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Procº nº 15/97.
2ª Secção. Relator:- BRAVO SERRA.
Nos presentes autos vindos do Supremo Tribunal de Justiça e em que figuram , como recorrente, A. e, como recorrido, o Ministério Público, dá o Tribunal, no essencial, concordância à exposição lavrada pelo relator de fls. 2245 a 2252, que aqui se dá por integralmente reproduzida e à qual o representante daquela magistratura em funções neste órgão de fiscalização concentrada da constitucionalidade deu integral anuência.
Anota-se ainda que, tocantemente ao pedido de
'ACLARAÇÃO' (tal como é designado) formulado pelo recorrente e dirigido à aludida exposição, não consubstancia ele, na realidade, uma solicitação de aclaração do que é referido naquela exposição - a qual, aliás, não enferma de qualquer deficiência, obscuridade ou contradição -, antes, e verdadeiramente, se devendo perspectivar como traduzindo uma «pronúncia» sobre ela efectuada pelo mesmo recorrente nos termos da parte final do nº 1 do artº 78º-A da Lei nº
28/82, de 15 de Novembro.
«Pronúncia» essa que, de todo o modo, não possui qualquer virtualidade para abalar as razões que foram carreadas à mencionada exposição e que mais não são do que a tradução de uma postura de há muito consolidada pela jurisprudência deste Tribunal.
Em face do exposto, decide-se não tomar conhecimento do recurso, condenando-se o recorrente nas custas processuais, fixando a taxa de justiça em oito unidades de conta. Lisboa, 19 de Fevereiro de 1997 Bravo Serra José de Sousa e Brito Guilherme da Fonseca Messias Bento Fernando Alves Correia Luís Nunes de Almeida José Manuel Cardoso da Costa
EXPOSIÇÃO PRÉVIA Procº nº 15/97.
2ª Secção.
1. Por acórdão datado de 7 de Novembro de 1995 e proferido pelo colectivo de Juízes da 6ª Vara do Tribunal Criminal de Lisboa, por entre o mais, foi A. condenado na pena única de nove anos de prisão, por isso que se considerou ter o mesmo praticado factos que foram subsumidos ao cometimento de um crime de associação criminosa previsto e punível pelo artº
229º, nº 1, do Código Penal, e de um crime de burla agravada, na forma continuada, previsto e punível pelas conjugadas disposições constantes dos artigos 217º, nº 1, e 218º, nº 2, alínea a), ambos do referido compêndio normativo.
Desse aresto recorreu o A. para o Supremo Tribunal de Justiça, sendo que, anteriormente à sua prolacção, tinha já interposto um outro recurso, que foi mandado subir com aquele que viesse a ser interposto da decisão que viesse a pôr termo à causa e a proferir na 1ª instância, recurso esse que visava uma decisão por meio da qual fora indeferida a pretensão do ora recorrente no sentido de ser efectuada a 'Documentação em Acta das declarações prestadas em sede de Audiência'.
Na motivação de recurso apresentada não suscitou qualquer questão de inconstitucionalidade referentemente a normas jurídicas, limitando-se, em certos passos dessa motivação, a dizer, no que ora releva e com invocação de preceitos ou princípios constantes do Diploma Básico:-
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III.8- Vossas Exas. aquilatarão da bondade de tais entendimentos. Mas, cabe ao Recorrente dizer que o Tribunal de Primeira Instância ao 'dar o dito por não dito', face ao teor do vertido em Fls. 1910 - 1913 e do teor da Acta de 03 de Outubro de 1995 - Fls. 1939 - indeferindo nesta sede ao que já tinha deferido, por despacho anterior, ou seja, a peticionada Documentação em Acta em tempo e mais do que tempo solicitada, nos termos e ao abrigo do disposto pela Lei Processual Penal e pala Constituição da Republica Portuguesa, violou duma forma manifesta e que não deixa margem para quaisquer equívocos não só o disposto pela Lei Penal Adjectiva mas também e ainda o disposto pelos Artigos
32º nº 1 da C.R.P. e 18º nº 2 da mesma Lei Fundamental; bem como o disposto pelo artigo 6º nº 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
III.9- Na medida em que subtrai 'ab initio' a garantia ao duplo grau de jurisdição no que toca à apreciação da matéria de facto e;
III.10- Mesmo existindo a limitação dos poderes cognitivos consignados pelo Artigo 433º do C.P.P. tal, não invalida nem afasta a conveniência ou a necessidade da disponibilidade da documentação da Audiência para decisão em Tribunal de Recurso, não se afigurando, quer em face à Lei Processual Penal, quer face ao Texto Fundamental a sua inutilidade, aliás pugnada pelo Tribunal 'a quo', termos em que e, além das disposições anteriormente referidas, como tendo sido violadas pelo despacho do que em tempo se recorreu, foram igualmente violadas as disposições contidas nos Artigos 97º nº 4 e 363º; Artigos 410º, nº 2 e 3; Artigos 432º al. c) e 433º, todos do C.P.P.
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Concluindo-se quanto a este ponto e, salvo melhor opinião, que também nos parece ser a do Tribunal da Relação de Lisboa - cf. Resposta à Reclamação do Recorrente A. nº 218/95 da 5ª secção em 30 de Outubro de 1995 - que hão-de prevalecer, em abono do Direito Constituído, da Justiça e da Lei Constitucional a decisão da inutilização da Audiência e dos actos subsequentes posteriores, que esperamos virá a ser ordenada por esse Superior Tribunal. Pois, de contrário e, sempre com a vénia que devemos às decisões adversas, ao serem violadas as disposições da C.R. Portuguesa, que correspondem a uma diminuição dos direitos de defesa dos Arguidos, não poderemos deixar de invocar em todas as Instâncias, tal, quer por imperativos legais, quer por imperativos de consciência.
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IV 8- O Tribunal ao não avaliar da existência da alteração substancial, ou não, de tais factos novos e externos ao Despacho Acusatório e, consequentemente, ao condenar por factos que não constam daquela; nem tendo concedido tempo para a preparação da respectiva defesa deixou o recorrente sem possibilidade de contraditar e de se defender. Diminuindo-lhe desta forma e consequentemente os seus Direitos Constitucionalmente consagrados, violando pois e disposto pelo Artigo 32º nº 1 da C.R.P.
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10 - Violou assim o Tribunal de Primeira Instância o disposto pela Lei Penal Adjectiva - Artigo 363º do C.P.P. - bem como o disposto pelos Artigos
32º nº 1 e 2 da C.R.P. e Artigo 18º nº 2 do mesmo Texto Fundamental, além do Artigo 6º do nº 1 da Convenção Europeis dos Direitos do Homem.
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13 - O Aresto em crise condenou os Arguidos por factos não constantes da Acusação, violando-se desta forma o preceituado pelo Artigo 263º nº 3 al. b) do C.P.P.
14 - O que não poderia suceder, sem que o Tribunal fizesse constar em Acta da Alteração Substancial, ou não, dos factos nos termos a que se referem os Artigos 358º e 359º, ambos do C.P.P.
15 - O que deixou desta forma os Arguidos sem defesa, diminuindo-lhes consequentemente os seus direitos Constitucionalmente consagrados, violou-se assim o disposto pelo Artigo 32º nº 1 e 5 da C.R.P.
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De outro lado, na alegação a produzir perante o Supremo Tribunal de Justiça, e que requereu que seguisse a forma escrita, o recorrente unicamente, no que concerne a pretensas violações do que se postula na Lei Fundamental, referiu:-
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II.3- Pretensão - Documentação em Acta - que é legítima, legal e se encontra expressamente consagrada quer pela Lei Adjectiva quer pelo próprio Texto Fundamental, constituindo esse direito uma garantia de defesa do Arguido constitucionalmente consagrada.
Pelo que a sua preterição, constitui a nosso ver, uma violação manifesta não só do disposto pela Lei Penal Adjectiva, mas também, uma violação do disposto pelos Artigos 32º nº 1 e 18 nº 2 da C.R.P., bem como do disposto pelo Artigo 6º nº 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
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III.2- Estamos, pois, em crer que o tribunal 'a quo' ao avaliar da existência, ou não, de factos novos e externos ao Despacho de Acusação e, consequentemente ao condenar por factos que não constam daquele, nem tendo concedido tempo para a preparação da respectiva defesa aos Arguidos, nos termos já referidos na Motivação de Recurso, para a qual, nesta sede se remete, mais uma vez deixou o Arguido e ora Recorrente, sem possibilidade de os contraditar e de assim se defender.
III.3- Pelo que, também, se nos afigura nulo o acórdão por violação das disposições processuais penais aplicáveis, maxime por imperativo do disposto pelo artigo 379º al. b) do C.P.P..
Referindo-se ainda que diminuídas que foram, nesta parte, as garantias de defesa do Arguido, foram igualmente diminuídos e coarctados os seus direitos de defesa constitucionalmente consagrados, violando-se igualmente o disposto pelo, Artigo 31 nº 1 e 5 da C.R.P.
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Por acórdão de 9 de Outubro de 1996 o Supremo Tribunal de Justiça, de entre o mais, negou provimento aos recursos interpostos pelo ora impugnante, o que motivou que este apresentasse nos autos requerimento por intermédio do qual manifestou a sua vontade de colocar aquele aresto sob censura do Tribunal Constitucional, dizendo que no mesmo se aplicaram normas - as constantes dos artigos 363º, 410º, nº 1 e 433º, todos do Código de Processo Penal - 'cuja inconstitucionalidade foi suscitada' nas 'Motivação de recursos e, por remissão nas alegações do atinente recurso interposto junto do Venerando Supremo Tribunal de Justiça'.
Tal recurso foi admitido por despacho de 30 de Outubro de 1996, prolatado pelo Conselheiro Relator do Supremo Tribunal de Justiça.
2. Não obstante aquela admissão, porque o despacho que a consubstancia não vincula o Tribunal Constitucional (cfr. nº 3 do artº 76º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro), e porque se entende que tal admissão não deveria ter tido lugar, efectua-se, ex vi do nº 1 do artº 78º-A da aludida Lei, a presente exposição, na qual se propugna por se não dever tomar conhecimento do presente recurso.
Na verdade, como resulta do que acima se veio de indicar, nunca o ora recorrente, antes de ser tirado o acórdão desejado impugnar pelo vertente recurso, imputou, tocantemente a dada norma juridíca ínsita no ordenamento infra constitucional, qualquer vício de desconformidade com normas ou princípios constantes da Constituição.
Antes, e pelo contrário, o que, nessa sede de desconformidade, assinalou, foi que as decisões tomadas pelo colectivo de Juízes da 6ª Vara do Tribunal Criminal de Lisboa (quer a respeitante ao indeferimento da documentação da audiência, quer a concernente à condenação penal de que foi alvo o recorrente) feriam, elas mesmo, determinadas disposições do diploma adjectivo criminal e, também, da Constituição e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
Aliás, nem se concebe como, defendendo o recorrente que aquelas decisões violaram o disposto nos artigos 363º, 410º, nº 1 e 433º, do Código de Processo Penal - e que, por isso, deveriam ser tomadas pelo Supremo Tribunal de Justiça outras decisões que aquelas substituíssem, e que, desta arte, dariam cumprimento ao estatuído nesses artigos, cumprimento que, no seu entendimento, não foi levado a efeito pelo tribunal de 1ª instância - poderiam aqueles normativos padecer, na sua óptica, de incompatibilidade com a Constituição.
Como se disse já, o que o impugnante sustentou antes do acórdão lavrado no nosso mais Alto Tribunal da ordem dos tribunais judiciais foi, em dados pontos, uma questão de constitucionalidade de decisão.
3. Ora, como este Tribunal tem dito e redito - suportado no que se dispõe na alínea b) do nº 1 do artigo 280º da Constituição e na alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82 - os recursos de fiscalização concerta da constitucionalidade estribados naqueles dispositivos hão-de ter por reporte normas jurídicas e não a quaisquer outros actos do poder público, designadamente as decisões judiciais qua tale, razão pela qual a suscitação de inconstitucionalidade «durante o processo» igualmente haverá de ter por alvo aquelas normas, o que significa que, assacando-se aquela sorte de vício às decisões, não estará a ser cumprido um dos requisitos exigidos pelas alíneas b) supra citadas.
Termos em que se não deverá tomar conhecimento deste recurso.
Cumpra-se a parte final do aludido nº 1 do artº 78º-A
Lisboa, 30 de Janeiro de 1997.