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Procº nº 590/97 Rel. Cons. Alves Correia
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
I - Relatório.
1. Por Acórdão de 21 de Dezembro de 1996 do Supremo Tribunal Administrativo, foi negado provimento ao recurso jurisdicional interposto por J... de uma decisão anterior do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa. Pedida a aclaração da decisão do Supremo, foi esta indeferida, bem como o subsequente pedido de rectificação. Interposto recurso para o Tribunal Constitucional do referido Acórdão de 21 de Dezembro de 1995, foi proferido despacho de aperfeiçoamento, nos termos do nº 5 do artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional (Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, na redacção da Lei nº
85/89, de 7 de Setembro), pelo Conselheiro Relator do Supremo Tribunal Administrativo.
Passado o prazo legalmente fixado, foi indeferido o requerimento de interposição do recurso, nos termos do nº 2 do artigo 76º da Lei nº 28/82.
2. Veio então o recorrente alegar justo impedimento, por o envio da documentação, por fax, ter sido impossível dentro do horário de expediente do Supremo Tribunal Administrativo. Em tal documentação arguia nulidades do Acórdão de 21 de Dezembro de 1995 do Supremo Tribunal Administrativo e reclamava para a conferência do despacho de indeferimento do pedido de rectificação sobre ele formulado. Por despacho de 3 de Outubro de 1996 do Conselheiro Relator daquele Supremo Tribunal, decidiu-se não tomar conhecimento de tais requerimentos, por respeitarem a decisões já transitadas.
3. Inconformado, apresentou o recorrente reclamação para a conferência, que, por Acórdão de 21 de Novembro de 1996, desatendeu a reclamação e confirmou o despacho reclamado. De tal decisão apresentou recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo das alíneas b), f) e g) do artigo 70º da Lei nº 28/82, dando 'por reproduzido o indicado em 5 de folhas 207 ou 214', e que a seguir se transcreve:
'5- Dá-se aqui por reproduzido tudo o que foi suscitado nos autos, para todos os efeitos, nos termos do artº 280º, CRP, e, em particular, suscita-se que será inconstitucional, por razões de equidade, qualquer norma ou interpretação da Lei em desconformidade com o sentido Fixado no Acórdão
publicado no Diário da República mencionado e com o Decidido (fls. 171), relativamente à interpretação extensiva da Reclamação para a Conferência ou
(Reclamação) da Arguição de Nulidades como um dos meios previstos nos artºs.
70º/2 e 80º/4, LOFPTC, ainda que nestes o texto registe recurso.
E também não será constitucional, por razões de equidade, a interpretação da Lei ou norma que fundamente a Não Admissão do acto, praticado dois minutos após as 17h00, verificando-se impedimento desde as 16h45 desse dia
(15/7/96), nos termos alegados.
Portanto, tendo em conta o suscitado e em particular a doutrina do Prof. Alberto dos Reis, pede o Provimento desta Reclamação, para Apreciação do pedido em 23/7/96 (ou fax: 15/7/96), aqui dado como reproduzido; Julgando-se verificado o impedimento alegado em 23/7/96 (fls. 195 a 200 ou fax: 16/7/96 - fls. 178 a 184)'.
4. Por despacho de 21 de Janeiro de 1997, do Conselheiro Relator no Supremo Tribunal Administrativo, tal recurso não foi admitido, com fundamento em que a decisão recorrida não formulara qualquer juízo de constitucionalidade ou legalidade, limitando-se a indeferir a reclamação apresentada. Ainda inconformado, veio então o recorrente apresentar reclamação do despacho de indeferimento do recurso, salientando não se conformar 'com a interpretação dos artigos 70º/2 e 80º/4, LOFPTC, dado que no STA foi decidido em conformidade com o Acórdão do TC (...) e, por isso, há tempestividade para efeitos da Aplicação do previsto naqueles artigos'.
5. No Parecer do Exmº Procurador-Geral Adjunto em funções neste Tribunal sublinha-se a manifesta improcedência da reclamação, desde logo por não ter suscitado, 'de forma minimamente intelegível, qualquer questão de inconstitu- cionalidade normativa (...), o que, sem mais, conduz à inadmissibilidade legal do recurso de fiscalização concreta interposto'.
6. Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
7. Do relato resulta que foram sucessivamente apresentados:
- um recurso para o Tribunal Constitucional do Acórdão de 21 de Dezembro de 1995 do Supremo Tribunal Administrativo;
- um recurso para o Tribunal Constitucional do Acórdão de 21 de Novembro de 1996 do Supremo Tribunal Administrativo;
- uma reclamação do despacho que neste último Tribunal indeferiu o recurso interposto do referido Acórdão de 21 de Novembro de 1996.
O primeiro recurso, que não foi admitido por incumprimento do despacho de aperfeiçoamento, ficou definitivamente afastado nos termos do nº 2 do artigo 76º da Lei nº 23/82.
O segundo recurso, cujas normas a sindicar não foram claramente identificadas, é o que se pretende fazer prevalecer com a presente reclamação - que, como se viu, aponta, aparentemente, como objecto de controlo, as normas dos artigos 70º/2 e 80º/4 da Lei do Tribunal Constitucional.
8. Uma vez que o recurso interposto para o Tribunal Constitucional do Acórdão de 21 de Novembro de 1996 do Supremo Tribunal Administrativo se fundava nas alíneas b), f) e g) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, necessário seria que se verificassem os seus respectivos pressupostos. Como, manifestamente, as hipóteses normativas das alíneas f) e g) não têm aplicação possível ao caso - aliás, o Parecer do Exmº Procurador-Geral Adjunto considera a sua invocação 'perfeitamente absurda' -, só há que curar da verificação dos requisitos do recurso previsto na alínea b) do referido normativo, os quais, como é consabido, incluem, designadamente:
a) a suscitação, durante o processo, da inconstitucionalidade das normas a apreciar pelo Tribunal;
b) a aplicação de tais normas na decisão recorrida;
c) a impossibilidade de lançar mão de recursos ordinários em relação
à decisão impugnada.
A mais disso, é ónus do recorrente suscitar de forma adequada - isto
é, de forma clara e perceptível - as questões de inconstitucionalidade que pretende ver apreciadas. A esse propósito escreveu-se no Acórdão nº 269/94
(publicado no Diário da República, II Série, de 18 de Junho de 1994):
'Suscitar a inconstitucionalidade de uma norma jurídica é fazê-lo de modo tal que o tribunal perante o qual a questão é colocada saiba que tem uma questão de constitucionalidade determinada para decidir. Isto reclama, obviamente, que - como já se disse - tal se faça de modo claro e perceptível, identificando a norma (ou um segmento dela ou uma dada interpretação da mesma), que (no entender de quem suscita essa questão) viola a Constituição; e reclama, bem assim, que se aponte o porquê dessa incompatibilidade com a Lei Fundamental, indicando, ao menos, a norma ou princípio constitucional infringidos'.
9. Ora, no caso dos autos, não houve, como se viu, suscitação, de modo minimamente perceptível, da inconstitu- cionalidade de qualquer norma jurídica durante o processo, isto é, antes da prolação do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de que se pretende recorrer para este Tribunal. Daí que o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 21 de Novembro de 1996 não tenha conhecido, nem expressa, nem implicitamente (nem tinha de conhecer), qualquer questão de inconstitucionalidade.
E isto é quanto basta para se ter de concluir pelo indeferimento da presente reclamação.
III - Decisão.
10. Nos termos e pelos fundamentos expostos, indefere-se a presente reclamação e condena-se o reclamante nas custas, fixando-se, para o efeito, a taxa de justiça em oito Unidades de Conta.
Lisboa, 10 de Fevereiro de 1998 Fernando Alves Correia José de Sousa e Brito Guilherme da Fonseca Messias Bento Bravo Serra Luis Nunes de Almeida