Imprimir acórdão
Procº nº 235/96 Rel. Cons. Alves Correia
Exposição nos termos do artigo 78º-A da Lei do Tribunal Constitucional (Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, na redacção da Lei nº 85/89, de
7 de Setembro):
1. A. intentou, em Dezembro de 1994, no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, um procedimento cautelar - ratificação de embargo extrajudicial de obra nova contra a Junta Autónoma das Estradas, por esta ter invadido um prédio pertencente às heranças dos seus pais, destruindo um muro e uns anexos nele existentes.
Após inquirição de testemunhas e exame dos documentos apresentados, aquele Tribunal julgou procedente a providência . Do despacho que ratificou o embargo, levou a embargada recurso ao Tribunal da Relação do Porto que, por Acórdão de 1 de Junho de 1995, confirmou o despacho recorrido.
Ainda inconformada, recorreu a embargada para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo o Desembargador Relator, por despacho de 12 de Junho de 1995
(confirmado pelo Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 13 de Julho de
1995), negado a admissão do recurso, por o valor atribuído à providência cautelar (500.001$00) estar contido na alçada da Relação.
Depois de outras vicissitudes indiferentes para o que aqui se discute, foi admitido novo recurso para o Supremo Tribunal de Justiça referente
à recusa do incidente relativo à alteração do valor da causa para 7.000.000$00, ao qual, por Acórdão daquele Tribunal de 23 de Janeiro de 1996, foi negado provimento.
2. Veio, então, a embargada apresentar recurso deste acórdão para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº
28/82, nos seguintes termos:
'(...) Entendeu esse Venerando Tribunal, no aliás douto Acórdão recorrido, não admitir o recurso interposto pela ora recorrente, alicerçando-se
única e exclusivamente nos artºs. 314º e 315º do C. Proc. Civil.
Assim, só agora a recorrente se encontra em condições e oportunidade vg processuais de suscitar a inconstitucionalidade das referidas normas na interpretação que das mesmas é realizada pelo douto aresto em apreciação'.
3. Já os autos se encontravam neste Tribunal quando foi recebido o seguinte requerimento, dirigido ao Conselheiro Relator do Supremo Tribunal de Justiça:
'JAE - Junta Autónoma de Estradas.
Nos autos de agravo em que é recorrido,
A. e outros,
Vem:
Requerer a V. Exª que se digne considerar ter-se verificado a inutilidade superveniente da providência cautelar em causa nos autos, dado que a parcela do prédio, seu objecto, foi expropriada com tomada de posse administrativa por parte da requerente conforme 32 documentos ora juntos; de que protesta juntar certidão caso V. Exª o considere necessário'.
Remetido o processo ao Supremo Tribunal de Justiça e notificado por este o recorrido, sem obtenção de resposta, foi aí lavrado o seguinte despacho pelo Conselheiro Relator:
' Requerimento de fls. 119:
Julgado o recurso por este Tribunal (conforme acórdão de fls. 108), extinta ficou a respectiva instância, salvo revalidação pelo TC.
Como assim, não se toma conhecimento daquele requerimento no que respeita ao seu objecto'.
4. Devolvidos os autos ao Tribunal Constitucional, desnecessário se torna considerar a questão das consequências da invocada inutilidade superveniente da providência cautelar na matéria em discussão neste Tribunal, uma vez que não estão preenchidos os pressupostos de admissibilidade do recurso, sendo certo que a decisão que o admitiu não vincula o Tribunal Constitucional
(nº 3 do artigo 76º da Lei nº 28/82). De facto, os recursos interpostos ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional exigem a verificação dos seguintes pressupostos específicos:
- que a inconstitucionalidade da norma tenha sido suscitada 'durante o processo';
- que tal norma seja aplicada na decisão impugnada;
- que não haja recurso ordinário dessa decisão.
Ora, a inconstitucionalidade de uma certa interpretação dos artigos
314º e 315º do Código de Processo Civil só foi suscitada no requerimento de recurso para o Tribunal Constitucional - num momento que, como tem sido pacificamente entendido (cfr., por exemplo, o Acórdão nº 591/95, ainda inédito; o Acórdão nº 318/90, publicado no Diário da República, II Série, de 15 de Março de 1991; o Acórdão nº 94/88, publicado no Diário da República, II Série, de 22 de Agosto de 1988, e o Acórdão nº 90/85, publicado no Diário da República, II Série, de 11 de Julho de 1985) - já não era idóneo para dar como verificada a sua suscitação 'durante o processo', uma vez que o Tribunal a quo não se pronunciou sobre essa questão e, portanto, a intervenção do Tribunal Constitucional não pode revestir a natureza de recurso. É certo que há uma igualmente bem estabelecida orientação no sentido de dispensar essa invocação de inconstitucionalidade onde inexista oportunidade processual de a suscitar (cfr., por todos, o Acórdão nº 318/90, publicado no Diário da República, II Série, de
15 de Março de 1991; o Acórdão nº 51/90, publicado no Diário da República, II Série, de de 12 de Julho de 1990; o Acórdão nº 391/89, publicado no Diário da República, II Série, de 4 de Setembro de 1989; o Acórdão nº 94/88, publicado no Diário da República, II Série, de 22 de Agosto de 1988; e o Acórdão nº 136/85, publicado no Diário da República, II Série, de 28 de Janeiro de 1986 - o segundo, o terceiro e quarto invocados, aliás, no requerimento de interposição de recurso, ao lado de outros acórdãos irrelevantes para o que ora se aprecia), mas de forma alguma pode pretender-se ser esse o caso sub judicio. É que as normas impugnadas no requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade, por serem directamente atinentes ao que discutia, sempre pertenceriam ao círculo de normas aplicáveis. Não estamos, pois, perante uma daquelas situações raras e de carácter 'certamente anómalo' em que se reconhece que o interessado 'não teve mesmo qualquer possibilidade de suscitar a questão da inconstitucionalidade antes da decisão' (Acórdão nº 94/88, cit.).
5. Por assim ser, por faltar o primeiro pressuposto específico do recurso da constitucionalidade interposto, torna--se desnecessário recorrer ao disposto no nº 5 do artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional para completar os elementos em falta no requerimento apresentado.
6. Ouçam-se as partes por cinco dias, nos termos da parte final do artigo 78º-A da Lei do Tribunal Constitucional.