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Processo nº 997/98
2ª Secção Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
A- Nos presentes autos, vindos do Tribunal de Círculo e de Comarca de Matosinhos
(4º Juízo Cível), exarou o Relator a seguinte DECISÃO SUMÁRIA:
'1- O Ministério Público veio interpor recurso para este Tribunal Constitucional da sentença do Mmº Juiz do Tribunal de Circulo e de Comarca de Matosinhos (4º Juízo Cível), de 3 de Junho de 1998, 'nos termos dos arts 70, nº 1, al. a), 72º, nº 1, al. a), 75º, nº 1, e 75º-A, nº 1, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro (este
último introduzido pela Lei nº 85/89, de 7 de Setembro, e o penúltimo na redacção da Lei nº 13-A/98, de 26 de Fevereiro) (...) por nela se ter recusado a aplicação dos arts. 69º, nº 1, al. a) e 107º, nº 1, al. b), do Dec. Lei
321-B/90, de 15 de Outubro, com fundamento na inconstitucionalidade parcial de tais preceitos'. Com efeito, na sentença recorrida foi recusada 'a aplicação ao presente caso das normas do nº 1, Al. a) do art. 69º do RAU (D.L. nº 321-B/90 de 15.10), na parte em que permite ao senhorio a denúncia para habitação dos seus descendentes em primeiro grau, e da Al. b) do nº 1 do art. 107º do mesmo RAU, que alargou de 20 para 30 anos o período de manutenção no locado do arrendatário, como impeditivo da denúncia do contrato pelo senhorio, por tais normas terem sido produzidas por
órgão incompetente para o efeito, violando reserva de lei parlamentar', e, por consequência, ao abrigo do artigo 2º, da Lei nº 55/79, de 15 de Setembro, foi considerado 'extinto o direito de denúncia dos autores por terem decorrido, à data da propositura da acção, mais de 20 anos de permanência da ré-arrendatária no locado' e julgadas procedentes 'tais excepções peremptórias que são do conhecimento oficioso e obrigatório, absolvendo a ré dos pedidos, apesar de por motivos diferentes dos que invocou – arts. 493º nº 3, 496º e 510º nº 1, al. b) todos do C.P.Civil' (a ré e ora recorrida E..., com os sinais identificadores dos autos).
2- Acontece que o Tribunal Constitucional já julgou inconstitucional a mesma
'norma do art. 69º, nº 1, alínea a), do Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pelo Decreto-Lei nº 321-B/90, de 15 de Outubro, na parte em que refere os descendentes em 1º grau do senhorio, por violação da alínea h) do nº 1 do art.
168º da Constituição (versão de 1989)' no acórdão nº 127/98, publicado no Diário da República, II Série, nº 114, de 18 de Maio de 1998, seguido depois pelos acórdãos nºs 426/98 e 427/98, inéditos, a cujos fundamentos adiro e aqui se dão por inteiramente reproduzidos. E também o Tribunal Constitucional julgou já inconstitucional 'por violação do artigo 2º da Constituição da República, a norma do artigo 107º, nº 1, alínea b), do RAU, interpretada no sentido de abranger os casos em que já decorrera integralmente, no domínio da lei antiga, o tempo de permanência do arrendatário, indispensável, segundo essa lei, para impedir o exercício do direito de denúncia pelo senhorio' no acórdão nº 255/98, publicado no Diário da República, II Série, nº 258, de 7 de Novembro de 1998, (e do mesmo modo, in casu, 'tendo o contrato de arrendamento começado em 01.01.1997, quer à data da propositura da acção em
06.12.1995, quer à data em que os autores pedem que a denúncia produzisse os seus efeitos – 31.12.1996, haviam decorrido mais de 20 anos, que a arrendatária aqui ré permanecia nessa qualidade, no locado, uma vez que, não sendo ela a primitiva arrendatária beneficia do período de tempo de arrendatário do seu ex-marido, nos precisos termos do nº 2 do art. 107º do RAU, ao considerar como tendo a qualidade de arrendatário o cônjuge a quem tal posição se transferiu, contando-se a seu favor o decurso do tempo de que o transmitente já beneficiasse'), a cujos fundamentos igualmente adiro e aqui se dão por inteiramente reproduzidos. Há, pois, que repetir esses mesmos juízos de inconstitucionalidade relativamente
às normas questionadas dos artigos 69º, nº 1, a), e 107º, nº 1, b), do RAU, donde resulta a confirmação da sentença recorrida, embora, em parte, por diferentes fundamentos, quanto àquela norma do artigo 107º, nº 1, b).
3- Termos em que, DECIDINDO, ao abrigo dos poderes conferidos pelo artigo 78º-A, nº 1, da Lei nº 28/82, aditado pelo artigo 2º da Lei nº 85/89, de 7 de Setembro, na redacção do artigo 1º da Lei nº 13-A/98, de 28 de Fevereiro, nego provimento ao recurso.'
B- Dessa DECISÃO SUMÁRIA veio 'o representante do Ministério Público neste Tribunal (...), deduzir reclamação para a conferência, nos termos do artigo
78º-A, nº 3, da Lei nº 28/82', sustentando que o 'caso dos autos apresenta diversa configuração: na verdade, o arrendamento em causa iniciou-se em 1 de Janeiro de 1971, pelo que à data em que entrou em vigor a norma desaplicada na decisão recorrida – emergente do Decreto-Lei nº 321-B/90, de 15 de Outubro, que entrou em vigor 30 dias após a sua publicação, nos termos do artigo 2º - ainda se não haviam completado os 20 anos de tempo de arrendatário'. E acrescentou a seguir o reclamante:
'4º Ou seja: na situação concreta dos autos, em 15 de Novembro de 1990, não tinha ainda o arrendatário o tempo de permanência no local arrendado de 20 anos, suficiente – face à lei antiga – para o eximir ao exercício do direito potestativo invocado pelo senhorio.
5º Deste modo apenas será pertinente discutir a questão da inconstitucionalidade orgânica da norma do citado artigo 107º, nº 1, alínea b) confrontando que seja a solução nela consagrada com as directrizes constantes da respectiva Lei de autorização legislativa.
6º Estando, aliás, pendente sobre a questão o processo nº 483/97, da 1ª Secção ainda não decidido pelo Tribunal.
7º Termos em que – por não ser de aplicar ao caso dos autos, salvo melhor opinião, a doutrina constante do acórdão nº 259/98 - deverá proceder a presente reclamação, com as legais consequências quanto à tramitação do recurso, no que se refere à questão da constitucionalidade da norma do artigo 107º, nº 1, alínea b) do RAU'. C- A recorrida E... não respondeu àquela reclamação. D- Sem vistos, vêm os autos à conferência.
É certo, como demonstra o reclamante (e por lapso na DECISÃO refere-se 1997 e não 1971), que, in casu, 'não tinha ainda o arrendatário o tempo de permanência no local arrendado de 20 anos, suficiente – face à lei antiga – para o eximir ao exercício do direito potestativo invocado pelo senhorio', e, portanto, não se pode dizer que a 'eliminação desta competência do senhorio era para o mesmo arrendatário, no início de vigência do Regime do Arrendamento Urbano, um dado adquirido, uma mais-valia de protecção da sua permanência no local arrendado'. Daí que, como sustenta o reclamante, não seja caso para aplicar aqui o entendimento do citado acórdão 259/98, cuja fundamentação não pode, por isso, transpor-se para a hipótese sub juditio. Tanto basta para concluir que, não valendo in casu o juízo de inconstitucionalidade em que se ancora a DECISÃO SUMÁRIA, quanto à norma questionada do artigo 107º, nº 1, b), do RAU, não pode manter-se aquela DECISÃO, nesse ponto, tendo que prosseguir os autos para feitura de alegações. E- Termos em que, DECIDINDO, atende-se a reclamação, para prosseguir o recurso, conforme vem exposto. LX.10.2.99 Guilherme da Fonseca Paulo Mota Pinto José Manuel Cardoso da Costa