulidade; o que o equilíbrio do agregado familiar do recorrente se pressupõe no plano do médio prazo e não no plano do dia a dia; o que o acesso aos tribunais não pode ser considerada uma coisa banal, mas sim excepcional; o que o acesso à justiça praticado pelo recorrente implica um desequilíbrio do seu agregado familiar, o que é da sua responsabilidade; o que o deferimento da pretensão do recorrente constitui um mau exemplo para os outros cidadãos; o que o juízo de despropósito da prática do recorrente do acesso do recorrente à justiça gera incomodidade.
I. Se o juízo de despropósito da prática pelo recorrente do acesso à justiça gera incomodidade, parece que tal incomodidade não pode levar à negação do direito fundamental de acesso à justiça do recorrente, levando sim à implementação dos institutos relativos às garantias de imparcialidade, se a incomodidade referida tiver relevo para a negar direitos, como parece ser o caso.
II. De acordo com o artº 20º, nº1, da Constituição, e nos termos do artº 1º, nº1, do Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro, o sistema de acesso ao direito e aos tribunais destina-se a promover que a ninguém seja dificultado ou impedido por insuficiência de meios económicos de fazer valer ou defender os seus direitos.
III. Por outro lado, dispõe o artº 7º, nº1, do mesmo diploma legal, que têm direito a protecção jurídica as pessoas singulares que demonstrem não dispor de meios económicos bastantes para custear, total ou parcialmente, os encargos normais de uma causa judicial.
IV. Face ao regime legal do sistema de acesso ao direito e aos tribunais, verifica-se que a concessão do apoio judiciário assenta na individualidade de cada cidadão em concreto.
V. A análise semântica do ponto 5 do texto do Acórdão – ponto em que se concentra a motivação do indeferimento – denota o uso de expressões linguísticas de sentido vago e indeterminado, tanto mais que não se apresentam como expressões comunicativas de índole jurídica.
VI. Assim, verifica-se que o Acórdão nº
350/99, de 15.6.99, não contém a fundamentação exigida pelo artº 205º, nº 1, da Constituição, na medida em que não contém a indicação, interpretação e aplicação das normas jurídicas aplicáveis (artº 659º, nº2 do, CPC), isto é, não especifica os fundamentos de direito que justificam o indeferimento da pretensão do recorrente ao apoio judiciário (artº 668º, nº1, alínea b), do CPC), o que gera nulidade do referido acto jurisdicional, nos termos do artº 668º, nº 1, alínea b), do CPC. Termos em que requer:
1. Seja declarada a nulidade de sentença resultante de falta da fundamentação de direito;
2. Seja a nulidade referida suprida, ordenando-se o prosseguimento do incidente de apoio judiciário, de forma a julgar-se que o recorrente não tem rendimentos suficientes que lhe permitam custear as despesas inerentes à presente causa judicial, pelo que lhe deve ser concedido o direito à protecção jurídica, na modalidade de apoio judiciário, com dispensa total do pagamento de custas.'
Como decorre da transcrição feita, o que o requerente pretende é obter uma reapreciação do decidido, uma vez que a nulidade que refere como alegadamente praticada é a de falta de fundamentação de direito do acórdão. Não podendo a reclamação de nulidades servir para proceder a uma reapreciação ou repetição do já decidido, dispensa-se o Tribunal de reproduzir os critérios que seguiu e a forma como os aplicou aos factos. Importa, apenas, referir que a fundamentação legalmente exigida consta do Acórdão e nele pode ser lida, em termos que significam que se considerou que a demonstração apresentada não convenceu o Tribunal de que o reclamante não dispõe dos meios económicos bastantes para custear, total ou parcialmente, os encargos normais de uma causa judicial com o que se deu observância ao disposto no nº 1 do artigo 7º do Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro. Não procede portanto a nulidade invocada. Nestes termos, decide o Tribunal desatender a presente reclamação. Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa da justiça em 10 UC’s. Lisboa, 12 de Janeiro de 2000 Vítor Nunes de Almeida Maria Helena Brito Luís Nunes de Almeida