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Processo n.º 937/98 Conselheiro Messias Bento
Acordam no Plenário do Tribunal Constitucional:
I. Relatório:
1. O... recorreu para este Tribunal do acórdão do Pleno da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo, de 23 de Junho de 1998, a fim de ser apreciada 'a inconstitucionalidade das normas do artigo 456º, n.º 3, do Código de Processo Civil ex vi artigo 1º do Decreto-Lei n.º 267/85, de 16 de Julho (LPTA) e do artigo 22º do Decreto-Lei n.º 129/84, de 27 de Abril (ETAF), com a interpretação dada e aplicada' naquele acórdão, uma vez que - disse -, com essa interpretação, elas 'violam os artigos 2º, 13º, 20º, 16º, 12º, 18º e 26º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa'.
O acórdão recorrido, decidindo uma reclamação do despacho do relator, tinha julgado que um anterior aresto do mesmo Pleno, que condenara o recorrente como litigante de má fé, era irrecorrível, não obstante o n.º 3 do artigo 456º do Código de Processo Civil preceituar que, 'independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admitido recurso, em um grau, da decisão que condene por litigância de má fé'.
Neste Tribunal, o relator proferiu, em 18 de Novembro de 1998, decisão sumária. Aí, depois de se concluir que a questão de constitucionalidade, que constituía objecto do recurso, era a de saber se era compatível com a Constituição uma interpretação do mencionado artigo 456º, n.º 3, segundo a qual não há recurso
(ordinário) do acórdão do Pleno da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo que condena alguém por litigância de má fé, negou-se provimento ao recurso.
2. Dessa decisão sumária, reclamou o recorrente para a conferência que, pelo acórdão n.º 52/99, confirmou o julgamento de improvimento.
3. O recorrente veio, então, interpor recurso para o Plenário, invocando o disposto no artigo 79º-D da Lei do Tribunal Constitucional e alegando que, no referido acórdão n.º 52/99, a 3ª Secção 'julgou a questão de inconstitucionalidade suscitada em sentido divergente do anteriormente adoptado, quanto à mesma norma, pela 1ª Secção, no douto acórdão n.º 440/94'.
O relator, por despacho de 5 de Fevereiro de 1999, fundado em que se não verifica o pressuposto daquele artigo 79º-D (a saber: um julgamento da questão de inconstitucionalidade 'em sentido divergente do anteriormente adoptado quanto
à mesma norma'), não admitiu o recurso para o Plenário.
4. É deste despacho do relator que o recorrente agora reclama para a conferência, ao abrigo do artigo 700º, n.º 3, do Código de Processo Civil, pedindo que se admita o recurso por si interposto daquele acórdão n.º 52/99 para o Plenário do Tribunal. Nessa reclamação, com interesse para a questão que, agora, há que decidir, disse o recorrente o seguinte:
(a). Atenta a sua natureza processual ou adjectiva, o n.º 3 é inseparável dos restantes números do artigo 456º do Código de Processo Civil, veiculando ele a norma de proibição de indefesa perante actos jurisdicionais que condenem por litigância de má fé, em 1º grau de jurisdição.
(b). Ora, o douto acórdão n.º 52/99, de 20 de Janeiro, acaba por adoptar uma solução da questão de inconstitucionalidade suscitada que priva o interessado da possibilidade de apresentar perante os órgãos jurisdicionais qualquer tipo de defesa, vendo-se confrontado com uma decisão condenatória susceptível de afectar gravemente a sua dignidade pessoal e profissional, sem lhe ter sido dada oportunidade de contraditar os respectivos fundamentos de facto e de direito.
(c). Assim, o reclamante considera que a solução adoptada no douto acórdão n.º
52/99, de 20 de Janeiro de 1999, sobre a questão de inconstitucionalidade tem por consequência julgar constitucional um regime de condenação em multa por litigância de má fé, em termos de o interessado não poder alegar o que tem por conveniente, apesar de o artigo 456º, n.º 3, do Código de Processo Civil prever que 'é sempre admitido recurso, em um grau, da decisão que condene por litigância de má fé'.
(d). Numa visão substancial das coisas, a questão de inconstitucionalidade no caso do douto acórdão n.º 52/99 da 3ª Secção do Tribunal Constitucional diz respeito à mesma norma que a questão de inconstitucionalidade resolvida no acórdão n.º 440/94, ou seja, à norma de proibição da indefesa contra actos jurisdicionais que condenem por litigância de má, veiculada pelo n.º 3 do artigo
456º do Código de Processo Civil.
A CÂMARA MUNICIPAL DE VIMIOSO, recorrida nos autos, não respondeu.
5. Cumpre, então, decidir se, no acórdão n.º 52/99, a 3ª Secção apreciou, sub specie constitutionis, a mesma norma que a 1ª Secção analisou no acórdão n.º
440/94; e, bem assim, se julgou essa questão de inconstitucionalidade em sentido divergente do aresto citado por último.
É que, só tendo-o feito, o recurso para o Plenário é de admitir.
II. Fundamentos:
6. No acórdão n.º 52/99, que o recorrente pretende impugnar perante o Plenário, o Tribunal decidiu que o artigo 456º, n.º 3, do Código de Processo Civil - que dispõe que, 'independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admitido recurso, em um grau, da decisão que condene por litigância de má fé' - não viola qualquer norma ou princípio constitucional (designadamente, os preceitos indicados pelo recorrente), quando interpretado no sentido de que não há recurso (ordinário) do acórdão do Pleno da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo que condena alguém por litigância de má fé. No acórdão n.º 440/94 (publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 28º volume, páginas 319 e seguintes), decidiu-se 'não julgar inconstitucionais as normas dos artigos 456º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, na parte relativa à condenação em multa por litigância de má fé, desde que interpretados no sentido de tal condenação estar condicionada pela prévia audição dos interessados sobre a matéria'. Ou seja: entendeu-se que essas normas seriam inconstitucionais, se interpretadas no sentido de permitirem tal condenação sem prévia audição do interessado.
Como se vê, no acórdão n.º 440/94, apreciou-se, ratione constitutionis, o complexo normativo constituído pelos nºs 1 e 2 do artigo 456º do Código de Processo Civil (redacção anterior aos Decretos-Leis nºs 329-A/95, de 12 de Dezembro, e 180/96, de 25 de Setembro), na parte em que neles se prevê a condenação em multa do litigante de má fé, quando confrontado com a necessidade do contraditório. No acórdão n.º 52/99, o que se confrontou com a Constituição foi a norma do n.º 3 do dito artigo 456º (redacção do citado Decreto-Lei n.º
329-A/95) - que prevê a existência de recurso, em um grau, das decisões que condenem em multa por litigância de má fé -, aplicada a um caso em que a condenação por má fé foi proferida pelo Pleno da 1ª secção do Supremo Tribunal Administrativo. Foi, pois, com inteiro acerto que o despacho reclamado sublinhou que, 'no acórdão ora recorrido [ o acórdão n.º 52/99] , concluiu-se pela não inconstitucionalidade do artigo 456º, n.º 3, do Código de Processo Civil, ao passo que, no acórdão-pretexto (acórdão n.º 440/94), concluindo-se, embora, pela inconstitucionalidade, as normas que foram objecto desse julgamento foram as dos nºs 1 e 2 do dito artigo 456º, e não a do n.º 3 do mesmo preceito'.
Não merece, por isso, censura a decisão de não admissão do recurso para o Plenário. De facto, como se escreveu nesse despacho, não se verifica o pressuposto do artigo 79º-D da Lei do Tribunal Constitucional: julgamento da questão de inconstitucionalidade 'em sentido divergente do anteriormente adoptado quanto à mesma norma'.
7. Conclusão: Não se verificando o pressuposto do artigo 79º-D da Lei do Tribunal Constitucional, do acórdão n.º 52/99, proferido pela 3ª Secção, não é admissível recurso para o Plenário do Tribunal. Há, por isso, que indeferir a reclamação apresentada e confirmar o despacho reclamado, de 5 de Fevereiro de 1999, que não admitiu tal recurso.
III. Decisão: Pelos fundamentos expostos, o Tribunal decide:
(a). indeferir a reclamação apresentada;
(b). confirmar o despacho reclamado, que não admitiu o recurso interposto do acórdão n.º 52/99 para o Plenário;
(c). condenar a reclamante nas custas, com quinze unidades de conta de taxa de justiça. Lisboa, 24 de Março de 1999 Messias Bento Guilherme da Fonseca Vítor Nunes de Almeida José de Sousa e Brito Alberto Tavares da Costa Paulo Mota Pinto Maria Fernanda Palma Bravo Serra Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Maria Helena Brito Artur Maurício Luís Nunes de Almeida