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Processo n.º 751/10
2.ª Secção
Relator: Conselheiro João Cura Mariano
Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
Relatório
A. veio deduzir oposição, nos termos dos artigos 203.º e seg., do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), no processo de execução fiscal no qual foi citado para efectuar o pagamento da quantia de €25.413,44, por reversão das dívidas da sociedade B., Limitada, à Fazenda Nacional, entre as quais se contava o pagamento de coimas.
Foi proferida sentença em 11 de Outubro de 2010 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra que julgou procedente a reclamação e julgou extinta a execução contra o Reclamante quanto à parte da divida proveniente de coimas, com fundamento na desaplicação, por inconstitucionalidade, do disposto no artigo 8.º do Regime Geral das Infracções Tributárias, quando interpretado com o sentido de que aí se consagra uma responsabilização subsidiária pelas coimas que se efectiva através do mecanismo da reversão da execução fiscal contra os gerentes e administradores da sociedade devedora.
O Ministério Público recorreu desta sentença, nos termos do artigo 70.º, n.º 1, alínea a), da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), na parte em que efectuou a recusa acima aludida.
Em 13 de Janeiro de 2011 foi proferida decisão sumária que negou provimento ao recurso, tendo julgado inconstitucional, por violação dos princípios constitucionais da culpa, da igualdade e da proporcionalidade, a norma do artigo 8.º, do Regime Geral das Infracções Tributárias aprovado pela Lei 15/2001, de 5 de Junho, interpretado com o sentido de que aí se consagra uma responsabilização subsidiária pelas coimas que se efectiva através do mecanismo da reversão da execução fiscal contra os gerentes e administradores da sociedade devedora, com seguintes fundamentos:
“É objecto do presente recurso a interpretação normativa do artigo 8.º, do RGIT, com o sentido de que aí se consagra uma responsabilização subsidiária pelas coimas que se efectiva através do mecanismo da reversão da execução fiscal contra os gerentes e administradores da sociedade devedora.
Esta secção do Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 481/2010, já se pronunciou no sentido de julgar inconstitucional, por violação dos princípios constitucionais da culpa, da igualdade e da proporcionalidade, a norma do artigo 7.º-A, do Regime Jurídico das Infracções Fiscais Não Aduaneiras (RJIFNA, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 20-A/90, de 15 de Janeiro, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 394/93, de 24 de Novembro), à qual sucedeu o artigo 8.º do RGIT, na parte em que se refere à responsabilidade subsidiária dos administradores e gerentes pelos montantes correspondentes às coimas aplicadas a pessoas colectivas em processo de contra-ordenação fiscal.
A fundamentação exposta nesse aresto é transponível para a apreciação da constitucionalidade da interpretação normativa que o presente recurso tem como objecto, até porque o disposto no artigo 7.º A, do RJIFNA, foi aí encarado precisamente com o sentido que aqui foi recusado pela sentença recorrida, pelo que, remetendo-se para essa fundamentação, deve julgar-se inconstitucional a norma sob apreciação.
O mesmo já efectuaram os acórdãos n.º 24/11 e 26/11 proferidos por esta Secção.”
O Ministério Público reclamou desta decisão, com os seguintes fundamentos:
“Pela Decisão Sumária nº 33/2011, julgou-se inconstitucional a norma do artigo 8º do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), aprovado pela Lei n 15/2001, de 5 de Junho, interpretada no sentido de que aí se consagra uma responsabilidade subsidiária pelas coimas que se efectiva através do mecanismo da reversão da execução fiscal contra os gerentes e administradores da sociedade devedora.
Nessa Decisão, remete-se para a fundamentação do Acórdão nº 481/2010, que tinha julgado inconstitucional a norma do artigo 7º-A do Regime Jurídico das Infracções Fiscais Não Aduaneiras (RJIFNA), norma de conteúdo idêntico à do artigo 8º do RGIT.
Porém, quer sobre a norma do Artigo 7º-A do RJLFNA, quer sobre a norma do artigo 8º do RGIT, já o Tribunal se tinha anteriormente pronunciado no sentido da não inconstitucionalidade (Acórdãos nos 150/2009 e 129/2009, respectivamente).
O Ministério Público, nas alegações produzidas nos processos em que foram proferidos os Acórdãos referidos, sempre sustentou a não inconstitucionalidade daquelas normas, posição que se mantém.
Assim, remetendo-se para a fundamentação constantes dos Acórdãos nºs 129/2009 e 234/2009, deve deferir-se a reclamação, não se julgando inconstitucional a norma do artigo 8º do RGIT.
Acrescentaremos ainda que, mesmo que concordássemos com o sentido da Decisão Sumária, impunha-se a reclamação para a conferência, pelas razões que a seguir mencionaremos.
É obrigatório para o Ministério Público interpor recurso para o Plenário, em caso de conflito jurisprudencial – que se verifica – sobre a questão da constitucionalidade da norma do Artigo 8º do RGIT (artigo 79º-D, nº 1, da LTC).
Ora, este meio impugnatório apenas poderá ser utilizado se, sobre aquela questão, incidir um acórdão, uma vez que exclusivamente destes cabe recurso para o plenário, sendo a reclamação para a conferência o único meio processual de impugnação de um Decisão Sumária.
Aliás, precisamente para que o Plenário possa dirimir o conflito jurisprudencial que se verifica existir sobre a constitucionalidade da norma do artigo 7º-A do RJIFNA, do Acórdão nº 481/2010 foi interposto recurso para o Plenário, já admitido.”
Fundamentação
Na decisão sumária reclamada seguiu-se a posição sustentada nos acórdãos n.º 24/11 e 26/11, desta Secção (acessíveis em www.tribunalconstitucional.pt).
Essa posição não é contraditória com qualquer outra decisão deste Tribunal, nomeadamente com o decidido no Acórdão n.º 129/09, uma vez que, enquanto naqueles arestos da 2.ª Secção se apreciou a constitucionalidade duma dada interpretação normativa do artigo 8.º do RGIT, a qual foi efectuada pela decisão recorrida e se impôs ao Tribunal Constitucional como um dado adquirido, sem possibilidade de discussão sobre a sua correcção, já no Acórdão n.º 129/2009, o Tribunal Constitucional foi colocado perante a questão da constitucionalidade do próprio preceito legal, tendo-o interpretado duma forma diversa e julgado essa interpretação por si próprio efectuada como não desconforme à Constituição. Assim, apesar de terem por base o mesmo preceito legal, as duas decisões pronunciaram-se sobre a constitucionalidade de duas leituras normativas distintas desse preceito, isto é tiveram como objecto de fiscalização normas diferentes, pelo que não é possível dizer que o julgamento efectuado nesses Acórdãos seja antagónico e incompatível.
Ora, uma vez que na reclamação apresentada não são aduzidos quaisquer outros argumentos que possam justificar um repensar da questão objecto da decisão reclamada, mantém-se a posição sustentada nos referidos acórdãos n.º 24/11 e n.º 26/11, indeferindo-se, por isso, a reclamação apresentada pelo Ministério Público.
Decisão
Pelo exposto indefere-se a reclamação apresentada pelo Ministério Público da decisão sumária proferida nestes autos em 13 de Janeiro de 2011.
Sem custas.
Lisboa, 15 de Fevereiro de 2011.- João Cura Mariano – Catarina Sarmento e Castro – Rui Manuel Moura Ramos.