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Processo nº 545/96
1ª Secção Rel. Cons. Tavares da Costa
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
1.- Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que são recorrente A., e recorrido o Ministério Público, o relator lavrou exposição preliminar, nos termos e para os efeitos do nº 1 do artigo
78º-A, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro.
Aí se ponderou que, não obstante só normas jurídicas constituirem objecto de controlo de constitucionalidade, o recorrente, ao defender que o acórdão recorrido, alicerçando-se no 'assento' de
24 de Janeiro de 1990, ofendeu o preceituado nos artigos 114º, 115º, nº 5, 207º e 227º, nº 1, da Constituição, pretende, na verdade, rediscutir a matéria da decisão recorrida, na medida em que esta acolhe a doutrina do assento que se põe em causa.
Assim sendo, e uma vez que o Tribunal Constitucional só tem competência para apreciar a constitucionalidade de norma jurídica ou uma sua dada interpretação, emitiu-se parecer no sentido do não conhecimento do objecto do recurso.
2.- Notificado, o recorrente veio dizer, em síntese, contrariando a tese da exposição mencionada:
'[...] ao declarar que pretende interpor recurso do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido a fls. 4 677 e segs., que, aplicando
«doutrina obrigatória» do assento de 24 de Janeiro de 1990 [Diário da República, I, 86, de 12 de Abril de 1990 (págs. 1795 e segs.)], inadmitiu o recurso, para o mesmo Supremo Tribunal, do acórdão do Tribunal da Relação do Porto que negou provimento ao recurso do despacho de pronúncia do recorrente, proferido pelo M.mo. Juiz do 1º Juízo do Tribunal Criminal do Porto, o recorrente pretende que este Tribunal Constitucional aprecie a inconstitucionalidade da norma em que se expressa a «doutrina obrigatória» do assento de 24 de Janeiro de 1990 [Diário da República, I, 86, de 12 de Abril de
1990 (págs. 1795 e segs.)], aplicada no caso concreto, segundo a qual «dos acórdãos da Relação proferidos sobre despachos de pronúncia não há recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, quer verse sobre matéria de direito, quer de facto».
O que - crê-se - se afigura conforme ao estatuído no artº 70º,
1, b), da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro.'
3.- Ouvido, o representante do Ministério Público, por sua vez, veio 'manifestar inteira concordância' com o teor da exposição, acrescentando que, de qualquer modo, sempre o recurso seria de qualificar como
'manifestamemte infundado', já que:
'- está perfeitamente definido na jurisprudência constitucional, formada quer no âmbito do Código de Processo Penal de 1929, quer no vigente, que não padecem de inconstitucionalidade as normas que estabelecem limitações à recorribilidade do despacho de pronúncia ou equivalente (acórdãos nºs. 353/91 e
265/94);
- A inconstitucionalidade do instituto dos assentos - e de certo segmento do artigo 2º do Código Civil - não significa que padeça de inconstitucionalidade qualquer decisão judicial que adira à doutrina estabelecida por assento - mas tão-somente que as partes podem impugnar tal doutrina perante o Supremo Tribunal de Justiça, tendo este Tribunal legitimidade para, se for caso disso, rever o anteriormente decidido, de modo a realizar de forma plena uma interpretação actualista do direito; ora, no caso dos autos, é patente que o Supremo Tribunal de Justiça aderiu autonomamente a doutrina constante do assento, não procedendo à sua 'revisão' por naturalmente entender que nada o impunha ou aconselhava, face ao acerto da decisão nele contida.'
4.- Corridos os vistos legais, cumpre decidir, o que se faz concordando-se, no essencial, com a exposição do relator que a resposta do recorrente não logrou abalar - para além de se afigurar intempestiva a suscitação da questão de constitucionalidade, se outro fosse o entendimento a adoptar, sem esquecer a eventual manifesta infundamentação aludida pelo Ministério Público - uma vez que, repete-se, o que na verdade se impugna não é a 'norma' retirada da doutrina do 'assento', mas sim a decisão que aplica essa
'norma' como, claramente, começou por admitir.
5.- Em face do exposto, decide-se não tomar conhecimento do recurso.
Custas a cargo do recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 5 (cinco) unidades de conta.
Lisboa, 11 de Março de 1997 Alberto Tavares da Costa Antero Alves Monteiro Diniz Maria Fernanda Palma Armindo Ribeiro Mendes Vitor Nunes de Almeida José Manuel Cardoso da Costa
Exposição preliminar a que se refere o nº 1 do artigo 78º-A da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro.
1.- A. foi pronunciado no 1º Juízo Criminal da comarca do Porto, com outros, como autor de um crime previsto e punido pelos nºs. 1 e 3 do artigo 287º do Código Penal.
Confirmado o despacho recorrido pelo Tribunal da Relação do Porto, de 1 de Março de 1995, recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça, invocando o disposto nos artigos 645º, 647º, nº 2, 651º e 371º e seu §
1º do Código de Processo Penal de 1929.
O Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 28 de Fevereiro de 1996, tirado em conferência, não recebeu o recurso por o julgar inadmissível, tendo, nomeadamente, em conta o disposto no assento de 24 de Janeiro de 1990 (publicado no Diário
da República, I Série, de 12 de Abril de 1990), segundo o qual 'Dos acórdãos da Relação proferidos sobre despachos de pronúncia não há recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, quer verse sobre matéria de direito quer de facto'.
2.- Do acórdão de 28 de Fevereiro último recorreu o arguido para o Tribunal Constitucional e, em observância do disposto no nº 5 do artigo 75º-A da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, conjugado com os nºs. 1 e 2 do mesmo preceito, veio dizer, além do mais, que 'considera que o acórdão recorrido, alicerçando-se no referido assento, ofendeu o preceituado nos artºs.
114º, 115º, nº 5, 207º e 227º, nº 1, da Constituição'.
3.- Constitui jurisprudência pacífica o entendimento de que a competência do Tribunal Constitucional se confina ao controlo de normas, que não de decisões.
Reiteradamente se tem afirmado constituirem objecto de controlo de constitucionalidade apenas normas jurídicas e não quaisquer outros actos do poder público, designadamente as decisões judiciais elas mesmas
(neste sentido, por todos, citem-se os acórdãos nºs. 442/91, 178/95 e 640/96, publicados no Diário da República, II Série, de 2 de Abril de 1992, 21 de Junho de 1995 e 9 de Julho de 1996, respectivamente).
No caso sub judice é manifesto pretender-se rediscutir a matéria da decisão recorrida, na medida em que esta acolhe a doutrina do assento que se põe em causa.
No entanto, ao Tribunal Constitucional tão só compete apreciar a constitucionalidade de uma norma jurídica, ou de uma sua dada interpretação.
4.- Em face do exposto, sem necessidade de maiores desenvolvimentos, entende-se não se poder conhecer do objecto do recurso.
Ouçam-se as partes, por 5 dias, nos termos do nº 1 do artigo 78º-A da Lei nº 28/82.