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Proc.Nº 509/94
Sec. 1ª Rel. Cons. Vitor Nunes de Almeida
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
I - RELATÓRIO:
1. - A propôs no Tribunal do Trabalho do Funchal uma acção emergente de contrato individual de trabalho contra a firma 'B, LDA', acção esta que veio a ser julgada improcedente, na primeira instância, por se ter considerado que não existia entre os contraentes uma relação de trabalho subordinado.
Interposto recurso desta decisão pelo trabalhador, o Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 31 de Maio de 1989, negou provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida.
2. - Inconformado com esta decisão, o trabalhador interpôs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça (STJ), que, por acórdão de 26 de Setembro de 1990, negou a revista, assim se mantendo o acórdão da Relação e a sentença de primeira instância.
Notificado desta decisão, o trabalhador e autor veio interpor recurso para o Pleno do STJ, indicando no requerimento de interposição seis acórdãos considerados em oposição ao acórdão recorrido.
Posteriormente, o recorrente veio proceder à correcção do requerimento de interposição de recurso para o Pleno, indicando apenas como acórdão-fundamento o Acórdão de 21 de Novembro de 1986 (publicado nos 'Acórdãos Doutrinais', nº 307, pág. 1045).
Entretanto, o recorrente não pagou as custas pela interposição do recurso, tendo sido proferido a fls. 393 um despacho pelo qual se decidiu não admitir o recurso interposto para o Pleno do STJ.
Em 25 de Janeiro de 1991, o trabalhador e recorrente apresentou um requerimento ao relator no sentido de lhe serem mandadas passar as guias para pagamento das custas, as quais não pudera pagar nessa data por lhe terem sido recusadas as referidas guias, invocando em tal requerimento a inconstitucionalidade da interpretação do artigo 117º, nº 1, do Código das Custas Judiciais (CCJ), na parte em que não concede uma segunda oportunidade ao responsável por custas contadas nos termos do artigo 122º do CCJ.
Na sequência deste requerimento, o relator exarou o seguinte despacho:
'Há decisão do relator a não admitir o recurso, da qual não se reclamou tempestivamente para a conferência, assim ocorrendo o seu trânsito.
Aliás, o recurso não seria viável por não se poder invocar como acórdão fundamento decisão que não se declare ter transitado e sido proferida no domínio da mesma legislação (artigo 763º do Cód. Proc. Civil).'
Notificado deste despacho, o recorrente veio dele reclamar, em 19 de Fevereiro de 1991, para a conferência; o relator, porém, não submetendo o requerimento à conferência, voltou a proferir um despacho em que repetiu os fundamentos do seu anterior despacho, pelo que o recorrente voltou a reclamar para a conferência, renovando os fundamentos já aduzidos na anterior reclamação.
Submetidos os autos à conferência, o STJ tirou, em 10 de Abril de 1991, um acórdão pelo qual se decidiu que 'por falta de reclamação tempestiva para a conferência do despacho do relator, verificou-se o seu trânsito, ficando a instância extinta.'
3. - Notificado ao recorrente o teor do acórdão citado, veio interpor recurso para o Tribunal Constitucional, para apreciação da inconstitucionalidade da interpretação da norma do artigo 117º, nº 1, do CCJ, que não concede uma segunda oportunidade ao responsável por custas contadas nos termos do artigo 122º, nº 4, do CCJ.
Sobre este requerimento recaiu um despacho do relator, cujo teor é o seguinte:
'O que se decidiu foi, por falta de reclamação tempestiva para a conferência, ter transitado o despacho do Relator a não admitir o recurso para o tribunal pleno (fls. 392).
Assim, o problema da eventual inconstitucionalidade levantada no requerimento de fls. 394 não chegou a ser objecto de apreciação e decisão, por antes ter transitado o despacho reclamado desatempadamente.
Não se verifica, pois, o fundamento para recurso para o Tribunal Constitucional previsto na alínea b), nº 1, do artº 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, pelo que não é admitido.'
Notificado este despacho ao recorrente, veio dele reclamar para a conferência de STJ para que se admitisse o recurso.
O STJ, por acórdão de 16 de Outubro de 1991, depois de fazer a história pregressa dos termos relevantes para a decisão, veio a indeferir a reclamação, com fundamento em que o que ocorreu nos autos 'foi não ter sido admitido recurso para o Tribunal Pleno e desse despacho não ter sido interposta reclamação', pelo que se verificou o trânsito do despacho do relator,
'ficando a instância extinta', concluindo-se no acórdão que 'face ao exposto, mantém-se o não recebimento do recurso por a questão invocada de inconstitucionalidade para o fundamentar não ter relação, directa ou indirecta, com a decisão que julgou extinta a instância de recurso, mais uma vez se reafirmando que, por falta de reclamação tempestiva para a conferência do despacho do Relator que não admitiu o recurso para o Pleno, verificou-se o seu trânsito, encontrando-se finda a instância.'
4. - O recorrente, notificado desta decisão, veio invocar o disposto no artigo 79º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, para interpor novo recurso para o Pleno do STJ, mas agora contra o acórdão de 10 de Abril de 1991, relativamente ao qual interpusera recurso de constitucionalidade não recebido, invocando como acórdão-fundamento o acórdão do STJ, de 7 de Junho de 1983, publicado no Boletim do Ministério da Justiça, nº 328, pág. 511.
Entretanto, o trabalhador recorrente notificado das contas de custas da sua responsabilidade, veio delas reclamar, alegando erro de cálculo, por um lado, e erro de direito, por outro, entendendo que na respectiva conta não se deviam aplicar as normas dos artigos 6º, nº 1, do Decreto-Lei nº
387-D/87, de 29 de Dezembro e dos artigos 5º, nºs 1 e 2 do Decreto-Lei nº 92/88, de 17 de Março, que introduziram alterações no CCJ, na versão do Decreto-Lei nº
387-D/87.
Notificado para efectuar o preparo em falta acrescido de igual valor de taxa de justiça e ainda de uma multa de 5.000$00, por falta de duplicado e cópia da reclamação, o recorrente veio requerer a devolução do montante do preparo que pagara cautelarmente, por entender que afinal não apresentara qualquer reclamação de conta mas apenas um requerimento nos termos do artigo 670º do Código de Processo Civil (CPC).
Sobre os dois requerimentos em referência o relator veio a proferir um despacho pelo qual indeferiu a reclamação das contas de custas e bem assim o requerimento relativo ao pedido de devolução do preparo e da multa por não ter junto os duplicados em falta.
O recorrente, notificado deste despacho, veio reclamar dele para a conferência.
Em acórdão de 25 de Novembro de 1993, o STJ decidiu, quanto a esta reclamação, não só confirmar o despacho do relator, assim indeferindo a reclamação e o requerimento, mas ainda condenar o trabalhador e recorrente como litigante de má fé.
5. - Notificado deste acórdão, o recorrente veio requerer a sua reforma quanto à condenação em multa como litigante de má fé. A este respeito o Ministério Público elaborou parecer no sentido de ser indeferido tal pedido.
Levado o processo à conferência, o STJ, por acórdão de
17 de Fevereiro de 1994, decidiu indeferir o pedido de reforma da condenação do recorrente em multa, como litigante de má fé .
Notificado do acórdão, o recorrente interpôs recurso para o Tribunal Pleno, invocando oposição de julgados com cinco acórdãos.
O relator proferiu depois um despacho, pelo qual dava conta de que o recorrente tinha interposto dois recursos para o Tribunal Pleno, um com o requerimento de fls. 416/419, do acórdão de fls 400, e outro, com o requerimento de fls. 530/531, do acórdão de fls. 514. Quanto ao primeiro, o recurso veio a ser admitido, sem efeito suspensivo. Quanto ao segundo, o despacho depois de analisar os requisitos dos recursos por oposição de acórdãos, acabou por decidir que, tendo o recorrente indicado cinco acórdãos de oposição quando só podia indicar um, não admitiu o recurso, nos precisos termos do que se dispõe nos artigos 687º, nº3, e 765º, nº2, ambos do CPC.
Notificado deste indeferimento, o recorrente veio reclamar para a conferência, sustentando aí a inconstitucionalidade da interpretação da norma do artigo 763º, nº 1, do CPC, que apenas admite a indicação de um acórdão fundamento de oposição por cada questão de direito.
O STJ, por acórdão de 11 de Outubro de 1994, decidiu manter o despacho reclamado, assim indeferindo a pretensão do recorrente exposta na reclamação para a secção social.
Notificado deste acórdão, o recorrente interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, sem mais qualquer referência, recurso que foi admitido no STJ, fixando-se-lhe a forma de subida e o efeito.
6. - Remetidos os autos a este Tribunal, foi determinado pelo relator que o recorrente completasse o requerimento de interposição de recurso com os elementos exigidos pelo artigo 75º-A, da Lei do Tribunal Constitucional (LTC).
Na sequência deste convite, foi apresentado um requerimento, pelo qual se forneceram os seguintes elementos:
'(...)o recurso oportunamente interposto para o Tribunal Constitucional tem por fundamento a inconstitucionalidade das normas contidas nos artigos 117º, nº1, e
122º, nº 4, do C.C.J., na interpretação restritiva dada pelo S.T.J. no douto acórdão de fls... dos autos, por cercear o direito fundamental de acesso à justiça por razões económicas e por violar os princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade contidos nos artºs 13º, 20º e 207º da C.R.P., ao não admitir por analogia e com as necessárias adaptações um regime idêntico ao previsto nos artigos 168º, 115º. 113º e/ou 110, nº 1, do C.C.J., cuja questão de inconstitucionalidade ou desconformidade com os princípios consignados na C.R.P.foi suscitada nas alegações de recurso apresentadas em 20.06.94 a fls.. dos autos, bem assim, a inconstitucionalidade da norma contida no artº 763º, nº
1, do C.P.C., na interpretação restritiva dada pelo S.T.J. no douto Acórdão de fls.. dos autos, por violar os direitos fundamentais contidos nos artigos 20º, nº 1 e 207º da C.R.P. e 10º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, nomeadamente o direito de recurso, que incorpora no seu âmbito o próprio direito de defesa contra actos jurisdicionais, cuja questão de inconstitucionalidade ou desconformidade com os princípios consignados na C.R.P., foi suscitada nas alegações de recurso apresentadas em 20.06.94 a fls. dos autos, pelo que requere a V.Exas se dignem admiti-lo nos termos legais.'
Produzidas as pertinentes alegações apenas pelo recorrente, nelas formulou este a seguinte conclusão:
'Nestes termos e com o douto suprimento de V. Exas., deverá ser dado provimento ao presente recurso, declarando-se ilegal e/ou inconstitucional a interpretação restritiva dada pelo tribunal «a quo» às normas legais contidas nos artigos
117º, nº 1 e 122º, nº 4 do C.C.J. e 763º, nº 1, do C.P.C., com todas as legais consequências, designadamente as descritas no artº 80º, nº 3, da Lei nº 28/82, de 15-11'.
A firma recorrida não apresentou alegações.
Corridos que foram os vistos legais, cumpre, apreciar e decidir o presente recurso.
II - FUNDAMENTOS:
7. - Importa, antes de mais, saber se se verificam os requisitos de admissibilidade dos recursos de constitucionalidade relativamente a todas as normas que o recorrente fez incluir no âmbito do recurso, tal como vem definido no requerimento em que se completou o de interposição do recurso.
Embora o recorrente o não refira, nem no requerimento de interposição nem no de completamento deste, o presente recurso só pode ter sido interposto ao abrigo da norma do artigo 70º, nº1, alínea b) da LTC, ou seja, trata-se de um recurso de constitucionalidade em consequência de a decisão recorrida ter utilizado as normas questionadas apesar de o recorrente as ter oportunamente arguido de inconstitucionais.
A admissibilidade deste tipo de recurso obedece à concorrência dos seguintes pressupostos: a) prévia suscitação durante o processo, pelo recorrente, da inconstitucionalidade da norma (ou da interpretação a ela dada pela decisão); b) utilização da norma pela decisão recorrida em termos de tal norma ou a interpretação contestada integrar a sua ratio decidendi; c) exaustão dos meios de recurso ordinário, por a lei os não prever ou por já se haverem esgotado os que no caso cabiam.
O presente recurso pretende abranger a interpretação dada às normas dos artigos 117º, nº 1 e 122º, nº 4, ambas do CCJ e, por outro lado, a dada à norma do artigo 763º, nº 1, do CPC.
Porém, é manifesto que não se verificam os requisitos de admissibilidade do recurso relativamente às normas do Código das Custas Judiciais. Com efeito, na decisão recorrida - o acórdão do STJ de 11 de Outubro de 1994 - não se utilizaram tais normas como fundamento do que nela se decidiu, não tendo o acórdão recorrido aplicado ou sequer referido as normas que o recorrente questiona, com a interpretação que refere ou qualquer outra.
Assim sendo e não se verificando os pressupostos do recurso quanto a tais normas, não pode o Tribunal conhecer do recurso relativamente às normas dos artigos 117º, nº 1 e 122º, nº 4, ambas do CCJ.
8. - Vejamos agora o recurso relativo à interpretação da norma do artigo 763º, nº1, do CPC, esta sim aplicada e utilizada na decisão recorrida como seu fundamento.
O recorrente entende que o STJ, no acórdão recorrido ao interpretar o nº 1 do artigo 763º do CPC, no sentido de apenas admitir o recurso para o Tribunal Pleno se se indicar um único acórdão-fundamento para cada questão de direito, faz uma interpretação inconstitucional de tal norma, pois, assim entendida, viola esta o artigo 20º, nº 1 e o artigo 207º da Constituição.
Adiante-se desde já que o recorrente não tem razão na posição que defende.
A norma cuja conformidade constitucional vem questionada, inserida na Secção relativa ao 'Recurso para o Tribunal Pleno', tem o seguinte teor:
'Artigo 763º
(Fundamento do recurso)
1. Se, no domínio da mesma legislação, o Supremo Tribunal de Justiça proferir dois acórdãos que, relativamente à mesma questão fundamental de direito, assentem sobre soluções opostas, pode recorrer-se para o tribunal pleno do acórdão proferido em último lugar.'
Trata-se do recurso de oposição de julgados com vista à fixação da jurisprudência através da figura jurídica dos assentos.
A questão que vem suscitada prende-se com os pressupostos de admissibilidade do referido recurso: para que possa levantar-se recurso para o Pleno é indispensável que, no domínio da mesma legislação, o STJ tenha proferido dois acórdãos sobre a mesma questão fundamental de direito, com soluções opostas, daí resultando a necessidade de fixar uma orientação definida para o futuro.
Tem sido jurisprudência uniforme do STJ o entendimento de que se a oposição respeitar a uma única questão de direito, o recorrente apenas pode apresentar como fundamento do recurso um único acórdão.
E é esta interpretação que o recorrente tem por violadora do princípio constitucional do direito de acesso aos tribunais, na modalidade do direito de recurso que fica em tal interpretação ilegitimamente restringido.
Vejamos se assim é, de facto.
9. - O artigo 20º, nº 1 da Constituição (Revisão de
1989) determina que 'a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legítimos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos'.
Esta norma consubstancia uma garantia de protecção jurídica e da via judiciária, que integra vários direitos, designadamente o direito de acesso ao direito e o direito de acesso aos tribunais, incluindo-se neste último, para além do direito de acção e do direito ao processo, o direito de recurso.
O direito de recurso das decisões judiciais implica para qualquer cidadão, a possibilidade de acesso a todos os graus de jurisdição que forem legalmente reconhecidos, sem que a tal obstem dificuldades económicas. A Constituição, ao prever a existência de tribunais de recurso no artigo 212º, não pode deixar de conter a implícita referência à existência de um qualquer sistema de recursos, ainda que com uma larga margem de conformação do legislador, na sua estruturação, não podendo este, porém, suprimir, em bloco, os tribunais de recurso, abolir genericamente o sistema de recursos nem inviabilizar, na prática, a faculdade de recorrer (cfr. Armindo Ribeiro Mendes, 'Recursos em Processo Civil', 1992, pág. 99/101).
Assim, a existência de três níveis na estruturação dos tribunais judiciais não implica que todas as causas passem por todos eles, mas admitido pelo legislador ordinário o acesso a sucessivos graus de jurisdição, então tal acesso deve basear-se em regras objectivas, respeitando os princípios da proporcionalidade e da igualdade.
No caso em apreço, o direito ao recurso reporta-se ao recurso por oposição de julgados para o Tribunal Pleno do STJ, que está já para além dos três níveis de estruturação dos tribunais judiciais e, no caso concreto, concretiza o terceiro grau de jurisdição. Com efeito, este tipo de recurso é considerado no esquema do CPC como um recurso ordinário, a interpor pela parte vencida e que interrompe o trânsito da decisão recorrida, devendo processar-se em separado e sem efeitos suspensivos.
A questão de constitucionalidade suscitada refere-se apenas a um dos pressupostos do recurso: a exigência de um conflito de jurisprudência consubstanciado em um acórdão-fundamento para o recurso. E é a interpretação do STJ que apenas admite um único acórdão que se considera violadora do direito de recurso.
Mas tal interpretação nem se afigura arbitrária, nem desrazoável ou violadora da proporcionalidade ou igualdade que devem presidir aos critérios objectivos dos recursos.
Na verdade, o recurso em causa é um recurso de fixação de jurisprudência, tendo como núcleo central justificativo a existência de um conflito de decisões concretizado, segundo a norma questionada, no facto de o STJ, no domínio da mesma legislação, ter proferido dois acórdãos que dêem à mesma questão de direito soluções opostas.
É claro que a exigência de indicação de um só acórdão não retira o direito de recurso: ele mantém-se integralmente; nem sequer se pode, em boa verdade, dizer que tal direito seja restringido com tal exigência: se não existe nenhum acórdão com solução oposta à da decisão recorrida, não se verifica o pressuposto do recurso, cujas condições de existência se têm de considerar como contidas dentro dos poderes de conformação do legislador ordinário; se existem vários acórdãos com soluções opostas, em nada se limita o direito ao recurso, exigindo que se indique apenas um desses acórdãos: impõe-se apenas a obrigação do recorrente escolher de entre os acórdãos com soluções opostas o que melhor serve os seus interesses.
Assim, sendo manifesto que a oposição tem de ser alegada, é o recorrente que tem de optar sobre o acórdão a indicar como fundamento do recurso, sob pena de vir a recair sobre o próprio tribunal aquilo que é incumbência da parte recorrente: a demonstração da oposição. Se se admitisse a junção de mais de um acórdão para comprovar a oposição, teria o tribunal de examinar todos quantos fossem indicados, complementando assim, por forma oficiosa, o requerimento de interposição do recurso, para poder decidir a questão da alegada oposição de julgados, não sendo exigível impor ao tribunal tal tarefa, que de alguma forma ultrapassaria os limites do princípio do dispositivo que, no processo em geral, e no processo civil muito em particular, exprime ainda exigências da autonomia da vontade dos particulares e se coaduna com as notas características da função jurisdicional.
Pode, por isso, concluir-se que a indicação de vários acórdãos para demonstrar a existência de oposição, equivale à não identificação de oposição pelo que, em tal hipótese, se tem de considerar como não cumprido o pressuposto de admissibilidade do recurso.
Concluindo, tem-se a interpretação da norma do nº 1 do artigo 763º do CPC feita pelo STJ na decisão recorrida como não violadora do artigo 20º, nº 1 da Constituição, pelo que o recurso tem, nesta parte, de improceder.
III - DECISÃO:
Pelo exposto, decide-se não tomar conhecimento do recurso na parte relativa às normas dos artigos 117º, nº 1 e 122º, nº 4, do CCJ e, quanto à norma do artigo 763º, nº 1, do CPC, na interpretação que exige apenas a indicação de um único acórdão de oposição de julgados, decide-se negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmar o acórdão recorrido.
Lisboa, 20 de Março de 1996 Vitor Nunes de Almeida Armindo Ribeiro Mendes Antero Alves Monteiro Diniz Maria Fernanda Palma Alberto Tavares da Costa José Manuel Cardoso da Costa