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Proc. nº 44/99
3ª Secção Rel. Cons. Tavares da Costa Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. - Nos presentes autos de recurso de constitucionalidade, interposto ao abrigo do artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, em que é recorrente T..., SA, sendo recorrido o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, foi proferida decisão sumária, em 5 de Fevereiro do corrente ano, nos termos do nº 1 do artigo 78º-A daquele diploma legal. Pretende a recorrente ver apreciada a constitucionalidade da norma da alínea g) do nº 1 do artigo 41º do Código de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC), na redacção anterior à Lei nº 39-B/94, de 27 de Dezembro, por entender que contraria o disposto nos artigos 2º, 61º e 266º, nº 2, da Constituição da República (CR).
2. - Entendeu-se, na oportunidade, não poder conhecer-se do objecto do recurso, por falta de suscitação atempada da questão de constitucionalidade uma vez que, não obstante alegar que o fez nas alegações de recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, o certo é que em momento algum, anterior ao requerimento de interposição do recurso, o terá feito. Escreveu-se, a este propósito:
'Na verdade, e como decorre da singela leitura dos artigos 7º, 15º e 16º das alegações a que se refere (ou de qualquer outra passagem das mesmas ou em diferente momento processual) não se põe em causa a norma do Código que determina não serem dedutíveis, para efeito de determinação do lucro tributável, os encargos oriundos de despesas de representação, 'escrituradas a qualquer título, na parte em que a Direcção-Geral das Contribuições e Impostos as reputa exageradas'. O mesmo se diga no tocante aos convocados 'artigos 28º e seguintes', que consubstanciam as respectivas conclusões da sua alegação, que se transcrevem:
‘28º A gestão de qualquer sociedade pertence aos órgãos sociais e não à Administração fiscal,
29º nos termos dos princípios da certeza, segurança e justiça do Direito tributário
(artigo 2º da C.R.).
30º respeito da iniciativa privada (artigo 61º da C.R.)
31º e justiça e imparcialidade da actividade administrativa (artigo 266º, 2 da CR).
32º A Administração fiscal, no caso em análise, limitou-se a substituir os seus critérios (não revelados) de boa gestão, aos critérios do contribuinte,
33º com o objectivo evidente (e único) de obter acréscimo de receitas,
34º e reduzindo a metade indiscutidas despesas de representação, de montante moderado,
35º pelo que o Douto Acórdão recorrido ao aprovar tal substituição de 'critérios' violou as referidas normas – artigos 2º, 61º e 266º, 2 da C.R.
36º A exigência de fundamentação expressa destina-se a exteriorizar as razões que levaram a Administração a praticar um certo acto com um certo conteúdo.
37º No caso em análise, a Administração não revelou o 'iter' decisório mas só a decisão;
38º pelo que o Douto Acórdão recorrido ao sancionar tal vício violou o disposto nos artigos 21º do CPT e 268º, 1 da CRP.
39º Termos em que se pede a revogação do Acórdão recorrido com as devidas consequências legais.’
Ou seja, a questão de constitucionalidade não foi suscitada durante o processo, no sentido funcional que a jurisprudência constitucional reiterada e pacificamente acolhe, de modo que essa invocação seja feita em momento em que o tribunal a quo ainda pudesse conhecer da questão: como tal, não se verifica esse pressuposto necessário de admissibilidade do recurso.'
3. - E acrescentou-se, ainda:
'De qualquer modo, sempre seria o mesmo o destino a dar ao requerimento de interposição do recurso: os vícios de constitucionalidade que a recorrente considera existirem são, manifestamente, atribuídos à decisão judicial em si e não a qualquer norma. Não é esta que se discute mas sim os critérios que, no
âmbito dessa norma, foram utilizados pela Administração e avalizados pelas decisões judiciais - em contraste com os propostos pela recorrente. Ora, o controlo da fiscalização dos critérios estabelecidos legalmente e a suficiência da fundamentação da sua utilização in casu não competem a este Tribunal e dizem respeito às decisões judiciais em si mesmas consideradas, que não integram o objecto do recurso de constitucionalidade.'
4. - Notificada, vem agora a recorrente reclamar para a conferência, nos termos do nº 3 do artigo 78º-A da Lei nº 28/82, reiterando ter suscitado a questão de constitucionalidade em termos directos e perceptíveis, a ponto de o tribunal recorrido se ter pronunciado sobre a mesma, pelo que pede a revogação da decisão sumária de modo a que o Tribunal Constitucional possa conhecer do recurso. Por sua vez, o recorrido sustenta o indeferimento da reclamação, uma vez que a recorrente, embora sustente o contrário, 'nunca ao longo do processo de recurso contencioso, apresentado junto do STA, invocou a inconstitucionalidade da, então em vigor, alínea g) do nº 1 do artigo 41º do Código do IRC'.
5. - Não assiste, manifestamente, razão à reclamante. Desde logo, observe-se que a própria reconhece não ter suscitado a questão da inconstitucionalidade da norma ipsis verbis, se bem que argumente não estar obrigada a utilizar essa fórmula, tendo 'por outras palavras perfeitamente equivalentes' equacionado a questão, que foi percebida pelo Acórdão recorrido ao pronunciar-se sobre ele. Ora, o problema não é, evidentemente, de fórmula mas sim de suscitação inequívoca, em termos claros e directos, que não proporcionem dúvida e representem linearmente a questão equacionada perante o tribunal que a terá de afrontar e resolver. O que se retira dos autos é, em primeiro lugar, a verificação de que, excepto no requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional, nunca a reclamante colocou, sequer implicitamente, a questão da constitucionalidade da norma constante da alínea g) do nº 1 do artigo 41º do Código do IRC, na versão então em vigor; e, em segundo lugar, que essa questão não foi objecto de pronúncia pelo acórdão recorrido. Com efeito, nas alegações de recurso para o Pleno da Secção e, nomeadamente,
'nos artigos 7º, 15º, 16º e 28º e seguintes', a reclamante apenas considerou contrária aos princípios constitucionais a actuação da Administração Fiscal
(cfr., artigos 15º e 16º) e, em segundo lugar, o acórdão da 2ª Secção, (de fls.
125), que impugnou perante o Pleno (cfr., em especial, os artigos 35º e 38º e seguintes). A citação da alínea g) do referido nº 1 do artigo 41º não é acompanhada de qualquer acusação de inconstitucionalidade, até porque o que a reclamante questiona é sempre a suficiência de fundamentação do acto por si impugnado da Administração Fiscal. Por outro lado, a circunstância de o voto de vencido aposto no acórdão recorrido se basear na inconstitucionalidade da norma agora questionada não significa que o Supremo tenha conhecido da questão, que nem sequer abordou.
6. - Assim sendo, e porque foram imputados vícios de inconstitucionalidade à decisão em si e não a quaisquer normas e só estas constituem objecto do recurso de constitucionalidade em causa, decide-se: a) manter a decisão sumária de não conhecimento do recurso; b) condenar a reclamante nas custas, com taxa de justiça que se fixa em 15
(quinze) unidades de conta. Lisboa, 25 de Março de 1999 Alberto Tavares da Costa Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Luís Nunes de Almeida