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Procº nº 1058/98.
2ª Secção. Relator:- BRAVO SERRA.
1. Em 2 de Dezembro de 1998 lavrou o relator, de fls. 174 a 178 destes autos, decisão sumária com o seguinte teor:-
'1. T..., SA, recorreu para o Tribunal Tributário de 1ª Instância de Leiria da decisão, tomada pelo Director de Finanças de Leiria e por delegação, que lhe aplicou a coima de Esc. 5.000.000$00 por infracção ao artº 29º, números 1, 2 e
9, do Regime Jurídico das Infracções Fiscais não Aduaneiras, aprovado pelo Decreto-Lei nº 20--A/90, de 15 de Janeiro.
Tendo, por sentença de 29 de Novembro de 1996, sido negado provimento ao recurso, da mesma recorreu a T... para o então Tribunal Tributário de 2ª Instância.
Em 31 de Dezembro de 1996 foi junta aos autos uma peça processual, consubstanciadora de alegação, que, dado o facto de não vir subscrita por quem quer que fosse, deu origem a um despacho, datado de 23 de Setembro de 1997 e proferido pelo Relator do Tribunal Central Administrativo, por intermédio do qual foi a mesma mandada desentranhar e devolver à apresentante para correcção da irregularidade consistente na sua não subscrição.
Na sequência desse despacho, o mandatário da recorrente fez juntar ao processo, em 13 de Outubro de 1997, ‘as alegações de recurso devidamente assinadas’.
Nessa peça não foi suscitada qualquer questão de desconformidade com a Lei Fundamental reportadamente a norma ou normas jurídicas constantes do ordenamento jurídico infra-constitucio- nal.
Na verdade, a única questão de constitucionalidade que aí se lobriga consta da «conclusão» 7 dessa alegação, na qual se disse que ‘Com a decisão sob censura fez-se aplicação e ou interpretação inconstitucional dos artigos 205º, nº 2 e 207º ambos da CRP’.
Por acórdão de 16 de Junho de 1998 negou o Tribunal Central Administrativo provimento ao recurso, sendo que, nessa decisão jurisdicional, se não discreteou sobre qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, por isso que nenhum problema desse tipo foi suscitado na alegação apresentada pela recorrente.
Após a prolação desse aresto, veio a T... apresentar requerimento por intermédio do qual manifestou a sua vontade de o impugnar perante o Tribunal Constitucional ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, e pretendendo ‘ver apreciada a inconstitucionalidade das normas dos artºs 1º do D.L. 422/82 de 27 de Outubro e 29º do RJIFNA – D.L. nº 20-A/90 de 15 de Janeiro’, sendo que – disse - a ‘questão de inconstitucionalidade foi suscitada nos autos na alegações de recurso apresentadas em 31 de Dezembro de
1996 corrigidas em 13 de Outubro de 1997’.
O recurso veio a ser admitido por despacho de 29 de Setembro de 1998.
2. Não obstante tal despacho, porque o mesmo não vincula este Tribunal (cfr. nº 3 do artº 76º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro) e porque se entende que o recurso não deveria ter sido admitido, profere--se, ex vi do nº 1 do artº 78-A da mesma Lei, a vertente decisão sumária, por intermédio da qual se não toma conhecimento do objecto da vertente impugnação.
Na verdade, estribando-se o recurso na alínea b) do nº 1 do artº 70º da assinalada Lei nº 28/82, mister seria que a recorrente, antes de ser lavrada a decisão intentada impugnar, tivesse suscitado a inconstitucionalidade das normas ínsitas nos artigos 1º, do D.L. 422/82, de 27 de Outubro, e 29º, do RJIFNA, aprovado pelo Decreto–Lei nº 20- -A/90, de 15 de Janeiro, que foram aquelas que elegeu como objecto do vertente recurso.
Só que, na peça em que o poderia e deveria ter feito e que deva ser tida como válida do ponto de vista processual - ou seja, a alegação do recurso interposto da sentença proferida no Tribunal Tributário de 1ª Instância de Leiria – não cumpriu a ora recorrente um tal ónus.
De facto, como se relatou, não foi aí suscitada, directa ou indirectamente, explícita ou implicitamente, qualquer questão de invalidade de que padecesse norma (ou normas) do ordenamento infra- -constitucional por ofensa de preceitos ou princípios constantes do Diploma Básico.
Por outro lado, a menção de que na decisão desejada pôr sob a censura deste órgão de fiscalização concentrada da constitucionalidade normativa se fez
‘aplicação e ou interpretação inconstitucional dos artigos 205º, nº 2 e 207º ambos da CRP’ não constitui, seguramente, uma suscitação de desconformidade com a Lei Fundamental por banda de normas jurídicas. Constitui, isso sim, um assacar do vício de inconstitucionalidade à própria decisão jurisdicional, sendo certo que o recurso de fiscalização concreta previsto na alínea b) do nº 1 do artigo
280º da Constituição e na alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82 tem de ter por objecto normas jurídicas e não outros actos do poder público tais como, verbi gratia, as decisões judiciais consideradas Qua tale.
E nem se diga que foi suscitada a inconstitucionalidade que ora se intentava ver apreciada numa peça processual que, anteriormente, foi junta aos autos.
É que essa mesma peça foi expressamente substituída por outra, como resulta do requerimento de fls. 148, e a ela não foi dada qualquer relevância pela própria decisão tomada no Tribunal Central Administrativo, que não equacionou qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, por a tanto não ser minimamente obrigado em face do teor da alegação a que tinha de dar relevo, isto é, a alegação apresentada em 13 de Outubro de 1997, na qual, é necessário sublinhar, nem sequer se remeteu para o que quer que fosse que constasse da peça anteriormente junta e não subscrita.
Neste contexto, não se toma conhecimento do objecto do recurso.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em cinco unidades de conta.
Lisboa, 2 de Dezembro de 1998'
2. Notificada de tal decisão, fez a T... juntar aos autos requerimento, dirigido ao 'Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional' e por intermédio do qual manifestou a sua vontade de dessa mesma decisão 'recorrer nos termos do artº 668º do Código de Processo Civil', peticionando, a final, que a entidade à qual dirigiu o requerimento ordenasse 'a notificação da recorrente, para em cinco dias se pronunciar sobre a decisão sumária proferida ou ... ordenar o prosseguimento dos autos para apreciação da inconstitucionalidade nas normas ínsitas no artº 1º do D.L. nº 433/82 de 27.10 e artº 29º do RJIFNA'.
Segundo a requerente:-
- o relator não teria, segundo o disposto no nº 1 do artº 78º-A da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, mandado ouvir as partes, pelo que a mesma não foi notificada para se pronunciar sobre a matéria;
- que foi por manifesto lapso que 'as alegações produzidas em 13 de Outubro de 1997, não reproduzem na íntegra as apresentadas em 31 de Dezembro de
1966, nomeadamente os seus arts. 28º, 29º e 30º', pelo que só por esse lapso aquelas não foram coincidentes com estas;
- que, por isso, não faz sentido pensar que 'se tinha desistido de se ver apreciada a questão de inconstitucionalidade das normas ínsitas nos arts.
1º do D.L. 433/82 de 27.10 e 29º do RJINFA para passar a quer assacar do vício de inconstitucionalidade à própria decisão jurisdicional', pelo que nunca 'se pretendeu modificar o objecto do recurso', não sendo, por isso, 'válida a presunção feita pelo' relator.
Cumpre decidir.
2. Em primeiro lugar, cumpre assinalar que não é perfeitamente entendível a razão pela qual a peticionante solicita ao Presidente deste Tribunal, e invocando o artº 688º do Código de Processo Civil (norma que cura da reclamação para o presidente do tribunal que seria competente para conhecer do recurso do despacho que o não admita), que ordene a sua notificação para se pronunciar sobre a decisão sumária.
E não é entendível, por um lado, porque o vertente caso, de todo em todo, não se pode subsumir a uma qualquer das situações para a qual rege aquele artº 688º, visto que em causa não está a prolação de um despacho que não admitisse um recurso intentado interpor ou que o retivesse.
Efectivamente, o recurso interposto para este Tribunal foi admitido pelo Relator do Tribunal Central Administrativo e subiu a este órgão de fiscalização concentrada da constitucionalidade normativa, sendo que o que foi decidido de fls. 174 a 178 foi o não conhecimento do objecto do recurso e dessa decisão, seja no domínio do Código de Processo Civil [cfr. seus artigos 700º, nº
1, alínea e), parte final, 701º, nº 1, e 704º, nº 1], seja no domínio da Lei nº
28/82, na redacção da Lei nº 13-A/98, de 26 de Fevereiro [cfr. artº 78º-A, números 1 e 3], não se prevê reclamação (e muito menos um recurso), quer para o presidente de tribunal superior, caso o processo penda por órgão de administração de justiça pertencente a uma ordem judiciária que ainda comporte um outro tribunal de hierarquia superior, quer para o presidente desse mesmo tribunal.
Por outro lado, não se percebe o motivo pela qual a solicitante requer que seja notificada da decisão sumária para sobre ela se pronunciar, porquanto essa notificação foi, efectivamente, levada a efeito; e tanto o foi quanto é certo que sobre tal decisão a peticionante se veio a pronunciar.
Por fim, não é igualmente perceptível a razão pela qual a T..., em alternativa, pede ao Presidente deste Tribunal que ordene 'o prosseguimento dos autos para apreciação da inconstitucionalidade nas normas ínsitas no artº 1º do D.L. nº 433/82 de 27.10 e artº 29º do RJIFNA', já que uma tal determinação não se inclui nos poderes daquela entidade.
3. Conforme deflui do nº 3 do citado artº 78º-A da Lei nº 28/82, da decisão sumária proferida nos termos do seu nº 1 pode caber reclamação para a conferência.
Daí que se deva perspectivar o requerimento de que ora se ocupa este Tribunal como consubstanciando, na realidade das coisas, uma reclamação para a conferência e, por isso, se lhe deva conferir um tratamento como tal, cumprindo, desta arte, analisar a peça processual em causa nessa óptica.
Adianta-se, desde já, que a reclamação em crise não deve lograr deferimento.
De facto, o Tribunal dá, na sua essencialidade, concordância ao que
é referido na decisão sumária de fls. 174 a 178 e, assim, porque, antes da prolação do aresto desejado pôr sob a censura deste órgão de administração de justiça, a impugnante não questionou, do ponto de vista da sua compatibilidade com a Lei Fundamental, as normas constantes dos artigos 1º do Decreto-Lei nº
433/82, de 27 de Outubro (por lapso de escrita mencionou-se, na decisão sumária, por duas vezes, 422/82), e 29º do Regime Jurídico das Infracções Fiscais não Aduaneiras, aprovado pelo Decreto-Lei nº 20-A/90, de 15 de Janeiro, haverá forçosamente que concluir que, in casu, falta um dos pressupostos do recurso a que se reporta a alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82.
É certo que a reclamante vem agora dizer que só por mero lapso não se referiu, na alegação apresentada no Tribunal Central Administrativo em 13 de Outubro de 1997, a que a mesma dava por reproduzida a peça processual antecedentemente apresentada em 31 de Dezembro de 1996.
Simplesmente, a ter, efectivamente ocorrido esse lapso, não poderá ele, agora e neste Tribunal, ser corrigido e levado em conta (note--se, aliás, que essa circunstância, como se assinalou na decisão sumária ora sob reclamação, não foi minimamente tida em conta, não tendo o aresto pretendido recorrer, sequer, feito qualquer menção à peça processual apresentada em 31 de Dezembro de
1996 e equacionado qualquer questão de inconstitucionalidade, por isso que uma tal questão lhe não foi colocada na alegação que foi tida por válida e operante em termos processuais).
4. Em face do exposto, desatende-se a reclamação, desta sorte se não conhecendo do objecto do recurso, condenando-se a reclamante nas custas processuais, fixando a taxa de justiça em 15 unidades de conta. Lisboa, 13 de Janeiro de 1999 Bravo Serra Maria Fernanda Palma Luís Nunes de Almeida