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Proc. nº 47/00
3ª Secção Relator: Cons. Sousa e Brito
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional: I – Relatório
1. J. A. (ora reclamante) interpôs, no Tribunal Administrativo de Círculo do Porto, recurso contencioso com vista à impugnação da deliberação da Câmara Municipal de Esposende, de 5 de Junho de 1997, que negou provimento ao recurso hierárquico interposto do despacho da Vereadora do pelouro das obras particulares que o mandou notificar 'para no prazo de vinte dias, proceder à legalização do reclame de anúncio instalado'.
2. Por decisão do Tribunal Administrativo de Círculo do Porto, de 9 de Junho de
1998, foi concedido provimento ao recurso e, consequentemente, anulado o acto impugnado, com fundamento na violação do disposto no art. 115º, nº 7 da Constituição.
3. Inconformada com esta decisão a Câmara Municipal de Esposende, ora reclamada, recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo. Nesse Supremo Tribunal o representante do Ministério Público suscitou a seguinte questão prévia:
'O recorrente impugnou contenciosamente para o TAC do Porto, deliberação camarária proferida em sede de recurso hierárquico, tendo por objecto acto praticado pela vereadora. Sucede que dos actos dos vereadores não cabe recurso hierárquico para a Câmara Municipal respectiva dado não existir uma relação hierárquica entre eles. Nesta conformidade, o acto da Vereadora – objecto do referido recurso hierárquico – reveste carácter definitivo dele cabendo recurso contencioso, pelo que a deliberação camarária surge como mero acto confirmativo irrecorrível contenciosamente. Em consequência, o recurso contencioso interposto no TAC deverá ser rejeitado com prejuízo da apreciação e julgamento do presente recurso jurisdicional'.
4. O Supremo Tribunal Administrativo, por decisão de 13 de Outubro de 1999, decidiu:
'a) Conceder provimento ao recurso jurisdicional revogando a sentença recorrida, embora por fundamentos diferentes dos alegados no recurso. b) Rejeitar o recurso contencioso, por manifesta ilegalidade da sua interposição, nos termos do disposto no art. 52º, nº 7 do DL nº 100/84 e art.
25º, nº 1 da LPTA'.
5. Inconformado com esta decisão o ora reclamante pretendeu recorrer para o Tribunal Constitucional. Apresentou, para o efeito, um requerimento com o seguinte teor:
'O alegado «Regulamento sobre afixação e inscrição de mensagem de propaganda», alegadamente aprovado em 17.08.89, da Câmara Municipal de Esposende e base da decisão em crise, é inconstitucional e ilegal, inconstitucionalidade e ilegalidade que se pretende que o Tribunal Constitucional aprecie. Foi violado o nº 7 do art. 115º da Constituição (nº 8 do art. 112º, após a Lei Constitucional nº 1/97, de 20 de Setembro) e os princípios constitucionais da legalidade, da prossecução do interesse público e da protecção dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, da igualdade e da proporcionalidade e da justiça e da imparcialidade. O ora recorrente suscitou as questões de inconstitucionalidade e de ilegalidade na petição de recurso contencioso, interposto em 15.09.97, no Tribunal Administrativo de Círculo do Porto (proc. nº 592/97)'.
6. O recurso não foi, porém, admitido, por despacho do Relator do processo no Tribunal Central Administrativo, que se apoiou para tanto na seguinte fundamentação:
'Não recebo o recurso interposto pelo recorrente para o Tribunal Constitucional do acórdão de fls. 152 e ss., proferido em decisão de recurso jurisdicional de sentença do TAC do Porto, por manifestamente infundado (art. 75º, nº 2 da Lei do tribunal Constitucional). De facto o acórdão recorrido não procedeu à aplicação de qualquer norma cuja inconstitucionalidade tenha sido suscitada no processo, pois rejeitou o recurso contencioso por ilegalidade da respectiva interposição, nos termos do disposto no art. 52º, nº 7 da Lei 100/84 e 25º, nº 1 da LPTA. E em relação a estas normas não houve qualquer arguição de inconstitucionalidade'.
7. Contra este despacho de não admissão do recurso apresentou o requerente, em
13 de Dezembro de 1999, a reclamação que agora se aprecia.
8. Já neste Tribunal foram os autos com vista ao Ministério Público, que emitiu parecer no sentido da manifesta improcedência da presente reclamação. Dispensados os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. II – Fundamentação.
9. O recurso previsto na al. b) do nº 1 do art. 70º da Lei do Tribunal Constitucional – que foi o interposto pelo ora reclamante – pressupõe, para além do mais, que o recorrente tenha suscitado, durante o processo, a inconstitucionalidade de determinada norma jurídica – ou de uma sua interpretação normativa – e que, não obstante, a decisão recorrida a tenha aplicado, como ratio decidendi, no julgamento do caso. No quadro destes pressupostos do recurso de constitucionalidade que o ora reclamante pretendeu interpor importa averiguar se a decisão recorrida - o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 13 de Outubro de 1999 (fls. 44 a
50 dos autos) -, efectivamente aplicou, como ratio decidendi, as normas cuja constitucionalidade o reclamante pretende ver apreciada – as constantes do
'Regulamento sobre afixação e inscrição de mensagem de propaganda' da Câmara Municipal de Esposende. Ora, como vai ver-se, é por demais evidente que não o fez. Como resulta, de forma muito clara, quer da decisão recorrida quer do despacho reclamado, verifica-se que aquela efectivamente não aplicou qualquer norma constante de qualquer regulamento da Câmara Municipal de Esposende. Na realidade, tendo considerado manifestamente ilegal o recurso contencioso interposto, por força da aplicação do disposto nos artigos 52º, nº 7 do Decreto-Lei nº 100/84 e 25º, nº 1 da LPTA – considerando, assim, procedente a questão prévia suscitada pelo Ministério Público junto daquele Tribunal – o Supremo Tribunal Administrativo considerou prejudicado o conhecimento da questão de mérito objecto do recurso e, nessa medida, não teve efectivamente oportunidade de aplicar - ou desaplicar – as normas regulamentares que o ora reclamante pretendia ver apreciadas por este Tribunal. Ora, não o tendo feito, falta inequivocamente um dos pressupostos de que depende a admissibilidade do recurso de constitucionalidade que o ora reclamante pretendeu interpor; a saber: ter a decisão recorrida efectivamente aplicado, como ratio decidendi, as normas cuja constitucionalidade o recorrente pretende ver apreciada. III – Decisão Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação. Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em quinze unidades de conta. Lisboa, 22 de Fevereiro de 2000 José de Sousa e Brito Messias Bento Luís Nunes de Almeida