Imprimir acórdão
Proc. nº 461/99
3ª Secção Relator: Cons. Sousa e Brito
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I - Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que figuram como recorrente F. P. e como recorrido o Ministério Público, foi proferida, ao abrigo do disposto no artigo 78º-A, nº 1, da Lei do Tribunal Constitucional, decisão sumária em que se decidiu não conhecer do objecto do recurso que o recorrente pretendeu interpor (fls. 514 a 526 dos presentes autos).
2. Notificado daquela decisão o recorrente veio requerer, em 4 de Agosto de
1999: a) a aclaração da referida decisão no que se refere ao modo como se deu cumprimento ao dever de ouvir as partes; b) que os prazos processuais relativos a actos a praticar pelo recorrente não corressem, relativamente a ele, durante as férias judiciais.
3. O requerimento foi, porém, indeferido, por decisão de 30 de Agosto de 1999
(fls. 539 a 541 dos presentes autos).
4. Em 20 de Setembro de 1999 veio de novo o recorrente aos autos, desta vez para reclamar para a conferência, ao abrigo do disposto do nº 3 do artigo 78º-A da Lei do Tribunal Constitucional, da decisão sumária em que se decidiu não conhecer do objecto do recurso.
5. Na sequência foi proferido o acórdão nº 513/99, no sentido do não conhecimento do objecto da reclamação apresentada, por ter sido considerado que a mesma era extemporânea, uma vez que havia sido apresentada fora do prazo – 10 dias – para reclamar para a conferência de que o reclamante dispunha (fls. 549 a
551).
6. Ainda inconformado veio de novo o requerente aos autos, desta vez para requerer a realização de diligências adicionais de prova – designadamente a junção aos autos da listagem de faxes recepcionados no Tribunal Constitucional no período entre 10 e 20 de Setembro, bem como a inquirição de testemunhas – tendentes a provar que a reclamação havia sido expedida por fax em data anterior a 20 de Setembro, e ainda dentro do prazo de 10 dias de que o reclamante dispunha.
7. Em face do requerimento que antecede foi proferido pelo Relator do processo neste Tribunal um despacho com o seguinte teor:
'O requerente pretende a prática de actos de prova de um requisito processual de admissibilidade da reclamação – nomeadamente, de tempestividade da sua interposição -, quando a reclamação já foi julgada, por acórdão que transitou em julgado, extemporânea. Trata-se, portanto, de acto inadmissível nesta fase processual. Nestes termos, indefere-se o requerido'.
8. Mais uma vez inconformado o reclamante veio de novo aos autos, desta vez para arguir a nulidade do despacho que antecede, o que fez nos termos e com os fundamentos seguintes:
'1. Em anterior requerimento, o ora requerente havia alegado justo impedimento para a apresentação que tinha sido considerada extemporânea, por tardia, de reclamação para a conferência sobre a decisão sumária desfavorável.
2. O aliás douto despacho cuja nulidade agora se argui veio considerar que, tendo a reclamação sido julgada extemporânea, por acórdão transitado em julgado, seria inadmissível já a prova da tempestividade da interposição da reclamação (a que conduziria ao reconhecimento do justo impedimento).
3. Omite o aliás douto despacho, porém, qualquer referência à exacta data do trânsito em julgado da decisão sobre a extemporaneidade da reclamação.
4. Ora, salvo o sempre devido respeito, cuida-se que a alegação de justo impedimento foi efectuada antes daquele trânsito em julgado.
5. Nem sequer a ocorrência do trânsito em julgado parece ser, em certas circunstâncias de inquestionável similitude com a sub judice, obstáculo ao disposto e imposto pelo nº 2 do art. 146º do CPC, sendo perfeitamente concebível que o justo impedimento só cesse após o trânsito da decisão cuja inércia da parte é determinante de desfavorecimento.
6. Assim sendo, impunha-se ter-se procedido à audição da parte contrária – in casu, o Digno Magistrado do MP – e julgar-se verificado ou não o impedimento e reconhecido ou não que a parte – o ora recorrente – se apresentou a requerer logo que o impedimento cessou.
7. Pelo que o aliás douto despacho cuja nulidade é agora arguida, por manifesta oposição ao comendo daquele mencionado nº 2 do art. 146º, enferma de irregularidade – e esta influi obviamente no exame ou decisão da causa, pelo que
é manifesto que constitui nulidade.
8. Requer-se, pois, que seja declarado ferido de nulidade o referido aliás douto despacho e que seja ele substituído por outro que admita o ora recorrente a fazer prova do justo impedimento por si alegado, seguindo-se os demais trâmites legais'.
9. Notificado o Ministério Público para se pronunciar sobre o requerimento que antecede pelo mesmo foi dito:
'1º - O requerimento de fls. 554 é intempestivo já que não foi apresentado nos
10 dias subsequentes à notificação do acórdão nº 513/99: na verdade, tal notificação deve considerar-se feita em 27 de Setembro, a partir da qual se contam os 10 dias, terminando em 7 de Outubro.
2º - A prova da prática, por fax, de um acto processual pelas partes apenas poderá ser feita através dos registos existentes neste Tribunal, acerca das mensagens recebidas, ou mediante exibição pelo interessado do talão respectivo.
3º - Sendo obviamente inadmissível pretender «reconstituir» o documento em que necessariamente se corporizou tal forma de comunicação através de depoimentos testemunhais (cfr. artigo 393º do Código Civil).
4º - Nestes termos – reconhecendo a interessada que não existe o talão comprovativo da pretensa expedição do fax em causa – restará apenas averiguar se figura nos registos deste Tribunal a recepção de tal mensagem'.
10. Realizada a averiguação sugerida pelo Ministério Público, constatou-se que entre os dias 13 e 20 de Setembro de 1999, não deu entrada neste Tribunal o fax a que se refere o ponto 1 do requerimento/FAX do recorrente de fls. 554 e 555.
Dispensados os vistos legais, cumpre decidir.
II – Fundamentação.
11. Na perspectiva do requerente a alegada nulidade de que padece o despacho de fls. 558 assenta em - independentemente de se considerar ter havido ou não trânsito em julgado da decisão que julgou intempestiva a reclamação - não se ter julgado verificado ou não - após prévia audição da parte contrária - o justo impedimento alegado pelo requerente.
É, porém, manifesto, como vai ver-se, que não lhe assiste qualquer razão. Desde logo porque, ao contrário do que pretende o requerente, a decisão que julgou extemporânea a reclamação por si apresentada transitou efectivamente em julgado. É que – como, bem, refere o Ministério Público – devendo o recorrente considerar-se notificado dessa decisão a 27 de Setembro o prazo de 10 dias a que se refere o artigo 153º, nº 1, para as partes requererem qualquer acto ou diligência, terminou efectivamente em 7 de Outubro. Nesses termos, é efectivamente de considerar apresentado depois do trânsito em julgado e, por isso, intempestivo, o requerimento, apresentado em 11 de Outubro, para a realização de diligências adicionais de prova, o que, só por si, sempre obstaria ao conhecimento do seu objecto. Nesse sentido refere-se, e bem, no despacho reclamado, ser inadmissível a realização de diligências adicionais de prova – e, obviamente, o seu requerimento – já depois do trânsito em julgado da decisão que julgou a reclamação extemporânea. Acresce, porém, que as próprias diligências probatórias requeridas são, em si mesmas, legalmente inadmissíveis. É que - como bem refere o Ministério Público -
é efectivamente inadmissível substituir o documento em falta por prova testemunhal do facto que o mesmo visa documentar (cfr. art. 393º do Código Civil). Finalmente refira-se, a título de simples obiter dictum, que nem se vê em que é que, na situação que é objecto dos autos, consistiria o alegado «justo impedimento», que, nos termos do artigo 146º, nº 1 do CPC, há-de consistir sempre num facto não imputável à parte nem aos seus mandatários ou representantes, o que, manifestamente, não aconteceria no caso sub judice.
III – Decisão: Em face do exposto, decide-se indeferir a requerida alegação de nulidade e, em consequência, confirmar o despacho reclamado.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 15 U.C. Lisboa, 11 de Janeiro de 2000 José de Sousa e Brito Messias Bento Luís Nunes de Almeida