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Procº nº 659/96 Rel. Cons. Alves Correia
Exposição nos termos do artigo 78º-A da Lei do Tribunal Constitucional (Lei nº 28/82 de 15 de Novembro na redacção da Lei nº 85/89 de 7 de Setembro):
1. A. intentou no Tribunal do Trabalho de Lisboa uma acção emergente de contrato de trabalho com processo sumário contra a sua entidade patronal B. alegando em suma que entre Outubro de 1988 e Dezembro de 1990 exerceu funções de Chefe de Secção no Armazém --------- de ---------- embora recebesse como Escriturário Altamente Qualificado.
Por sentença de 24 de Março de 1994 o Mmº Juiz do 4º Juízo daquele Tribunal do Trabalho considerou a acção procedente condenando a Ré no pedido.
Inconformada levou esta recurso ao Tribunal da Relação de Lisboa dizendo em síntese que o armazém em causa não constituía uma unidade orgânico-funcional (Secção) de que o Autor pudesse ser o chefe antes correspondendo as suas funções naquele às de um 'encarregado de armazém' categoria essa inferior à que lhe foi atribuída. Por Acórdão de 15 de Maio de
1996 foi concedido provimento ao recurso da Ré revogando-se a sentença recorrida e absolvendo-se aquela do pedido.
2. Veio então A. interpor recurso para o Tribunal Constitucional do referido acordão porquanto neste foi referido que 'o Exmº Representante do Ministério Público teve vista nos autos e emitiu parecer nº 1735/95 de fls. 112 no qual entende que o recurso merece provimento ou se assim não se entender deverão os autos baixar à 1ª instância afim de se apurar se o Armazém 59 constituía ou não na organização da Ré uma secção' sendo tal 'vista' e parecer
'inconstitucionais como resultado da inconstitucionalidade do art. 707º do C.P.C. que foi (implicitamente) aplicado bem como o correspondente dispositivo da Lei Orgânica do Ministério Público'.
Admitido o recurso interposto ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artº
70º da Lei do Tribunal Constitucional (Lei nº 28/82 de 15 de Novembro) entendo que dele não deve este Tribunal conhecer. Vejamos porquê.
3. Pressupostos específicos do recurso de constitucionalidade intentado ao abrigo daquela alínea da Lei nº 28/82 são:
- invocação da inconstitucionalidade de uma norma durante o processo;
- aplicação dessa norma na decisão recorrida;
- prévio esgotamento dos recursos ordinários.
Na medida em que o valor da acção estava contido na alçada da Relação o terceiro requisito deve ter-se por preenchido.
Já o mesmo não sucede quanto ao primeiro uma vez que a invocação da inconstitucionalidade da norma do artigo 707º do Código de Processo Civil só surgiu no requerimento de interposição do recurso para este Tribunal e portanto depois de esgotado o poder jurisdicional do Tribunal a quo. É certo que se tem entendido que os recorrentes podem ser dispensados do ónus de suscitação da questão de inconstitucionalidade 'durante o processo' quando não tenham tido oportunidade processual de suscitar previamente a questão - cfr. os Acórdãos nºs. 90/85 e 136/85 publicados no Diário da República II Série de 11 de Julho de
1985 e de 28 de Janeiro de 1986 respectivamente que estabeleceram o princípio e os Acórdãos 46/88 94/88 199/88 391/89 61/92 e 188/93 publicados respectivamente no Diário da República II Série de 9 de Maio de 1988 22 de Agosto de 1988 28 de Março de 1988 de 14 de Setembro de 1989 de 18 de Agosto de 1992 e no Vol. 23º dos Acórdãos do Tribunal Constitucional pp. 495 a 512 - e que o recorrente invoca ser o seu requerimento de interposição de recurso a sua primeira intervenção no processo após a do representante do Ministério Público junto do Tribunal da Relação de que aliás só pelo texto do acórdão aqui sob recurso teria tido conhecimento. Sendo nos termos da lei a intervenção deste circunscrita à pronúncia 'sobre a má fé dos litigantes' (nº 1 do artigo 707º do Código de Processo Civil) é verdade que o conteúdo do seu parecer terá constituído uma surpresa para o ora recorrente que aliás tinha até estado na origem da sua intervenção ao invocar nas contra-alegações a má fé processual da apelante. Poderá dizer-se pois que o recorrente estará numa daquelas situações 'anómalas e excepcionais' em que não teria tido oportunidade processual para suscitar atempadamente a inconstitucionalidade da norma ao abrigo da qual o representante do Ministério Público interveio no processo.
Sucede porém que o recorrente tinha o ónus de uma vez conhecido o conteúdo do acórdão arguir a irregularidade processual decorrente da emissão pelo representante do Ministério Público de um visto ao abrigo da norma do nº 1 do artigo 707º do Código de Processo Civil a qual na sua óptica tinha sido interpretada com um sentido inconstitucinal e do acórdão que eventualmente desatendesse essa arguição é que poderia recorrer para o Tribunal Constitucional.
Na verdade aceitando-se que o recorrente não poderia ter suscitado a questão da inconstitucionalidade da norma do nº 1 do artigo 707º do Código de Processo Civil antes da prolação do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de
15 de Maio de 1996 tem de entender-se que o deveria ter feito na primeira oportunidade processual que se lhe deparasse. E essa era a da arguição perante o tribunal a quo da irregularidade processual que na sua opinião no caso se verificava.
Como foi acentuado no Acórdão deste Tribunal nº 270/92 (publicado no Diário da República nº 271 de 23 de Novembro de 1992) em situação análoga à presente e citando o Acórdão nº 290/90 (por publicar) se o recorrente apenas com a notificação do acórdão recorrido teve conhecimento de que nele se tinha aplicado a norma do nº 1 do artigo 707º do Código de Processo Civil com um sentido que considerava inconstitucional o que lhe cumpria era 'arguir a respectiva irregularidade processual e do acórdão que eventualmente desatendesse essa arguição é que competiria recorrer para o Tribunal Constitucional'.
Assim sendo como o recorrente não reclamou do acórdão recorrido suscitando aí a inconstitucionalidade da norma do artigo 707º nº 1 do Código de Processo Civil - a qual deve considerar-se como tendo sido aplicada nesse acórdão já que nele foi acolhida a tese que o Ministério Público sustentou no visto emitido ao abrigo daquela norma - haverá de concluir-se que ele não suscitou como lhe cumpria a questão de inconstitucionalidade 'durante o processo'.
4. Nestes termos entendo que não deve tomar-se conhecimento do recurso.
5. Ouçam-se as partes por cinco dias nos termos da parte final do nº
1 do artigo 78º-A da Lei do Tribunal Constitucional.
Lisboa 6 de Novembro de 1996
ACÓRDÃO Nº 1238/97
Procº nº 659/96 Rel. Cons. Alves Correia
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
Nos presentes autos vindos do Tribunal da Relação de Lisboa em que figuram como recorrente A. e como recorrida B. pelo essencial dos fundamentos da Exposição do relator de fls. 131--136 - que não foram abaladas pela resposta discordante do recorrente - decide-se não tomar conhecimento do recurso e condenar o recorrente em custas fixando-se a taxa de justiça em oito Unidades de Conta.
Lisboa 5 de Dezembro de 1996 Fernando Alves Correia Guilherme da Fonseca Bravo Serra José de Sousa e Brito Messias Bento Luís Nunes de Almeida