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Proc. nº 788/97
2ª Secção Rel.: Consª Maria Fernanda Palma
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
I Relatório
1. I..., Lda., interpôs junto do Tribunal Cível da Comarca de Lisboa recurso, nos termos do artigo 203º do Código da Propriedade Industrial, do Despacho do Senhor Director de Serviços de Marcas do Instituto Nacional da Propriedade Industrial de 3 de Janeiro de 1994, que recusou o pedido de registo da marca nacional nº 203952.
O Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, por sentença de 6 de Março de
1995, negou provimento ao recurso, confirmando o despacho recorrido.
2. I... interpôs recurso da sentença de 6 de Março de 1995 para o Tribunal da Relação de Lisboa.
O Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 21 de Maio de 1995, negou provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.
3. I... interpôs recurso do acórdão de 21 de Maio de 1995 para o Supremo Tribunal de Justiça.
O Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 28 de Maio de 1997, concedeu provimento ao recurso no que se refere ao registo de marcas para os esquentadores, revogando, nessa parte, o despacho recorrido, e ordenando a sua substituição por outro que autorizasse o registo.
W... arguiu a nulidade do acórdão de 28 de Maio de 1997, sustentando que a interpretação da norma contida no artigo 668º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil, no sentido de não ser nula a decisão reclamada, é inconstitucional, por violação do artigo 114º da Constituição.
O Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 5 de Novembro de 1997, indeferiu a reclamação, confirmando o acórdão de 28 de Maio de 1997.
4. W..., Srl, interpôs recurso de constitucionalidade, ao abrigo dos artigos 280º, nº 1, alínea b), da Constituição, e 70º, nº 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, para apreciação da conformidade à Constituição da norma contida no artigo 668º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil, interpretada no sentido de permitir que num processo em que se recorreu de um despacho do Instituto Nacional da Propriedade Industrial que negou o registo de uma marca possa o Supremo Tribunal de Justiça ordenar a substituição do despacho recorrido por auto que autorize o registo.
Junto do Tribunal Constitucional a recorrente apresentou alegações que concluiu do seguinte modo: A) O artigo 668º, nº 1, alínea d) in fine, do Código do Processo Civil, quando aplicado em sede de recurso de decisão proferida por órgão do INPI que nega um registo de marca, interpretado em termos de permitir que o Tribunal possa ordenar que se substitua o despacho de negação por outro que conceda o registo, viola o princípio constitucional de separação de poderes, vertido no artigo
111º, nº 1 da CRP.
Por seu turno, a recorrida contra-alegou, tendo tirado as seguintes conclusões: a) O recurso em apreço é da exclusiva competência dos tribunais comuns, devendo o respectivo processo obedecer às regras processuais estabelecidos para esses tribunais (arts. 2º do Decreto-Lei nº 16/95 de 24 de Janeiro, art. 38 e 43 do actual CPI a que correspondiam os arts. 203 e 209 do Código de 1940); b) O Vº Tribunal recorrido, uma vez que estava no âmbito de um recurso de revista aplicou, como lhe competia, aos factos materiais assentes pelas instâncias, o regime jurídico que entendeu adequado; c) O presente recurso é, pois, manifestamente infundado, além de que a recorrente, litigando com manifesta mà fé, alterou conscientemente a verdade dos factos (arts. 28 a 34 das alegações da recorrente); d) O Vº Supremo Tribunal de Justiça não praticou qualquer acto administrativo, nem se substituiu ao INPI. Limitou-se, sim, a conhecer da revista, concedendo-a parcialmente, e a exprimir a consequência necessária da sua decisão, ou seja: a substituição (a ser levada a cabo pelo INPI) do despacho em causa por outro que conceda o registo quanto a esquentadores. e) Qualquer outro entendimento, nomeadamente o defendido pela recorrente, esvaziaria totalmente de sentido as disposições legais acima citadas (arts. 38 e
43 do CPI e arts. 203 e 209 do anterior Código), pois o INPI, ao arrepio das decisões dos tribunais judiciais, poderia sempre voltar a decidir como muito bem entendesse. f) Não se verifica, pois, qualquer inconstitucionalidade na interpretação dada pelo Vº Supremo Tribunal de Justiça ao art. 668, nº 1, d) do CPC, devendo ser negado provimento ao presente recurso.
5. Após os vistos, a Relatora proferiu parecer, nos termos do artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil, no sentido do não conhecimento do objecto do recurso, em virtude de não se verificar o pressuposto processual consistente na não aplicação pela decisão recorrida da norma impugnada. O conteúdo do parecer é o seguinte: Apresentado projecto de Acórdão pela relatora em 9 de Junho de 1998, veio a resultar do debate realizado em secção a questão prévia do não conhecimento do objecto do recurso. A questão do não conhecimento do objecto do recurso emana do facto de o artigo
668º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil, objecto do recurso de constitucionalidade nos presentes autos, não ter sido a norma que justificou o julgamento do tribunal recorrido quanto à questão material de constitucionalidade normativa. Com efeito, a questão de constitucionalidade nomativa suscitada diz respeito à delimitação dos poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça no caso concreto. Mas essa delimitação foi fundamentada pelo Supremo Tribunal de Justiça nas normas do Código da Propriedade Industrial de 1940, que respeitam aos recursos dos 'despachos que concederem ou remeterem as patentes, depósitos ou registos' (artigos 203º e 209º do Código da Propriedade Industrial), e não no artigo 668º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil. Deste modo, não se verifica o pressuposto processual constante do artigo 70º, nº
1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, consistente na aplicação pela decisão recorrida da norma cuja inconstitucionalidade se pretende ver apreciada com a dimensão interpretativa que lhe é assinalada pelo recorrente. Com efeito, a norma cuja constitucionalidade se questionou, na dimensão interpretativa referida, não foi a ratio decidendi da decisão recorrida no que se refere à delimitação dos poderes de cognição do tribunal (sobre questão idêntica se pronunciou o Tribunal Constitucional, no Acórdão nº 423/98, de 4 de Junho).
A recorrente não respondeu II Fundamentação Questão prévia
6. O Tribunal Constitucional, no Acórdão nº 423/98, de 4 de Junho, apreciou uma questão no essencial idêntica à dos presentes autos.
Nesse aresto, o Tribunal Constitucional considerou que o tribunal recorrido, para definir os seus poderes de cognição, não fez apelo ao artigo
668º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil, mas sim às normas do Código da Propriedade Industrial de 1940, atinentes aos recursos dos despachos que concedem ou recusam patentes, depósitos ou registos.
Em consequência, o Tribunal entendeu que a norma então impugnada [a contida no artigo 668º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil] não foi aplicada pela decisão recorrida, concluindo, consequentemente, pela não admissibilidade do recurso interposto.
Nos presentes autos, a questão a decidir é, como se referiu, substancialmente idêntica à decidida no referido aresto. Com efeito, a questão de constitucionalidade nomativa suscitada diz respeito à delimitação dos poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça no caso concreto. Mas essa delimitação foi fundamentada pelo Supremo Tribunal de Justiça nas normas do Código da Propriedade Industrial de 1940, que respeitam aos recursos dos
'despachos que concederem ou remeterem as patentes, depósitos ou registos'
(artigos 203º e 209º do Código da Propriedade Industrial), e não no artigo 668º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil. Deste modo, não se verifica o pressuposto processual constante do artigo 70º, nº
1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, consistente na aplicação pela decisão recorrida da norma cuja inconstitucionalidade se pretende ver apreciada com a dimensão interpretativa que lhe é assinalada pelo recorrente. Assim, a norma cuja constitucionalidade se questionou, na dimensão interpretativa referida, não foi a ratio decidendi da decisão recorrida no que se refere à delimitação dos poderes de cognição do tribunal.
Conclui-se, consequentemente, que o Tribunal não tomará conhecimento do objecto do recurso de constitucionalidade interposto.
III Decisão
7. Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide não tomar conhecimento do objecto do presente recurso de constitucionalidade.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 6 UCs. Lisboa, 23 de Março de 1999 Maria Fernanda Palma Bravo Serra Guilherme da Fonseca Paulo Mota Pinto José Manuel Cardoso da Costa