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Proc. nº 507/97
1ª Secção Rel: Cons. Ribeiro Mendes
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. Nos autos à margem identificados, vindos do Tribunal de Relação de Lisboa, em que são recorrentes A..., L... e AA... e recorrida a C..., E.P., em liquidação, o relator elaborou exposição, nos termos do art. 78º-A, nº
1, da Lei do Tribunal Constitucional, em que preconizava a procedência do recurso, considerando a questão de constitucionalidade simples, dada a jurisprudência acerca dela formulada neste Tribunal (a fls. 305 a 314).
2. Os recorrentes manifestaram o seu acordo com o teor da exposição, considerando que o 'sentido e alcance da declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, constante do Acórdão do Tribunal Constitucional nº 162/95, impõe a todos os Tribunais, bem como à Administração Pública, o acatamento e cumprimento da decisão proferida no citado Acórdão', in casu, o pagamento de uma indemnização, 'em consequência da perda dos seus postos de trabalho' (a fls.
316).
3. A recorrida, por seu turno, discordou abertamente do teor da exposição, sustentando a bondade do acórdão recorrido e considerando não ter havido aplicação implícita da norma constante do art. 4º, nº 1, alínea c), do Decreto-Lei nº 137/85, de 3 de Maio. Em sua opinião, os direitos dos autores a uma indemnização acham-se prescritos por força do regime geral da Lei do Contrato Individual de Trabalho, não tendo a declaração de inconstitucionalidade constante do acórdão nº 162/95 (com o sentido e alcance definidos pelo acórdão nº 528/95) a virtualidade de provocar a suspensão ou interrupção da prescrição ou a transferência do início do prazo para a data da sua própria publicação. Nessa medida, a decisão recorrida limitara-se a extrair uma inelutável consequência da cessação factual da relação laboral em 1985 (publicação do Decreto-Lei nº 137/85, de 3 de Maio). A declaração de inconstitucionalidade seria insusceptível de alterar uma situação factual ou, mais rigorosamente, de caducidade, que é similar à de um despedimento ilícito por falta de processo disciplinar. A situação estaria definitivamente esgotada ou exaurida, sendo insusceptível de afectação pela subsequente declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral.
'A qualificação jurídica mais ajustável [segundo a recorrida] ao caso vertente é a caducidade dos contratos de trabalho nos termos gerais de direito, implicando a qualificação jurídica como despedimento colectivo ilegal consequências jurídicas totalmente incompatíveis com a extinção da empresa ope legis' (a fls. 324).
Considerou, por isso, que não deveria tomar-se conhecimento do recurso.
4. As razões invocadas pela recorrida não logram abalar o conteúdo da exposição liminar.
De facto, a recorrida insurge-se, no fundo, contra a declaração da inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, constante do acórdão nº
162/95, passando em claro que não ocorreu jamais qualquer situação exaurida ou esgotada, dada a contestação levada a cabo por grande parte dos trabalhadores da C... através da propositura de numerosas acções, como a presente, que estiveram na origem da jurisprudência referida do Tribunal Constitucional.
Como se escreveu no acórdão nº 513/97 desta 1ª Secção, ainda inédito:
' Com efeito, e independentemente do que vier a ser decidido a final pelo tribunal a quo quanto à definição em concreto dos direitos que poderão ou não assistir aos ora recorrentes, o certo é que a conclusão contida no acórdão recorrido de que «à data da propositura da acção os créditos dos AA. estavam prescritos e por conseguinte extintos, há alguns anos» envolve aplicação pelo menos implícita da norma constante da alínea c) do nº 1 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 137/85, de 3 de Maio, com preterição da declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral dessa norma...'
Ora, não pode aludir-se a uma cessação factual das relações de trabalho entre os recorrentes e uma empresa pública, emanação do Estado, ou a uma caducidade dos contratos de trabalho decorrente da própria extinção da C... resultante do citado Decreto-Lei nº 137/85.
A longa contestação judicial da norma que decretou a caducidade dos contratos de trabalho sem compensação deu origem à corrente jurisprudencial no sentido da inconstitucionalidade que desembocou na invalidação, com força obrigatória geral, dessa norma. A consideração de que os créditos de indemnização estavam prescritos só pode basear-se na licitude constitucional da norma que estabeleceu a caducidade.
5. Termos em que, no essencial pelas razões constantes da exposição do relator e do citado acórdão nº 513/97, decide o Tribunal Constitucional conceder provimento ao recurso, devendo o acórdão recorrido ser reformulado em consonância com a aplicação da declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma do art. 4º, nº 1, alínea c), do Decreto-Lei nº 137/85, de 3 de Maio, constante do acórdão nº
162/95 (publicado no Diário da República, I Série-A, nº 106, de 8 de Maio de
1995), com o sentido explicitado no acórdão nº 528/96 (publicado no Diário da República, II Série, nº 165, de 18 de Julho de 1995).
Lisboa, 11 de Fevereiro de 1998 Armindo Ribeiro Mendes Maria da Assunção Esteves Vitor Nunes de Almeida Maria Fernanda Palma Alberto Tavares da Costa José Manuel Cardoso da Costa