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Proc. nº 93/99
1ª Secção Relatora: Maria Helena Brito
Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. O..., notificado da decisão sumária que decidiu não tomar conhecimento do recurso, por não estarem verificados os pressupostos processuais exigidos no artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, veio reclamar para a conferência, nos termos do artigo 78º-A, nº 3, da mesma Lei.
Tanto o Ministério Público como a recorrida F... se pronunciaram no sentido de que a reclamação não tem qualquer fundamento.
2. Reafirma-se que o ora reclamante não suscitou, de modo processualmente adequado, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa que pudesse constituir objecto do recurso interposto. Isto mesmo reconhece o reclamante no requerimento agora apresentado:
'Há-de dizer-se, por estrito amor à verdade, que o requerimento do aqui recorrente, onde era arguida a violação do princípio do contraditório, era mudo no que atine à refracção constitucional de tal princípio. Efectivamente, apenas se diz na sobredita peça que, o Tribunal ao omitir a notificação à parte, da peça em questão, violou flagrantemente, o princípio do contraditório. Acrescentando-se, em fase conclusiva que, tal princípio do contraditório, radica no Art. 3º do Código de Processo Civil, aplicável por força do Art. 4º do Código de Processo Penal.'
3. Vem dizer o reclamante que pretende que o Tribunal Constitucional aprecie a 'interpretação sufragada pela Relação de Coimbra do Art. 3º nº3 do CP Civil'.
Ora, segundo jurisprudência firme deste Tribunal, quando o recorrente questiona a conformidade constitucional de uma determinada interpretação normativa, deve explicitar o sentido atribuído às normas em causa que considera inconstitucional e que pretende ver apreciado no âmbito do recurso de constitucionalidade. Como se afirmou no acórdão nº 367/94 (Diário da República, II, nº 207, de 7.9.1994, p. 9341 ss),
'Ao questionar-se a compatibilidade de uma dada interpretação de certo preceito legal com a Constituição, há-de indicar-se um sentido que seja possível referir ao teor verbal do preceito em causa. Mais ainda: esse sentido (essa dimensão normativa) do preceito há-de ser enunciado de forma que, no caso de vir a ser julgado inconstitucional, o Tribunal o possa apresentar na sua decisão, em termos de tanto os destinatários desta como, em geral, os operadores do direito ficarem a saber, sem margem para dúvidas, qual o sentido com que o preceito em causa não deve ser aplicado, por, deste modo, afrontar a Constituição.'
Em momento algum do processo, nem mesmo no âmbito da reclamação da decisão sumária – que, de qualquer modo, não seria já momento processualmente adequado para o efeito – o ora reclamante explicitou qual o sentido atribuído no acórdão recorrido à norma do artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil que considerava inconstitucional e que pretendia que o Tribunal Constitucional apreciasse.
Confirma-se assim que, através do recurso de constitucionalidade, o ora reclamante pretendeu impugnar a própria decisão recorrida. Tal pretensão excede o âmbito de competência do Tribunal Constitucional, sendo certo que o poder de fiscalização de constitucionalidade atribuído a este Tribunal apenas incide sobre normas e não sobre outros actos, nomeadamente sobre as próprias decisões judiciais.
4. Não estando verificados os pressupostos processuais do recurso interposto, o Tribunal Constitucional não pode tomar conhecimento do recurso.
A decisão do Tribunal da Relação de Coimbra que admitiu o recurso não vincula o Tribunal Constitucional, conforme dispõe expressamente o artigo
76º, nº 3, da Lei do Tribunal Constitucional.
5. Pretende a recorrida F... que este Tribunal condene o reclamante como litigante de má fé, por considerar que é intenção da presente reclamação protelar o trânsito em julgado da decisão sob recurso.
Embora seja patente uma finalidade dilatória, não pode até este momento reconhecer-se que exista, por parte do reclamante, 'um uso manifestamente reprovável' de meios, cuja falta de fundamento não ignora, com o fim de 'entorpecer a acção da justiça'.
5. Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide: a) confirmar a decisão reclamada, de 25 de Fevereiro de 1999, que não tomou conhecimento do recurso;
b) não condenar o reclamante como litigante de má fé.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em quinze unidades de conta. Lisboa, 21 de Abril de 1999- Maria Helena Brito Vítor Nunes de Almeida José Manuel Cardoso da Costa