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Proc. nº 157/97
1ª Secção Cons: Rel. Assunção Esteves
Acordam no Tribunal Constitucional:
I. 1. O Tribunal Judicial do Seixal, em sentença de 21 de Novembro de 1992, julgou a acção de alimentos definitivos que M... propôs contra J.... Mas na fórmula decisória da sentença consignou: 'julga-se a presente acção procedente por provada e, consequentemente, absolve-se o réu do pedido'.
A autora interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, que lhe negou provimento, em acordão de 3 de Março de 1994, e depois, para o Supremo Tribunal de Justiça, que também negou provimento ao recurso deste acordão.
Nos dois recursos, a autora debatia a contradição da fórmula decisória da sentença de Iª Instância, com a consideração de que, sendo a acção julgada procedente, o réu não poderia ter sido absolvido do pedido e que isso implicava a nulidade da sentença. E os dois tribunais de recurso trataram a questão, assinalando o erro de escrita manifesto e resolvendo-o através de uma interpretação do sentido global da sentença, que era o sentido da improcedência da acção.
Durante o processo nunca foi suscitada qualquer questão de constitucionalidade.
Na sequência do acordão do Supremo Tribunal de Justiça, de 28 de Maio de 1996, a autora interpôs recurso de constitucionalidade, invocando o artigo 70º, nº 1, alíneas b) e g) da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro. Assim:
'(...) O presente recurso é interposto ao abrigo das alíneas b) e g) do nº 1, do artº 70º da Lei nº 28/82 de 15 de Novembro, com a nova redacção da Lei nº 85/89 de 7 de Setembro.
O inciso 'durante o processo' contido no citado artº 70º não prejudica o presente recurso, pois a suscitação da inconstitucionalidade feita aqui e agora, dado o caso especial dos autos, é relevante e admissível.
Assim, porque o acordão surpresa é recorrível para o Venerando Tribunal Constitucional de Lisboa e a recorrente tem legitimidade e actua em circunstâncias especiais de oportunidade, requer a VV. Exas. se dignem admitir o recurso, o qual tem subida imediata nos próprios autos e com efeito suspensivo, por a deliberação em crise e irreverente para com o instituto do caso julgado, com força jurídica constitucional, causar à requerente prejuízos irreparáveis ou de difícil reparação (artº 740º/3/ do CPC).
O recurso não foi admitido no Supremo Tribunal de Justiça, por despacho do relator , de 2 de Julho de 1996, com o fundamento de que 'a recorrente nunca levantou nos autos a questão da inconstitucionalidade ou da aplicação de alguma norma anteriormente declarada inconstitucional ou ilegal pelo Tribunal Constitucional'.
Depois de deduzida reclamação para a Conferência, a recorrente foi ainda solicitada a indicar a norma constitucional que considerava violada. Veio a identificá-la como sendo 'a do artigo 205º, nº 2, da Constituição, em conjugação com os artigos 666º e 671º do Código de Processo Civil'.
No Tribunal Constitucional, o Ministério Público pronunciou-se no sentido do indeferimento da reclamação.
II. É, na verdade, manifesto, que o recurso de constitucionalidade não pode ser admitido. Ele não satisfaz nem aos pressupostos do artigo 70º, nº
1, alínea b) nem aos da alínea g). A questão não foi suscitada nunca durante o processo como o requer a primeira, nem desrespeita qualquer julgamento de inconstitucionalidade anterior [que tão pouco é identificado] pelo Tribunal Constitucional, como o requer a segunda. E não vale aqui o argumento 'surpresa' que concretiza uma via excepcional para o conhecimento do recurso de constitucionalidade, mesmo quando a questão não é suscitada durante o processo. O acordão recorrido do Supremo Tribunal de Justiça tratou do mesmo modo que a Relação o único tema que vinha sendo objecto do debate. Não configura, de modo algum, uma decisão surpresa.
Assim, não se verificam os pressupostos do recurso de constitucionalidade, do que se prevê na alínea b) nem do que se prevê na alínea g), da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro.
III. Nestes termos, decide-se indeferir a reclamação. Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em seis Ucs.
Lisboa, 4 de Março de 1998 Maria da Assunção Esteves Vitor Nunes de Almeida Alberto Tavares da Costa Armindo Ribeiro Mendes José Manuel Cardoso da Costa