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Proc. nº 410/97
2ª Secção Relator: Cons. Luís Nunes de Almeida
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
I - RELATÓRIO
1. A.. intentou, no tribunal de comarca de Lisboa, acção de despejo contra G..., LDA e AR.., relativamente a uma loja sita no Campo Grande, nº 9-A, Lisboa. Pediu que fosse decretado o despejo contra quem estivesse na detenção da loja e a condenação da ré G..., LDA no pagamento das rendas vencidas e vincendas.
Após várias vicissitudes processuais, por despacho de 30 de Setembro de 1994, considerando resolvido o contrato de arrendamento, o Mmo Juiz a quo decretou o despejo
imediato da Ré G..., Lda, prosseguindo a acção tão somente contra o Réu AR...
2. Inconformada com esta decisão, a Ré G..., Lda interpôs recurso da mesma para o Tribunal da Relação de Lisboa.
Admitido o recurso, e apresentadas alegações por recorrente e recorrida, o Tribunal da Relação, por acórdão de 11 de Julho de 1996, concedeu provimento ao recurso, revogando a decisão recorrida.
Inconformada, a recorrida veio então interpôr recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, requerendo para o efeito ainda que fosse ampliado o valor da acção.
Por despacho de 18 de Setembro de 1996, o desembargador relator indeferiu o pedido de alteração do valor da acção e admitiu aquela revista.
3. Nas conclusões das suas alegações, a recorrente considerou que o tribunal da Relação «atentou contra o poder judicial constitucionalmente consagrado, em violação ao preceito do artº
208. 2 da CRP».
Por acórdão de 27 de Maio de 1997, o STJ negou aquela revista.
4. Inconformada, a recorrente interpôs então recurso desse aresto para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 70º, nº 1, alínea b) da LTC.
Admitido o recurso, subiram os autos a este Tribunal, onde o relator, nos termos do artigo 75º-A da LTC, convidou a recorrente a indicar
a norma cuja inconstitucionalidade pretende que o tribunal aprecie, a norma ou princípio constitucional que considera violado, bem como a peça processual em que suscitou a questão de inconstitu-cionalidade.
Dando cumprimento a esse despacho, a recorrente veio dizer que:
na terceira conclusão da sua minuta de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça a recorrida disse que o Tribunal a quo 'atentou contra o poder judicial constitucionalmente consagrado, em violação do preceituado no artº
208.2 da CRP'.
Esta conclusão foi expressamente referida no acórdão do STJ de
27-1-97 que reincidiu na não consideração de que o AR... deixou transitar a decisão da primeira instância que decretou o despejo. Contra ele há trânsito daquela decisão, trânsito este violado pelas instâncias de recurso, em flagrante violação daquele preceito constitucional.
É essa a questão que a recorrente pretende seja apreciada por esse Venerando Tribunal Constitucional.
5. Pelo relator do processo foi então elaborada exposição prévia, nos termos do artigo 78º-A da LTC, nos seguintes termos:
Como decorre expressamente da Constituição (artigo 280º, nº 1, al. b)) e da lei -LTC (artº 70º, nº 1, al. b)), o recurso de constitucionalidade tem como objecto a apreciação de normas jurídicas cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada pela parte durente o processo.
Ora, durante o processo, nas suas alegações para o STJ, a recorrente não suscitou a questão de inconstituciona-lidade de qualquer norma, mas tão-só a da decisão judicial recorrida, o que não abre caminho ao recurso de constitucionalidade, como este Tribunal vem afirmando em jurisprudência unânime, uniforme e constante.
Na sua resposta, a recorrente veio afirmar que:
O preceito invocado pela recorrente é o 208.2 da Constituição
(duzentos e oito e não duzentos e oitenta) que determina
'as decisões dos tribunais são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as de quaisquer outras autoridades'.
Ora há no processo uma decisão judicial com trânsito: a da primeira instância que decretou o despejo, no que concerne a AR...
Pois não foi respeitada pelo Supremo. O que está em causa é a imperatividade daquele trânsito em julgado (BMJ 394, 396).
Que foi violada pelo Supremo estando esta violação em causa, violação que é inconstitucional e cai na previsão do art. 208.2 da C.R.P. abrindo caminho ao recurso [...]
Dispensados os vistos, cumpre decidir.
II - FUNDAMENTOS
6. Como é referido na exposição do relator, o presente recurso tem por objecto a apreciação da constitucionalidade de norma ou normas jurídicas, que tenham sido concretamente aplicadas na decisão recorrida, e cuja inconstitucionalidade o recorrente haja suscitado durante o processo.
Ora, e desde logo, é claro que a recorrente, na sua motivação de recurso no STJ, se refere, expressamente e apenas, à inconstitucionalidade da decisão recorrida, que não de qualquer norma jurídica .
Nem anteriormente, em qualquer momento do processo, suscitou a inconstitucionalidade de quaisquer normas jurídicas.
7. A Constituição da República e a Lei do Tribunal Constitucional atribuem a este um controlo da constitucionalidade de normas jurídicas, e não das decisões judiciais em si mesmas. Como flui do disposto nos artigos 280º, nº 1, alíneas a) e b), e nº 5, da Constituição, e dos artigos 70º, nº 1, e 75º-A, nº 1, da Lei do Tribunal Constitucional, o recurso de constitucionalidade há-de interpôr-se de decisões judiciais que apliquem norma jurídica cuja inconstitucionalidade o recorrente haja suscitado durante o processo, ou que desapliquem determinada norma jurídica com fundamento na sua inconstitucionalidade.
Não competindo a este Tribunal o conhecimento de questões de inconstitucionalidade de decisões judiciais, manifestamente faltam os pressupostos processuais para que se possa conhecer do recurso.
III - DECISÃO
8. Nestes termos, decide-se não tomar conhecimento do recurso.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em oito unidades de conta.
Lisboa, 22 de Janeiro de 1998 Luis Nunes de Almeida Fernando Alves Correia José de Sousa e Brito Guilherme da Fonseca Messias Bento Bravo Serra José Manuel Cardoso da Costa