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Procº nº 608/96 Rel. Cons. Alves Correia
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
I - Relatório.
1. Em processo de expropriação, em que figuram como expropriante a A. e como expropriado B., vieram os herdeiros deste apresentar, no Tribunal da Relação de Évora, recurso do Acórdão desta, de 25 de Março de 1993, nos seguintes termos:
'Vêm interpor recurso do referido Acórdão para o Venerando Supremo Tribunal de Justiça de Lisboa, como hodiernamente alguma jurisprudência vem entendendo, aceitando a existência de um 4º grau de jurisdição expropriativa.
Doutra forma, caso o entendimento seja diferente, então o recurso consider-se-ia interposto para o Venerando Tribunal Constitucional de Lisboa'.
O Desembargador Relator, tendo presente uma reclamação de decisão que não admitiu o recurso de revista em caso análogo, proferiu despacho, em 27 de Maio de 1993, no sentido de se aguardar a decisão a proferir sobre a tal reclamação. Tendo esta sido favorável à admissão, proferiu despacho de admissão de recurso, no caso sub judicio, em 8 de Julho de 1993. Porém, por Acórdão de 1 de Fevereiro de 1994, o Supremo Tribunal de Justiça decidiu não admitir o recurso, com base no Parecer do Relator, onde se referia que, 'ulteriormente, se for caso disso, apreciar-se-á a admissibilidade do recurso para o Tribunal Constitucional'.
2. Reapreciado o assunto pelo Desembargador Relator do Tribunal da Relação de Évora, proferiu este despacho, em 14 de Março de 1996, cujo teor em parte se transcreve:
'Se admitimos o recurso que os recorrentes queriam ver admitido, com o que esgotámos o nosso poder jurisdicional, o facto de o Supremo Tribunal de Justiça não ter conhecido dele não pode fazer renascer, como parece, o recurso para o Tribunal Constitucional - os recorrentes fizeram uma opção, aceite por quem tinha de receber o recurso, pelo que terão eles de suportar as consequências do facto de tal opção não os ter favorecido.
Por isso, entendemos que não cabe conhecer do recurso interposto para o Tribunal Constitucional, que, em consequência, não se recebe'.
3. Inconformados, os recorrentes apresentaram reclamação para o Tribunal Constitucional que, nos termos do nº 3 do artigo 688º do Código de Processo Civil, foi apreciada pelo Tribunal da Relação de Évora.
Por Acórdão de 9 de Maio de 1996, decidiu este no sentido da improcedência das razões apresentadas pelos recorrentes e da manutenção do despacho reclamado, com base, essencialmente, nos dois argumentos seguintes:
- o artigo 30º, nº 1, do Código de Processo Civil obsta a que a cumulação de pedidos ofenda regras de competência, designadamente, em razão de matéria. Assim, não será possível cumular pedidos 'em alternativa subsidiária' para diferentes tribunais;
- nos termos do nº 2 do artigo 75º da Lei do Tribunal Constitucional, o trânsito em julgado de uma decisão de não admissão de um recurso ordinário, com fundamento em irrecorribilidade, dá início ao prazo de recurso para o Tribunal Constitucional.
Não valendo o recurso subsidiário e não tendo sido apresentado, no prazo em que o podia ser, um outro, concluiu-se, naquele aresto, pela improcedência da reclamação.
4. O Exmº Procurador-Geral Adjunto em funções neste Tribunal teve vista dos autos, tendo exarado parecer no sentido da improcedência da reclamação, com base no esgotamento ou consumpção do 'pedido subsidiário' no momento da admissão do recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça e na existência de 'meio idóneo e perfeitamente adequado para - se agisse com a diligência devida - ter interposto o pretendido recurso de constitucionalidade, ao ser notificado da decisão proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça'.
II- Fundamentos.
5. Subjacente à discussão sobre o momento próprio para a interposição do recurso de constitucionalidade está a decisão sobre o momento do esgotamento dos recursos ordinários, uma vez que tal constitui pressuposto do recurso de constitucionalidade previsto na alínea b) do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional (Lei nº 28/82, de 15 de Novembro).
O Desembargador Relator do Tribunal da Relação de Évora sustou inicialmente a sua decisão sobre o recurso apresentado como subsidiário, para aguardar a posição do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça num caso análogo, alvo de reclamação. Em função dela, admitiu o recurso que, porém, o Supremo Tribunal de Justiça não admitiu. Sobre esta divergência não pode este Tribunal pronunciar-se - como, aliás, num caso em tudo semelhante a este se deixou consignado (cfr. o Acórdão nº 187/93, publicado no Diário da República, II Série, de 17 de Maio de 1993, que invoca o Acórdão nº 297/92, publicado no Diário da República, II Série, de 23 de Novembro de 1992, o qual, por sua vez, refere outros acórdãos no mesmo sentido) -, já que lhe não cabe tomar posição sobre questões 'que escapam à sua função específica de controlo da constitucionalidade'.
6. O que compete a este Tribunal apreciar é, tão-só, se a decisão de rejeição do recurso que originou a presente reclamação está, ou não, bem fundada do ponto de vista dos requisitos do recurso de constitucionalidade previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional. Ora, suposto que houve suscitação da inconstitucionalidade de normas 'durante o processo' e que estas foram aplicadas na decisão recorrida - embora as certidões juntas aos autos não o permitam esclarecer -, o que importa apurar é se, no momento da interposição do recurso, se encontravam esgotados os recursos ordinários que no caso cabiam (cfr. o nº 2 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional).
Ora, o único recurso de constitucionalidade apresentado - configurado como subsidiário a um outro - é o que consta do requerimento de 15 de Abril de 1993. Porém, nesse momento, ao ter-se como possível um recurso ordinário para o Supremo Tribunal de Justiça, não podia admitir-se um recurso para o Tribunal Constitucional, justamente porque não teria havido prévio esgotamento dos recursos. Se dúvidas havia - e, pelo que se viu, fundadas -, teria de se ter interposto o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça e, não admitido este com fundamento em irrecorribilidade, intentar então o recurso de constitucionalidade, como a Lei do Tribunal Constitucional
expressamente prevê que se faça (cfr. o nº 2 do artigo 75º). Para mais, ao sujeitar o requerimento de recurso de constitucionalidade a uma condição - a da não admissão do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça -, os próprios recorrentes estabeleceram os termos de relevância da sua pretensão. Admitido aquele recurso no tribunal a quo, sempre teria de se ter como objectiva e subjectivamente inviável o recurso de constitucionalidade: objectivamente, porque se não tinham, portanto, esgotado os recursos ordinários que cabiam no caso; subjectivamente, porque essa tinha sido a vontade expressa dos recorrentes.
7. Tendo transitado em julgado o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1 de Fevereiro de 1994, que não admitiu o recurso interposto pelo referido requerimento de 15 de Abril de 1993, com fundamento em irrecorribilidade da decisão, sem que os ora reclamantes tenham formulado a intenção de recorrer para o Tribunal Constitucional no prazo que lhes era consentido pelo nº 2 do artigo 75º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, forçoso é concluir que não poderia ser admitido o recurso interposto para este Tribunal, datado de 15 de Abril de 1993.
Não merece, assim, censura a decisão reclamada.
III - Decisão.
8. Nos termos e pelos fundamentos expostos, decide-se indeferir a presente reclamação, condenando-se os reclamantes em custas e fixando-se a taxa de justiça em oito Unidades de Conta.
Lisboa, 5 de Dezembro de 1996 Fernando Alves Correia Guilherme da Fonseca Bravo Serra José de Sousa e Brito Messias Bento Luís Nunes de Almeida